Saint Seiya Future: A New Beginning

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    Capítulos:

    Capítulo 7

    Conhecendo o Inferno

    Spoiler

    As estrelas estavam magníficas, como se fossem um pó brilhoso onde nenhuma luz era capaz de ocultar aquela beleza. As aglomerações e nebulosas eram vistas à olho nu e Capela estava ali no alto, um pouco mais ao norte, como se me mostrasse sempre uma direção. Meu coração estava apertado, os olhos inchados indicando que chorara o dia inteiro e o corpo cansado de tanto treinar em demasia para esquecer o que se passava. Estava sentada em uma pedra lisa e áspera, próximo de um riacho cristalino. Não havia barulho algum a não ser o da minha respiração e o das águas. As mãos machucadas e enfaixadas, com manchas de sangue escuras. Usava apenas uma blusa regata surrada e acinzentada, calça jeans justa e um tanto suja, e o clássico all star preto que parecia ter sido mergulhado em lama. Os cabelos negros e lisos presos em um rabo de cavalo mal feito e a sensação terrível de mal estar que não passava.

    Erguia-me, andava e rodeava o local com tranqüilidade, depois voltava a sentar-me, inquieta. Havia se passado uma semana e eu tivera a brilhante idéia de brigar com Max. Irritada e desgostosa, saí de perto da minha própria família e fui para o lugar que possui o poder de me acalmar. Estava deserto, a construção da antiga fazenda estava coberta pelo mato e castigada pelos anos e pela chuva. As lembranças de uma vida ali eram sufocantes. E uma terrível saudade e nostalgia tomavam conta do meu corpo ao pisar naquele lugar. Nunca compreendi até hoje como eu sabia a exata localização dos destroços que eu via em sonhos. Era como se uma parte da minha vida fosse apagada ou coberta por um véu que lentamente se abria aos meus olhos, revelando resquícios de vidas passadas.

    A região era localizada no Brasil, no interior de Mato Grosso. Pretendia passar uns dias lá, onde eu me sentia bem, para depois retornar ao Santuário. Simplesmente desapareci contra as ordens de Prya e os protestos de Elane. Eu queria ficar só para pode pensar e me preparar para o que estava acontecendo. E eu sentia uma forte sensação de que algo me guiava para aquele local, onde eu simplesmente deveria estar e não estava.

    Passei aqueles dias limpando o local e reconstruindo aos poucos. Foi cansativo, mas valeu à pena. Pelo menos parecia habitado e um pouco convidativo. Eu pescava, caçava, cozinhava, construía, treinava e tudo sem descanso. Dormia quando o corpo cedia apenas. E eu sentia que algo estava me observando, algo estava perto, mas não sabia o que era até ouvir o choro de uma criança ao longe.

    Pareceu estranho à primeira vista, mas sai correndo na direção do barulho e do choro. Avançava rápido, sentindo cada músculo do corpo doer e uma leve falta de ar. A brisa era suave e cortante, em um frio terrível que eu não evitava sentir. Alguns metros na direção sugerida senti um terrível cosmo que incentivava sentimentos suicidas fortes. Pegava seus pontos fracos e lançava-lhe em uma tensa nuvem escura e nublosa. O colar esquentou muito e brilhou intensamente, envolvendo-me em um cosmo claro e morno. E de repente eu parecia uma tocha de luz no escuro.

    O choro havia cessado quando cheguei ali, mas meu coração parecia descompassado ao pensar que um ser tão inofensivo poderia estar perdido por ali. Comecei a procurar. E agora o colar pulsava de acordo com as batidas do meu coração e a luz tremeluzia bonita, mas eu não queria... Chamava muito a atenção.

    Um grito estridente de uma mulher. Agudo, dolorido. Parecia estar bem ao meu lado e ao virar-me para observar encontrei. Uma mãe com o bebê nos braços, correndo na minha direção aos prantos e toda machucada. Tentei tocá-la, mas não consegui. Era um fantasma. Era um espírito. Chamas por todos os lados, mas não sentia calor infernal. Eram as impressões do local. E eram recentes.

