Sora Lusting

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    Capítulo 6

    O MUNDO DA PEDRA CIRCULAR.

    Violência

    - Da última vez foram só quatro dias. Por que desta vez eu dormi mais tempo?

    -Quando você não usa adequadamente seus poderes acaba gastando energia demais.

    Shiro bateu na porta e pediu permissão para entrar no quarto.

    - Entre!

    - Eu trouxe comida. Fiz yakissoba e tempurá de legumes. Espero que você goste. O suco é de uva.

    - Obrigada. Você bateu na porta dessa vez ao invés de aparecer derrepente. Fiquei muito contente com isso.

    Da última vez você ficou muito irritada por fazermos isso, então combinamos de tentar agir de forma que você não se assustasse tanto.

    - Isso ajuda muito. Eu poderia morrer com mais facilidade se continuassem a me assustar daquela forma.

    Ela falou brincando e sorriu um pouco e isso impressionou os dois que até então não haviam conhecido tão bem a personalidade verdadeira de Sora. Olharam-na com certo fascínio e chegaram a achar aquilo aconchegante.

    - Você deveria sorrir mais. Fica mais sexy.

    - Você não perde uma oportunidade?

    - Você deveria aproveitar algumas também.

    - Ok, isso não é assunto para discutir agora. Eu já entendi que muita coisa depende de mim, mesmo que eu não tenha escolhido isso. Vamos parar logo com essa enrolação toda. Quero treinar e aprender mais sobre meus poderes para que isso não volte a acontecer. Não quero perder a consciência toda vez que lutar. Quando começamos o treinamento?

    - É assim que eu gosto! Finalmente vai deixar de passar por uma garota super frágil e vai aprender a se defender!

    - Termine de comer, se arrume e então vamos treinar. Você tem muita coisa para aprender em pouco tempo. Fico feliz que tenha tomado uma decisão.

    - Está bem então.

    Ela tomou um banho, vestiu-se com uma calça moletom qualquer e uma camisa regata. Roupas que não a incomodassem. Pensou que aprenderia coisas como artes marciais e outros estilos de luta, mas ao encontrar os dois guardiões eles a seguraram e derrepente foram transportados para um vasto campo florido. Nada fazia muito sentido. Foi como num se num piscar de olhos ela tivesse simplesmente morrido e aquilo ali fosse o paraíso. O lugar era tão lindo e tão tranquilo que dava uma sensação de paz constante. Eles caminharam até um lago que refletia o céu perfeitamente, lindo. No centro dele havia uma pedra circular. Ela parecia levitar, mas a essa altura ela já não fazia questão de entender nada. Estava aceitando os fatos como eram. Isso ajudava bastante.

    - Primeiro você deve treinar a mente. Uma mente forte ajudará quando o corpo ainda é fraco. Nem tudo é força física. Muitos inimigos não são fortes fisicamente, mas possuem uma habilidade de raciocínio que poderá derrubá-la em instantes. O primeiro passo é conhecer seu interior e saber lidar com ele. Você meditará durante um mês inteiro ali em cima daquela pedra.

    - Você está louco? Se eu ficasse um mês inteiro só meditando eu morreria de fome, de sede, de sono e de tédio.

    - Eu também odiaria ter que fazer algo tão chato, mas acha mesmo que não pensamos em todos os detalhes? Esse lugar não é um lugar comum. Se você passar um ano aqui, no seu mundo não terá passado nem sequer um segundo. Aqui o tempo não existe. E esse lugar também não tem fim. É uma dimensão completamente diferente de qualquer coisa que você já viu.

    Ao olhar para Kuro ela teve uma grande surpresa. Seus cabelos estavam ficando brancos, seus olhos haviam mudado de cor e eram azuis. Ela ficou perplexa com aquele acontecimento. Não entendia o porquê daquilo. O demônio que ela conhecia parecia tornar-se uma criatura totalmente diferente.

    - O que está acontecendo com você?

    - Aqui é um lugar de paz total e a serenidade deve ser plena. Aquele que se recusa a aceita-la ou possui uma natureza inversa é purificado quase que imediatamente. Esse lugar não pode ser habitado por mal algum. Nenhum ser de natureza maligna pode permanecer aqui por muito tempo. O único lugar no qual se podem ter sentimentos como raiva, rancor e outras coisas do tipo é o centro desse mundo e esse lugar é a pedra circular ali no centro daquele lago. Ainda assim, a pedra, o lago e todo esse mundo é vivo e eles escolhem se alguém pode ficar aqui ou não. Assim, a pedra também possui o poder de escolher quem é digno de pisar nela.

    - Para mim ficar aqui é como perder a alma. Por isso, bye.

    - Como assim? Você vai me deixar aqui?

    - Fica tranquila gatinha. Você vai ficar bem.

    Kuro foi desaparecendo lentamente enquanto falava. A impressão que Sora teve foi de que ele estivesse saído dali com um sorriso leve e terno, mas não pôde confirmar, pois ele virou-se imediatamente como se quisesse esconder aquela personalidade tranquila. Sora foi levantada imediatamente como se fosse uma pluma por uma força invisível e levada até a pedra no centro do lago. Ficou ali flutuando em cima da pedra sem poder tocá-la.

