The Game

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    Capítulo 19

    Reflexo da Bruma.

    Lá estavam os dois em um dos limites do Jardim das Ilusões. O lugar estava totalmente mudado, destruído. Os gramados verdes deram lugar a lagos de musgo, as árvores perderam as folhas e o que restou ficou podre ? assim como os troncos -, o céu estava escuro, avermelhado e com uma grande rachadura. Não tinha nenhum sinal de vida ali, nem mesmo as ilusões pareciam estar ali. O antigo aroma refrescante e calmante ficou ácido, como o cheiro de coisa estragada, cheiro de corpos mortos.

    - Hiver...

    - Se pensas que fiz algo, estais enganada.

    Os dois andaram olhando em volta, a procura de algo, mas nada acharam. Onde estaria aquela estranha boneca dos sonhos de El? Ela parecia esperta demais para ter morrido, ou ter perdido as forças. Mas a questão que ambos procuravam resposta era o que estava matando o Jardim. Algo sobrenatural bem mais forte que o próprio Hiver deveria ser o autor daquilo.

    Ao longe eles avistaram uma planta estranha, formava uma gaiola viva. Ao chegarem mais próximo viram que aquilo se tratava de uma roseira. Os galhos ainda verdes eram suas grades, os espinhos os guardas da prisão, as flores seu alimento e as raízes meras serviçais. Criaturas ? eram pequenas, tinham os cabelos longos e vestiam uma túnica - que lembravam anjos de asas negras voaram em volta de algo. Ali o próprio Jardim aprisionou o Grande Salgueiro, tal árvore era responsável pela criação de um fruto que dava a imortalidade. Por causa disso, o simples observar e chegar perto eram proibidos. Todo o Jardim era uma forma de vida pensante e para seu próprio bem, tomava decisões cruéis.

    O prisioneiro dormia em seu longo e tranquilo sono.

    - Creio que seja melhor tu aguardar longe daqui. ? o cabeça de cabra sugeriu esticando o braço e impedindo El de continuar. ? Procure por alguém, se é que ainda tem alguém aqui.

    ?Tem, eu sinto que tem? a boneca respondeu mentalmente enquanto concordava e ia embora.

    Hiver continuou adentrando na prisão. Sua pele foi rasgada pelos competentes guardas, porém aquilo não foi problema. Falando algumas palavras mágicas a planta começou a queimar, por ser algo resistente ela não cedeu de primeira. Então ele aumentou o calor do fogo, ficou tão quente que o próprio ferro derreteria. As rosas vermelhas foram tomando a tonalidade de um vermelho mais escuro, por fim ficando pretas e virando pó.

    Lá dentro em volta do enorme salgueiro estavam várias árvores mortas, suas energias vitais foram sugadas. O homem logo concluiu que a resposta para tudo aquilo era porque a árvore estava sugando a vida do Jardim.

    - Essa árvore não cria frutos... ? ele murmurou para si mesmo.

    Uma estranha bruma pairava sobre o solo dançando aos movimentos do vento, quanto mais próximo a árvore, mais densa era. Apenas os borrados das árvores mortas podiam ser vistas ao longe, até uma figura aparecer atrás de uma delas. Uma silhueta feminina usando um vestido negro escondia-se atrás de uma das árvores. Seus olhos vermelhos cintilavam e Hiver logo a notou ali.

    - Minha querida, tu és capaz de ouvir-me? ? ele estava sendo mais cortês que o de costume, queria se aproximar sem espantar. ? Nesse Jardim de Ilusões?

    Ela não respondeu, mas pensando alto demais deixou escapar seu nome. Os sentimentos ali se transformavam em figuras, e dessas figuras nasciam às ilusões. Aquela menina criou três apenas com o sentimento de dúvida, curiosidade e medo. As novas figuras não tinham formas e por isso eram apenas sombras que a rodeavam.

    - Sei que se esconde Boneca de Olhos de Vidro. ? ele se aproximou mais, semicerrando os olhos ? Sei que esta atrás dessas árvores mortas. ? concluiu.

    A boneca timidamente mostrou-se, saiu devagar de trás de uma árvore. A palma de sua mão vacilante em soltar, finalmente largou o débil tronco. Ela tinha o olhar turvo, estava quase em transe. Os olhos transparentes eram chamativos, sua beleza cativante, entretanto perigosa. Ela andou devagar na direção do homem e, este encontrava imóvel maravilhado com a visão. Aquela boneca era mais delicada e bonita que El. Ele foi ao encontro dela, esticando a mão para poder tocá-la e por um momento nos olhos dela viu o reflexo da sua mãe. Ficando mais perto, não se assustou com o liquido carmesim que escorria dos olhos da boneca, de seu olhar mais profundo. Por um estante ele sentiu seu coração e seu corpo serem destruídos, pedaço por pedaço, apenas por causa daquele olhar.

    Hiver balançou a cabeça voltando a si.

    - Hey minha bela, tu pode ouvir-me? ? a voz dele era vacilante, um sussurro quando não apenas o mexer de seus lábios ? Nesse deserto de pensamentos?

    Escondida em meio à névoa, escondida em suas ilusões a boneca correu para longe. Seus cabelos brancos balançavam graciosamente e seu vestido negro foi sumindo em meio à bruma. Após isso, Hiver finalmente desviou sua atenção para o Salgueiro.

    - Então. ? ele sorriu de canto.

    Desviou seu caminhar para a direção da árvore, sentindo a força vital que emanava dela. Sentindo o miasma que se misturava a pálida bruma. O salgueiro pulsava, estava forte e cheio de vida e conseguiu isso sugando cada gota de felicidade daquele lugar, cada gota de sangue ou sonho. Pequenas esferas marrons caiam da árvore, chegando ao solo já podre. Aqueles eram os tais frutos da imortalidade que qualquer morador do Jardim um dia já ouviu falar. Laurant levantou uma das mãos conseguindo pegar um desses frutos, analisou e apertou em meio os dedos vendo que não era resistente e soltava um suco esverdeado.

    - Tudo é um jogo afinal, jogamos por nossos ideais, essa árvore joga por sua vida. ? concluiu suspirando e jogando o fruto fora. ? Tu és mais poderosa que eu. ? comentou em voz baixa ? Sei que pode me ouvir!

    Em resposta recebeu um sussurrar incompreensível.

    - Como desejas morrer...? Ah ela tem a resposta... Como queres me matar...? Ah ela sabe como...

    - Quem? ? Hiver indagou impaciente afinal, não gostava ser forçado a entender como a mente de alguém ou de alguma coisa funcionava.

    - Pergunte a sua alma...

    ?El!? ele pensou e em seguida correu dali em busca da pequena companheira, era de se suspeitar que nem mesmo ela sabia que tinha a chave para a destruição do Jardim.


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