A paixão do capitão de gelo

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    Capítulos:

    Capítulo 33

    Acalento

    Álcool, Hentai, Heterossexualidade, Linguagem Imprópria, Nudez, Sexo, Violência

    Hueco Mundo

    O Inferno dos Sofrimentos Incessantes, também conhecido como Daí Avici. Segundo os mortais, é o pior de todos os Infernos. Neste nível em Jigoku o tempo é interminável sem pausas para descanso, seu espaço é longiquo e o sofrimento é incessante. A alma condenada à este Inferno sofre todos os tipos de agonia, com diversas intensidades sem distinção ou direito de um descanso final. A reencarnação simplesmente não existe para os Pecadores de Daí Avici.

    Por isso, com uma mórbida admiração Karin mirava para o alto o portão de Jigoku, sem desviar o olhar apesar da areia e as rajadas de vento ao redor. Diante do portão, a passagem de Garganta se mantinha aberta em grande escala. Da abertura escura saíam as três criaturas que viu em Soul Society, urrando com voracidade ao mergulhar dentro do céu escarlate que via através do portão do Inferno.

    Enquanto ainda estava sentada na areia e assistindo, um coro de sons graves ecoou pelo deserto. Tão forte que teve de cobrir os ouvidos pelo barulho. A intensidade do vento aumentou enquanto o ar tremulava pesado com a pressão espiritual. Entreabrindo os olhos quase sufocada pela densa energia, Karin pode ver mais dessas criaturas vindo de todas as direções até o portão. Saídas de diversos portais para aquele local.

    O homem maltrapilho foi arrastado para dentro da passagem escarlate, berrando em puro medo e agonia... Enquanto todas as sentinelas mergulharam de volta para Jigoku.

    KARIN P.O.V.

    Com fascínio e horror contemplava o céu desse deserto, olhando àqueles monstros entrarem um por um dentro daquele portão com esqueletos. A passagem negra da Garganta e aquela além dos portões duplos com esqueletos agiam com um túnel interconectado. Quando todas entraram naqueles portões o ar se nivelou sem a reiatsu deturpada predominando nesse lugar.

    - O.. o que aconteceu?

    - Ele acaba de ser arrastado para o Inferno.

    O que?

    De olhos arregalados virei o rosto para a pessoa, encontrando o Arrancar de pé ao meu lado, observando inexpressivo o alto. Voltei os olhos para frente assistindo o portão vermelho lentamente se fechar num som abafado. Diante dele o rasgado de Garganta no céu pálido de Hueco Mundo esvanecia, desaparecendo simultaneamente junto com os portões duplos do então Inferno. Estes  trincaram até despedaçarem num clarão. Os fragmentos sumiam em partículas de luz até não restar mais nada.

    Com isso as rajadas de vento também cederam, se tornando apenas brisas suaves. Baixei o olhar me sentindo de repente sem ar, levando uma mão até a garganta numa reação de sufoco. Meu Deus... Outra vez esses monstros e não desconfiei de nada! Por isso sentia o ar quente, via aquelas chamas azuis saírem dos corpos das pessoas quando caudas das criaturas, não, sentinelas atravessavam-nas.

    Fechei os olhos, segurando a ânsia de enjoo pelo nervosismo. Kurotsuchi taichou citou sobre Jigoku naquela conversa e nem estranhei.

    - Levante-se.

    Nani? Abri os olhos, erguendo a vista em confusão para o Arrancar. Ele me encarava com frieza, inflexível e me dei conta pela primeira vez de onde estou. Pelo o modo como arregalei os olhos, ele percebeu meu choque e de certo modo pavor. Não que fizesse diferença, apenas evidenciou sua apatia ao me encarar com mais frieza naqueles olhos verdes e penetrantes.

    - Levante-se agora, garota. Não irei carrega-la.

    Engoli em seco um pouco tremula e ao ficar de pé devagar o encarei contrariada. O tom seco de sua voz me situou e me lembrou. Não foi preciso explicar. Foi ele o arrancar que me tirou do hospital até aquele poço. Ficamos em silêncio por uns instantes numa batalha de olhares e quase perdi a coragem. Ele... é praticamente inexpressivo. Esse tom berrante de verde dos seus olhos ajudaria bastante para ler o que estivesse pensando se não fossem tão frios.

