Já era tarde da noite no pequeno e remoto bairro de Shelton, em Londres, Inglaterra, não havia mais ninguém nas ruas frias e um pouco cobertas por neve, devido ao forte inverno que ali estava presente. As ruas eram pouco iluminadas, a circulação de pessoas sempre terminava quase que as dez da noite, em ponto, achavam, as pessoas do bairro, um lugar um tanto perigoso, pois ali habitavam muitas crianças. Mas também pareciam não se preocupar tanto, pois, não eram muitos os que ligavam para as subprefeituras para resolver o problema da iluminação... Não costumava mesmo passar alguém ali a altas horas da noite. Exceto uma pessoa. Era uma fria noite de inverno, dezembro, dia vinte e cinco. O natal de Londres estava quase chegando ao fim, e ali estava ela. Uma garota alta, bonita, aparentando uns dezessete ou dezoito anos, estava a passos curtos, sem nenhuma pressa. Seus azul-esverdeados olhos, opacos devido a pouca claridade e, também, devido a grande quantidade de delineador preto que usava no contorno deles, brilhavam fracamente diante as meras luzes. Uma sombra negra pintava suas pálpebras e podia notar-se um leve toque rosado em suas maças do rosto. Seus lábios eram negros, devido ao batom muito escuro que usava. Tinha uma pele quase pálida, se olhasse direito, seus cabelos eram bem longos, muito lisos e preto-azulados, mas nessa noite, estavam cobertos por um capuz. A garota segurava um skate na mão direita, o que dava sempre a entender que estava a voltar de uma pista de skate local, um tanto longe da casa da garota, mas também a mais perto. Usava um blusão preto com capuz e uma calça larga do exercito, usava também um ?All Star? preto. Pelo bairro, a chamavam de ?A Revoltada Stapp? ou até de ?Aquela Que Nunca Foi Tocada? (isso, realmente, não a incomodava), isso porque era muito difícil de alguém chegar perto dela... Era uma menina muito séria, com aspecto de ?não enche?, não falava muito e não tinha amigos. Gostava muito de se isolar pelos cantos e ler alguns livros de magia negra, o que gerava muitos comentários, a maioria, maldosos, mas nada que a impedisse de fazê-lo.
Andava devagar, realmente parecia não ter pressa. Quase onze e meia e estava ela lá, ainda um pouco longe de casa, pensativa, olhando sempre para os lados, tentando imaginar como as pessoas conseguem sorrir... Pensava isso porque jamais conhecera os pais verdadeiros, ou pelo menos, nunca se lembrou deles. Desde seus sete anos de idade viveu com pais adotivos, que nunca a amaram. A garota nunca soube o porquê. Fugiu de casa com quatorze anos e passou a morar numa casinha simples, porém grande, em Shelton, que comprou com uma estranha herança que recebera uma vez, de alguém desconhecido. Jennyffer Stapp é uma garota, a principio, estranha e que, geralmente, gosta de se meter em brigas. Jenny, como é falada por aí, mesmo sem conhecer ninguém, é aquela com quem muitos gostariam de estar, mas lhe falta coragem para, pelo menos, admitir isso...
Ø Capítulo Um ? Pupilas Verticais
Jennyffer havia se esquecido, mas tinha uma prova no cursinho que fazia pela manhã (o que a garota achava incrível, um dia depois do Natal, justo o seu cursinho ia dar prova...), acabara por não estudar durante o dia, saíra logo cedo de casa e fora dar uma volta, voltando somente agora.
-Droga, esqueci da prova... ?disse a garota, trancando a porta, encostando o skate na parede, perto da porta, e colocando a chave na mesinha de centro da sala de estar, jogando-se em seguida no sofá e tirando as roupas pesadas.
Várias pessoas do bairro se perguntam: ?como uma garotinha conseguiu uma casa tão fácil??, e então quem mora a mais tempo no lugar, responde que a casa era amaldiçoada e por isso venderam-na, por telefone, sem saber quem era e por um preço muito barato. Jennyffer nunca ligou para isso. Vive a bastante tempo na casa e não quer saber de onde ela veio.
Na mesma mesinha onde colocara a chave, pegou o controle remoto da televisão e ligou a mesma, onde passava um noticiário:
-...estamos com nossa repórter, Cameron Sandler, no local do acidente...
Rumou para a cozinha, estava morta de sede, enquanto isso, ouvia a notícia, sem se abalar.
-...Sam, o atropelamento aconteceu agora pouco, aqui perto dos nossos estúdios... parece que o garoto que foi atropelado não sofrera danos graves...
Andou novamente até a sala, bebendo um grande copo d?água, e sentou-se no sofá, ainda sem se concentrar na tevê.
-...não parece ter mais que dezesseis anos e está aqui, vivo, sofrera apenas um pequeno corte no rosto... Vamos ver se ele nos dá uma palavrinha!...
-Bando de idiotas, calem a boca! ?no mesmo momento que o garoto do acidente ia falar alguma coisa, Jennyffer desligou a televisão e resolveu ligar o som. Nele já havia três cds, um da banda ?Rhapsody?, um da banda ?Creed?, que era a sua favorita, mesmo tendo chegado ao fim há alguns meses, e um cd da banda ?Blind Guardian?, que foi o que ela escolheu para ouvir, colocando, num volume alto ?não estava nem aí com o barulho?, a música ?I?m Alive?.
Na manhã seguinte, acordara com o sol batendo em seu rosto.
-Ah, não acredito...
Pelo jeito que reclamara, estava atrasada para o cursinho e justo em dia de prova, parecia que isso sempre a perseguia.
