Mudando fragmentos da verdadeira história, Hiver encontrou El e logo contou sua descoberta. Por um momento ela ficou pasma, imóvel e incrédula. Balbuciava algumas palavras enquanto processava a informação que lhe fora contada, até que finalmente assentiu. No fundo estava feliz por seu amigo ter descoberto sem demora como destruir aquele lugar maldito, entretanto estava desconfiada, já que não vira nem sentira a presença da outra boneca.
Já estavam nas grades vivas da prisão quando por reflexo de curiosidade a garota olhou para o homem que ainda segurava sua mão firmemente, sua alma estava mudada ? isso ela já tinha reparado, dês da vez que ele matou o palhaço sua alma mudou pouco a pouco -, estava mais obscura que o normal. Enquanto apressadamente era puxada pelo outro, ela se perguntava o que passava pela cabeça de Hiver, quais sentimentos estavam tomando ele pouco a pouco. Quando estavam chegando aos pés do salgueiro, as pequenas criaturas voadoras, antes inofensivas, soltaram um grito agudo e cortante ao verem El. Voaram na direção deles dando rasantes e cortando a pele com as garras. Hiver foi ferido no olho e se abaixou tentando proteger o que restou do olho ferido, juntamente protegendo o olho saudável.
A boneca foi brutalmente atacada pelas criaturinhas, seus membros foram arranhados e deles como nunca antes, brotou um liquido avermelhado e mal cheiroso. Ela não quebrou como o de costume, apenas sangrou e seu sangue foi rapidamente absorvido pela terra. Gritando apavorada, ela olhava o liquido em suas mãos. Passou a mão nos cabelos, fechando as mãos e puxando os fios. Seus olhos estavam arregalados, o preto dos seus olhos perdeu o costumeiro brilho. Novamente ela estava enlouquecendo.
No que teria se tornado? Ficar por muito tempo no mundo dos homens teria a transformado em um deles?
Estendida sobre a terra, viu seus atacantes voarem em volta dela, porém sem atacá-la. Faziam um som irritante com as asas, juntamente com o canto melancólico.
?Morrendo onde os anjos gritam. Ninguém pode te ouvir, ninguém pode te ver. Nesse Jardim barrento, não há mais nada para se ver, não há nada para sentir. Não restou mais nada.?
Por fim elas riram e caíram mortas no chão, de suas bocas saia uma gosma vermelha e fedorenta. De seus olhos pequenas rachaduras apareceram, cresceram por toda a extensão dos corpos. Ao longe em meio à bruma, podia-se ver o cabeça de cabra com o braço direito estendido e levantado. O sangue do olho ferido escorria pelo seu rosto, descendo pelo pescoço e sujando sua roupa.
- Óh El. ? ele lamentou ? Perdoe-me, olhe para tu, olhe teu estado. ? abaixando-se e pegando a boneca do colo, ele olhou tristonho para ela. Não desejava sofrimento, mas e o sacrifício? Ela ainda era o sacrifício, porém a bipolaridade do homem não o deixava executar seu plano sem sentir remorso. ? Vamos embora daqui. ? concluiu, já estava feito o que era preciso. Agora só restava a eles esperar.
E ela a ele respondeu. ? Não posso ir, não acabei.
- Sim, acabou. ? censurou.
Assim que colocaram os pés para fora daquele lugar magicamente amaldiçoado, o Grande Salgueiro rompeu. Quebrando das raízes até os galhos mais altos ele foi morrendo pouco a pouco, as folhas caíram, a cortiça soltou por inteira. Por ter sugado o sangue envenenado o salgueiro apodreceu. Apenas o sangue de alguma boneca que viveu no Jardim seria capaz de matar a planta, nada mais, nem o mais forte feitiço era capaz de tal façanha. Igual os galhos, o céu passou a desabar, pedaço por pedaço. Quebrando a terra que já rachava e levantava. O próprio Jardim estava aos poucos se matando e sugando o que restava. Um vórtice se formou, misturando tudo. O salgueiro estava no centro do turbilhão, seus restos eram arrancados sem piedade sendo possível ouvir a árvore grunhir. Em um piscar de olhos, o vórtice explodiu e dessa explosão nada restou. Onde ficava o jardim sobrou apenas um terreno vazio e encoberto pela bruma.
Atrás deles, Elyse os seguia. Escapou por pouco da destruição e viu naquele estranho homem a salvação. Já imaginava o que ele tinha feito, as palavras por ele faladas mais cedo denunciou o fascínio dele por ela. Resolvera tomar como sacrifício a que com ele caminhava, e não a estranha e melancólica boneca que lhe era estranha. Pré supôs que a outra não sabia da verdade. Verdade tão fácil de manipular nas horas de desespero.
- Ufufufufu então esse seria o mundo deles, tão tolos. ? vitoriosa, a boneca concluiu seus pensamentos. Bem diferente de El, esta ainda estava com as roupas intactas e a aparência melhor do que nunca. Seus olhos não mais transbordavam sangue, já que usando que alguma magia Hiver fez com que o liquido para-se no corpo de boneca de cabelos negros. Elyse então passou a mão nas bochechas e sorriu fascinada com tamanho poder, estava grata pelo fim do tormento. ? Preciso agradecer.
Segui-os pela estrada de pedra tomando cuidado para não ser vista, não por Hiver que já sabia de sua presença, mas por El que estava fraca demais para senti-la ali. Eles caminharam até uma estranha floresta, dessa floresta passaram perto do vilarejo e de lá rumaram para onde tiveram seu primeiro encontro.