    Meu pulso cardíaco acelerou ao me dar conta que estava em suas mãos. Aliado ou não, nesse momento esse cara é perigoso.

    - Siga-me.

    Dando meia volta, ele seguiu caminho sem me esperar. Me retraí desconfiada no lugar.

    - Pra onde?

    - Para Las Noches.

    Simples assim sem mais explicações. Nervosa, engoli a apreensão caminhando obediente atrás.

    ~*~*~*~*~

    Las Noches era literalmente um palácio. Branco giz de proporções enormes possuía quatro torres ao norte, sul, leste e oeste completando com muralhas enormes e uma abobada em seu centro. De longe quando o vi pela primeira vez me lembrou fortemente de construções islâmicas, mas a semelhança iria até aí.

    Logo no portão principal, assim que aparecemos diante dele – O arrancar com seu sonido me segurando pelo braço –, dois guardas de vestes brancas se espantaram ao nos verem. Eles olhavam boquiabertos para mim, tremendo de raiva e nervosos para o hollow que me acompanhava.

    - Ulquiorra, o que diabos aconteceu? E por que está com essa shinigami?

    Me espantei, como perceberam isso? Então lembrei da minha zanpakutou pendurada nas costas e suspirei quieta olhando para o hollow ao meu lado. “Ulquiorra”... Então esse era seu nome? Interessante. O arrancar da direita, com a máscara cobrindo seu olho esquerdo procurava manter a calma.

    - Ainda pouco uma pressão espiritual surgiu de repente. Era mais vezes forte do que de uma sentinela comum. Será que...?

    Silêncio, ninguém disse nada principalmente Ulquiorra. Os outros dois engoliam em seco escaneando pelo o olhar os arredores dessa entrada do palácio. Para além do deserto atrás de nós. O Arrancar que me acompanhava nem se importou.

    - Halibel está?

    Que fala brusca. Até pestanejei de susto.

    - Claro que sim, por que?

    Ignorando o franzir de cenho confuso do outro, Ulquiorra simplesmente cruzou a entrada comigo o seguindo. Os guardas se entalaram indignados, girando no lugar pela indiferença dele. Pude ouvir até rangerem os dentes, mas acima de tudo o que me impressionou foi o comportamento de outrora. Eles estavam estremecendo, os olhos frenéticos e arregalados de pavor. As espadas que portavam estavam à postas, prontas para serem sacadas.

    Nunca pensei que Hollows também fossem capazes de uma emoção tão forte como o medo. Genuíno e puro.

    Encarei as costas retas do hollow branco giz, pensativa sobre o que ouvi do guarda. “Ulquiorra”... Onde já ouvi esse nome? Não era comum e parecia ser importante. De qualquer modo, saber como se chamava me deixou mais calma. Tirava essa sensação de estar perdida em Hueco Mundo por mais que ainda não me fizesse mal.

    Conforme andávamos, o arrancar me guiava por um corredor largo e alto. As paredes eram brancas também lembrando um tom cinzento, além de lisas com colunas dispostas a cada poucos metros. O piso polido e azulado parecia espelhar. Observei ao redor, intrigada pela iluminação tão clara e não vi uma lâmpada sequer, apenas o teto alto e seus arcos. O caminho não se diferenciava e a monotonia quase me deu uma sensação de tédio se não fosse o cansaço.

    Estou exausta desde que salvei Yuuki da propriedade dos Kasumiooji. Isso não era bom. Nada bom mesmo.

    - Chegamos.

    Pisquei saindo do devaneio em tempo de Ulquiorra cruzar as portas duplas e enormes que abriam com lentidão. O ranger me deixou mais nervosa e engolindo em seco o segui, entrando num salão de proporções enormes. O teto alto com arcos de pedra, o comprimento e largura me dando a impressão de estar num salão real. O piso ladrinhado e vermelho era opaco, sem brilho enquanto a luz incidia justamente no outro extremo, para um trono de pedra rústico e imponente. Sua altura chegava aos uns cinco metros e sentada nele uma mulher de cabelos loiros selvagens e pele acobreada nos observava atentamente. Pela vestimenta branca lembrando um traje de amazona entendi que se trata de Halibel, a Espada que Toushirou enfrentou e agora governava esse mundo.

