Sobrado Azul

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    Capítulos:

    Capítulo 2

    Capítulo II

    Os personagens de Saint Seiya pertencem ao tio Kurumada e é ele quem enche os bolsinhos. Todos os outros personagens são criações minhas, eu não ganho nenhum centavo com eles, mas morro de ciúmes.

    SOBRADO AZUL

    Chiisana Hana

    Beta-reader: Nina Neviani

    -S -A -S -A -S -A -S -A -

    Capítulo II

    ? Apaixonado, Ikki? Shiryu conheceu a Shunrei há umas duas horas! ? Shun argumenta olhando inquisitivamente para o irmão.

    ? E daí? Essas coisas são assim mesmo. Quando está escrito, está e pronto ? Ikki rebate, esticando-se sobre o sofá. ? Eu bem sei que é assim...

    ? É... ? Shun responde, agora olhando para o irmão com compaixão. ? Aconteceu assim com você e...

    ? E a Esmeralda ? corta Ikki. ? Eu me apaixonei por ela quando a vi, por isso estou dizendo: Shiryu caiu de amores pela chinesinha.

    ? Pode ser. Mas ele tem aqueles ideais de filantropia, justiça para todos, creio que ele faria isso por qualquer pessoa.

    ? Blá, blá, blá... Shun, põe uma coisa na sua cabeça: Shiryu resolveria o problema de qualquer outra pessoa calmamente, pensando e tal, jamais sairia de casa furioso daquele jeito. Se ele saiu é porque ficou perturbado. Do contrário, ele não resolveria as coisas na porrada.

    ? Você tem razão e... porrada? Acha que ele vai bater no cara?

    ? São duas horas da manhã, Shiryu saiu daqui cantando pneu, acha que ele vai sentar no sofá do cara e argumentar? Vai descer o braço! Finalmente vai usar o que aprendeu nas aulas de kung-fu!

    ? Ikki! Pega o carro! Vamos atrás dele! ? Shun exclama nervoso.

    ? É ruim! Shiryu sabe o que faz ? conclui Ikki, virando-se para o lado. ? Agora me deixa que eu vou dormir aqui mesmo no sofá.

    -S -A -

    Shiryu dirige até o subúrbio. Antes, passa num caixa eletrônico e saca a quantia que julga suficiente para pagar a dívida de Shunrei. Ao chegar no conjunto habitacional, para o carro em frente ao primeiro bloco de apartamentos, sai pisando duro e bate à porta do apartamento 01 educadamente. Minutos depois, já um tanto impaciente, bate com mais força, depois com mais força, até que alguém responde lá de dentro.

    ? Já vou! Vai tirar a mãe da forca? ? o sujeito abre parcialmente a porta. ? O que é? Isso é hora de vir à casa dos outros, cara?

    ? Por acaso você tinha uma inquilina chamada Shunrei? ? Shiryu pergunta incisivo, empurrando a porta.

    ? Nem me fale no nome daquela pequena vadia...

    Shiryu responde ao insulto com um soco na face do sujeito.

    ? Vadia é uma coisa que eu tenho certeza que ela não é.

    ? Que é isso, cara? Qual é? ? o homem esfrega a mão no local atingido.

    ? Eu vi o machucado no rosto dela e sei que foi você ? Shiryu diz, segurando o sujeito pela gola do pijama.

    ? Não... Não fui eu! Nunca encostei nela!

    ? Se continuar mentindo eu te arrebento ainda mais!

    ? Tudo bem. Tudo bem. Fui eu.

    Outro soco.

    ? Cara, você está ferrado! Eu vou chamar a polícia. Vou denunciar você por agressão.

    ? Chama agora! Quero ver quem vão levar preso, eu ou você ? Shiryu diz calmamente, mas segurando o sujeito pela gola outra vez. ? Exigir favores sexuais como pagamento de uma dívida! Onde já se viu? Eu vou fazer tudo pra você não sair da cadeia nem tão cedo. Pode chamar a polícia. Estou esperando. Vou até soltar você.

    ? Calma aí, cara. Vamos conversar.

    ? Eu não converso com criminoso. Quanto é que ela lhe deve?

    ? Quinhentos paus.

    ? Aqui estão ? Shiryu responde, tirando o dinheiro da carteira. ? Pega a chave do apartamento onde ela morava. Vou levar as coisas dela embora.

