Disclaimer: Essa história e seus devidos personagens me pertencem e não devem ser utilizados em outros lugares sem a minha autorização.
Doce Pecado
Tentação
A voz dela é como uma canção, um feitiço. Como uma sereia, ela me hipnotiza, tentando me levar para o fundo do oceano. Mas no meu caso não há água, apenas escuridão. Um negro quadro, manchado com vermelho, que me envolve e me controla, me mostrando o caminho que existe além da trilha da imortalidade.
A doce tentação do pecado. Preciso resistir. Ah! Grito, firmando meu olhar na brilhante imagem da cruz. Ah! O perfurar da morte marca meu pescoço, continuando a manchar a escuridão com a tinta escarlate. Ah! Pontadas, facadas em um coração pulsante, transformando-o, roubando-lhe o ar da vida.
Ela quer que eu me torne dela, que caia em seus encantos, mas eu não posso. Oh, Senhor, me ajude a resistir! Meu corpo cede, caindo no chão. Paralisado, observo as linhas que meu sangue desenha sobre a madeira. Sinto o toque macio e suave sobre meu rosto, beijos frios, vazios de sentimento, são depositados em meus lábios trêmulos.
Seguro a cruz de prata pendurada em meu pescoço, meus dedos sangrando, machucados pela força que coloco em minha desesperada tentativa de resistir. Ela toca minha mão, lambendo o sangue, beijando brevemente o pingente. Um sorriso tranquilo me é oferecido. Por que me quer?
- Seja meu. ? ela pede ? Até que esse mundo se afogue em escuridão e seja destruído por seu próprio sangue. ? ela se deita sobre mim, a frieza de seu corpo fazendo meu corpo tremer ? Quem sabe você possa me mostrar novamente a luz. ? um olhar escuro, profundo, um toque em meu queixo ? A luz que há além do pecado.
- Você... ? tento dizer, o sangue atropelando minhas palavras ? Você é... Um pecado...
Uma ruga aparece entre os olhos negros, a expressão dela muda, parecendo magoada, ofendida. Mas a mudança não dura muito, logo a calma volta à face bela, relaxada.
- Todos somos pecados, pecadores. ? ela diz ? Esse mundo é o mundo do pecado.
- Da salvação... ? sussurro.
Ela sorri e se inclina, beijando minha face, meu pescoço, limpando minha pele do líquido vermelho que a suja. A frieza dos toques que me atingem é como uma corrente elétrica que intensifica a dor, mas também é o que me mantém desperto, resistente a escuridão que me envolve e ameaça me consumir.
- Seja meu. ? ela repete o pedido ? Somente meu. Assim veremos o que vencerá no final: a sua luz ou a minha escuridão.
Um grito rasga minha garganta quando a sinto beijar meu peito, parecendo atravessá-lo com uma faca, que não corta somente minha carne como também minha alma. Tusso, sentindo o sangue escapar em grande quantidade por entre meus lábios. A dor aumenta, insuportável. Sinto como se milhares de agulhas perfurassem minha pele, a sensação proporcionada por cada uma delas entrando em sintonia com a dor provocada pela faca em meu coração.
- Meu. Somente meu. ? a ouço sussurrar.
Nenhuma palavra é dita, o silêncio sendo cortado apenas pelo som de passos calmos se afastando e passos rápidos se aproximando. Ouço vozes conhecidas me chamando, mas não consigo responder. Olho para a cruz, grande e brilhante sobre o altar. O que será de mim agora? Irei ser devorado pela escuridão, marcado pelo vermelho do pecado?
- Padre! Padre! ? os chamados continuam, cada vez mais baixos, mais distantes ? Padre! Padre!
Sinto lágrimas escorrerem por minha face, tão frias quanto o toque dela. Respiro fundo, sentindo todo meu ser doer. Fecho os olhos, deixando que a morte se aproxime com seus braços de sombras e me leve para o lugar ao qual pertenço, seja ele qual for. Pelos poucos momentos em que continuo consciente, repito as palavras que me parecem apropriadas para esse momento.
Pai nosso que estais no céu...