Olá, meus caros leitores.
Como vocês estão?
Segue mais um capítulo intenso e tão aguardado.
Boa leitura
“Minhas últimas palavras”
Foi o que escrevi e o que veio na minha mente perturbada. Continuei.
“Para você...
... que jamais vai ler essa carta, deixo minha confissão.
Antes de tudo, eu agradeço a sua curiosidade.
Saiba que sou péssima em me expressar e esse foi o único jeito de deixar registrado tudo o que fiz.
Saiba que não me arrependo de nada. Dei a Ichigo Kurosaki meus poderes por sua coragem. Vi com meus próprios olhos a minha inutilidade quando fui vencida por um hollow.
Reconheci o quanto era fraca e inexperiente. Por um erro meu, coloquei em risco Ichigo e suas irmãs.
Confiei e naquele exato momento quando transferi meu poder, me deparei que, por mais grave que fosse minha atitude, de certa forma, foi a minha melhor decisão. O pior foi evitado.
Descobri que meu erro foi não ter compreendido que a pressão espiritual que atraía os hollows para aquela região era na verdade a de Ichigo. Ele tem a habilidade de ver espíritos tanto que ele me enxergou perfeitamente.
Você deve estar se perguntando ‘Por que eu não reportei a situação ao meu Esquadrão, ou, até mesmo, por que não pedi ajuda a uma pessoa mais experiente?’
Não havia tempo suficiente e pela capacidade já demonstrada pelo humano, decidi confiar.
Mesmo reconhecendo ser fraca eu tentei ser forte e vi que fui orgulhosa demais em pedir outra ajuda.
Pode me dizer que eu sou fraca e fui irresponsável. Eu reconheço.
Eu tentei apenas ser motivo de orgulho por um longo período. Só isso. E eu falhei...
Falhei em ser como alguém com privilégios, pertencente a uma família nobre. Talvez porque eu nunca fui uma, já que fui adotada. Desconheço minhas raízes apesar de saber onde cresci e passei boa parte da infância.
Me perdoa...
Eu sinto muito... em ter envergonhado a família que me deu um nome, e um lar...
Sinto muito em não ter mostrado meu melhor, e, também, por nunca termos sido amigos, apesar de termos nos tornado irmãos.
Sinto tanto que minha mente me perturba por ter aceitado ser adotada, já que minhas escolhas me guiaram a estar justamente aqui, nessa cela escura e fria, manchando o tão nobre nome da família Kuchiki. A família que me ajudou.
Deixo aqui, nessas folhas aleatórias, minhas últimas palavras, já que não terei outra oportunidade e suspeito que ninguém lerá isso. Nem Nii-sama perderia seu tempo...
Mas se alguém estiver vendo essas singelas palavras... saiba que Rukia Kuchiki existiu.”
Não aguentei e só pensei na minha morte, tão próxima estava. Meus olhos marejaram só de imaginar que não existiria mais. Que não passaria dessa para melhor. Literalmente eu deixaria de existir sem um legado. Só a minha carta existiria ainda e tudo o que estivesse nela.
Retomei a escrita pois achei que apenas poucas linhas eram insuficientes para existir de mim. Afinal, eu não era só lamentações.
Chega de se lamentar, Rukia.
Dei um tapa no rosto para frear as lágrimas atrevidas.
Decidi escrever mais uma folha, tentando imaginar se tudo tivesse sido diferente. Ou se eu pudesse mudar o passado com outras escolhas.
Só uma eu não mudaria.
Eu aceitaria ser adotada novamente pelo Nii-sama. Sim!
Por mais doloroso, e por ser o início de uma série de tomadas de decisões erradas, eu não mudaria isso.
Eu não mudaria todos esses anos em que vivi na mansão Kuchiki.
Com o passar dos anos que vivi lá, eu deixava de me sentir uma estranha. Me sentava à mesa para todas as refeições com Nii-sama e tinha meu próprio aposento. Até os serviçais me tratavam com respeito como ninguém nunca me tratou antes.
Havia apenas algo que eu mudaria. Apenas uma.
Nii-sama.
O único que não consegui alcançar e que nunca consegui ser tão verdadeira, nem ser tão transparente.
Eu nunca consegui entender o porquê de ele ter me adotado, ou a explicação que ele me deu a respeito de eu parecer com a sua falecida esposa.
Se eu pudesse mudar algo, começaria em tentar descobrir os motivos dele.
Mas como?
Byakuya sempre foi tão distante e deixou bem delimitada essa linha de divisão.
Eu nunca ultrapassei, nem ousei...
Vivemos todos esses anos assim, silenciosamente e separados. Eu sempre estive a um passo atrás. Conforme notei, era o mais confortável. Eu deveria sempre respeitar a hierarquia.
Sua presença e força imponente me abalava. Contudo, me fascinava!
Os cinco anos da minha vida foram os melhores, porém os que me condenaram.
Que dilema!
"Se eu pudesse mudar o passado, o que eu mudaria..."
