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Dois meses haviam se passado, e Verônica encontrava-se deitada sobre a cama, não estava comendo e nem bebendo direito, ela ainda não havia superado a morte de sua mãe.
Seu mundo havia se tornado sem cor e sem beleza. Frio como nos dias de chuva e céu nublado, nuvens acinzentadas que pareciam estar de bronze. Angústia e tristeza que não passavam, lágrimas que vinham aos olhos e o arrependimento de algo que poderia ter feito melhor, não lhe dava trégua e nem descanso.
Afinal, era tudo o que tinha...
Jamais esqueceria, jamais essa dor poderia passar. Seria algo que carregaria para sempre em toda a sua existência, e se um dia conseguisse superar, não seria por completo.
Afinal, foi-se uma "mãe", foi-se também uma "rainha" que jamais voltaria.
Deitada ainda sobre a cama, com os olhos lacrimejados, abraçava o travesseiro com força para ver se trazia algum tipo de conforto em meio ao seu luto.
— Como deve ser possível? — Pensava Verônica.
Hadassa e os outros irmãos estão vivendo uma vida tão tranquila de alegrias e sorrisos que nem parece que houve uma perda tão preciosa em nossa família. Era a mãe deles também. — Pensava para consigo mesma em meio aos choros e soluços.
Após a morte de sua mãe, seus irmãos venderam a casa e repartiram a herança com todos. Verônica, no entanto, não quis aceitar mais seu marido Otávio. Otávio aceitou em seu lugar pensando nas dívidas que poderia quitar, afinal, somente ele trabalhava em sua casa e as despesas eram altas.
Seus irmãos, alguns deles viajaram e os outros deram festas em suas casas, convidando a maioria da vizinhança, deixando Verônica e sua família revoltados e indignados com a situação.
— Muita falta de consideração. — Falava em voz alta para consigo mesma. — Nem Hadassa, que era a sua favorita, teve esse mesmo apreço para com ela. Canalha e extorquista.
— Todos os canalhas e a vida um dia irá lhe retribuir a cada um de vocês pelas suas más obras. — Desejava Verônica o mal para os seus irmãos, acreditando que só assim eles poderiam mudar.
Toc, toc... Duas batidas na porta do quarto no qual se encontrava. Verônica não fez esforço para responder ou perguntar quem poderia ser, pois ela já sabia quem era.
No entanto, a porta se abre, revelando a figurada por trás dela, Maitê, sua filha primogênita, segurando em suas mãos um prato de comida para sua alimentação. Pois ela estava encarregada de cuidar de sua mãe e tirar os trincos da porta de todos os quartos e do banheiro, pois Otávio temia um possível "suicídio" e, para que isso não acontecesse enquanto ele estivesse fora no caso, "trabalhando", Maitê seria responsável por Verônica. Essa missão ultra secreta foi designada somente a ela, pois era nela em que ele confiava.
— Trouxe a sua refeição. — Falava Maitê, olhando sério para ela, pois estava cansada de fazer a comida e ela jogar fora.
— Não quero, não pedi comida, leve-a de volta. — Disse Verônica sem ao menos olhar para ela. Maitê apenas arqueou as sobrancelhas. Quanta teimosia.
— Eu estou preocupada com a sua saúde, você não está comendo e nem bebendo direito. Na verdade, você está fingindo que está ou você não acha que vejo os restos da comida no lixo do banheiro? — Maitê falava, mostrando indignação pelos comportamentos de sua mãe. Verônica apenas tampou os ouvidos.
— Saia e me deixe sozinha ou será que nem isso eu posso? — Verônica sentou-se sobre a cama, apontando para a porta para que Maitê saísse e levasse aquilo que ela chamava de comida.
Maitê olha para ela por um momento incrédula, mas resolve obedecê-la, saindo do quarto, deixando sua mãe em meio às suas tristezas. Tentava ajudá-la, mas Verônica mostrava que não queria ser ajudada. Tentava mostrar novamente a ela algum tipo de apoio, porém, sempre era rejeitada e expulsa do quarto em meio aos gritos e pontapés.
— Deus, dai-me paciência, pois eu não sei mais o que faço! — Pensava Maitê, voltando para cozinha, colocando a comida de sua mãe na geladeira para mais tarde, talvez ela coma, se conseguir!
O tempo havia se passado e a noite havia chegado. Maitê estava na sala assistindo à série favorita, Otávio estava tomando banho e Verônica estava comendo a comida que Maitê havia feito para ela mais cedo. Finalmente, ela havia conseguido ajuda de seu pai, se não fosse por ele, Verônica teria dormido com fome por teimosia e orgulho.