    Algo saiu do solo e subiu como tentáculos imensos e gosmentos. Envolveram a mulher que gritou novamente. Senti um aperto no coração. De repente, rosas. Um show delas. Todas negras, explodindo o que tocavam e fazendo subir um veneno peculiar e fatal. Uma luz dourada protegia a mulher dos efeitos enquanto uma linda amazona de peixes caminhava tirando os tentáculos e indo em direção ao espectro. Um homem loiro e bonito pegava a humana nos braços com o bebê junto e ia para o outro lado, sumindo em uma estrada. Era Asmita. Calista ficou para matar o espectro e seguiu logo atrás. Haviam encontrado Athena, e eu não ouvi nada? Eu estava ali por aqueles dias, será que foi antes? E a visão sumiu e me vi sozinha no meio de uma região queimada. Ainda havia flores negras no chão.

    E reconheci a estrada. Aproximei-me lentamente e tentei ir naquela direção, mas uma voz masculina logo atrás me chamou a atenção.

    - Não faria isso se fosse você. ? A voz era dura e fria e me deparei com um Cavaleiro de Fênix embirrado e irritado. Ele parecia queimar tudo ao seu redor. Impressionante. Instigava coragem na gente.

    - Por que não, Juan? ? Perguntei curiosa e inocente de verdade. Ele riu com maldade e ficou ao meu lado.

    - Só eu posso ir por ai, ninguém mais. ? Isso era territorialismo né? E então ele entrou na minha frente e me observou inteira. ? Você está bem machucada e fraca. O que aconteceu? ? Não era uma pergunta, era uma ordem. ? Elane mandou que eu a procurasse.

    Fiz cara feia. Eu não podia simplesmente sumir uma semana e ficar na minha? Não, ela mandava o namorado atrás de mim. E não era apenas isso, Juan era chato. Ele me deixaria inconsciente se fosse necessário e me levaria arrastada.

    - Por acaso é uma estrada que leva ao inferno? ? Perguntei o óbvio. Só ele era capaz de ir e voltar de lá quando bem quisesse, era um brinde da armadura que possuía. ? E não é da sua conta. Nem sua e nem dela. ? E virei às costas, voltando para o local onde eu costumava dormir por aqueles dias, pensativa na visão que eu tivera. Eu peguei as impressões locais recentes. E por alguma razão. Seria o colar? Pousei os dedos nele e de repente senti tontura e cambaleei para o lado, ameaçando desabar no chão.

    Fênix vinha ao lado, apenas observando e atento. Não me ajudou, mas ficou bem perto disso. Logo me recompus e suspirei dolorida. Queria ficar só.

    - Sim, é um caminho para o inferno. ? Certo. E o que fez Asmita e Calista irem para lá com Athena? Se é que era Athena... ? E pode não ser da minha conta, mas sua amiga está preocupada com você. E eu a encontrei primeiro do que ela. ? Sua voz indicava tédio profundo pela situação.

    - Sabe de algo da missão de Calista e Asmita? ? Perguntei depois de um curto silêncio.

    - Não, por quê?

    - Curiosidade.

    - Não mente. ? E entrou na minha frente de novo. ? Fala. ? Novamente, era uma ordem.

    Algo tomou conta de mim e o colar brilhou novamente. Fênix era uma ameaça? Senti receio e recuei dois passos. Era algo além. Ao recuar, me desequilibrei e cai sentada no chão. Pisquei várias vezes e me deu acesso de raiva. Comecei a querer quebrar tudo o que eu via, queria lutar contra fênix. Ele era uma ameaça. O colar brilhou mais intensamente e senti o corpo em chamas. Gritei. Pensamentos suicidas. O que era aquele cosmo de antes? Aquele... Que instigava negativismo e maldade?