    ? Você que manda, chefe ? responde o homem, contando o dinheiro e colocando-o embaixo de um vaso.

    ? Chefe? Se eu fosse seu chefe, você já estaria demitido.

    ? É aqui do lado ? ele diz ao pegar a chave. ? Eu o levo até lá.

    ? Ótimo.

    ? Os móveis são do apartamento, tá? Só os bagulhos são daquela va... daquela moça.

    ? Você está querendo levar outro soco, não está? ? Shiryu diz, pegando uma mala que estava sobre o guarda-roupa. ? Não vai caber tudo nessa mala. Arruma uma caixa.

    ? Agora, chefe.

    Prontamente o homem traz uma caixa de papelão e Shiryu recolhe todas as coisas de Shunrei que ele não queria devolver. Com a mala arrumada e o restante dos pertences na caixa, ele sai do apartamento.

    ? Muito bem. Era só isso que eu queria. A dívida está paga ? Shiryu diz, colocando a mala e a caixa no chão.

    ? Tudo certo, chefe. Não tem mais dívida.

    ? Isso. Esqueça que a Shunrei existe, nunca mais pense nela e... ? desfere outro soco na face do homem. ? Nunca mais chame nenhuma moça de vadia, nem tente obter favores sexuais da forma que tentou. Se não tem capacidade para conquistar uma mulher, contrate uma prostituta.

    Shiryu pega a caixa e a mala e vai embora, deixando o homem esfregando o rosto.

    ? Tomara que fique bastante roxo ? Shiryu diz, sem olhar para trás.

    Calmo, Shiryu põe a mala e a caixa no carro e vai embora. Quando ele finalmente chega em casa, o sol já está começando a nascer. Ele entra no sobrado tentando não fazer muito barulho e põe as coisas num canto da sala. Mesmo assim, Ikki, que dormia no sofá, acorda.

    ? E aí, bateu no cara? ? Ikki pergunta, esfregando os olhos e se espreguiçando.

    ? Bom dia pra você também ? Shiryu responde e se joga na outra poltrona.

    ? Bateu?

    ? Bati ? ele admite.

    ? Sabia! Muito? ? Ikki se senta no sofá.

    ? Não muito. Alguns socos. Ele mereceu.

    ? Nunca imaginei que um dia ia ver você, o cara sereno, responsável e equilibrado, dando uma de Ikki! ? ri o rapaz de cabelos azuis.

    ? É, eu também nunca me imaginei fazendo isso ? Shiryu responde sorrindo.

    ? Finalmente as artes marciais serviram para alguma coisa, né?

    ? Você sabe que a violência não é um propósito das artes marciais, mas eu senti uma vontade imensa de partir a cara do safado. Eu não estava descontrolado, estava só com vontade de dar uma lição nele.

    ? Hehehe! São as coisas dela? ? Ikki pergunta, apontando para a mala e para a caixa.

    ? São. Fiz ele abrir o apartamento para pegá-las.

    ? Você está gostando loucamente da chinesinha, não está?

    ? Eu não sei... ? Shiryu diz confuso, corando ligeiramente. ? O que eu sei é que eu sinto uma coisa aqui dentro, uma necessidade de protegê-la, de fazer aquela melancolia desaparecer dos olhos dela.

    ? Eu sei exatamente o que você sente... ? Ikki diz. Depois de uma longa pausa, continua: ? Tomara que você tenha mais sorte que eu.

    ? É. Bom, já que estou acordado, vou preparar o café. Me ajuda?

    ? Eu tenho cara de quem sabe fazer café, Shiryu?

    ? Eu sei que não, mas vamos para a cozinha, ok? Eu faço o café, você só me faz companhia.

    Um pouco mais tarde, Hyoga acorda. Tinha chegado em casa depois que Shiryu saíra e quando Ikki e Shun já estavam dormindo, por isso nada sabia dos acontecimentos anteriores.

    ? Poxa, aquela cama do Shun é uma tristeza! Porcaria de colchão mole! ? reclama o russo.

    ? Você dormiu na cama dele? ? Shiryu pergunta.

    ? Foi o jeito! Quando cheguei, ele estava lá na MINHA cama e aquela amiga dele na SUA cama. Não entendi nada. Aliás, onde você estava? Não saiu com a gente, mas saiu sozinho, né, safado?

    ? É uma longa história ? Shiryu responde, pondo a garrafa térmica com café na mesa.

