Luar da Sonata

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    Capítulo 1

    Luar da Sonata

    Momentos como esses eram raros para nós.

    Onde apenas fazíamos aquilo que mais nos agradava ou acalmava.

    Momentos em que eu podia me sentar frente à mesinha de meu quarto e escrever.

    E Rukia ao meu lado, sentada em minha cama lendo seus mangás.

    Aproveito o momento para observá-la um pouco.

    Tão forte e tão frágil...

    Tão mulher e tão criança...

    Tão pálida...

    Lentamente ergo meu braço e com a ponta dos dedos toco seu braço.

    Eu precisava saber se ela estava ali mesmo.

    Se estava viva...

    Se era real !

    Pálida, tão branca, como se fosse feita

    toda de luar,

    ? um luar humano...

    ? como se seu corpo fosse o maravilhoso teclado

    de um piano

    à espera de mãos de artista para o despertar !

    Ela se assusta com meu gesto.

    Me olha com a face levemente corada.

    Mais não diz nada e nem se afasta.

    Eu finjo não perceber e continuo a acariciá-la.

    Sem nem me dar conta real disso, passo a arranhar de leve sua pele com as unhas.

    Uma corrente elétrica parece percorrer nossos corpos.

    Ela fecha os olhos e eu prendo a respiração.

    De repente tocá-la não era o bastante.

    Pálida, tão branca, como se seu corpo fosse

    feito de espuma do mar,

    mar de delicias, mar de meus anseios...

    ? adivinho a inquietação desse mar de mistérios

    quando tremem as ondas vivas dos meus seios !

    Eu precisava de mais.

    Saio de meu lugar e me sento ao seu lado na cama.

    Retiro o mangá de suas mãos e o arremesso por cima de meus ombros.

    Ela se assusta com meu gesto e se retrai.

    Encolhe os ombros tentando se defender.

    Ela não tem o que temer e eu vou lhe mostrar isso !

    Pálida, tão branca, como se fosse feita

    da mais fina areia,

    dessa areia que é luz embebida de sol

    dessa areia que canta ao contato do mar !

    Areia de uma praia impossível e desconhecida

    numa enseada escondida

    onde nenhuma vaga ainda foi se espraiar...

    Aproximo minha face do braço que ate pouco acariciava.

    Beijando-lhe.

    Sentindo em meus lábios o calor de sua pele.

    Sua maciez.

    Posso ouvir seu coração bater.

    Rápido, descompassado.

    Num misto de delírio e medo.

    Pálida, tão branca, como se seu corpo fosse

    uma estátua vestida em mil véus de luar,

    ? branco luar de camélias e de lírios

    que tem forma de mulher em meu olhar -

    um morno luar de amor, a viver em meus nervos,

    como a lua, sobre os nervos deslumbrados

    do mar !

    Sinto sua mão em meu ombro me empurrando suavemente.

    A olho nos olhos.

    A face tão corada.

    Seus lábios se abrem e fecham várias vezes querendo dizer algo.

    Mais nada é dito.

    Talvez faltem palavras.

    Talvez falte voz, não sei.

    Mas há algo que eu quero dizer...

    Pálida, tão branca, como se seu corpo fosse

    num gesto heráldico e fino

    um lírio esbelto no ar !...

    ? um lírio de alma vermelha de rosa feiticeira

    que abre os lábios úmidos, brejeira

    para o sol beijar !

    Me aproximo de seu rosto sussurrando em seu ouvido.

    ? Eu te amo Rukia.

    ? Me deixa mostrar isso.

    ? Me deixa cuidar de você.

    O sentimento é recíproco e ela busca meus lábios com a mesma ânsia com a qual se busca água no deserto.

    Seus braços circulam meu pescoço me puxando para mais perto.

    Tão pálida.

    Tão branca.

    Minha boneca de porcelana.

    E eu a protegerei.

    Mesmo a custo de minha própria vida !

    Pálida, tão branca, como se seu corpo fosse

    esta folha sem mancha onde escrevo os meus versos

    a pensar,

    ? pensar que hei de compor na alvura do seu corpo,

    versos do nosso amor, sem rimas nem palavras,

    que ela só há de ler... a viver...

    Momentos de calmaria como esse, é algo tão raro que aprendi a respeitá-los.

    Aprendi a respeitar seu silencio.

    Sempre mergulhado em pensamentos que parecem não ter fim.

    Ele fecha seu caderno recostando na cadeira.

    Os braços pendurados ao lado do corpo.

    Os lábios entre abertos.

    A face corada.

    Os olhos fixos no teto.

    ? Ichigo tudo bem ?

    ? Tudo.

    Pálida, tão branca, como o meu pensamento

    antes de a encontrar...

    É obvio que ele mente, mais vou deixar assim.

    Se ele quiser conversar ele mesmo vai dizer.

    Isso foi algo que eu aprendi.

    Mais tenho que admitir uma coisa...

    Morro de curiosidade para saber o que ele tanto escreve naquele caderno.

    Talvez se eu o lesse, eu descobriria o porque dessa expressão de alivio e desse olhar de tristeza que se encerra em seu peito sempre que ele o fecha.


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