Saint Seiya Future: A New Beginning

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    Capítulo 3

    O Lírio

    Spoiler

    Quatro dias se passaram e a casa de virgem foi totalmente reconstruída e eu estava um pouco exausta, pois os treinos com Asmita tornaram-se mais pesados e junto com isso tudo eu ajudei BASTANTE a fazer aquela casa ficar de pé. E Elane adormecida que nem uma cinderela no quarto do Mestre. Humpf. E não, não pretendíamos voltar para nossa casa na vila, até que as coisas se ajeitassem ali e ganhássemos as competições. Ao menos era o que eu esperava. Cinco armaduras de bronze seriam distribuídas: Unicórnio, Dragão, Cisne, Corvo e Lobo, e uma de prata também: Ofíucus. E os indicados para as competições seriam apenas os pupilos dos cavaleiros de ouro. Enquanto outras doze armaduras de bronze seriam distribuídas depois daquela competição em algo mais geral. Não era favoritismo, era algo meio urgente conseguir cavaleiros naquela atual situação e os primeiros seriam os pupilos dos de ouro por simplesmente serem os mais preparados e estarem há anos em treinamento em comparação com o resto dos aspirantes.

    Estava deitada no chão da casa gélida de barriga para cima e espichando as pernas, quando um barulho logo atrás de mim fez com que eu virasse o corpo lentamente e de barriga pra baixo, apoiando o queixo em uma das mãos, quando vi Asmita chegando com uma Amazona de prata. Ergui uma sobrancelha curiosa e me sentei com as pernas cruzadas e os observei conversando ao longe. Então Elane pareceu acordar e veio caminhando preguiçosamente até onde eu estava, sentando-se ao meu lado.

    - Bom dia! ? Disse sacana. ? Tenho fome, muita fome. Vamos comer? ? Acho que quatro dias só dormindo não fizera bem a ela. ? Nossa, a casa de virgem voltou ao lugar? Bom trabalho Akemi. E quem é aquela falando com o Mestre?

    Revirei os olhos irritada.

    - Você fala demais Elane. Ainda mais depois que desmaia e acorda após quatro dias. ? Retruquei de má vontade.

    - Quatro dias? ? Resmungou dolorida, como se aquilo fosse inacreditável. ? Depois da lição do mestre eu apaguei. Agora eu compreendo o que aconteceu. Atingi o nirvana... Então meu corpo não suportou a expulsão de todo o cosmo e eu... Apaguei. ? Sua voz era pausada agora e reflexiva. Elane suspirou profundamente, soltou os cabelos e tornou a perguntar. ? Quem é aquela falando com o Mestre?

    Acho que um detalhe importante aqui é que as duas morriam de ciúmes ao ver Asmita com qualquer outro cavaleiro de bronze, de prata e demais aspirantes. Com exceção dos de ouro que eram amigos do Mestre de verdade, o resto ficávamos com bico no rosto e irritadinhas. Então ao ver aquela Amazona bonita falando com ele, um sentimento de revolta tomou conta das duas, que achavam que as únicas pupilas de Asmita éramos nós duas (o que era verdade) e que por isso, o resto era resto.

    - Faz um tempinho já que eles subiram e estão ali. ? Comentei pensativa. ? Não sei o que poderia ser e também não quero saber. ? E fechei a cara.

    - Eu vou lá perguntar. ? Disse Elane decidida e levantou-se antes que eu pudesse impedi-la.

    - Ei! ? E me levantei logo atrás, acompanhando-a. ? Espera! ? Acho que ela seria capaz de dar um soco na mulher e... Não seria legal. ? Elane! ? Resmunguei brava e quando chegamos bem pertinho, tive de forçar o melhor dos sentimentos.

    - Que bom que você acordou Elane! ? Disse Asmita com um sorriso sincero no rosto. ? Estava contando do treino que tive com as duas para a Prya. ? Por Athena, que nome era aquele? ? Eu ia dizer mais tarde, mas ela ficará encarregada de treinar as duas enquanto eu estiver fora.

    - O senhor vai embora do Santuário? ? Perguntaram as pupilas ao mesmo tempo.

    - Mas porquê? ? Perguntei chorosa, mesmo que eu soubesse melhor os motivos do que Elane, que acabara de voltar ao mundo.

    - É... Porquê? ? O tom de voz de Elane era melancólico. Eu sabia que seu apego à Asmita ia além da compreensão humana.

    - O Mestre do Santuário me encarregou de procurar Athena bem longe daqui. Vou liderar um grupo de busca com outros cavaleiros. ? Respondeu como quem falava do tempo. Prya ao seu lado mantinha-se silenciosa e observadora. Era educada, ao menos.

    - Tem previsão de quando irá voltar? ? Perguntou Elane curiosa.

    - Nenhuma. Só vou me ausentar um pouco da missão para observar a competição e vê-las lutar no campo, quando ela acontecer. ? Por mais ocupado que fosse, tínhamos que reconhecer o esforço do Mestre em nos mimar daquela forma.