    ? Pois pode começar a contá-la ? Hyoga diz, antes de morder um pão. ? Esse pão é de que semana?

    ? De ontem. Ou anteontem. Sei lá. Só sei que ninguém foi comprar hoje ? Ikki diz, olhando acusadoramente para Shiryu.

    ? Ah, não me olhe assim! Não deu pra lembrar de comprar pão!

    ? Tá, mas comece a contar a tal história ? pede Hyoga.

    Shiryu explica a Hyoga toda a situação, sendo sempre entrecortado por comentários espirituosos de Ikki.

    ? Então é isso: você se apaixonou pela menina à primeira vista, foi lá, bateu no cara e pagou a dívida que ela tinha? ? Hyoga pergunta um tanto perplexo.

    ? Eu não disse isso! ? rebate Shiryu, bastante nervoso.

    ? Ah, disse sim, Shiryu! ? assente Ikki.

    ? Eu só quis ajudá-la! Sem nenhum interesse! ? Shiryu tenta explicar.

    ? Seeeeeeei! ? Ikki e Hyoga dizem juntos.

    ? Juro! ? Shiryu responde, profundamente envergonhado.

    Logo em seguida, Seiya chega em casa com o cabelo desgrenhado e cara de sono.

    ? E aí? Estão preparados para fazer um pequeno campeonato de video game? ? ele pergunta esfregando os olhos.

    ? Aconteceu tanta coisa que eu nem lembrava que você tinha marcado isso! ? Shiryu diz.

    ? Pô! Campeonato é sagrado! ? Seiya argumenta. De vez em quando organizava competições em casa para animar o pessoal.

    ? Sem video game, Seiya. Hoje eu não consigo jogar nem Pacman ? Shiryu diz coçando a cabeça.

    ? Ai, que frescura! Ei, mas o que é que está rolando aqui? Você e Ikki estão com a roupa de ontem...

    ? Você reparou? Que interessante... ? Shiryu diz irônico, já começando a perder a paciência.

    ? O que houve?

    ? O Shiryu... ? Ikki começa, mas é interrompido pelo amigo.

    ? Eu mesmo conto! Você vai distorcer tudo. Uma amiga do Shun estava com um problema, então ela veio pra cá e eu ajudei a resolver.

    ? Não entendi nada. Quer explicar direito? ? Seiya diz.

    ? Não. Você entende depois ? Shiryu diz, pois ao ver Shun descendo a escada imaginou que Shunrei viria logo atrás dele.

    ? Bom dia, pessoal! ? Shun diz, ainda bocejando.

    Todos respondem ao cumprimento de Shun.

    ? Cadê a branquelinha? ? Ikki pergunta.

    ? Está no banheiro. Mais tarde vou falar com a June. Precisamos arrumar umas roupas para ela enquanto não conseguimos pegar as dela de volta.

    ? Não precisa ? Shiryu diz sem olhar para Shun. ? As coisas dela estão lá na sala.

    ? Como?

    ? Estão lá. Eu fui buscar.

    ? Aaah, é mesmo! Ontem você saiu daqui que nem louco... Mas que bom que convenceu o homem a deixar trazer as coisas!

    ? É, convenceu ? Ikki diz, sarcástico. ? Quem não convenceria daquele jeito, enchendo o cara de socos?

    ? Você fez isso, Shiryu? ? Shun pergunta, sem acreditar que Shiryu tinha sido capaz de um ato violento.

    ? Fiz ? envergonha-se Shiryu.

    ? Poxa, Shiryu, não se resolve as coisas desse jeito ? Shun o repreende.

    ? Ah, resolve, sim, Shun! Um bom sopapo sempre funciona ? Ikki comenta.

    ? Violência só gera mais violência ? Shun diz.

    ? Ué? Como é que é isso? ? questiona Seiya. ? A sua amiga chinesinha veio pra cá sem roupa, Shiryu foi buscar e para isso encheu um cara de porrada?

    ? É mais ou menos isso ? explica Shun.

    ? Mas por que o Shiryu foi buscar e não você? A amiga não é sua? E se era para dar porrada, por que o Ikki não foi junto? Não é ele o lutador de vale-tudo? Não estou entendendo.

    ? Depois conversamos, Seiya ? Shiryu diz apressado, ao ver que agora Shunrei realmente está descendo a escada. Ela parece melhor, embora a marca do soco que levara no dia anterior esteja um pouco mais arroxeada. Vestia a mesma calça de ontem e uma camiseta emprestada por Shun.

