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O campo era magnífico, porém um tanto assustador. Era como se adentrássemos a Grécia Antiga, com aquele estádio de pedras e no centro milhares de aspirantes lutando entre si ferozmente. Acima das arquibancadas tinha um espaço especial para o Mestre do Santuário e Athena observarem os treinos, onde apenas o Mestre estava lá. Imponente, aparência de Ancião, porém com a saúde vitalizada e uma força interior imensa que se exteriorizava mesmo que fosse quase centenário. Era humano, cabelos branquíssimos e longos. Presos em um rabo de cavalo frouxo no meio do cabelo. Aquela espécie de pessoa que causava intimidação e admiração só de estar ali no local. E seu cosmo era imenso e forte, incentivador e encorajador. Cada pessoa possuía na sua essência (ou seja, o cosmo) um sentimento exterior. Causava nas pessoas ao redor ou perto de si um sentimento único, marcante. Alguns acalmavam (Asmita era assim), outros encorajavam, e por ai vai. Sentimentos ruins e devastadores provinham de espectros, Pandora, Perséfone, Hades e Deuses que idealizavam o mal no geral. Mas isso não era generalizado, tinham exceções.
E quanto mais poderoso você é, maior alcance e mais nítido era esse sentimento nas pessoas em sua presença. Asmita era capaz de tranqüilizar multidões, o Mestre era capaz de encorajar a Terra inteira. E eu sinceramente não queria imaginar (e nem conseguia) o que Athena era capaz de fazer com o cosmo dela. Deuses possuem o controle sobre um planeta inteiro. Os aspirantes variavam em grau de influenciação, por variarem em seus poderes pessoais com relação ao cosmo. Não eram apenas técnicas, apenas força... Já que o cosmo começa a queimar no coração, é imprescindível estar bem e em seu equilíbrio mental e psicológico. E o papel do Mestre com seu pupilo era ensinar não só a lutar bem, a usar o seu próprio cosmo para intensificar ataques, mas também a controlar emoções, sentimentos e por limites às vontades impulsivas e transmitir a importância de colocar prioridades nas nossas ações.
Elane fazia algo com nosso interior que sinceramente eu só passei a apreciar depois de compreender a importância da interiorização com Asmita. Ela remexia no nosso íntimo, incentivando a reforma íntima e fazendo-nos repensar em nossas atitudes. Ela interiorizava as pessoas ao seu redor, calando-as apenas com sua presença quando bem quisesse. Era contra violência e lutava apenas quando necessário (ou irritada, o que geralmente não era bom), usando e abusando da influência que tinha sobre as pessoas de fazê-las repensar as atitudes. Conseguia evitar muitas lutas desnecessárias com isso.
Eu conseguia curar pessoas incentivando-as a não desistirem. Causava um verdadeiro sentimento de determinação nelas, que se fosse bem assimilado e compreendido, conseguia levantar e por de pé qualquer um que quisesse e fizesse uso da minha presença ao seu lado. Asmita vivia brincando que eu seria uma futura Mestre malvada que derrotaria sem dó os pupilos e os incentivaria a se superarem a cada treino. De certa forma, era verdade. Eu não queria mortes, por isso incentivava a verdadeira vitória: vencendo a si mesmo e a seus medos, você é capaz de lutar com o coração leve e a consciência tranqüila, fazendo com que NADA consiga te derrotar. E funcionava, inacreditavelmente. E isso variava de pessoa para pessoa.
Ao chegarmos às entradas do estádio no campo (era campo por ser um ?campo de treinamento?, mas também por ser rodeado de grama verde, de flores lindas e de árvores imensas e centenárias), alguns aspirantes e cavaleiros de prata nos observaram com certa surpresa. Eu podia sentir e notar ciúmes, inveja, admiração, todo o tipo de sentimento neles. E não eram todos os cavaleiros que sentiam as emoções ao seu redor, isso era restrito à Asmita e seus pupilos.
Então cada Mestre puxou seus pupilos para si e explicou detalhadamente o que era para ser feito, onde ficaríamos com quem ficaríamos e de que forma treinaríamos até que eles retornassem.