    E um soco na cara. Pisquei algumas vezes. Evitei o segundo e olhei Juan irritada.

    - Ei! ? E me ergui com a ajuda dele. ? Por que me bateu? ? Mimimi.

    - Para ver se parava de idiotice. Me conta o que viu. E me explica o que é esse colar. ? E me puxou pelo braço na direção do que era uma casa recém-construída.

    - Como sabe que vi algo? ? Retruquei de má vontade. ? E me solta Fênix! ? Falei com firmeza, mas ele me ignorou completamente.

    - O que é esse colar Akemi? ? Tornou ele, intimidador.

    Virei o rosto para o lado desgostosa.

    - Asmita me deu de presente. ? Respondi num murmúrio de saudade.

    Então ele me soltou e se afastou. Paramos de caminhar e eu me virei para encará-lo de frente.

    - E o que foi que viu? ? Tornou a perguntar rispidamente.

    - Asmita e Calista levando uma mulher e uma criança para o que você disse ser o caminho do inferno. E depois senti que você era uma ameaça e que eu deveria ficar longe. E então eu me senti dentro de um inferno, pois tudo queimava. E você me deu um soco. ? A última frase foi dita com perplexidade.

    Então ele fez expressão de desentendimento.

    - Tem certeza?

    - Sim. Ta me achando maluca? ? Eu odiava aquele garoto às vezes. Quase sempre.

    - Até que você pensa. ? Zombou rindo. ? Sim, estou. ? E fechou a cara.

    Revirei os olhos.

    - Vou ficar naquela casa ali, pretendo ir daqui uns dias, diga à ela que estou bem. ? E fiz menção de sair, mas ele me segurou novamente. ? Ah Juan, por favor... ? E o empurrei para longe de mim. ? Eu não vou com você!

    Ele ignorou qualquer palavra minha e me lançou um golpe certeiro na barriga. Estremeci de dor. Foi maldade. Eu só o empurrei. Como estava fraca, não consegui me erguer do chão e facilmente fui carregada e arrastada até algum lugar.

    --x?

    Acordei na metade do caminho, sentindo ser chacoalhada por inteira. Ainda doía minhas costelas com o golpe e vi que a velocidade com o qual Juan corria era tal que parecíamos estar voando. Estava sendo carregada no ombro, com as pernas na frente e a cabeça para trás. Linda a cena. Comecei a me debater e gritar, chamá-lo de louco, xingá-lo, ameaçá-lo, mas nada surtiu efeito. Vencida, pedi para ir andando. E nada. Silêncio. Pedi para ser carregada de uma forma mais suave, por que estava doendo onde ele tinha golpeado. Então surtiu efeito. Ele parou e me arrumou para ficar com as pernas em sua cintura, deitada em suas costas e com a cabeça ali e os braços envolvendo seu pescoço.

    - Foi a única forma de te levar. Não reclama. ? E bufou irritado, voltando a caminhar (ou voar?).

    Fiquei quieta pensando em qualquer coisa, quando de repente ele para e... Me larga no chão sem aviso prévio. Foi tão brutal que comecei a reclamar alto e em troca recebi uma cara feia.

    - Cala a boca! Olhe onde estamos!

    Surpresa, virei o corpo lentamente para dar uma geral. Ainda estávamos no interior de um estado cheio de mato, mas bem longe de onde era a fazenda anterior. Era bem verdinho e no meio daquilo tudo havia um castelo. Tipo, um castelo no meio do nada, no meio do mato, onde simplesmente não havia nada antes e era de aparência sinistra. Senti-me imediatamente mal.

    - Que cosmo é esse? ? Sussurrei postando-me ao lado dele.