    ? Bom dia... ? ela diz, um pouco envergonhada. Não é uma situação muito confortável estar numa casa com cinco homens e ela começa a se perguntar se tinha feito a coisa certa ao procurar Shun.

    Os rapazes respondem ao cumprimento de Shunrei.

    ? O café está pronto. Pode se sentar e se servir ? Shiryu diz, oferecendo a Shunrei seu lugar à mesa.

    ? Obrigada... ? ela responde, olhando para o chão.

    ? Ah, que bom! Café! Estou morto de fome. Você também deve estar, né, Shunrei? ? Shun diz sorrindo, na tentativa de quebrar o visível constrangimento dela.

    ? Um pouco... ? ela responde, ainda olhando para o chão.

    ? Ei, pessoal, onde é que vamos almoçar hoje? ? Seiya pergunta, sempre preocupado com a comida.

    ? Eu posso fazer o almoço hoje. Pelo menos como forma de agradecer por vocês terem me acolhido por essa noite.

    ? Não precisa. Você está cansada, Shunrei ? Shun argumenta.

    ? Nós vamos pegar o almoço num restaurante aqui perto, como fazemos todos os sábados. Não se preocupe ? Ikki diz.

    ? É. E além disso, acho bom passar num posto de saúde para dar uma olhada nesse machucado ? Shiryu concorda.

    ? Não foi nada. Eu não estou cansada. Deixem, por favor! Eu quero ajudar!

    ? Melhor não, querida. E Shiryu está certo, acho bom passar num posto de saúde ? Shun diz.

    ? Realmente não precisa...

    ? Precisa sim ? continua Shun. ? Agora tome café que mais tarde vamos ao posto.

    ? O certo era passar também na delegacia e prestar queixa contra o sujeito ? Shiryu fala, evitando olhar para Shunrei.

    ? Não, vamos deixar assim. Eu não quero mais confusão. Por favor ? ela responde.

    ? E de tarde tem campeonato de vídeo game! ? Seiya diz, bastante empolgado.

    ? Eu já disse que não vou jogar ? Shiryu diz, bocejando. ? Estou morrendo de sono.

    ? Ah... a culpa é toda minha por você não ter dormido bem ? Shunrei diz, dessa vez olhando para ele e imaginando se ele teria dormido no sofá, já que ela se apossara de sua cama. Já tinha percebido como ele é bonito, mas agora, à luz do dia, notou que seus olhos ganham um tom azul ainda mais intenso, o que a faz lembrar do mar. Só então se dá conta de que ele ainda está com a roupa da noite anterior e tenta imaginar o porquê.

    ? Não é culpa sua ? ele diz olhando para ela, fazendo com que seus olhares se encontrem. Os dois sustentam o olhar alguns segundos, até corarem. Ao perceber que os dois estão envergonhados, Shun intervém, antes que mais alguém perceba.

    ? Então, Shu, quer participar do nosso campeonato de vídeo game? ? ele pergunta.

    ? Ah, eu não sei jogar ? ela lamenta.

    ? A gente ensina! ? Seiya se oferece.

    ? Então eu posso tentar.

    ? Você vai gostar! A gente se diverte muito! ? Shun continua tentando animar a menina.

    ? Tá... Ainda estou com essa roupa de ontem... ? Shunrei

    ? Shunrei... as suas coisas estão lá na sala... ? Shun diz, olhando para Shiryu.

    ? Quê? Como conseguiram? ? ela pergunta surpresa.

    ? Foi ele ? Shun diz, apontando para Shiryu.

    ? Está tudo resolvido ? Shiryu diz. ? Fui buscar tudo ontem.

    ? Ele não vai sossegar enquanto eu não pagar o que devo ? Shunrei murmura, nervosa. ? Eu quero pagar, mas não estou conseguindo!

    ? Ele não vai mais lhe perturbar. Não tem mais dívida ? Shiryu afirma.

    ? Como? ? surpreende-se a moça.

    ? Eu paguei. Tinha umas economias e achei melhor resolver isso logo.

    ? Eu não tenho como agradecer! Muito obrigada, muito obrigada mesmo. Quando eu arrumar emprego, eu prometo que pago tudo ? Shunrei diz, realmente agradecida e comovida pelo gesto solidário.

    ? Não precisa, ok? É um presente...