    - O que eu faço agora?

    - A pedra decidiu deixar que você ficasse aí. Parabéns. Não é qualquer um que a pedra aceita como aprendiz. Esse lugar permite trabalhar suas personalidades. Sente-se de forma confortável, aprecie a paisagem, respire o ar puro, limpe a mente, tranquilize-se e então raciocine. Aqui nada se trata de força bruta, mas de força interior. O treinamento acaba quando você conseguir fazer o lago virar um rio. Isso significa que a pedra terminou o treinamento com você. No meio de uma batalha, se entrar em pânico sua mente pode deixá-la indefesa e tornar-se sua pior inimiga. Foi o que aconteceu na faculdade aquela vez. Se Kuro não a tivesse salvado, agora você seria comida de Ocrin.

    - Eu sei que ainda não estou pronta.

    - Você está. Só não sabe disso. Ah! Se você tentar sair da pedra e fugir do treinamento a água a impedirá. Se você não conseguir terminar o treinamento, sua alma ficará presa aqui para sempre. Eu não te contei, mas separamos seu corpo da sua alma. Mesmo que o tempo não passe no seu mundo, aqui será um mês. Uma alma não pode sobreviver mais do que 30 dias fora de um corpo. Você sente fome, sede e outras coisas, porque sua alma se acostumou com o fato de seu corpo precisar disso constantemente. Quanto mais tempo você ficar longe de seu corpo, menos necessidades físicas você sentirá. Quando não sentir necessidade física nenhuma não será mais possível reunir alma e corpo. Isso será exatamente daqui a um mês. Fique contente em sofrer um pouco com a fome e a sede. Isso significa que você ainda está viva. Eu e Kuro também vamos treinar enquanto você estiver aqui. Esperaremos uma Sora mais forte. Até mais!

    - Espera!

    E então, ele desapareceu da mesma forma que Kuro havia feito. Ela ficou sozinha... Ela ficou realmente furiosa por eles terem ido embora e a terem deixado. Derrepente a força que a segurava flutuando sumiu e ela caiu sobre a pedra circular. A água do lago começou a se mexer e por um instante ela pensou que já estava fazendo algum progresso sem nem mesmo ter treinado. Mas a água ficou ainda mais tensa, e foi aumentando a velocidade com a qual girava e também o tamanho das ondas. De um instante a outro parecia um lugar totalmente diferente. A água estava feroz, com ondas enormes e seu barulho a fazia parecer um monstro gigante. Ela ficava cada vez mais apavorada com aquilo. Nem parecia ser o lugar maravilhoso e tranquilo de instantes atrás. A água tinha vida própria e naquele momento ela parecia um demônio dos mais assustadores. O lago ficou tão agitado que num instante já estava quase virando um ciclone. O susto foi tamanho que as pernas dela tremiam, seu coração parecia querer fugir de dentro do peito e ela suava frio, até que ela desmaiou. A água caiu como se tivesse perdido a vida e voltou a ficar tranquila sem nenhuma onda sequer em sua superfície. Espelhando, novamente, o lindo céu azul.

    - Você acha que ela vai conseguir?

    - A única coisa que podemos fazer por ela é treinar, torcer e nos fortalecer para protegê-la quando for necessário.

    - Isso mesmo.