    - É Pandora. ? E senti que ele falara isso com o tom de voz melancólico, mas fiquei na minha. ? Venha. ? E me puxou até uma ?entrada? naquele... Castelo mais adiante, mas antes me emprestou a própria armadura. Ela se ajustou ao meu tamanho, mas senti que ela não responderia à mim. Claro, não me pertencia. Era apenas um empréstimo para que eu sobrevivesse no inferno, ou na entrada dele, provavelmente. Juan, por alguma razão oculta, podia entrar ali totalmente nu e sem armadura, sem sofrer muitos danos ou coisa parecida. Mas havia sim a possibilidade de um ?empréstimo?, da armadura que era capaz de renascer das próprias cinzas, como a fênix.

    E puxando-me pelo braço, entramos em uma espécie de abertura na base da construção. Senti vários choques ao redor do meu corpo e gritei de dor. Fênix segurou minha boca para não emitir sons altos e esperou que a armadura se adaptasse à mim e me protegesse. A ligação entre o cavaleiro e a constelação eram tais que a armadura ?conversava? com o seu dono e lhe atendia certas coisas. Não fosse por ela, eu teria virado purpurina e minha alma seria puxada até onde eu ?merecia?. Sabe os noves infernos de Dante? O primeiro deles era o Limbo, onde estávamos agora. As pessoas vagavam sem rumo em círculos. Ou almas, melhor dizendo. Antes disso havia um abismo sem fim, onde ficavam os pecadores e condenados por Hades e seus comparsas amiguinhos da Morte e do Sono.

    Logo adiante, existiria o Vale dos Ventos, onde Minos dominava. Era um dos três juízes do Inferno, equivalentes à um Cavaleiro de Ouro em força e poder. Ele dominava onde os homens levados à luxúria viveram na terra. Antes, eles eram levados pelas paixões arrebatadoras da Terra como o vento. Agora, é o vento que os leva para o Inferno. Depois vinha o Lago de Lama, onde cérberos, o cão de três cabeças ficava. Eram onde os gulosos engoliam lama desesperados por comida. Caía neve, cinzas e granizo sobre as almas. Os espíritos não conversavam entre si, por isso era um círculo de inferno silencioso, ouvindo-se apenas o barulho de quem comia.

    Após isso, a Colina das Rochas, onde ficavam os gananciosos. Os que antes eram ricos e não distribuíam o que possuíam aos outros, eram obrigados a carregar ouro maciço (pedras e barras), dentro de um saco e empurrá-los até um topo que nunca existia. Em seguida, vem o Rio Estinge, que é onde fica o barqueiro que só permite passar os mortos e que quem é vivo, deve pagar-lhe com moeda de prata ou ouro. A cor desse rio, que corta todo o inferno por caminhos tortuosos, é arroxeada. É feita de sangue fervente e borbulhante, onde estão mergulhados os acusados de ira e agressividade. Se você é um vivo e entra no rio sem permissão para atravessá-lo, o barqueiro permite que os espíritos ali subam e te carregue até o fundo.

    A Cidade de Dite serve de divisão entre os pecados cometidos sem intenção (culpa) e os pecados cometidos conscientemente (dolo). É cercada por fogo, fossos profundos e por muralhas de ferro, sobre as portas da cidade estão mais de mil anjos caídos (ou seja, espíritos que tinham a missão de vir e fazer algo de bom, mas falharam entregando-se à prazeres carnais). No alto de uma torre estão as três Erinias (Megera, Aleto e Tisífone) enroladas em hidras e a Medusa. As três Erinias fazem a patrulha para não permitir fuga sob a ordem de Medusa. Os espíritos ficam mergulhados em fogo eterno agüentando a dor da própria ira. Quanto maior a ira, maior é o seu sofrimento.

    No fim do sexto círculo há um alto precipício circular (de onde vem um terrível cheiro) que leva ao sétimo círculo, onde estão os violentos, que se distribuem por três vales (ou giros).

