Estou levando os saleiros de mesa em mesa com bandeja, quando os primeiros clientes começam a chegar.
Claro que, com a sorte que tenho, o turno está mais movimentado que de costume, logo hoje quando eu precisava de certa calma. Vejo mamãe servindo café para um homem elegante de cabelos grisalhos, pele bronzeada e dentes perfeitos. Presumo que seja Mitchell , da emissora de tevê. Ele está usando uma blusa de lã azul-escura e calça cinza muito bem passada, alem de sapatos marrons novos, fazendo com que se destaque do grupo de caminhoneiros e turistas ao seu redor.
Quando mamãe se vira e faz um sinal para min, percebo que estou parada no meio da lanchonete,encarando-os, Respiro fundo e dou um passo á frente, indo em sua direção, e sorrindo.
-Hinamori, quero que conheça Mitchell , do canto da comedia.
Estando a mão para cumprimenta-lo.
- como vai?
O aperto de mão dele é firme e ele dá um sorriso que me faz relaxar um pouco. Depois aponta o banco do outro lado da mesa, cujo estofamento esta rasgado e preso com fita colante transparente, me lembrando da importância dessa reunião.
- Por favor , sente-seHinamori.
- Vou deixa-los a sós para conversarem ? mamãe diz e se afasta.
Sento-me no banco gelado de vinil.
- Então, Sr. Mitchell, conte-me sobre essa competição de dança de salão.
- Pode apenas me chamar de Mitch ? Ele diz antes de tomar um gole de café.
- Você assiste ao canto da comedia,Hinamori?
- quase não assinto tevê.- O que não deixa de ser verdade , e omito o fato de não gostar da maior parte dos programas.
- Mas mia Irma é um grande fã ? acrescento, tentando me lembrar de algumas palavras que ela disse ontem á noite.
- Ela aprecia as sátiras políticas e as ... hum.. parodias da cultura pop.
Olho-o com seriedade e percebo que ele aperta os lábios.
-? Será que pronunciei algum palavra errada??
- Eu disse algo engraçado?
- Não, não ? ele me garante com um sorriso. ? Eu só estava apreciando seu sotaque . Adoro com você alonga as silabas das palavras.
- Eu faço isso ?. ? eu o pergunto.
- Você faaaz. ? ele ri.
- Vocês do norte do pais adoram caçoar do modo como falamos.
Acham que só porque temos sotaque somos inferiores.
- Não estou caçoando, Hinamori. Gosto do seu sotaque . Há um grande diferença.
- Está bem .- Dou de ombros. ?Não estou ofendida.
- Não quis ofende-la. Sabe , no canto da comedia, a brincamos com tudo, ás vezes apenas para nos divertirmos, ou para provarmos algo. Dançando em Kyoko Deve ser uma parodia dos reality Shows, e a loucura que está dominando nossa cultura. Mas você precisa estar disposta a rir de si mesma Também.
- Entendo.
- Claro, haverá humor, e talvez você possa ate mostrar a nossa audiência algo sobre Kyoko. Nunca se sabe..Bem eu sei que nós vamos dançar muito mal, faço que sim com a cabeça, como se concordasse com ele.
Imagino Kukai e Rima Rodopiando pelo salão de dança e tenho de me conter para não rir. Por sorte, ele está abrindo uma pasta de couro e não percebe a minha luta interior.
- Aqui está um dossiê com as informações para você. Por favor, leia com cuidado. Precisarei que me devolva tudo assinado dentro de trinta e seis Horas. Esperamos começar os ensaios até o fim de semana. Temos um equipe no Acampamento Rabbit Run preparando tudo.
- Isso não está acontecendo rápido demais ?
- Sim , mas precisamos levar ao ar este programa enquanto esta moda de dança de salão ainda está em, alta.- Ele me encara com seus penetrantes olhos azuis .
- Você quer mesmo fazer isso, não quer Hinamori?
- Sim ! E por favor , me chame Amu. Mamãe é a única que me chama de Hinamori, a não ser Ami, quando quer me irritar.
Ele sorri .
- Sua Irma é um jovem talentosa. Sua redação me fez rir muito.
- Mesmo? Ami e sempre tão reservado..
- Bem, então ela tem um talento secreto. Com um pouco de treinamento, posso ver um futuro para ela no nosso meio.
?Nossa. Quem diria ? Claro que mamãe e eu estamos sempre tão ocupadas com lanchonete que a vida tem passado quase despercebida por nós , inclusive a infância de Ami.?
- Você esta bem, Amu? ? Ele coloca a xícara sobre a mesa e me olha , preocupado.
- Devo admitir que tudo isso é um pouco assustador , mas por pergunta?
- Me parece , por um momento, que você tinha o peso do mundo sobre suas costas.