Escrevi sem perceber, tentando imaginar tudo o que eu poderia de fazer diferente nesses cinco anos.
Pensa, Rukia! Seja corajosa, já que isto é sua confissão...
Uma breve luz clareou a minha mente nebulosa, me encorajando a voltar ao papel a minha frente.
"Mudaria como começamos a nossa jornada de quarenta anos. Eu perguntaria o motivo de você ter me escolhido para ser sua irmã. Eu sei que a resposta que você me deu, apesar de vaga, não é completa. Nunca entendi os motivos de um Kuchiki adotar uma pobre alma como eu.
Me permiti sentir privilegiada, no entanto isso sempre me deixava curiosa.
Parecer com a sua falecida esposa sempre me pareceu algo terrível e lindo ao mesmo tempo. Eu sempre me senti dividida por ser a imagem de alguém que você amou, porém que nunca foi além disso, já que éramos irmãos.
Apesar de termos tornados irmãos, eu nunca me senti dessa forma. No começo você era um tutor, mestre, um exemplo que eu sempre quis seguir. Mas conforme o tempo foi passando, você se tornou a minha instabilidade.
Sua presença é capaz de mudar até a gravidade do ambiente, pois eu sempre tinha que me segurar para não cair.
Seus olhos falam mais que as suas próprias palavras, apesar de eu não compreender o seu verdadeiro significado, me sentia tão vulnerável e, por uns instantes, tão próxima.
Uma troca de olhares sobre um assunto qualquer durava uma eternidade para mim. Tão doce e tão áspera.
Me lembro de quando treinamos pela primeira vez caligrafia. Por mais concentrada eu me mantinha, nunca esqueci a delicadeza e firmeza de sua mão ao tocar a minha, que teimava tremer, denunciando minha instabilidade.
Não esqueço também de como você se posicionou perante os anciãos do Clã, me defendendo e mostrando o significado de ‘tomar decisões’. Você quis que eu entrasse para a família Kuchiki e sua decisão foi firme e aceita. Não sabe como isso mexeu comigo!
Quando fui aceita para o Décimo Terceiro Esquadrão foi um dos dias mais felizes da minha vida. Seu olhar suave, raro, ao saber que eu tinha passado nos exames admissionais, foi o melhor presente que eu poderia ter recebido. Foi o estopim para que eu conseguisse te mostrar o meu melhor a partir de então.
Você me deu um ursinho de pelúcia logo após chegarmos em casa. Confesso que eu o abracei a noite inteira e se tornou o meu presente favorito. Eu ainda pude sentir o cheiro das sakuras.
Tantas lembranças boas e outras amargas...
Também eu jamais esqueci do dia em que eu senti a pior dor de perder alguém. Eu vi esmorecer a vida do meu amigo e tenente Shiba Kaien, bem a minha frente e em meus braços. No entanto, de surpresa eu te vi me espiar e seus olhos me amedrontaram. Desde aquele dia eu nunca entendi sua rejeição. Me senti culpada por imaginar que eu poderia ter salvado alguém do meu Esquadrão e eu não fiz nada. Seus olhos me disseram isso. Eu chorei a noite inteira com essa dúvida na cabeça.
Eu falhei tanto...
Percebi que estava na hora de ter experiência em campo e sempre me vigiar.
Pedi para Ukitake Taichou a oportunidade de adquirir melhor desempenho em missões leves. Você aceitou com ressalvas. Não poderia ir para o mundo humano.
Eu me senti muito inútil e diminuída. Não sei se você queria me castigar ou me proteger. Nunca me pediu para eu ir ao seu escritório para falarmos a respeito...
Logo depois eu senti sua distância me afetar drasticamente. Você sempre estava fora, o tempo inteiro dedicado ao seu Esquadrão e em missões mais importantes. Aquilo que tínhamos, e que até agora não sei definir o que é, estava mais uma vez se perdendo.
Todo avanço que lutei nesses cinco anos estava se arrebentando.
A corda sempre se arrebenta pelo lado mais fraco.
Eu comecei a confundir tudo. Meus sentimentos começaram a me enganar. Por isso sempre me ausentava ou me atrasava para as refeições. Afinal, parecia que eu o tinha decepcionado por ainda não ter evoluído como shinigami.
Treinei incansavelmente aos fins de semana, kidous e até shunpo, já que eu era muito lenta. Treinei pensando que poderia mudar a sua opinião sobre mim, ou mudar talvez a confiança que pensei que havia esfriado.
Mas nem assim eu consegui te chamar atenção. Como eu poderia estar em uma família e ser ignorada? Será que você se arrependeu de ter me adotado? Me questionei...
Quando surgiu a primeira oportunidade de eu realizar missões no mundo humano, eu sabia que era a minha grande oportunidade. Eu estava preparada para os testes e logo realizei o exame de aptidão que concluí com sucesso.
Porém, dessa vez, você não esteve ao meu lado. Você não me apoiou, ou meu deu um ‘ganbatte’.