    Shunrei olha ligeiramente desconfiada para Shiryu e depois, para Shun, imaginando se Shiryu tinha feito isso com alguma intenção escusa.

    ? Não se preocupe. Ele não vai exigir nada em troca. Esse aí é o cara mais justo que existe na face da terra, pode ter certeza. Ele só vai ser advogado por causa de ideais filantrópicos.

    ? Defensor público. Quando me formar quero fazer concurso para a defensoria pública.

    ? É a sua cara atender pobretões ? Ikki diz, rindo.

    ? E é a sua ficar numa obra dando gritos nos coitados dos operários ? rebate Shiryu, indignado.

    ? Eu não vou gritar, cara. Eu só vou botar moral... hehe.

    ? Shiryu, eu não sei mesmo como agradecer ? Shunrei diz, com os olhos marejados. Está tão acostumada a ser sozinha, que agora, cercada de cuidados acaba se comovendo com o gesto solidário de Shiryu.

    ? Não precisa agradecer ? ele diz sorrindo. Olha nos olhos dela por alguns segundos. A melancolia esvanecera um pouco.

    ? Bom, Shu, já que você vai ficar aqui com a gente, vamos ter que mudar algumas coisas nessa casa, não é pessoal? ? Shun pergunta.

    ? Eu não acho certo, Shun... ? Shunrei diz, surpresa, ao ver que Shun está mesmo disposto a deixá-la ficar. ? Vocês já fizeram demais por mim. Agora eu tenho que me virar sozinha.

    ? Vocês concordam que a Shu fique conosco? ? Shun pergunta em voz alta, ignorando o que Shunrei acabara de dizer.

    ? Por mim, tudo bem ? concorda Hyoga.

    ? Por mim também. É até bom, para falar a verdade ? Seiya assente, e completa: ? Vai dar um toque feminino na nossa casinha.

    ? Também acho uma boa idéia ? concorda Shiryu, evitando olhar para Shunrei. Deseja intensa e sinceramente que ela fique, mas ao mesmo tempo teme tamanha proximidade.

    ? E você, Ikki? ? Shun pergunta ao irmão que, pensativo, até agora nada respondera.

    ? Ela fica ? ele responde e se levanta da mesa. ? Vamos tirar a tralha do quartinho da bagunça e transformar aquele lugar num quarto decente para ela. Depois de tirarmos, cada um faz o que quiser com sua tralha. Se ficar alguma coisa espalhada por aí, eu vou jogar no lixo.

    ? Não precisa, gente... ? Shunrei diz. Não foi sua intenção cair de pára-quedas na vida daqueles cinco rapazes, não quer mudar a rotina da casa deles, mas também não vê outra solução imediata para sua vida.

    ? E você vai para onde? Pra debaixo da ponte? ? Shun questiona, olhando nos olhos dela. ? Nós não vamos deixar.

    ? É. Você fica no quartinho. Vamos precisar pintá-lo e arrumar pelo menos um colchão. Enquanto não arrumamos seu quarto, você pode dormir na minha cama ? Shiryu diz.

    ? Obrigada ? ela murmura entre lágrimas. ? Eu não sei como pagar tudo que vocês estão fazendo por mim.

    ? Que tal sorrir? ? Shun diz, abraçando-a e enxugando-lhe as lágrimas. Ela sorri timidamente. Ele continua: ? Bom, galera, vamos lá tirar as tralhas do quartinho. Mais tarde levo a Shu ao posto de saúde. Seiya você lava os pratos!

    ? Eu?

    ? Pode deixar que eu lavo, Seiya ? Shunrei se oferece.

    ? Ah, valeu, Shunrei! ? ele diz e sai correndo para evitar que ela mude de idéia.

    Ela lava os pratos e arruma a cozinha, enquanto os rapazes passam toda a manhã retirando as tralhas do quartinho.

    ? Aqui dentro tem tanta coisa que é capaz de acharmos um dinossauro ? comenta Hyoga enquanto tira uma caixa de cima da velha estante de metal.

    ? Um boneco do He-Man! De quem é essa porcaria? ? zomba Ikki, ao encontrar o brinquedo noutra caixa.

    ? É meu, caramba! ? Seiya responde. ? Me dá ele! Eu não sabia onde estava.

    ? Boneco do He-Gay queima o filme, né, Seiya? ? Ikki continua.

    ? Queima nada! É uma lembrança da minha infância. Me dá!