Dou de ombros, e fico um pouco irritada por um estranho conseguir me entender tão facilmente.
- Se está preocupada com sua mãe, bem , ela parece capaz de lidar com as coisas em sua ausência. ? ele estica o braço e dá tapinhas sobre a minha mão .
- Vai ser uma aventura emocionante, Amu .Absorva tudo isso e divirta-se.
- Está bem ? Respondo com um sorriso.
Michell conseguiu me acalmar e me deixar ansiosa por essa loucura em que me envolvi.
- está pronta para toda a agitação, Amu ?
?Sinto um arrepio de ansiedade e me seguro na borda da mesa. Ami tinha razão quando disse que minha vida estava numa rotina . Mas estou prestes a sair do buraco em que me escondi.?
- Acho que sim.
- Que bom. Leia o dossiê com cuidado . Haverá um reunião de orientação esta noite, no acampamento, mas você pode se mudar ainda esta manha e ajeitar suas coisas.
- Hoje? ? um milhão de perguntas surgem em minha mente, mas nem sei por onde começar, então apenas pisco os olhos , tentando me controlar.
- Se você quiser. Mas esteja lá para a reunião. Os instrutores chegarão amanha á tarde.
- Bom.... bom .- sorrio, mesmo sentindo o estomago saltar. ? É melhor eu começar a fazer as malas, então.
Levanto-me do banco . Ele educadamente se levanta também e me estende a mão.
- Nos veremos á noite , Amu .
Quando paro no ultimo sinal vermelho, no limite da cidade, olho para trás no espelho retrovisor. É estranho sair da cidade em vez de estar trabalhando na lanchonete. Me sinto um pouco culpada, com se estivesse fazendo algo errado.
Embora eu estivesse disposta a ficar e terminar meu turno, mamãe insistiu para que eu subisse e arrumasse as malas.
Tentei argumentar , mas quando mamãe mete um coisa na cabeça, é impossível fazê-la mudar de ideia.
Sem saber exatamente o que precisaria levar, empacotei quase tudo que possuo. Agora minhas malas estão escorregando de um lado para o outro na caçamba da caminhonete. Ainda bem que tenho uma lona para cobri-la, pós parece que pode chuver , ou até mesmo nevar. Já estamos no final de Novembro , e a primei vera se aproxima , mas nesta região, o tempo é imprevisível.
A caminhonete sobe a estrada íngreme e sinuosa como um cavalo velho, parando aqui ali , fazendo barulho estranhos e deixando bem claro o quanto , é difícil para ela se movimenta.Finalmente chego ao alto da montanha onde esta localizado o Rabbit Run , numa clareira rodeada por pinheiros altos , o lugar serve de acampamento de férias no verão,portanto passei muitas semanas agradáveis aqui durante minha infância , e conheço o local como a palma da minha mão.
Tirando o pensamento assustador da minha mente, estaciono perto da entrada. Rústico e antigo , a sede do acampamento se integra á floresta ao redor como se estivesse ali desde o começo dos tempo.Me lembro que há uma varanda enorme nos fundos, que dá para vale. Á Esquerda fica um lago onde eu costumava pescar e nadar . Me apoio sobre o volante, tentando absorver tudo e pensando que jamais poderia ter imaginado vir este lugar aprender dança de salão para um programa de tevê. Finalmente , reúno coragem para abrir a porta do carro e descer . A brisa gelada agita meus cabelos e me faz sentir o cheiro de terra úmida e pinheiros. Respiro com calma , absorvendo o aroma e tentando sossegar mais nervos enquanto caminho em direção á porta. Alguns carros e caminhonetes já estão estacionados por ali, então acredito não ser a única participante a ter chegado.
Quando finalmente me acalmo, abro a porta dupla do prédio e sou obrigada a parar onde estou.E um vaivém constante, gente pendurando lustres, empurrando carrinhos com mantimentos e garrafas de água.No fundo do recinto fica o refeitório, cujo piso de madeira esta sendo encerado por uma equipe especializada. Alguém carregando um enorme arranjo de flores esbarra na minhas costas, pede desculpas e continua seu caminho. Outro grita ordens , e embora a cena pareça de caos extremo, imagino que logo o Rabbit Run estará completamente transformado.
Embora eu esteja , no caminho dos trabalhadores, eles parecem não me ver , nem reparar na minha presença. Gostaria muito de encontrar meu quarto, levar minhas malas ate lá e ler o dossiê que recebi, mas nem sei a quem pedir informação.
Olho ao redor , tentado encontrar Michell , quando dou de cara com Nadeshiko . Ela não parece tao perdida quando eu. Esta andando animadamente como a líder de torcida que foi, com seus cabelos roxos lisos e um sorriso de orelha a orelha.