O sol logo lhes abandonaria, e ainda faltava um pouco mais até o dojo Kamiya. Na frente, Aoshi Shinomori seguia sem pausas, sério e indiferente. Carregava as coisas dele e as de Misao, e mesmo assim, não se queixava por desgaste, nem por estar seguindo em uma viagem da qual poderia ter evitado. Na verdade não dizia coisa alguma, mantendo seu espírito calmo e pacífico, assim como havia feito desde sua luta com Kenshin Himura, tempos atrás. Misao, no entanto, seguia logo atrás, já exausta e reclamando até mesmo das pedras em seu caminho.
- Senhor Aoshi...Senhor Aoooshiii... - dizia ela, com uma expressão forçada de criança manhosa - Senhor Aoshi! Estou cansada! Vamos parar em algum lugar para descansar... estou com fome também, e o senhor comeu os últimos bolinhos que tinhamos, lembra?
- De fato comi os últimos. Pelas minhas contas, você comeu os primeiros doze, enquanto fiquei com os últimos quatro. - disse Aoshi, sem olhar para trás, de onde Misao se escondia cabisbaixa de vergonha.
- Desculpe, é que... - disse ela um tanto atrapalhada - O senhor viaja por todo esse caminho comigo sem dizer nada, ai eu fico nervosa e... quando fico nervosa me dá fome e... enfim, deixamos Kyoto já tem um tempão, e o senhor também nem avisa se está com fome ou se quer descansar... Não na verdade o senhor parece nunca precisar descansar e...
Um olhar bastou para que Aoshi calasse a garota. Virou-se novamente e continuou caminhando pela estrada que seguia até Edo. Agora começava realmente a escurecer, e Misao sentiu o incômodo abraço do frio que a rodeava. Percebendo isso, Aoshi retirou sua capa e a deixou cair levemente sobre os ombros de Misao. A garota sorriu satisfeita, por conseguir retirar uma gentileza de seu amado. Deixou as reclamações de lado e seguiu junto a Aoshi, que não olhava nada além da linha do horizonte a sua frente, até que disse:
- Não falta muito, e quando chegarmos poderá desfrutar da hospitalidade de Kaoru Kamiya como sempre faz. Se pararmos agora, chegaremos tarde demais. Seria indelicado de nossa parte.
- É verdade... - disse Misao, puxando mais a enorme capa em volta do corpo - Agora Kaoru tem alunos de verdade, não apenas aquele pivete do yahiko... O dojo deve abrir bem cedo, então ela tem que descansar...
Nada mais foi dito até chegarem a Edo. Sobre tudo, Aoshi pressentia algo enquanto atravessavam uma trilha por entre a floresta. Sempre usava aquela trilha para cortar caminho, mas era a primeira vez que tinha aquela sensação, como se a floresta respirasse. Poderia ser qualquer coisa, animais a espreita, homens esperando para saquear quem quer que estivesse passando. Poderia não ser nada, mas no treinamento de Aoshi para se tornar o Okashira da Onimitsu Oniwabanshuu, era indispensável acima de tudo, prevalecer o ceticismo absoluto, de modo que não fosse nunca surpreendido.
Por esta razão, manteve a mão bem firme na empunhadura de uma de suas novas Kodachis, feitas pelo velho ferreiro da Oniwabanshuu, amigo de Okina que já havia se aposentado no ramo das armas, mas após longos meses de procura, foi encontrado pela equipe do Aoiya e concordou em restaurar e modificar as espadas curtas como forma de pagar um favor ao velho Okina.
O tamanho era o mesmo, as espadas eram agora ligeiramente mais pesadas, embora isso lhes conferisse resistência fora do comum, e o poder destrutivo aumentara consideravelmente em relação as antigas. O que quer que pudesse surgir daquela escura floresta, não poderia vencer as kodachis que cortam até mesmo o aço.
- Senhor Aoshi... - disse Misao, quando enfim avistaram o Dojo - Acha que está tudo bem por lá?
Aoshi limitou-se a baixar a cabeça, em tom de indiferênça.