    ? Esses livros sacais são do Shiryu, né? ? mais uma vez Ikki comenta.

    ? São meus, sim. Vou doá-los para a biblioteca. Não tem mais onde colocar livro lá no quarto.

    ? Minhas luvas de boxe! ? Ikki diz, ao encontrá-las dentro da mesma caixa. ? Poxa, faz tanto tempo que não luto boxe.

    ? Agora viciou no vale-tudo ? Shun diz, desdenhando.

    ? Vale-tudo é muito mais interessante ? Ikki afirma.

    ? É mais violento ? Shun diz, já esperando a resposta do irmão.

    ? Por isso mesmo é mais interessante.

    ? As paredes estão meio sujas. Precisam mesmo ser pintadas ? Shun muda de assunto. Não conseguia entender essa história de Ikki lutar vale-tudo por diversão. Sempre chegava das lutas com a cara amassada, sangrando. Que prazer havia nisso?

    ? Tem essa lata da tinta azul que usamos na fachada ano passado ? Hyoga diz, tirando a lata de cima da estante.

    ? Excelente! ? exclama Shun ? Acho que deve ter pincel e rolo em algum lugar por aí.

    ? Temos que começar ainda hoje, para que amanhã tenhamos nosso quarto de volta, Shiryu ? Hyoga diz, abrindo a lata para ver o estado da tinta. ? Está boa.

    ? Achei o rolo e os pincéis! ? Shun diz, remexendo numa caixa atrás da porta.

    ? Ótimo. Eu posso começar a pintar aquele lado que já está sem bagunça. ? oferece-se Hyoga.

    ? Ok. Vamos deixar essa estante aqui mesmo ? Shiryu diz, limpando a estante com um paninho. ? Dá pra ela guardar as coisas enquanto não arrumamos um guarda-roupa.

    ? Boa idéia, Shiryu. E onde ela vai dormir? ? Seiya pergunta, ainda com o boneco do He-Man na mão.

    ? Tem aquele colchão para visitas. Podemos trazer para cá ? sugere Ikki.

    ? Aquele colchão é nojento! ? exclama Shun. ? Você o usa para suas coisas obscuras com as mulheres que traz aqui.

    ? E o que você sugere, senhor Pureza?

    ? Eu não sei, mas a coitada da Shunrei não pode dormir naquele colchão.

    ? Eu posso pedir um colchão novo a minha namoradinha linda ? Seiya diz. ? Ela não vai se importar.

    ? Certo. Faça isso amanhã, agora temos que pintar ? Hyoga diz, já começando a pintar uma das paredes.

    ? Pedir colchão à namorada? Você é muito sem vergonha, Seiya ? zomba Ikki.

    ? O que tem? Ela é rica!

    ? Acho que vou comprar uma tinta de outra cor e pintar algumas coisas alegres. Umas flores, talvez ? Shun sugere, imaginando que Shunrei gostaria de um quarto alegre.

    ? É gay, muito gay! ? retruca Ikki.

    ? Mas vai ser um quarto de moça! ? Shun argumenta.

    ? Bom, isso é verdade.

    ? Tenho outra idéia. Já vi fazerem na tevê ? Shun diz, revirando uma caixa que estava no quartinho. ? Achei! Sabia que tinha esse resto de pano estampado! Nem lembro mais para que usamos.

    ? Para as fantasias do carnaval ? Hyoga diz, sem sequer olhar para o pano.

    ? Isso! Que tal recortar as flores da estampa do pano e colar na parede?

    ? Vai ficar uma merda ? Ikki diz.

    ? Vai nada. Pelo menos o quarto dela fica alegre ? rebate Shun, já procurando uma tesoura para recortar as flores.

    ? Basta que fique limpo, Shun. Não precisa afrescalhar ? Ikki continua. ? E depois, sua namorada vai ficar irada quando souber que você anda cheio de cuidados com a branquelinha.

    ? Não vai, não. Conheço a Ju, ela vai entender que eu e Shunrei somos apenas amigos.

    ? Isso é o que você pensa.

    Shunrei aparece na porta do quartinho.

    ? Rapazes, tomei a liberdade de preparar um lanche para vocês. Suco e biscoitos.

    ? Ah, obrigado, Shu! ? agradece Shun.

    ? Opa! Lanche é comigo mesmo ? afirma Seiya, colocando o boneco do He-Man num canto e esfregando as mãos.