    Primeiro Vale - Vale do Rio Flegetonte: O Rio Flegetonte é um rio de sangue fervente. Na sua margem estão algumas ruínas e o Minotauro de Creta, ainda na margem do rio, mais um pouco mais para frente, correm as filas de centauros, dentre eles destacam-se Quíron, Nesso e Fólo, os centauros estão armados com arcos e flechas, e atiram setas em todas as almas que se erguem do sangue mais do que lhe destinou sua culpa. Os violentos contra pessoas e seus bens, estão mergulhados no rio de sangue daqueles que oprimiram, quanto mais grave o crime, maior a parte imersa.

    Segundo Vale - Vale da Floresta dos Suicidas: Os violentos contra si mesmos (suicidas) são transformados em árvores sombrias, para todo o lado estão gritos lamentosos, quando os pecadores chegam aqui e caem na selva, caindo onde o acaso os leve a cair, são transformadas em sementes, crescendo até tornarem-se árvores silvestres. "A folhagem não era verde, mas escura, os ramos não eram lisos, mas nodosos e torcidos, não frutos, mas espinhos venenosos". É onde estão os ninhos das Harpias citadas na Eneida, que se alimentam das suas folhas, causando dor e sangramentos nas árvores. Aqui também estão cadelas famintas correndo atrás dos esbanjadores, dilacerando-os.

    Terceiro Vale - Vale do Deserto Abominável: Os violentos contra os Deuses são condenados a um deserto incandescente, o areão, estéril e sem vida, é o oposto do mundo criado por Zeus. Eles vivem em um mundo sem cor, sem conforto e sem esperança, é o mundo que desejaram ter quando em vida, rejeitaram tudo o que Zeus lhes oferecera, preferindo dar maior valor às coisas materiais. Aqui chove chamas sobre terra areenta, como chove neve nos Alpes.

    Cachoeiras de Sangue: Aqui brota o rio Flegetonte, cujas águas passam pelo deserto e a floresta, suas margens são de pedra. A passagem para o próximo círculo, está no fundo do vale, sendo feita de pedra.

    O próximo círculo chama-se Malebolge, é todo em pedra e da cor do ferro, assim como a muralha que o cerca. Aqui estão os fraudulentos. Radamanthys, o Segundo Juiz do Inferno, governa neste local.

    O Nono e último Círculo é o Lago Cocite, que está congelado, o lago das lamentações que fica no centro da Terra e é formado pelas lágrimas dos condenados e pelos rios do inferno que nele deságuam seu sangue. Aqui ficam os traidores da carne perante seus conjugues ou os Deuses.

    - O que estamos fazendo aqui, para início de conversa? ? Perguntei incrédula.

    - O caminho mais perto é por aqui. Vamos só até o Rio, pagar o barqueiro e desceremos no Lago Cocite. Lá existe uma passagem aberta por Asmita até o Santuário. Não que alguém do submundo saiba disso. ? E com cautela, fomos caminhando pelo Limbo a procura de algo. Se você não sabe o caminho certo, se perde no inferno com muita facilidade. E Fênix parecia conhecer tranquilamente cada mínimo detalhe do local.

    - Como conhece o inferno tão bem? ? Tornei a indagar observando ao redor. Era terrível. ? E como saberemos se Minos não está no próximo círculo? ? Meu tom era de preocupação.

    - Por que os Juízes não estão aqui, estão lá na Terra a procura de Athena para matar sob a ordem direta de Pandora. ? E pareceu novamente melancólico e triste ao falar da companheira de Hades.

    - E como você sabe disso? ? Não era desconfiança, era só curiosidade mesmo.

    - Não interessa agora. Venha com cuidado. ? E entre o Limbo e o Vale dos Ventos havia uma estreita passagem de pedras. Eu passei com facilidade na frente, mas Juan precisou ir com mais calma e devagar. Ele era alto e forte, robusto e muito atlético fisicamente para conseguir a proeza de deslizar pelas paredes como uma japonesa mirradinha como eu.