Vestiu-se rapidamente (uma calça folgada, preta, camiseta de manga longa da banda ?Creed? e o ?All Star? preto, de sempre, já não estava mais tão frio) e também se maquilou, em seguida puxou o cabelo todo para trás e prendeu-o num rabo-de-cavalo. Eram quase oito da manha quando Jennyffer saiu as pressas de casa. Sua prova começaria às oito e quarenta e cinco e o lugar onde fazia o curso não era tão perto assim de sua casa... Para tentar ganhar tempo, a garota usou seu skate, mas mesmo assim, não chegou no horário.
-Senhorita Stapp, está atrasada... A prova começou faz dez minutos! Mas...
-?...como sou um cara legal, vou deixar você entrar...?, é eu já sei...
Era um rapaz com aparência de novo, mas não devia ter menos de vinte e cinco anos, mantinha os castanhos cabelos sempre bagunçados, com a ajuda de um gelzinho, tinha olhos castanhos e um tanto sedutores, mas, para Jennyffer, aqueles olhos não passavam de olhos de tarado. A garota sabia que ele era louco para ?pegá-la? qualquer dia desses...
A garota fora quase a última a terminar a prova, mas não porque tinha notas ruins ou porque não tinha estudado na noite passada, mas sim porque teve breves momentos em que começara a pensar em coisas que não tinha vontade de pensar antes. Onde estariam seus pais? Quem realmente foram? A garota parecia ter realmente acordado só depois que, na hora que estava saindo, o professor, Thomas J. Hawkson, a chamou:
-Jennyffer... Tem um minuto?
-Claro... Senhor Hawkson! ?a garota parecia sorrir ironicamente para o professor, até parece que não sabia o que ele queria.
-Pode me chamar de Thomas, Jennyffer, já lhe disse isso... ?o professor lhe sorria, parecendo ser nobre e gentil, para Jenny aquilo era pura piada. -...andei pensando e acho que deveria ir tomar um café comigo, não? O que acha?
Jennyffer riu. A expressão de ironia estava muito clara em seu rosto.
-Já é quinta vez que me chama, sabia?
-Nossa, sério? ?riu o professor, como se não soubesse ?E você recusou quatro vezes, se não estou errado!
-Exato! E vou recusar a quinta! -piscou, ainda de forma irônica- Até ano que vem... Senhor Hawkson... Se eu passar! ?e saiu andando, rindo ironicamente da cara de Thomas. Esse pareceu não se importar, e voltou a arrumar algumas pastas, balançando negativamente a cabeça.
Jennyffer saiu andando, tranqüilamente, e olhando a movimentação ao seu redor. Os pensamentos sobre seus pais, agora, pareciam ter sido varridos de sua mente de uma forma muito rápida. Em tudo o que pensava agora, era em chegar em casa e ler alguns livros, no silêncio. Sua mente estava bem fora de si, quando foi surpreendida por alguém que esbarrou em cima dela, quase derrubando-a.
-PUTA QUE O PA... ?mal terminara de xingar, fora atropelada de novo por outra pessoa, mas desta vez, por uma garota. ?Mas será que não olham por onde andam?! ?e virou-se para continuar seu caminho.
Porém, mal dera um passo, fora, mais uma vez, atropelada. Desta vez, o garoto que esbarrou em Jennyffer, fez questão de parar, ofegante, e lhe dizer,olhando-a nos olhos:
-M-me desculpe...!
-Mas q...? ?Jennyffer não pode evitar. Olhou nos olhos do garoto e seu coração deu um salto leve. Era estranho, mas, aquele olhar lhe parecia diferente de qualquer outro, e muito diferente. ?Espera... ?disse, parada, olhando o último garoto correr e seguir a garota e o outro garoto- Pupilas... Verticais? ?ficou pensativa por um momento, perecia estar dormindo de olhos abertos outra vez. Pupilas verticais? Não demorou muito a acordar e balançar a cabeça, virando os olhos e boba consigo mesma- Claro! Qualquer um pode ter pupilas verticais! Inventaram lentes para isso... ?e balançando a cabeça negativamente, voltou a seguir o longo caminho de casa. Seu coração, por algum motivo, estava mais acelerado do que o normal.
Ao chegar em casa, rumou direto para o banheiro. Era quase duas da tarde, Jennyffer queria um banho bem demorado de banheira e em silêncio. Parecia querer pensar. Despiu-se, então, e desfez o rabo-de-cavalo em sua cabeça e, ao olhar no espelho, reparou algo estranho que a fez até dar um pequeno salto.
-O... O que é isso?
Podia ver claramente. Seus olhos já não eram mais azul-esverdeados, e sim, amarelos mesclados com preto. Não entendeu o porquê daquilo. Mas, com um pouco de receio, a garota fechou os olhos e sacudiu a cabeça de leve, olhando em seguida, outra vez para o espelho, onde seus olhos estavam normais outra vez.
-Que...
Deu de ombros, apesar de ter ficado estranhamente curiosa com aquilo, entrou na banheira e fechou os olhos.
Viu, então, em sua mente o garoto que a atropelara na volta do cursinho. Aquelas pupilas verticais... Claro que a garota sabia que eram lentes, mas não era isso que sentia. Sentia que havia algo por trás daquelas supostas lentes. Deu vontade de vê-lo de novo, o garoto. Queria vê-lo só mais uma vez para tentar esclarecer sua mente de que aquilo eram, realmente, lentes. Ficou ali na banheira por quase três horas, quando ouvira o telefone tocar, resolvendo fingir que não ouvira...