    ? Obrigado pelo lanche ? Shiryu agradece, sorrindo timidamente. ? Seu quarto vai ficar uma graça.

    Shunrei sorri de volta.

    ? Ah, vocês estão tendo tanto cuidado comigo! O mínimo que eu poderia fazer era preparar esse lanchinho.

    ? Por falar em cuidado, você tem que ir ao posto de Saúde. Ikki ou Shiryu, um de vocês vai levá-la ao posto. Quem mandou vocês terem carro?

    ? O Shiryu vai, né? ? Ikki diz, empurrando Shiryu e sorrindo maliciosamente.

    ? É... claro... ? ele responde, um tanto confuso.

    ? Bom! Depois passe num restaurante e traga o nosso almoço ? Shun dá as instruções para Shiryu. ? Use o dinheiro que sobrou das contas, se não der, completa que a gente paga depois.

    ? Ok, Shun ? Shiryu afirma e depois se volta para Shunrei. ? Vou tomar um banho e trocar de roupa, ok?

    Shunrei balança a cabeça afirmativamente.

    ? Vai logo! ? outra vez Ikki empurra Shiryu, que sai do quartinho e sobe para tomar banho.

    ? Acho que preciso tomar um banho também... ? murmura Shunrei.

    ? Tem um banheiro pequeno aqui embaixo, pertinho do seu quarto ? Shun diz, apontando na direção do banheirinho. ? Vai ser o seu banheiro, certo?

    ? Obrigada, Shun.

    ? Vou pegar xampu, condicionador, sabonete... essas coisas... ? ele diz, e sai do quarto.

    ? E eu vou pegar toalha e roupas na minha mala.

    -S -A -

    No banho, Shiryu pensa nas últimas horas. Não consegue se reconhecer. Acaba de fazer algo que jamais pensara ser capaz de fazer, por uma moça que mal conhece, mas que não consegue tirar da cabeça.

    Ela, por sua vez, pensa na generosidade dos cinco rapazes enquanto pega uma roupa. Depois, já no banho, lembra-se de que Shun tinha lhe contado que eram todos órfãos. Talvez por isso eles compreendessem tão bem sua situação, seu abandono. De pronto, seu pensamento volta-se ao moreno de longos cabelos negros. Shun também lhe dissera que ele era o único dos cinco que nunca tivera notícia alguma dos pais. Nos documentos dele a palavra "desconhecido" se repetia nos lugares onde deveriam estar o nome do pai e da mãe. Era a mesma situação dos documentos dela, já que o homem a quem chamava de avô não o era verdadeiramente. Então pensa se foi somente por isso que ele fez o que fez por ela, ou se há alguma coisa a mais naquele gesto. A cada pensamento se identifica mais com o rapaz de olhar límpido e tímido. Se algum dia sonhara em ter um amor, ele seria exatamente igual ao rapaz de cabelos compridos.

    Shunrei sai do banho, veste-se, penteia os cabelos e olha-se no espelho. A marca do soco está roxa e dolorida, mas já não é importante. Ela agora se sente protegida. Ao sair do banheiro, ela vai diretamente para a sala, onde Shiryu já a espera no sofá.

    ? Podemos ir? ? ele pergunta, olhando-a nos olhos e oferecendo-lhe a mão num gesto impensado.

    ? Sim... ? ela responde, corando um pouco e segurando a mão do rapaz.

    Shiryu e Shunrei andam de mãos dadas até o carro dele. São apenas uns poucos passos da sala até a garagem, mas o suficiente para se sentirem perturbados com o calor das mãos um do outro. Entram no carro em silêncio. Shiryu respira fundo e dá a partida no motor. O silêncio começa a ficar incômodo, por isso Shunrei puxa conversa.

    ? Então você quer ser defensor público? ? ela pergunta esfregando as mãos, sem olhar para ele.

    ? É. Eu tenho muita vontade de ajudar as pessoas, sabe? ? ele responde. ? Parece que as pessoas só precisam de médicos, mas e aqueles sujeitos que foram presos injustamente e não podem pagar um advogado? Vão ficar mofando na cadeia porque são pobres? Eu não acho justo. Quero ajudar essas pessoas.

    ? Mesmo que signifique algumas vezes ter de defender um verdadeiro criminoso?

    ? Mesmo assim. É o preço a pagar.

    ? Entendo...