Na minha partida você não teve alguma objeção. Eu poderia ficar feliz pensando que você estava dando seu voto de confiança ao permitir que eu fosse ao mundo humano. Mas no fundo eu senti que você realmente não se importava mais comigo. Eu estava agora por minha conta em risco.
Nesse dia eu descobri que já não era mais uma criança.
Vim para o mundo humano abandonando várias questões em aberto.
Fechei meus sentimentos e me concentrei apenas na missão que fui enviada a investigar: As pressões espirituais irregulares em Karakura.
No entanto, essas questões em aberto sempre me perseguiam e por mais que eu negasse que estava tudo bem, não estava.
Me envolvi com os humanos e percebi que eu estava deixando meu lado sentimental tomar proporções cada vez maiores.
Ichigo mostrou ser alguém a quem eu confiei e foi a única pessoa que conseguiu me fazer sentir mais acolhida enquanto eu estava em missão.
Eu estava recomeçando uma nova etapa e acreditei que estava evoluindo até o fatídico acontecimento que você já sabe.
Eu dei os meus poderes e ele me salvou.
Tão logo as consequências da minha escolha vieram até mim.
Você mesmo veio ao mundo humano.
Depois de tanto tempo, era você que estava a minha frente para me prender e levar a Soul Society.
Aquele mesmo olhar estava desenhado novamente na minha frente. A sua rejeição mais uma vez me afetava.
Comprovei ao ouvir de sua boca: ‘Ele se parece com seu amigo’.
Eu não tinha nem parado para pensar, mas depois notei mera semelhança de Ichigo com Kaien.
Naquele momento tudo ficou claro, e vi que um shinigami não deveria ter se envolvido assim, afinal era uma missão.
Fui forte e firme nas minhas palavras e decidi que eu deveria ser punida pela minha escolha errada.
Aceitei a minha sina, largando para trás o mundo humano e com ele todos os meus poderes. Já não poderia me considerar uma shinigami e mais uma vez eu comprovei ser inútil.
Já você mostrou o seu poder inabalável, quase matando o humano que tentava me salvar da minha punição.
Vi que um shinigami não pode se dar ao luxo de ter sentimentos.
Desde então, eu estou aqui. Nessa cela fria e desoladora, aguardando a minha certeira sentença.
A única certeza que eu tenho!
Meu único desejo foi apenas dar o meu melhor e ser teu orgulho.
Minhas incertezas ficarão sem respostas.
Se eu pudesse fazer diferente eu faria muitas coisas.
Eu encontraria as respostas que me desequilibraram.
Eu perguntaria...
Por que você me adotou? Por que nunca me falou a respeito?
O que você sente por mim?
O que você quis de mim?
Por que se esforçou bastante para me fazer parte de sua família se me ignora?
Você foi capaz de ver meus esforços?
Eu consegui ser teu orgulho, mesmo que por um momento? Eu sei que fracassei, mas tentei...
Nunca compreendi aquele seu olhar nas duas vezes em que me rejeitou, o que você queria dizer?
Por que se afastou e nunca me fez saber as verdadeiras razões?
Por que nunca fomos amigos?
Por que você está sempre um passo à frente?
Por que você me espiava?
Por que não foi se despedir de mim?
Por que veio me buscar no mundo humano?
O que será daqui para frente?
Tantas dúvidas resumidas em poucas perguntas...
Eu confesso que...
Te admiro e sempre foi meu maior mentor.
Te respeito e sei o peso no nome Kuchiki.
Me fascina por ser tão forte e delicado ao manusear a sua bankai. (confesso que eu também te espiava em seus treinos).
Sempre quis estar ao seu lado nos seus passeios noturnos.
Sempre quis que você treinasse comigo shunpo.
Sempre quis que fossemos mais próximos.
Eu também sonhei em ver seu sorriso por uma única vez.
Em ser alguém de grande importância para você.
Em ser seu ombro amigo... Quando você se isolava.
Te tocar no rosto quando ficava até tarde no escritório da mansão.
Te abraçar todas as vezes em que eu estava feliz.
Dizer tudo o que sinto e ter coragem de te encarar de frente para confessar aquilo que nunca consegui...
.
.
.
Eu te amo, Nii-sama...
Eu levarei esse sentimento comigo. Mas saiba que, nessa singela folha de papel, o meu desejo sempre foi que essas palavras chegassem até você.
Adeus..."
Parei por um instante para gritar e soltar todas as minhas vontades ao eco daquelas paredes que me cercavam.
Era o meu fim e o meu legado.
Uma última lágrima escorreu pelo meu rosto enquanto ouvi as grades da minha cela sendo abertas.
Era a minha hora.
A hora da minha última jornada.
O caminho sem volta.
Virei-me e deixei aquelas folhas que foram as minhas fiéis testemunhas. Fechei meus olhos e aceitei meu sacrifício.
Força, Rukia. Chegou a sua hora.
Continua...