- As duas irão treinar com Prya... ? E Mila e ela estavam ao nosso lado. ? E ficarão hospedados na vila ao lado do santuário. Usem o que ensinei a vocês, mas com inteligência e bom senso. ? Sabíamos que não poderíamos causar ilusões nas pessoas e nem a sua possível morte brincando de poderes do cavaleiro de virgem. ? E guardem a promessa de que estarei aqui no dia da final do campeonato. E quero a promessa de que chegarão lá. ? E sorriu amoroso. ? Se ocorrer de lutarem uma contra a outra, lembrem-se do sentimento saudável de competição e coloquem em mente que alguma será merecedora de vencer a luta, mas que haverá outras oportunidades de obtenção de armadura. ? E com um aceno de cabeça para cada uma, despediu-se com imponência junto de Mila e seguiram atrás dos outros colegas que iam em direção ao Mestre do Santuário.
As três ficaram um tempo em silêncio, mas logo seguimos para as arquibancadas ali dentro e era incrível a extensão do pódio. Era uma perfeita circunferência com diâmetro de 60 metros. Muito grande. Mesmo. Sentadas e olhando ao redor, Prya começou a explicar.
- O treinamento é voluntário. Você pode combinar com um colega seu ou simplesmente desafiar qualquer aspirante aqui em um duelo. Geralmente os cavaleiros de prata que organizam os treinamentos entre todos para haver uma maior gama de possibilidades, uma interação e socialização maior entre os aspirantes. Surgem camaradagens legais, amigos interessantes e... Inimigos mortais. Só que por servirem Athena não se matam de verdade. ? E riu baixinho com certo desgosto. ? Vocês duas treinaram com Asmita por quase dez anos. Creio que estão preparadas para a competição. Mas há algo mais importante do que os treinos. Conhecer um pouco dos outros... ?Mundos?. ? E pensou antes de continuar.
?Além da nossa terra e da morada dos Deuses (que é sem tempo e sem espaço), há os mundos criados pelos Deuses onde só eles podem entrar e sair. Ou as almas daqueles a quem eles acham que merecem. Elíseos (o paraíso), uma espécie de purgatório com várias portas e entradas para cada tipo de pecado humano... E o inferno e Submundo, comandado por Hades.
Servos de cada Deus podem atravessar esses mundos se lhes é dado condições para isso. Para nós, amazonas de Athena, é a nossa Armadura que nos conferirá esse poder. Mas não podemos fazer nada sem a autorização do Mestre do Santuário. E o nosso dever é proteger a terra inteira contra o domínio de Hades, sendo que temos a total proteção de Athena... Ela escolhe um corpo humano para sair da morada dos Deuses e ficar presente e visível para nós aqui. Hades faz isso, mas ele espera até aparecer um corpo humano digno de sua ?morada? temporária. Sim, ele é bem fresco. Hades escolhe a mais pura das almas para tomar conta, o mais puro e bonito corpo... Seja homem ou seja mulher. Alguma dúvida??
As nossas cabeças giravam para assimilar tudo o que ela contou de uma vez. Nós sabíamos a respeito, e bastante, já que um dos Golpes secretos de Asmita era enviar o oponente para algum tipo dos mundos no Inferno. Pisquei algumas vezes, perdida e tentando processar algumas perguntas, mas sem sucesso. Elane pareceu tão perdida e surpresa quanto eu. Suspiramos ao mesmo tempo.
Finalizando o que tinha que explicar, levantou-se. Rodopiou nos tornozelos, observando ao redor e em uma pose típica de quem explorava o local, complementou. ? Quero ver o que vocês sabem ou aprenderam com o Asmita. ? E havia malícia em seu tom de voz. Elane pareceu se animar, mas eu permaneci séria e um tanto incomodada. Não estava acostumada em receber provocações e ordens sem ser de Asmita. Mas...
- E como iremos lhe mostrar? ? Perguntei curiosa.
- Quero que lutem entre si para uma pequena apresentação. ? E riu baixinho. ? Depois vou treinar individualmente com cada uma... ? Eu ia dar um único golpe naquela amazona de prata... Aaaah, eu ia sim! Humpf. ? E em seguida vou mostrar-lhes aonde irão se hospedar.
Elane levantara e me estendera uma mão. Era ela né... Pelo menos isso... Ao ficarmos uma de frente para a outra, notei que os aspirantes ao redor pararam para observar ?as pupilas de um dos de ouro!?. E os outros competidores se aglomeraram ao redor e aos lados de Prya. Legal, uma luta com minha amiga na frente de um bando de desconhecidos, do Mestre do Santuário, de todos os de Ouro e de... Asmita. Nervosa? Magina, nem um pouco.