    Minha nuca se arrepiou junto de um suor frio. A cada passo meu e de Ulquiorra, os ecos quebravam o silêncio juntos dos murmúrios.

    - Grávida?!

    - De fato sinto duas assinaturas de energia vindo dela.

    - Hã! Quem diria. Essa fedelha...

    Quem são essas pessoas? S..são tantos. Por mais que relanceasse os olhos não deixava de ficar surpresa. – ainda por terem adivinhado minha condição. Altos, baixos, os cabelos de vários tamanhos e formatos além do poder emanar dentro dessa sala. Chegava a ser sufocante. Engoli em seco pelo desconforto, ainda mais com essa atmosfera. O ar está tão denso, quase vibrante, mas tinha um aspecto vazio característico de Hueco Mundo.

    Paramos diante do trono e assisti quieta o arrancar pálido fazer uma leve mesura para a mulher acomodada nele.

    - Ulquiorra, quem é essa garota?

    Pestanejei. Eu... entendi bem? Olhei mais atenta em volta, para os arrancars nos blocos de concreto ao redor desse salão e me dei conta. Eles me observam intrigados, cautelosos com animosidade. Como se me vissem ou soubessem sobre mim à primeira vez.

    A sensação de nervosismo me tomou junto com a raiva.

    - Ela veio por um acaso. Quando abri uma passagem de Garganta ao trazer o Pecador, foi trazida para cá.

    Os olhos dourados se estreitaram levemente.

    - Finalmente o encontrou?

    - Hai.

    Pisquei aturdida, olhando dela para o hollow diante de mim. Então tinha um motivo para ele estar em Soul Society afinal. Essa conversa me intrigava ao mirar para a mulher no trono.

    - E onde está agora?

    - Em Jigoku. – arquejo geral – Todos os ryokas de muken o seguiram para dentro dos portões enquanto era arrastado pelas correntes.

    A atmosfera de alivio preencheu esse salão. Nítida pelos suspiros e os murmúrios ao redor. Halibel se recostou no espaldar de pedra menos tensa e pela primeira vez relanceou os olhos para mim, me deixando tensa.

    - Ótimo. Depois venha falar comigo sobre os detalhes.

    - Hai.

    - Matte. E essa garota?

    Voltei o olhar para a voz irritada. Perto do trono uma mulher morena e curvilínea me encarava rangendo os dentes. Engoli em seco, parecia uma leoa com aqueles olhos felinos sobre mim. À minha frente, Ulquiorra a encarou.

    - Ela não é uma ameaça Mila Rose.

    A mulher apenas arquejou. Me segurei para não recuar um passo.

    - Isso é o que você diz. Que diabos ela faz aqui? Nos espionar?

    Ao seu lado, uma outra de cabelos negros curtos e chifres na cabeça apontou com a mão no quadril.

    - Olhe só para as vestes dela. A garota está um trapo, sua idiota.

    A morena arregalou os olhos ofendida, pronta para atacar a outra.

    - O que disse, sua..!!!

    - Chega. – a voz potente de Halibel reverberou no local, paralisando as duas e em seguida dirigiu os olhos para frente – Ulquiorra, leve a shinigami para a torre leste e a coloque num aposento. Depois que a mesma descansar o suficiente a mande de volta.

    - Como ordenar.

    Girando no lugar, de mesmo jeito que entramos seguimos para a saída. O ar estava carregado de tão tenso até saírmos assim que as portas se abriram e nos dirigimos ao um corredor lateral. Pude me permitir um suspiro de alivio, havia prendido o fôlego sem perceber de tão nervosa.  Conforme seguíamos por esse corredor, cruzamos com outros arrancars. Alguns eram homens, outros mulheres e suas roupas variavam independente da cor branca. O buraco em seus corpos sempre eram no pescoço, peito ou barriga e ver isso causava um choque de realidade. Hollows apesar de assumirem aparência humana ainda são diferentes deles.

    Porque sou uma shinigami a hostilidade deixava o ar mais carregado, porem ninguém dizia nada ou se aproximava graças à Ulquiorra. Só mostrava o quanto esse sujeito era poderoso. Entretanto, eu não conseguia deixar de pensar no dia que me tirou do hospital em chamas, principalmente sobre o que me disse naquele poço.

