A PROMESSA EM UM BEIJO

  • Finalizada
  • Kakyuu
  • Capitulos 17
  • Gêneros Drama

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    12
    Capítulos:

    Capítulo 1

    o visgo

    Linguagem Imprópria, Sexo

    19 de dezembro de 1776

    Colégio interno flor das Marías, Paris

    A meia-noite tinha chegado e tinha passado. Serena ouviu o sino pequeno do carrilhão da igreja quando se deteve na soleira da enfermaria. Eram três da manha. selene, sua irmã mais nova, por fim tinha cansado em um sono profundo; remetida pela febre, estaria segura aos cuidados da irmã luna. Tranqüila a respeito, serena podia voltar para sua cama, no quarto além dos pátios.

    Cobriu-se os ombros com um chale de lã e saiu das sombras da enfermaria. Os tamancos de madeira repicavam brandamente contra os caminhos de pedra enquanto atravessava os jardins do colegio. A noite era gelada e clara. Só ia vestida com a camisola e o roupão; já estava dormindo quando a irmã a tinha chamado para que ajudasse a cuidar de selene. O sentido comum a impulsionava a se apressar. —Embora caminhasse devagar, sentindo-se cômoda naqueles jardins encharcados pela lua, naquele lugar onde tinha passado a maior parte dos nove últimos anos.

    Logo, apenas selene estaria bem para viajar, iria para sempre. Tinha completado dezesseis anos fazia três meses e o futuro se abria diante dela: a apresentação na sociedade e logo o matrimônio, um enlace de conveniência com algum rico aristocrata. Era o costume entre os de sua classe. Como condessa Delune, possuidora de vastas propriedades em La Camargue e, entre outros capitalistas De Mordaunt, sua mão seria uma presa cobiçada.

    Os ramos de uma enorme tília arrojavam densas sombras sobre o caminho. Ao cruzar, de novo sob a luz brilhante, deteve-se; levantou o rosto para o céu infinito. Embebeu-se de paz. A proximidade do dia da festa do natal tinha esvaziado o colegio, pois as filhas dos ricos já estavam em casa para as celebrações desses dias. Ela e selene ainda estavam ali por causa dos problemas respiratórios dela, pois serena havia se negado a partir enquanto sua irmã não estivesse em condições de viajar com ela. selene e a maioria das outras voltariam em fevereiro e recomeçariam seus estudos.

    A paz desdobrava em sua melancolia sobre os arbustos de pontas brilhantes sob o intenso clarão da lua que caía do céu espaçoso. As estrelas titilavam no alto, diamantes esparramados no véu da noite. Os claustros de pedra se abriam diante dela, uma visão reconfortante e familiar.

    Não estava segura do que lhe aguardava além dos muros do convento. Aspirou profundamente, alheia ao frio, saboreando a doçura dos últimos dias de sua adolescência. Os últimos dias de liberdade.

    As folhas secas enchiam de sussurros à noite. Olhou para a velha parede, antiga, que se aderia ao alto muro do quarto, justo diante dela, à esquerda. O muro estava sumido em sombras,negra e impenetrável. Fechou os olhos em um intento de espionar na penumbra, sem temor a essa hora. O colegio tinha fama, de ser um lugar seguro, razão pela qual eram tantas as famílias aristocráticas que enviavam ali suas filhas.

    Serena ouviu um ruído surdo, logo outro; então, entre uma inundação de ruídos, um corpo deslizou do alto do muro e, por não conseguir agarrar-se a beira do claustro, aterrissou escancarado a seus pés.

    Serena olhou. Não lhe ocorreu gritar. Por que teria que fazêr? O homem. —Muito alto e de ombros largos. — era sem nenhuma duvida um cavalheiro. Inclusive à incerta luz da lua pôde distinguir o brilho de seu casaco de seda e o brilho de uma jóia em seu

    pescoço. Outro reflexo maior adornava em um dos dedos de uma mão, a levantou com lentidão para afastar umas mechas de cabelo que caíam sobre sua testa. Cabelos negros como a noite.

    Permanecia como tinha caído, meio apoiado nos cotovelos.

    A sua postura mostrava o peito em todo seu esplendor. Os quadris eram estreitos,

    as pernas grossas e musculosas que marcavam com nitidez sob as calças de cetim.

    O homem era nem magro e nem gordo embora alto; os pés também, calçados com sapatos negros com fivelas de ouro..

    Embora aterrissasse sobre o atalho de pedra, tinha conseguido amortecer a queda. Além de uns poucos machucados. serena duvidava que tinha se ferido gravemente. Só parecia irritado e desiludido, e também receoso. O cavalheiro estava a olhando atentamente, sem dúvida esperando seus gritos.