- Leve na esportiva Akemi. ? Falou a outra tranquilamente, como se aquele simples duelo não fosse nada mais do que uma leve brincadeira. Eu resmunguei algo como ?sim? e me posicionei. Eu sabia quais eram os ataques dela, sabia por quais ela poderia começar, conhecia seus movimentos de tanto observá-los e idem dela com relação a mim. Quase certeza que aquilo daria um empate lindo. Ou não.
Com respeito e gentileza, curvamos uma na direção da outra e nos afastamos alguns passos. Uma das situações constrangedoras entre duas amazonas, é que não havia olho no olho. E nem haveria, tanto eu quanto ela fechávamos os olhos para lutar. Ignorei a pequena multidão ao nosso redor formando um semicírculo e me concentrei nela. Suspirei profundamente, notando que ambas aguardavam alguma coisa. Sendo assim, retirei o lenço da minha cintura e queimando meu cosmo, movimentei o braço direito lançando-o na direção dela, e cortando o ar e alguns fios de cabelo perdidos na movimentação repentina para o lado que ela fizera. Aproveitando o momento, senti um chute com o joelho na minha barriga e defendi um soco concentrado do rosto com os braços e ambas se empurraram juntas, indo cada uma para um lado.
- Achou mesmo que eu ia simplesmente permitir que você decepasse meu pescoço? ? Provocou Elane rindo e se aproximando com vários chutes altos na altura do rosto, que eu desviava ou bloqueava com os braços.
- Eu? Claro que não... ? E outro movimento com o braço direito, envolvendo o lenço em suas pernas e derrubando-a no chão com força, avançando com um soco do alto que ela desviou com infinita elegância. Uma cratera se formou no chão. À essa altura, alguns urravam ou aplaudiam e era visível o show de luzes verdes e vermelhos interligados próximas uma da outra.
Notei que Asmita se aproximara e observava com aquela curiosidade engraçada dele. Parecia admirar as pupilas. Nunca havia lutado para valer contra Elane e talvez nem quisesse, mas já que ela estava indo com tudo... Notei que ela avançara na minha direção e saltei para o ar, estalando o lenço como um chicote na direção dela que estava embaixo de mim. Esperta, ela segurou o lenço e o puxou com força na sua direção me desequilibrando e acabei recebendo um soco na boca do estômago e afundei no chão. Gritos e aplausos. Humpf. Ergui-me rapidamente e puxei de volta a minha ?arma? e ela se enrolou sozinha no meu braço direito. O lenço brilhava intensamente na cor esverdeada e com ele preso ali, permiti que meu cosmo explodisse ao máximo e avancei dando ?infinitos? socos. Ela bloqueava e desviava, mas ia afastando-se para trás, abrindo espaço entre a multidão e quando troquei de técnica e parti para os chutes altos e o lenço novamente, Elane fincou os pés no chão e puxou o rosário que ficava preso à sua cintura.
Imediatamente tentei parar o que estava fazendo, reconhecendo que eu levaria um ataque muito tenso, mas era tarde e logo uma bola de luz vermelha cresceu rapidamente entre os seus dedos e o rosário e com uma explosão fui lançada para trás com força. Saltei no ar e pousei no chão ainda sentindo aquele ?empurrão? no ar. Eita Elane, quanta apelação. E mais gritos e urros da platéia.
Ela agora estava imersa em uma bola de cosmo vermelha, flutuante no ar e na posição de lótus. Fiquei lentamente de pé e a observei alguns segundos. Eu sabia que técnica era aquela. Não tinha como contra-atacar e qualquer coisa que eu tentasse iria voltar para mim. Levitei no ar de pé e o lenço me rodeou por inteira formando uma barreira mental e física, mas impedindo-me de contra-atacar. Para que eu atacasse, eu precisaria quebrar nem que fosse por alguns instantes, a barreira. Recitando mantras baixinho, surgiu um rosário em minhas mãos e com alguns movimentos específicos com os dedos, soltei a proteção da barreira para lançar cada bolinha do rosário na direção de Elane por todos os lados. Mais de cem delas rodearam a barreira vermelha e ao simples toque com o cosmo do adversário elas explodiam e queimavam, soltando leves fagulhas de veneno concentrado. A multidão se afastou rápido, perplexa.