    Ao paramos diante de uma porta, assim que abriu ele esperou que eu entrasse para então me seguir e fechar a porta atrás de si. Aqui praticamente não havia mobília. Um tapete adornava e isolava o chão frio. Apenas uma janela numa parede deixava entrar o luar nesse cômodo. À um canto na direita havia uma cama. Grande, os lençóis brancos e nenhuma ruga dizendo que alguém dormia ali.

    - Acomode-se como achar melhor, daqui a pouco a levarei para Soul Society.

    - Espere.

    Girei no lugar para enfrenta-lo. Ele havia parado perto da porta e estreitei o olhar encarando-o.

    - O que disse naquele poço era verdade?

    Suspirando fundo esperei que reagisse, mostrasse algo que comprovasse minha desconfiança. Mas ele simplesmente não disse ou demonstrou nada. Estremeci frustrada.

    - Era Ulquiorra? Ou você mentiu?

    Silêncio mais uma vez e a frustração me engolfou junto com a raiva. O olhar apático dele apenas me deixou possessa. Avancei um passo, lembrando do medo que senti dele, principalmente quando ameaçou meu bebê!

    - Eu te perguntei naquela hora e você jogou uma mentira deslavada como se fosse suficiente:“em primeiro lugar, garantir sua segurança”. Porcaria nenhuma! Ninguém aqui me conhece! Por que raios me salvou?

    De olhos baixos, me fitou com um ar entediado.

    - Faz realmente diferença? Tudo está resolvido agor...

    - Chega! Eu quero respostas. O que ganharia fazendo aquilo?

    - Nada.

    Sustive o fôlego, surpresa pela resposta simples.

    - Não ganharia nada, muito menos perderia.

    Emudeci, sequer consegui falar algo. Sua franqueza foi tão crua, firme e reparando nisso, Ulquiorra afundou as mãos nos bolsos da hakama piscando calmo.

    - Pelo choque em seu rosto não esperava por isso.

    Pestanejei no lugar, desprevenida mais uma vez. Ele era mais atento em leitura corporal do que pensei. Ignorando minhas mãos trêmulas (que apertei em punho em tentativa de controlar) Ulquiorra caminhou em minha direção. Os ecos dos passos metódicos saltavam meu coração, martelando contra o peito cheio de medo.

    - Desarme essa guarda, não irei machuca-la.

    - Espera que eu acredite nisso?

    Estreitando o olhar parou diante de mim, apenas meio metro de distância e vi que se irritou um pouco comigo.

    - Tive todas as chances de te matar, garota tola e não fiz isso. Seria sem sentido e desperdício de tempo fazer agora.

    Baixei o olhar apertando os lábios relutante. Debatendo internamente, detestei aceitar essa lógica. Droga, ele tinha razão. Afinal, não foi o mesmo que impediu aquele Pecador de me matar em Sereitei? Ulquiorra era uma incógnita.

    - Quero ir pra casa.

    - Inviável agora.

    Arfei o encarando de novo, sem acreditar no que ouvi.

    - Não pode me prender aqui!

    - E não vou. Foram ordens de Halibel. Seireitei está um caos com todos aqueles incêndios, além de que não apresenta condições para voltar. Com todos esses kidous em seu corpo está praticamente esgotada.

    Prendi o fôlego, entalada pela observação certeira e justo nesse instante um tremor involuntário de exaustão me percorreu. E pensar que tinha disfarçado bem.

    - Então ficarei aqui esperando até recuperar as forças e ir embora? É isso que está dizendo? – como imaginei não disse nada e respirei fundo, o encarando sobriamente – Se não me levar agora, Toushirou virá até aqui. Não vai ser bom pra ninguém, te garanto.

    - É uma ameaça?

    - Um aviso.

    Ulquiorra sustentou meu olhar determinado, analisando o quanto de veracidade tinha nas minhas palavras e pude jurar que franziu as sobrancelhas, tão minimamente de desagrado. Quase curvei os lábios, mas me segurei. Teimosia era um dos meus traços fortes e realmente não exagerei. Se Toushirou invadiu o Inferno por mim, o que não faria para me buscar de Hueco Mundo?