    Enquanto eu sorria com sincera contentação, Elane soltou um muxoxo resmungão. Teria de conversar com ela depois.

    - Prya, esta é Akemi e esta Elane. ? Apresentou o Mestre com elegância singela e eu apertei a mão da amazona com segurança. Eu não tinha nada contra ela, não era pupila do Mestre, embora eu estivesse mexida com ciúmes. Elane recusou o aperto de mão, deu as costas e sumiu dentro da casa de virgem.

    - Perdoe a minha amiga, ela é teimosa e não admite que o Asmita deixe o Santuário. ? Fui sincera para os dois e dei de ombros, pedindo licença. Asmita segurou meu ombro com firmeza. Eu parei e me virei novamente.

    - Akemi, faça companhia à Prya. Eu vou ter uma conversa séria com a Elane, assim como já tive com você antes. ? Sua voz foi tão... Firme... Que senti certo medo por Elane. Acenei que sim e permaneci ali.

    Há dois dias, Asmita me contara de tudo o que se passava no santuário e eu tinha uma compreensão melhor da gravidade da situação do que Elane. Eu compreendera a necessidade do Mestre sair, mas eu sabia que mesmo que Elane soubesse das mesmas coisas, ela não iria mudar a idéia de que Asmita não devesse abandonar o Santuário. É. Seria difícil.

    - Eu compreendo a sua amiga. ? Comentou Prya com um tom de voz doce e melodioso. Era meiga no agir e no falar e fiquei pensando como que ela tornara-se amazona de prata.

    - Eu também, mas acho que ela deveria entender o Mestre. ? Desabafei sentindo-me triste. Acho que era eu quem mais compreendia os sentimentos de Elane. Asmita era quase como um pai para ela e diversas vezes, por Elane ser mais forte e ter o cosmo mais descontrolado, ele salvara sua vida... Assim como fez no último treinamento com ela. A ligação entre os dois era intensa demais e eu podia sentir que o Mestre também não queria se afastar, mas não tinha como abandonar a missão de proteger Athena.

    - Eu já fui como ela. E meu mestre não era tão bonzinho quanto o de vocês. ? E senti que ela parecia estar meio nostálgica.

    - Quem é seu mestre? ? Ou era, não sei.

    - É a Amazona de Áries. ? Respondeu com respeito e abnegação no tom de voz. ? Ela é bem mais rígida e fechada do que o Asmita, vocês duas tem sorte. ? É eu sabia Prya.

    - Você irá treinar com a gente no campo? ? Por que na casa de virgem eu acho improvável que aconteça. Sem Asmita, ninguém conseguia adentrar o local. Ele não ia abandonar a própria casa desprotegida.

    - Sim... Vai ser no campo. Todos os aspirantes vão estar por lá treinando. ? Explicou com suavidade.

    E enquanto conversávamos sobre técnicas de lutas diferentes que cada uma aprendera com o próprio mestre, Asmita adentrava o jardim aos fundos da casa de virgem onde Elane estava sentada próxima a cachoeira. Ele fitou Elane com certa compaixão e foi se aproximando devagar, sentando-se ao seu lado em seguida. Silêncio. A extensão do jardim era indescritível. Parecia um sem fim de belíssimas árvores, tipos de flores e ervas além da cachoeira linda e imponente ao lado, e no centro uma belíssima árvore que dividia o mundo dos vivos e a entrada para o mundo dos mortos. Os frutos daquela árvore eram redondinhos e quando secos, caíam ao chão e eram de coloração marrom. Com eles fazia-se o rosário que era consagrado com o cosmo do Mestre e então ele tornava-se uma arma potente nas lutas. O rosário de Asmita pertencera ao antigo dono da armadura de virgem e assim sucessivamente. Ele tinha o poder de ampliar o cosmo, ajudar nas técnicas próprias de quem ocupava aquela casa e fazia com que os espectros não retornassem do inferno e então morressem de uma vez. Sem o rosário, Hades faria com que seu exército renascesse até que conseguisse seu intuito. Conforme os 108 espectros de Hades morriam, cada bolinha tornava-se negra. E apenas o cavaleiro de virgem poderia possuir o objeto por ser o único a saber usá-lo corretamente.

    Os outros rosários dados às pupilas eram recém-colhidos e preparados para os treinos, somente. Porém Elane fez questão de torná-lo uma arma pessoal, enquanto Akemi apenas usava-o nas técnicas especiais, fazendo uso do lenço como arma pessoal.

    Asmita que antes estava sentado ao lado de Elane, ainda em silêncio, ergueu a mão direita para tocar um lírio logo a frente, entre alguns cascalhos duros e inférteis. Passava os dedos delicadamente por cada pétala enquanto notavam-se alguns respingos de água da cachoeira ali perto da flor. Elane baixou os olhos para observar, sentindo-se estranha. Ficava tensa com o mestre tão perto e tão silencioso.