    Outra vez o silêncio prevalece, mas agora é Shiryu quem o quebra.

    ? Então seu avô dizia que você tem vocação para ser psicóloga?

    ? É. Meu avô sempre disse que eu tenho vocação para ouvir e entender as pessoas. Porque somente ouvir não basta, né? Ele dizia que é como ouvir uma música numa língua que você não conhece. Você ouve, acha bonito ou interessante, mas não entende o que a letra quer dizer e assim, só é capaz de emitir uma opinião parcial sobre ela.

    ? Claro. Seu avô parece ter sido um homem muito sábio.

    ? Ele era. E não apenas sábio. Ele era a melhor pessoa do mundo. Quando ele partiu, foi como se eu tivesse ido com ele. Eu só sigo em frente porque sei que é o que ele gostaria que eu fizesse.

    ? Tenho certeza que sim. Bom, chegamos ao posto de saúde.

    ? Ah, sim ? ela diz, sem nenhuma alegria. Queria continuar o caminho com ele, sem destino, apenas seguir em frente. O jeito de Shiryu lembra muito o do seu avô. Os mesmos ideais de justiça, a serenidade, o sorriso sincero. Ela anda ao lado dele automaticamente até a recepção do posto de saúde. Depois, entra sozinha no ambulatório, enquanto ele a espera do lado de fora. Durante todo o exame, só consegue pensar nele, imaginando-se em sua terra natal, com ele a seu lado.

    ? Não é nada, mocinha ? o médico que a atende diz. Ela, entretanto, nem ouve. ? Mocinha?

    ? Ah, sim. Desculpe, doutor. Estou distraída hoje.

    ? Percebi. Eu disse que não é nada. Em alguns dias a mancha vai sair.

    ? Eu sabia que não era nada. Mas os meninos insistiram num exame.

    ? Foi bom. Podia ter acontecido algum dano. Mas felizmente é só um hematoma.

    ? Que bom que não foi nada. Obrigada, doutor. Tenha um bom dia.

    ? Obrigado.

    Shunrei sai do consultório.

    ? E então? ? Shiryu pergunta, aproximando-se dela.

    ? Não foi nada. Só vou ficar com essa "maquiagem" roxa por alguns dias ? ela diz, rindo.

    ? Que bom. Vamos? Ainda temos que passar no restaurante para comprar o almoço do pessoal.

    ? Ah, sim? ? Shunrei pergunta, rindo.

    ? É!

    ? Espero em breve colaborar com o almoço.

    ? Não se preocupe com isso...

    ? Como não? Vou ficar morando na casa com vocês, não é justo não colaborar.

    ? Quando você puder. Não se preocupe!

    Os dois voltam ao carro e o caminho até o restaurante é feito novamente em silêncio. Lá, eles se sentam numa mesa enquanto esperam que preparem as marmitas.

    ? Vindo buscar já economizamos a taxa de entrega ? explica Shiryu.

    ? Ah, claro.

    ? Geralmente é o Seiya quem vem buscar no sábado. Ele tem uma moto. Mas como hoje saí com você...

    Um homem alto e forte,vestindo roupas esportivas, aproxima-se da mesa e fala com Shiryu.

    ? Como vai, discípulo? ? ele pergunta com um enorme sorriso no rosto.

    ? Ah, muito bem, mestre! ? Shiryu responde também sorrindo. ? Shunrei, esse é Shura, meu mestre de kung-fu.

    ? Ah, sim, muito prazer ? Shunrei sorri.

    ? Igualmente! Muito bonita a sua namorada! ? Shura diz, olhando para Shiryu maliciosamente. Não imaginava que Shiryu tivesse uma namorada, visto que o rapaz nunca tinha comentado nada sobre isso.

    ? Ela não é minha... somos... somos amigos... ? Shiryu diz desconcertado, mais vermelho que um pimentão.

    ? Ih... desculpa. Eu e minha indiscrição... mil perdões.

    ? Tudo bem... ? Shiryu diz, dando graças a Deus porque o garçom já está vindo trazer seu pedido. Ele paga e prontamente se levanta da mesa. ? Bom, temos que ir, mestre.

    Shunrei também se levanta.

    ? Ok, vejo você na próxima aula ? o professor responde, ainda envergonhado pelo equívoco.

    ? Claro, mestre ? Shiryu diz e deixa o restaurante acompanhado de Shunrei.

    Continua...


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