    Sai e fiquei aguardando. Então me deparei com redemoinhos de vento e várias almas no meio. E gritos e lamentos e sangue... Juan saiu com tudo logo atrás, empurrando-me sem querer. Quase fui ao chão. Com delicadeza ele me ergueu a mão e a segurei. Ele não pareceu estar surpreso e nem assustado com o que via, quase ignorava completamente a cena e o ambiente.

    O segui por entre os redemoinhos, que eram fortes. Minha sorte era a ajuda dele, ou eu sairia voando. Alguns minutos de caminhada e encontramos o Lago de Lama, descendo por um precipício sem medo. Bom, éramos ambos amazona e cavaleiro, sabíamos cair com classe. Quase morri de nojo ali. E de medo. Um imenso, enorme, gigantesco, titânico cachorro com imensas, enormes, gigantescas e titânicas cabeças... Okay, já ficou claro. Ele estava adormecido logo na entrada e eu podia sentir o bafo dele respirando. Meus olhos se arregalaram muito e fitei Juan como quem falasse ?e agora, bonitão??.

    Desviamos com cuidado e fomos andando até o próximo círculo, acho, e quando finalmente encontramos a passagem de pedra (parecia uma porta de caverna) para a Colina das Rochas, o maldito acorda e só se ouvem os rosnados. Engoli em seco e ambos paralisados viraram devagar para olhar. Era feio. Os dentes afiadíssimos a mostra, de todas as cabeças, baba venenosa escorrendo por entre eles e caindo no chão formando buracos imensos e uma fumaça igualmente fatal. Olhos vermelhos, grandes, cheios de ódio e raiva.

    - Opa... ? Comentei de forma infeliz, fazendo-o latir várias vezes e sentindo meus tímpanos querendo explodir.

    Juan me puxou para dentro da Caverna e eu sentia que cada passo que o monstro andava, fazia tremer a terra inteira. Tentou nos pegar ali, e percebi que a passagem para o outro Círculo havia se fechado. Estávamos presos. E Cérberos começou a uivar alto e latir, correr, fazer estardalhaço, avisando alguma coisa de que havia intrusos ali.

    - Não vou te tirar a armadura para derrotar esse infeliz. ? Murmurou Juan pensativo. ? Alguma idéia?

    - Meu... É VOCÊ QUEM VEM PRO INFERNO SEMPRE! ? Gritei para o homem. ? Se tivesse me deixado lá, eu não estaria prestes a morrer viva dentro do submundo pelo guardião de Hades!

    - Shhhhhh! ? Falou ele verdadeiramente bravo, empurrando-me para o lado e saindo para fora. O cão havia parado a farra e havia uma mulher parada logo à frente. Cérberos parecia um fofo perto dela, deitado e quieto. E ela fazia-lhe carícias no corpo. Estava sentada sob uma das patas do cachorro. Ou monstro.

    Era... Linda. Parecia angelical, com os lábios naturalmente rosados, os cabelos escuros e lisos até a cintura e soltos. Olhava Juan como se fosse um velho amigo e demonstrou mais interesse nele do que na Japonesa vestida com armadura errada logo na entrada da caverna.

    Seus olhos eram claros, um tanto acinzentados e vestia roupas negras, além de possuir um detalhe na mão direita meio estranho. Era uma jóia. E parecia uma cobra enrolada no dedo do meio até o pulso. Anel e pulseira ao mesmo tempo. De prata e brilhante. E um colar de contas roxas.

    Não era difícil reconhecê-la como a Sacerdotisa do Submundo, Pandora.

    Ela não demonstrou emoção alguma quando se levantou e se aproximou do cavaleiro, que parecia não querer temê-la.

    - Ora, ora... Pensei que nunca mais voltaria... ? E sua voz era melodiosa e sombria. E possuía um quê de maldade muito grande.

    - Não voltei, apenas estou de passagem. ? Cortou ele rispidamente.

