El olhou em direção da vila, o caos tomando conta das almas dos moradores, ganância os que podiam estavam se protegendo largando os outros ao relento. As horas passaram rápidas e Hiver esperou calmamente a menina olhar para cada alma. Eles iriam para o vilarejo, mas antes tinha que achar o culpado de todo aquele caos. Ela estava disposta a salvar os que mereciam.
- Pois bem, querida. Não podemos aparecer lá vestidos assim. ? o homem comentou com uma das mãos no rosto. ? Eles só irão confiar em serventes de seu Deus. ? concluiu.
El tinha uma aparência exótica em um lugar onde as pessoas tinham cabelos loiros e olhos claros, seria chamada de bruxa logo na entrada da cidade. Laurant também, sua máscara de bode, sua capa preta e o rosto oculto, era o próprio Lúcifer na visão daquelas pessoas. Elevando os braços sobre a cabeça, o homem falou algumas palavras em um dialeto antigo. A boneca começou a flutuar, seu corpo, roupas, cabelos e cor dos olhos mudaram lentamente. Cabelos loiros, olhos azuis, corpo com aparência de mais velho e as roupas de uma camponesa. O cabeça de bote também mudou, a máscara e o rosto corroído deram espaço a pele branca, perfeita, os olhos não mudaram, o cabelo clareou e a roupa se transformou em uma túnica branca. Amarrado na cintura vinha um objeto feito com bolinhas e uma cruz na ponta. A boneca já no chão olhou para as mãos e depois para as roupas com certa curiosidade.
- Estamos adequadamente vestidos agora. El! ? chamou à atenção da boneca ? Mais uma coisa, - ele abaixou-se em frente da boneca e botou o dedo indicador em sua boca ? você é muda, eu sou um servente do Deus deles. Por isso tive pena de você e a trouxe comigo. Entendeu?
Assim que a boneca assentiu os dois rumaram para o vilarejo. Já era de tarde, o sol logo ia se por quando eles chegaram à entrada do lugar. As pessoas que lá estavam começaram a ser tomadas por um sentimento de salvação, mais um religioso chegou para salvar suas vidas do mal. Toda atenção dos moradores que ainda estavam nas ruas voltaram-se para eles, a boneca estava desconfortável em não poder falar, mentir não era uma de suas qualidades.
Um grito.
Um berro estrondoso foi o que todos ouviram, não veio de nenhum dos visitantes e sim de uma menina que andava pelos arredores de sua casa. Laurant, a boneca e todos os outros correram na direção do grito. A menina estava apavorada, envolvida pelos braços da mãe e do pai, todos se depararam com um corpo de uma mulher. Igual à outra que fora encontrada no cemitério. Vestia um vestido azul com detalhes dourados, o rosto fora pintado de branco e os lábios de vermelho. Hiver aproximou-se do corpo a fim de examina-lo.
- Ela foi deixada aqui há poucas horas. ? ele levantou-se ? O assassino deve estar perto!
Ele deu sua jogada, era um blefe. Realmente não sabia há quanto tempo o corpo estava ali, só fez aquilo para ver o pavor no rosto dos moradores e claro, os ver caçando a bruxa. Agora desconfiavam até do vizinho. El olhou para ele com o olhar de indagação ? já que era uma pseudo muda -, se aproximou de cabeça baixa e fitou o corpo estendido no chão. ?Hiver ela...? pensou.
- Vamos Elyse.
Chamando El por outro nome, o homem indicou o caminho. Naquela cidade não existiam pousadas ou tabernas. Iriam ter que arranjar um lugar para passar a noite, já que não era seguro executar magia ali. Começaram a caminhar quando foram parados por um homem e uma mulher ? que parecia ser sua esposa.
- Senhor, vocês não tem onde ficar. ? confirmou ? Então podem pernoitar em minha casa.
- Estamos muito gratos pelo convite.
- Estamos? ? indagou o homem.
El não tinha soltado nenhuma palavra ou nem sequer um ruído. Estava sempre de cabeça baixa, como se algo tivesse acontecido, como se uma tragédia tivesse ocorrido em sua vida e era isso que Laurant queria que as pessoas pensassem. A falsa muda seria digna de pena.
- Elyse... ? o servente de Deus a chamou esticando o braço ? Sim, ela é muda.