    Kuro sacou uma espada e atacou Shiro e então começaram o treino árduo de um mês. Enquanto isso, no outro mundo, Sora acordou olhando para o céu azul, perfeito e cheio de nuvens. Olhou para o lado tentando lembrar-se de tudo o que aconteceu antes de "apagar". Ela ainda estava no meio do lago que refletia perfeitamente o céu como se todo aquele evento tivesse sido apenas um pesadelo dos grandes. Começou a penar no quanto já estava cansada de tanto desmaiar. Ela levantou-se e pensou em entrar no lago, nadar até a beirada e fugir dali, mas tinha um enorme receio das palavras que Shiro havia pronunciado sobre tentar fugir do treinamento. Começou a pensar no que deveria fazer. Ficou sentada na pedra até que o entardecer veio e junto com ele o pôr-do-sol. Ela estava com fome. Pensou no que disse Shiro sobre morrer em um mês fora de seu corpo e resmungou algo sobre morrer naquele momento de tanta fome. Para tentar fazer a fome passar ela sentou-se e tentou meditar esvaziando a cabeça e então preenchendo com bons pensamentos. Pensou sobre como era lindo aquele lugar, sobre como era bom ter amigos, sobre como era bom ter a companhia de dois anjos que sempre a protegiam. Mas, com esses pensamentos vieram também lembranças. As lembranças confusas de suas transformações, lutas e desmaios. Foi quando a água, novamente, começou a agitar-se de forma brusca e veloz. Ela pensou em não abrir os olhos e ignorar aquilo, talvez assim, pudesse fazer tudo parar, mas como uma navalha afiada, ela sentiu a água querendo matá-la. Foi então que ela abriu os olhos para verificar a situação e o que viu quase a matou do coração. Era um dragão feito de água. Olhava fixamente para ela, como se a fosse devorar. Ela ficou apavorada, o medo começou a tomar conta de todo seu corpo novamente e o dragão ficava cada vez mais furioso e enorme. Ela pensou que dessa vez iria realmente morrer. Lembrou-se quando as águas tornaram-se um grande ciclone e em como o lago refletia o céu perfeitamente. Foi então que ela entendeu: O lago refletia os pensamentos dela. Refletia seu interior. E lembrou-se de que Shiro havia dito que sua própria mente poderia tornar-se um inimigo pior do que qualquer outro se ela não soubesse controla-la. Tomou coragem, sentou-se e começou a esvaziar novamente sua mente, começou a ordenar seus pensamentos e a organizar seus objetivos. O dragão desmanchou-se e as águas caíram novamente no lago. Ela começou a aceitar-se e também a aceitar suas personalidades e a deixar o medo de lado. A noite veio e ela continuava passando enquanto sora entrava numa espécie de sonho onde lutava contra suas fraquezas. Entendeu que deveria controlá-las, pois agora todas aquelas personalidades eram ela. Não se tratava de um demônio que a possuía e de um anjo que fazia o mesmo, mas sim, de várias faces da mesma pessoa. Todas elas eram apenas Sora. Enquanto lutava consigo mesma as águas do lago faziam uma espécie de "domo" ao redor dela, girando de forma agressiva. Mas, ela não demonstrou medo. Lembrou-se das pessoas que queria proteger e dos irmãos que ainda queria conhecer. E então, ganhou a batalha quando o sol nasceu. As águas acalmaram-se e começaram a fluir, como se aquele ponto do lago fosse uma fonte, criando um imenso rio que descia por entre aquele lindo campo batizado pelos primeiros raios de sol daquele maravilhoso dia que acabava de chegar. Foi aí, que derrepente, a pedra sumiu, ela caiu dentro da água e acordou na sala de sua casa, com Shiro e Kuro em sua frente. Como se não tivesse se passado nem sequer um segundo.

    - Pensei que você ia morrer pirralha.

    - Por acaso você é um ancião?

    - Não na aparência, mas tenho pelo menos dois mil anos.

    - Como você é chato...

    - É meu charme gatinha.

    - Impressionante! Em apenas um dia e uma noite você terminou o primeiro treinamento. Eu disse que você estava pronta!

    - Primeiro treinamento?

    - Achou que ia sentar numa pedra e com isso ia dominar seu poder? Você não é tão ingênua.

    - Por um momento eu fiquei feliz em ver sua cara... Tinha esquecido como você é arrogante.

    - Que seja. Vamos para o próximo treinamento!

    Então, ele abriu suas asas e como num acordar de um sonho eles estavam no mais alto prédio. Ela já não se espantava com isso. Começou a virar algo normal eles levarem-na de um lugar a outro num passe de mágicas para lugares extravagantes. Num outro instante Shiro apareceu ao lado de Sora com três sacolas de papel, deu-lhe uma e a outra jogou para Kuro. Sentaram-se na beira daquele imenso arranha-céu como se fosse a coisa mais simples e natural do mundo e começaram a abrir as sacolas, tirando de dentro hambúrgueres de algum fast food conhecido. Olharam para trás, onde ela ainda estava em pé, segurando aquela sacola de papel perplexa não com o fato de estarem num lugar tão incomum pra ela, mas sim por estarem mesmo comendo "porcarias" como aquelas. E ainda mais perplexa com aquelas asas. Era a primeira vez que as via. Eram lindas. O contraste das asas de um e de outro que estavam sentados lado à lado deixando espaço para ela no meio era incrível!

    - Você não vai querer o seu? Se não quiser eu como.

    - Se não quiser o milk-shake eu tomo pra você.

    - Não que eu devesse ficar espantada com algo, mas vocês também comem? Isso é algum tipo de Teste?

    - Não precisamos. E não é um teste.

    - E então?

    - Comer porque é preciso é uma coisa. Comer porque se gosta do sabor de algo, é outra coisa. Só porque não precisamos não significa que não gostamos de fazer isso.

    Ela desistiu de entender a lógica errônea daqueles dois. Apenas sentou-se entre eles no alto daquele prédio, abriu o saco e comeu aquele hambúrguer e tomou aquele milk-shake que estavam realmente deliciosos e achou aquilo muitíssimo divertido. A vista era realmente linda e ela lembrou-se das várias coisas que já havia passado. O pôr-do-sol era realmente magnífico e ela tentou memorizar cada momento para eternizar aquilo em seu coração. Ao terminarem de comer ainda ficaram ali olhando um pouco o cenário que aquele mundo tão observado por todo universo estava lhes proporcionando. Até que o sol foi-se e o cair da noite veio.

    - Desculpe Sora, essa é a única forma.

    - Desculpe pelo quê?

    - Por isso.

    Então eles colocaram ao mesmo tempo as mãos nas costas dela empurrando-a prédio abaixo. Nem é preciso dizer que ela apenas gritou desesperadamente pensando que iria morrer sem entender nada. Quando ela viu o chão e pensou que havia batido nele, uma surpresa: Ela o atravessou mergulhando numa escuridão profunda...

    Continua...


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