    Podia esperar. Ela ainda não tinha acabado de observá-lo.

    Darien teve a sensação de ter caído dentro de um conto de fadas, aos pés de uma princesa que tinha sido a causadora de seu tombo: ao olhar para baixo em busca do seguinte ponto de apoio, tinha-a visto surgir das sombras. Ela tinha levantado o rosto para o clarão da lua e ele ficou olhando-a, esquecendo o que estava fazendo, e afinal escorregou.

    O casaco tinha rasgado ao cair; moveu a mão sob a aba virada, procurando as dobras com os dedos. Localizou o brinco que tinha ido procurar ali, ainda a salvo no bolso.

    Agora, a adaga da família de Fabien de Mordaunt era dele.

    Outra aposta desatinada, outra façanha perigosa para acrescentar a sua vitória.

    E um encontro inesperado.

    Algum instinto subiu até sua cabeça: reconhecendo o momento, prestou atenção devida na menina estava seguro de que não era mais que isso. Ficou olhando-o com calma, estudando-o com cautela por sua condição, com certeza que o delicado cordão na gola de seu recatado roupão.

    Tinha que ser uma das nobres pupilas do colegio, estava ali por alguma razão. Com lentidão e com toda a soltura de que foi capaz, levantou-se.

    -Mil desculpas, mademoiselle.

    Viu uma sobrancelha arqueada de maneira delicada e singular; os lábios, redondos e muito grandes para o gosto da época, levemente entreabertos. O cabelo caindo em cascata sobre os ombros; as mechas onduladas, de um loiro absoluto à luz da lua.

    —Não era minha intenção assustá-la.

    Não parecia assustada; mas tinha o aspecto da princesa que ele havia imaginado que era: cheia de orgulho e um pouco regozijada. Embora com lentidão, ele se incorporou até ficar de pé. Era uma mulher pequena: sua cabeça logo chegava ao queixo dele.

    serena levantou os olhos para ele. A lua iluminava seu rosto. Não havia rastro de preocupação naqueles olhos azuis claros, grandes e cansados.

    As grossas sobrancelhas arrojavam um fraco traço de sombras sobre as bochechas. Seu nariz era fino, e seus traços confirmavam seu berço, sua provável condição social.

    A atitude da jovem era de tranquila espera. Devia apresentar-se, para o homem.

    —Diabo!...

    Deu a volta. Um clamor de vozes alagou a noite, fazendo pedaços a quietude. Pelo extremo do pátio surgiram brilhos.

    O homem saiu do atalho e se escondeu entre as sombras de um grande arbusto.

    A princesa ainda podia vê-lo, embora ele se escondia da ruidosa multidão que se aproximava correndo pelo atalho. Ela poderia ter informado imediatamente, aos guardas para ele...

    serena observou um grupo de freiras que se aproximavam apressadas, com os hábitos agitando-se em desordem. Acompanhavam-nas dois jardineiros. Quando a avistaram, foi logo perguntando

    —Senhorita, você viu alguem? — A irmã Aghata perguntou a serena

    — um homem? — A madre superiora, já sem fôlego, lutava por conservar a dignidade. — O conde de Vichesse nos alertou da intenção de um louco para encontrar-se com a senhorita Marchand. E essa menina tola e estúpida... —Inclusive na escuridão, o olho da madre superiora relampejava. — O homem esteve aqui. Estou segura! Deve haver descido pelo muro. Cruzou com você? Viu ele? Com os olhos bem abertos, Serena virou a cabeça à direita, longe da figura oculta pelo arbusto. Olhou para a cancela principal e assinalou com a mão...

    —Para entrada! Rápido! Se nos apressarmos, apanharemos ele!

    O grupo saiu correndo e entraram nos jardins que ficavam mais à frente e, gritando, derrubando as camas que estavam no caminho, procurando com frenesi. Pareciam que procuravam mais um suposto louco do que o homem que tinha caído aos pés de serena.

    O silêncio voltou; os gritos e barulhos ao poucos foi diminuíndo na noite. Depois de levantar-se do chão de novo e voltar a cruzar os braços, virou-se para ver o cavalheiro sair das sombras.

    —Minha gratidão, senhorita. Não pense que sou um louco. Mais do que simples palavras, a voz profunda e com expressão firme tranqüilizaram-na. serena olhou para o muro do qual tinha caído o homem. Minako aino Marchand tinha abandonado o colegio um ano antes, mas sua indignada família a havia devolvido à segurança do monastério até que chegasse seu irmão e a levasse para o campo. O comportamento de minako nos salões de Paris tinha provocado rumores. Serena olhou para o estranho, que se aproximava com sigilo.

    —Que tipo de homem é voce, então?