Agora estava tudo explicado, sem perguntas do casal os quatro rumarão para a moradia. A casa era simples, tinha apenas um andar, uma sala, a cozinha não muito grande e dois quartos. Era pequena e arrumada, como a casa de uma família rica, mas não, eles eram apenas pessoas sem muito dinheiro e humildes. Entrando na casa, a boneca notou que não tinham filhos pela maneira que a casa estava arrumada. Os quatro comeram e logo a mulher foi arrumar as camas. Como a casa só tinha dois quartos, El e Hiver iriam ficar no mesmo quarto ? o casal não via problemas nisso já que ele era um servente de Deus.
- Tenham uma boa noite. ? o marido desejou em nome dele e da mulher.
- A vocês também.
Nenhum outro nome fora dito e isso estranhou El. Já deitada na cama, à boneca ficou observando o homem sentado na frente da janela. O que estará pensando? Qual foi o motivo de ter blefado mais cedo? Ela nunca tinha o visto fazer algo parecido, apesar de que cada vez que o via sua alma estava mudada. Laurant ficou observando o que se passava do lado de fora, não pregou o olho já El, dormiu depois de mais ou menos uma hora. Fazia algum tempo em que deitou em uma cama, andou muito na estrada queria aproveitar o ?conforto? mesmo esse estando em meio a mentiras.
Na manhã seguinte outro corpo fora achado, a menina estava vestida e maquiada como as outras. Todos do vilarejo começaram a ficar nervosos com a situação. Em quanto isso na grande mansão parecida com um castelo, o irmão prendia a irmã em casa. Com a desculpa que o mundo exterior era perigoso nem a missa deixava a menina ir. Ela se acostumou a não ter um dos braços e a também não ter criados ? já que o irmão não deixava ninguém entrar lá. Naquela noite eles iriam comemorar o aniversário da menina, com uma festa surpresa o irmão dançou a noite toda com ela. Uma festa solitária e sem alegria. Também naquela noite, a mãe ? já morta ? contou nos sonhos do rapaz o próximo passo. A cada vitima, uma pintura era feita e a cada morte, a mesma pintura era queimada.
Naquela manhã, a boneca foi acordada pelo aroma de pão fresco. Ao abrir seus olhos notou estar só mesmo assim levantou animada, ao abrir a porta relembrou que deveria manter-se calada. Estavam todos sentados e comendo o desjejum e Hiver esticou o braço convidando-a para sentar-se ao seu lado.
- Bom dia criança. ? comentou a esposa e El assentiu.
A boneca comeu pouco e logo saiu com Hiver, foram investigar os acontecimentos e naquela manhã não foram só eles que saíram. Andando pelo vilarejo o irmão virou noticia, normalmente sem a irmã ele foi comprar suprimentos e tecido. Enquanto o cabeça de cabra olhava e falava com algumas pessoas, El foi ver alguns tecidos que achou bonito. Tocou na ponta do pano quando um homem se aproximou dela.
- Somente o mais belo tecido deve cobrir-lhe o corpo.
Encabulada, a boneca desviou o olhar, mas pelo silencio e o toque da mão foi forçada a olhar para o homem. Era dono de belos olhos e uma alma conturbada. Por esse motivo se deixou levar assim de afastando dos outros. Quando se deu conta, estava no fundo de um poço. O mesmo homem de antes a observava lá de cima, fechou a grade e acionou um mecanismo que enchia o poço aos poucos.
Um estalo.
Então é ele! Pensou El, agora estava tudo explicado, como as mulheres morreram, mas algo ainda estava estranho. Não parecia que elas morreram simplesmente afogadas, isso era uma coisa que estava incomodando a boneca mais do que o fato que poderia morrer naquela brincadeira. A altura da água já estava em sua cintura, arrependida de ser tão boba começou a chamar por Laurant, pedir socorro, gritar. Gritar? Não podia sua voz não saia. Não era um simples fingimento a voz tinha realmente sumido. Lembrou-se então no meio do pânico do sonho que teve morrer no fundo dos mares, afogada sem ninguém junto do Jardim.
Agora ela boiava, com a água quase chegando ao topo do poço de pedra a pequena só pedia para sobreviver. Algumas horas passaram-se e as pequenas mãos se agarravam a grade, procurando um meio de abrir ela fez força para cima, mas o cair da água fazia com que ela mergulhasse. Quando o ar não vinha mais aos pulmões ela desfaleceu e ficou inconsciente.
- E então? ? uma voz feminina perguntou.
- ...
Os dois irmãos estavam parados observando o corpo de El, a menina sentada em um tipo de bancada esperava o veredito do irmão. A boneca fora retirada do poço e estendida no chão, estavam esperando que ela voltasse à vida, expelindo a água dos pulmões.