- Isso não vai adiantar. ? Retrucou ela abrindo uma das mãos e com a palma dela virada na minha direção, as bolinhas fizeram o caminho contrário e voaram rápido me cercando. Puxei as pernas e fiquei na posição de lótus.
- E isso também não. ? E fechei uma barreira redonda esverdeada ao meu redor. Agora poderia atacar e me defender tranquilamente. As pessoas não acreditavam no que viam, pareciam nunca ter visto algo semelhante, mas só porquê não saíamos do lugar.
Ambas abriram os olhos ao mesmo tempo e dois filetes de luz dourada avançaram de dentro da barreira de cada uma. O encontro ocorreu exatamente no centro, com choques de poder.
- Isso não vai a lugar algum. ? Comentei com simplicidade, erguendo uma das mãos e lançando todo o rosário novamente. Pareciam pequenas fagulhas de fogo verde. Que iriam explodir a primeira coisa que tocassem. E eram capazes de destruir a pó as armaduras. Em contrapartida, ela sabia devolver os poderes, algo que eu não conseguia e jamais aprendera a realizar.
- Concordo. ? E de surpresa, quebrou a própria barreira e com tudo atacou com os jatos de luz que seguiram na minha direção, rodeados de fagulhas verdes do meu próprio rosário. Assustei-me, a barreira sumiu e por um triz não morri queimada já que consegui desviar deles.
- Ei! ? Reclamei um tanto feliz por ela. ? Isso poderia ter me matado... ? Provoquei e com um sorriso disse. ? Mas tem algo que nunca usei... ? E não me perguntem como aprendi aquilo.
A platéia estava silenciosa há algum tempo e notei que mais da metade estavam temerosos e surpresos.
- Você realmente acha que eu já usei tudo também? ? Eu tinha MUITO medo do que ela iria fazer, mas não iria querer perder a luta.
Ergui as mãos para cima da cabeça e o lenço me rodeou novamente, mas a cor do meu cosmo estava mudando. E isso significava o que? Que eu descobrira aquele tipo de poder interior e pessoal que era único. Eu aprendera aquilo sozinha, ninguém me ensinara. Tornou-se um azul cintilante e o lenço mudara de verde claro para branco. Abri os olhos e fitando Elane à minha frente lá distante, movimentei os braços e com o lenço preso nele, lancei um jato de cosmo congelante. Acertou ela em cheio na barriga, pois pareceu não compreender o que acontecia comigo e ficou olhando e baixou a guarda.
- Mas o que...? Isso é frio! ? Reclamou ela se levantando e sendo obrigada a queimar o próprio cosmo para esquentar-se logo. ? Com quem aprendeu isso?
Fui me aproximando devagar e parei um pouco perto dela.
- Foi intuitivo. ? E era sério, nem eu acreditava em certas coisas. ? Mas ainda consigo usar o rosário e o lenço... ? E pá, um soco. Parei ela bem de frente à mim e ela permaneceu quieta ali. Belo ataque de oportunidade Elane.
- Intuitivo? Então veja isso... ? E sem que eu pudesse perceber, me vi rodeada de pétalas vermelhas e brilhantes formadas com o cosmo dela e o rosário em suas mãos como fogo me prendendo o corpo inteiro. Fiquei presa, como se fossem cordas... Mas aquilo queimava! Gritei um pouco e logo em seguida, ela retirou aquilo de mim e me estendeu a mão para ficar de pé. ? Asmita não me ensinou isso. Aprendi a usar o rosário como se fossem cordas, onde simplesmente eu sugo a alma da pessoa e a mando para a entrada do inferno. Se ela resiste, seu sangue todo é consumido pelas pétalas e fará ela desistir... ? E enlaçou o braço ao redor do meu ombro, em gesto de camaradagem. ? Mas... Seus poderes não são fogo, é gelo... Isso é tão... Estranho...
E enquanto ouvíamos aplausos e gritos, Prya estava na nossa frente um tanto quanto perplexa demais e não disse nada. Sentamos-nos novamente ali, e eu queria muito saber quem bateria nela primeiro...