    Em seguida as mãos do mestre vagaram ao redor até onde possuía uma margarida, em terra fértil, com boa iluminação, porém com ausência de água constante. Elane acompanhou aquilo com os olhos, reflexiva.

    - Quem é mais frágil? ? Perguntou Asmita, finalmente. ? O lírio nos cascalhos ou a margarida em terra fértil?

    - O lírio? ? Respondeu meio em dúvida. Aquilo possuía uma enorme pegadinha, bem sabia.

    - Nenhuma das duas. O que as diferencia são as condições do meio e a persistência em manter-se vivo. O lírio conseguiu nascer em terra infértil, com respingos de água e sol forte demais. A margarida está em terra fértil e nasceu como qualquer outra flor desse jardim. Agora tente arrancar as duas. ? Ordenou de um jeito que impedia contestações.

    Obediente, ergueu a mão para arrancar a margarida primeiro. Ela saiu bem fácil e podiam-se notar as raízes curtas e fininhas. Pouco profundas. Asmita sorriu e tomou-lhe a flor das mãos.

    - Isso não é fragilidade, é falta de vontade em viver onde se tem todas as condições. As raízes não são profundas, pois ela nunca teve a necessidade de tentar sobreviver. ? Explicou, colocando a flor novamente no local. ? Mas é muito mais fácil retorná-la à terra.

    Então ela ergueu a mão e tentou arrancar o lírio com delicadeza. Não conseguiu. Forçou mais e sentiu que o lírio começava a sair. Teve de usar as duas mãos para conseguir puxar tudo e viu com espanto o tamanho das raízes que aquela mínima flor conseguira fazer. E eram raízes fortes, mesmo com toda a sua aparência delicada de flor.

    - Para sobreviver nos cascalhos e obter água em abundância, teve primeiro de formar as suas raízes para depois permitir que nascesse um botão de flor. Essas raízes iam até onde tinha água constante da cachoeira. E infelizmente não é possível plantá-lo novamente, pois o trabalho de sobreviver assim nos cascalhos depende apenas da planta, de mais ninguém. ? E tomou a flor das mãos de Elane, passando os dedos pelas raízes lentamente. ? Isso não é ser mais forte, é ser mais persistente em sobreviver. Mas o caminho que cada raiz fez no solo para obter a salvação necessária foi feito com esforço contínuo pela planta. E não é algo que o melhor dos jardineiros possa fazer. Em compensação, ela agüentaria a pior das tempestades por milênios, ampliando suas raízes e inundando o redor da cachoeira com belos lírios. Ela não teve pressa em obter o próprio jardim. Ela se esforçou no necessário para depois mostrar a beleza que possuía.

    Elane tentava compreender a lição, mas ainda estava perdida... Um pouco.

    - E agora, quem é mais forte? ? Perguntou Asmita novamente.

    - Nenhuma das duas. ? Respondeu começando a compreender.

    - E por quê? ? Tornou a perguntar.

    - As duas tiveram a mesma oportunidade inicial, mas o lírio se esforçou mais do que a margarida e por isso tornou-se mais resistente na luta pela sobrevivência. Mas mestre... E se a margarida tivesse no lugar do lírio?

    - Nem toda semente plantada nos cascalhos floresce. E nem toda semente plantada em solo fértil é frágil. Tudo depende da planta e seu esforço pessoal. ? E cortou algumas raízes do lírio e recolocou no antigo local. ? O lírio voltará a florescer, mas vai demorar. Ele precisava firmar-se novamente.

    - E qual a conclusão disso tudo?

    - Que cada um faz o seu caminho. O meio em que você está não vai influenciar no seu desempenho. E a ausência de algumas coisas também não. ? Quase, quase lá.

    - Então...

    - Você vai ser quem? O lírio ou a margarida? ? Perguntou sério. Elane manteve silêncio. ? É bem mais difícil em solo infértil, mas você vai se entregar só por que não terá o Mestre ao seu lado? Ou será que não aprendera nada sobre a Paciência e o que eu vivo lhe ensinando?

    Ainda em silêncio, Elane soltou um suspiro vencido.

    - Com paciência inabalável o lírio conseguiu algo que a margarida nunca poderia obter sem o mínimo de esforço. Ele teve muito sol, pouca água, ventanias, mas continuou firme no seu caminho e no seu dever de sobreviver. E sabe por que o lírio queria sobreviver? ? Silêncio novamente. ? Por que todo o dever de uma flor é florescer, e todo o dever de um cavaleiro é proteger Athena.

    Elane ficou meio perplexa, era muito profundo aquilo tudo para assimilar de uma vez só.

    - O lírio plantou raízes profundas, e mesmo que eu mate esse que você acabou de arrancar, outros irão florescer. É essa a essência de todo Mestre de verdade. Não se preocupe se vou voltar ou não. Cuide e preserve aquilo que deixei para vocês, que o nosso jardim nunca irá morrer. ? E sorriu com simpatia, erguendo-se e indo embora.

    Elane ainda mantinha os olhos fixos no lírio, tentando absorver a lição toda sem deixar nada para trás.


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