    Os lábios do cavalheiro, finos e de uma expressividade fascinante, moveram-se com rapidez quando parou diante dela.

    —Um inglês.

    Serena jamais o teria deduzido por sua forma de falar, já que seu sotaque eram de um parisiense. Entretanto, a confissão era muito reveladora. tinha ouvido falar que os ingleses estavam acostumados a ser farto e bastante louco; mais à frente, inclusive, pelo quais os costumes parisianos viam como normal. Mas nunca tinha conhecido um.

    O fato se pôde ler com claridade na expressão da garota, naqueles olhos pálidos de inquietante beleza. Sob a luz brilhante, darien não podia dizer se eram azuis, cinzas ou verdes. E lamentou que não pudesse averiguá-lo. Levantando a mão, observou a linha superior da bochecha de serena com o dedo.

    —De novo, minha gratidão, senhorita.

    Deu um passo atras em tensão, dizendo que tinha que partir. Algo brilhou na escuridão... Olhou para cima. Justo atrás de serena, um cacho de visgo pendurava de um ramo de tilo. E era quase Natal.

    Serena levantou o olhar, seguindo o desconhecido. Observou o visgo caindo. Então baixou a cabeça lentamente, para os olhos e os lábios do inglês.

    Seu rosto era de uma virgem francesa; não parisiana, a não ser mais verdadeira,

    mais vital. Darien sentiu entre a perna um puxão mais visceral que nunca tinha sentido antes. Baixou a cabeça com lentidão, lhe dando tempo de sobra para que, afastasse.

    Ela não se afastou; apenas levantou o rosto.

    Os lábios de darien roçaram os da garota, e sentiu o beijo mais casto da vida do inglês. Sentiu tremer os lábios de serena nos seus, e pode notar a inocência da garota.

    -Obrigado. Era tanto quanto dizia o beijo, e o quanto lhe permitiu dizer.

    Darien levantou a cabeça, ainda sem se afastar, e incapaz de fazê-lo.

    Seus olhares se encontraram, os fôlegos misturados... Ele voltou a inclinar sua cabeça.

    E desta vez foram os lábios de serena que, suaves, generosos e inseguros, encontraram os seus. O desejo foi poderoso, mas darien a refreou, tomando só o que inocentemente lhe oferecia, sem devolver mais que isso: uma troca. Apenas uma promessa,sabia mesmo aquilo seria impossível, e estava seguro de que ela também sabia.

    Custou para interromper o beijo, e o esforço o deixou ligeiramente perplexo.

    Mesmo que não a tocasse de forma intima, sentiu a calidez da moça percorrer seu corpo. Obrigou-se afastar, levantou o olhar e tomou fôlego.

    Seus olhos se fixou no visgo. Sem pensar, estendeu a mão, cortando um cacho; do ramo que lhe deu algo real, algo deste mundo a que se agarrar.

    Afastou outro passo antes que seu olhar se encontrasse com o dela. Fazendo uma reverência com o ramo, disse:

    —Joyeux Noel.

    Seguiu se afstando, e se obrigando a olhar além da garota, para as grades que tinha saltado para entrar.

    —Vá por ali. — disse ela.

    Com o sangue lhe pulsando mais rapido e uma estranha sensação, serena lhe indicou com a mão mais para trás, em sentido contrário a da grade principal.

    —Quando você chegar no muro, siga-o afastando do colegio. Então encontrará uma porta de madeira. Não sei se estará aberta O... — hesitou —É o caminho que seguem as garotas quando saem às escondidas. Dá para um beco.

    O inglês a olhou e, uma vez mais, inclinou a cabeça; a mão se moveu no bolso, onde pegou o ramo. Não deixou de olhá-la enquanto dizia:

    —Au revoir, mademoiselle. - virou e sumiu na escuridão.

    Em menos de um minuto, serena deixou de ouvi-lo. Encontrando forças, tomou fôlego, contendo — e tentando reter a magia que os tinha envolvido e, a contra gosto, voltou.

    Como se tivesse saido de um sonho, não notou o frio que passou através de sua camisola; tremendo e apertou o passo. Levando os dedos aos lábios, relembrando com doçura. Ainda podia sentir a calidez persistente, da cúmplice pressão daqueles lábios.

    Quem era ele? Desejou ter tido a audácia de perguntar a ele, mas possivelmente fosse melhor não saber. Depois de tudo, nada podia perder de o encontro... Da intocável promessa contida em um beijo. Por que teria ido ali? Sem dúvida pela manhã se inteiraria por boca de minna. Mas um louco?

    Sorriu com cinismo. Jamais confiaria que o conde de Vichesse pudesse dizer. E se de algum jeito o inglês se entretinha em chatear a seu tutor, então só se sentia imensamente feliz de havê-lo ajudado.


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