    - Então vejo que terei de... Deixá-los... ? E olhou para mim com certo interesse. Senti nojo e revirei os olhos, na cara dura. Não gostei dela. ? Morrer por conta de Cérberos. ? O cão ao ouvir seu nome sendo pronunciado ergueu uma das cabeças às ordens da ?dona?.

    - Não é assim que funciona. ? Cortou o homem novamente, olhando-me de forma significativa depois, fazendo-me aproximar lentamente de ambos. ? Vamos passar e pronto. Não é você quem vai me impedir de sair, Penélope. ? E chamou-a provavelmente pelo nome, com zombaria. ? Ou devo dizer... Pandora?

    Ela pareceu profundamente raivosa. Quase ri. Virou-se e foi embora, sumindo por entre umas escadas que desceram do alto e que sumiam conforme a mulher ia subindo.

    - Pra onde ela foi? ? Perguntei de novo, com intensa curiosidade.

    - Para o castelo logo acima de nós. ? Respondeu automático e passamos pelo cão que agora dormia profundamente e encontramos a passagem para o próximo círculo.

    - E... Como assim ela deixou a gente passar? ? Eu sabia que deveria haver alguma ligação entre eles, mas qual? Elane ia querer matar a mulher depois...

    - Não é da sua conta. ? Cortou ele virando-se repentinamente pra mim. ? E pare de fazer perguntas! ? Era sério. Levantei as mãos para o ar em resposta. Okay, sem perguntas.

    - Vai demorar? ? Opa, esqueci. Ele parou de andar, respirou profundamente e ignorou, voltando a caminhar. Ué, nunca vi o cara ficar tão balançado assim depois de ver uma mulher. Sério.

    A Colina das Rochas era terrível. Havia uma montanha infinita com milhões de mortos carregando sacos de dinheiro até o inexistente topo. Logo abaixo, aos pés daquilo tudo, um porto e um barco parado. Aproximando dali, notei que o rio de sangue era terrível. Subia fumaça quente, malcheirosa e que dava enjôos. No pequeno e maltrapilho barco, um ser que mais parecia a personificação da morte.

    - Pagamento, humanos vivos. ? Sua voz era rouca e desejei não ver o rosto daquilo. Parecia um esqueleto.

    Juan entregou-lhe duas moedas de ouro. Ele analisou e jogou-a para o alto, onde os mortos das colinas correram todos para pegar. E em seguida, jogou a outra.

    - Entrem. ? E entramos. Sentei com cuidadinho ali e Juan ficou de pé ao meu lado. E o barqueiro começou a remar, enquanto Juan dizia-lhe onde queríamos descer. Horas depois, ou ao menos o que me pareceu ser horas, chegamos a um lago congelado e cristalino, feito de lágrimas. Ali desaguava o rio Estinge, e a mistura de gelo e calor imensos faziam derreter o lago naquele ponto e uma fumaça horrível subia. Havia um porto ali e estacamos.

    Juan me ajudou a sair e estremeci. Logo mais a frente, para meu alívio, havia uma ?saída?. Atravessamos com cautela e rapidez e chegamos aos pés do santuário, na Terra. A Armadura imediatamente me deixou e voltou para o verdadeiro Fênix e eu notei que respirava com dificuldade e estava fria, gelada, como morta.

    - Vem... ? Era uma voz feminina e reconheci imediatamente ser de Elane. Juan estava recostado em uma árvore logo ao lado, silencioso e de olhos fechados. ? Você está um lixo Akemi!

    - Obrigada pelo apoio moral. ? Retruquei com dificuldade. ? Acho que mais um pouco e eu morria lá dentro...

    - Vocês vieram pelo inferno, isso é perigoso. ? E ela olhou Juan nos olhos e me pegou no colo em seguida. ? O que você ficou fazendo?

    - Eu não faço idéia... ? E realmente, não fazia. Em seguida, apaguei.


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