Mais uma vez ela se encontrava sozinha em casa, aos 12 anos, havia acabado de deixar as gêmeas na casa do tio, as meninas haviam nascido de um envolvimento de Clarice com outro homem e já estavam com 5 anos... Julie estava novamente escrevendo, algo que com certeza seria atirado no lixo logo em seguida.
Rosas vermelhas acordam em uma noite tão obscura
Que sangram de tristeza por uma luz do dia
Rosas choram nas sombras do sofrimento
Tal solidão é insana
Vivem com sede
Mas com o prazer de beber o liquido vermelho
Que jorra pelas raízes
Enquanto as rosas choram
Ela se aproxima devagar
observando?
Ela irá fazer o que quiser
Você se contorce, grita
E ela aplaude
Apenas aplaude
Dama do demônio,
A dor
A terna amiga de todos os momentos
A única que conhece os seus pontos fracos
Essa amiga de aparência serena
Que parece não conhecer os males do mundo
Não peça que o curem, nem poderiam fazê-lo
Apenas guarde os seus sentimentos para quando
Realmente precisar deles.
Não conseguiu escrever o que estava tentando, então não deu nenhuma importância ao papel que tinha nas mãos, nesse momento de sua vida Julie se sentia completamente sozinha, não via sentido algum no que fazia, aqueles movimentos ensaiados de todo dia, as mesmas pessoas, a ausência de Louise, que quase já não ficava em casa, se mantinha ocupada com o trabalho, a escola, e as amigas. Então simplesmente se deixava levar pela situação, durante anos foi daquela forma... e continuaria sendo.
Mas no fundo, algo naquela menina se negava a ser apenas mais um fantoche, se negava a deixar as coisas como estavam, foi a partir do momento em que ela percebeu isso que as coisas começaram a mudar, e não foi fácil, nada foi fácil, as pessoas exigiam muito e não davam nada, mas é impossível querer voltar à cegueira quando lhe é devolvida a visão.
Foi aí que começou a insônia, as noites rolando na cama, os problemas se tornavam incrivelmente maiores durante a noite. Ela tinha pressa em dormir, pois sempre tinha sonhos bons, tudo que ela desejava, tudo que não alcançava, tudo se tornava real enquanto dormia, era feliz enquanto mantinha os olhos fechados para o mundo.
Acordar de um sonho bom
Direto para o pesadelo do dia
Sentir seus ossos doerem?
Sem o repouso do que chama
De felicidade!
A alma já morta, luta para
Tirar de si as cinzas
E voltar a viver?
voltar a respirar?
Mas não existe um caminho de volta
E apenas acorda para viver seus pesadelos
Mais intensos.
Bem vindo ao meu mundo!
O desespero começou a se apossar daquela alma, se estressava facilmente com as pequeninas e com a mãe, era uma confusão dentro de si mesma, ela não se compreendia as vezes, não entendia porque se sentia daquela forma, queria que as coisas mudassem, suas oscilações de humor eram frequentes, e já não controlava as emoções.
Se tornou mais pacífica depois de algum tempo, passava as manhas no colégio, tinha apenas uma amiga, quando voltava para casa ajudava a mãe em alguns afazeres, e, como antes, passava a tarde na casa do tio, se tornou uma leitora fiel, se comovia com o sofrimento dos personagens com os quais se identificava e sorria quando tinham um final feliz. Se escondeu atrás das capas de livros durante anos, era considerada nerd, mas ela sabia que não... Estava apenas se colocando em um lugar melhor, poderia ser quem quisesse enquanto lia, poderia ser qualquer personagem, e foi... Teve vária vidas, menos a de Julie, menos a sua própria vida.
Os anos que se passaram nessa fase da vida da garota foram os piores, pois estava ciente de tudo que acontecia, sabia que não poderia continuar vivendo naquele conformismo, reconhecia os seus problemas, mas não podia fazer nada... Se sentia inútil, completamente presa na realidade e sem nenhuma possibilidade de reagir... Sobreviveu dessa forma por longos e dolorosos 5 anos...