Maitê por um momento sorri vitoriosa pela sua conquista e esforço de fazer a sua mãe comer a comida sem a desperdiçar. Conquista que obteve através do seu pai, que a obrigou, pois ele já estava cansado de todos os dias ouvir as mesmas reclamações, deixando Verônica furiosa com a jovem que apenas tentava ajudar. Para a insatisfação dela.
As horas haviam se passado e já era tarde da noite. Otávio e Verônica estavam dormindo e Maitê estava lavando a louça. Ela não se importava mais com as provocações de sua mãe, pois já havia se acostumado. Ela sempre dizia que preferia a Ashley, sua filha favorita, porém não era ela que estava com Verônica todos os dias e nos momentos difíceis. Apesar de isso, lhe trazia um pouco de tristeza ao seu coração que, se contasse, ninguém acreditaria que, em meio às risadas e sorrisos, existia ali também um coração ferido e cheio de tristezas e angústias ocultas.
Terminando de lavar a louça. Maitê prepara o lixo para jogá-lo fora. Abrindo a porta dos fundos, pode-se observar as ruas escuras com pouca iluminação e desertas. Pois na sua casa não era rodeada de muros e sim grades, porém, não altas o suficiente para trazer segurança, qualquer um poderia pular. Sem se importar, pois já era de costume sair tarde da noite para jogar o lixo fora, logo retorna para a sua casa de uma forma tranquila fechando a porta e se deparando com um pequeno gato de duas cores "preto e branco" que criava de estimação cujo nome se chamava "esquecido" em francês, pois era assim que ela se sentia. "Oublié" e para a sua mãe, "Mia".
Um pequeno sorriso havia se formado em seus lábios enquanto olhava para o filhote oublié que ela considerava seu confidente, afinal de contas Maitê não tinha amigos. Pegando-o sobre os braços, falava de uma forma como se ele pudesse entender o que ela dizia.
— Você é o meu único amigo e jamais se atreva a me deixar. Está me ouvindo? — Um pequeno miau em resposta, deixando Maitê feliz e satisfeita, pois era o único que ela considerava o seu confidente leal e fiel. Levando o seu gato junto a ela e apagando todas as luzes que estavam acesas para que assim pudesse ir dormir. Afinal de contas, amanhã seria outro dia e precisaria descansar bastante, pois levaria Verônica ao psicólogo se for preciso, com as reversas de dinheiro que tinha guardado e precisaria estar bem para ajudá-la.
Apagando todas as luzes do ambiente de baixo, a jovem garota sobe as escadas em direção ao seu quarto, levando oublié junto a ela. Ao chegar, a mesma se prepara para dormir e, quando estava prestes a fechar os olhos deitada em sua cama, ela escuta um pequeno barulho estranho que vinha da área da cozinha e outro na sala.
— O que poderia ser? — levanta Maitê e acende as luzes do seu quarto.
— Se oublié estava no quarto, quem poderia estar no andar de baixo? — pensava a garota, talvez pudesse ser a sua mãe. Preocupada com ela, Maitê desce as escadas em direção à cozinha pelos corredores escuros da casa.
Ao chegar na sala de estar a caminho da cozinha, Maitê chama por sua mãe. — Verônica? Onde você está? O que faz acordada uma hora dessas? — Sem resposta. Houve um pequeno silêncio pela sala de estar e logo depois uns pequenos cochichos espalhados pela casa.
Maitê sentiu um frio nas suas costas e o calafrio tomando conta do seu corpo. Quem poderia ser se não fosse a sua mãe? Ao acender as luzes, pode notar um pequeno grupo de rapazes mascarados e provavelmente armados a observando, a deixando completamente perplexa e imóvel.
— La.. la ladrões.... — A jovem começa a gaguejar ao sentir uma pequena faca de cozinha posta sobre o seu pescoço, impedindo de correr ou até mesmo gritar. Fechando os olhos, só conseguia pensar em seus pais que ainda estavam dormindo em profundo sono pelo cansaço do dia.
— E agora, o que faço? — Maitê, só conseguia pensar naquela porta dos fundos que se esqueceu de trancar, pois havia se distraído com o oublié o seu gato.
Aproximando-se da jovem garota, um dos caras mascarados a vê tremer de medo, sorri por debaixo da máscara e, sincera e zombeteiramente, ele diz: — Boa noite, moça!
Os outros atrás deram uma pequena gargalhada, acordando e assustando Otávio e Verônica, que dormia em seus quartos.
Continua.