    Uma briga feia seria o mínimo.

    - Muito bem, a levarei... – quase sorri de alivio – Depois que me escutar.

    Pisquei confusa, arquejando frustrada e em agonia. Mas por que?

    - Eu...

    - Pode ouvir por uns minutos. Não queria saber porque menti quando te salvei?

    Abri e fechei a boca, sem saber o que dizer. O desejo de ir embora rivalizava com a curiosidade por ter sido enganada. Ele me assusta, perigo exalava como uma aura em sua volta me estremecendo por dentro. Por um estranho e insondável motivo Ulquiorra nos ajudou e ele não é alguém que faria de bom grado, porque era o certo.

    Me encarando fixamente por um instante, ele desviou o olhar mesmo que seu corpo esteja voltado para mim.

    - Quando despertei no deserto há algumas semanas, fui encontrado por Halibel que me levou inconsciente até aqui. Nesse dia escutei em segredo ela conversar com alguém.

    - Quem era essa pessoa?

    Murmurei inquieta, um tanto cautelosa. Por que ele estava me contando? Não fazia sentido.

    - Um ex-Espada, agora Pecador. Ele veio para avisar sobre os ryokas de Muken vagando fora do Inferno.

    - R..ryokas... de Muken?

    - As sentinelas que viu em Soul Society.

    Frio correu pelos meus ossos e a espinha, ao lembrar do que vi horas atrás. Tomei fôlego para me acalmar, não adiantaria de nada entrar em pânico agora, principalmente por uma coisa que já passou.

    - Por que isso aconteceu?

    Piscando calmo, voltou o olhar para mim pensativo.

    - Estavam caçando. Procuravam um togabito que fugiu de Jigoku, um grande problema. Essas sentinelas caçam de forma predatória. Se nutrem de almas com reiraku, devorando-as ou apenas sugam parte de suas energias a fim de continuar a caçada.

    - Isso não explica porque me tirou do hospital.

    Seus olhos estreitaram mais uma vez minimamente e percebi que foi de incomodo. O silêncio momentâneo quase me fez achar que não diria mais nada até um ar contemplativo tomar seu rosto.

    - Você é irmã de Kurosaki Ichigo. – A frase me amorteceu. Me deixou mais gelada e ignorando tudo isso, Ulquiorra avançou um passo – Pelo poder anormal que esse humano tem foi sequestrada por Pecadores, envenenada com o miasma pelo tempo que permaneceu no Inferno. Apesar do laço consanguineo com àquele humano foi uma presa fácil para os Togabitos.

    - Aonde quer chegar com isso?

    Essa era minha voz, saindo tão sem fôlego? Droga... Pontos pretos estreitavam minha visão e procurei me acalmar. Isso era importante e Ulquiorra pelo visto, não se importava de me abalar citando meu sequestro.

    - Apenas tentei reparar o que fiz. Sem pretensão, somente curiosidade. Soul Society não sabia nada sobre as sentinelas, muito menos o porque delas estarem causando tantas baixas no Gotei 13. Halibel me enviou para investigar sobre as sentinelas na Sociedade das Almas naquele dia e encontro você, fugindo de um ataque naquele hospital. De todos os shinigamis era a única que via aquelas criaturas, como esperado de alguém da família de Kurosaki Ichigo.

    - En.. então quis me ajudar... por curiosidade?

    Franzi as sobrancelhas, incrédula. Eu não acredito, foi por algo tão simples e banal? Me dirigindo o olhar frio, ele sequer demonstrava desconforto por isso.

    - É a mulher de um dos capitães da Brigada. Seria esperado que contasse à ele sobre o que eu disse, mas não fez isso. Tola decisão.

    Me entalei ofendida, quase o xingando de raiva. Como iriam acreditar no Toushirou sem provas?! Era a minha palavra contra o ceticismo de todos os líderes da Brigada, com exceção dele. E aquele taichou do 12º Bantai tão ardiloso, dificultaria o trabalho na investigação com certeza. Esse Arrancar viu o quanto me irritei e não disse nada. Sequer debochou. Essa apatia me deixava uma pilha de nervos...

    Até que me lembrei do que disse.

    - Reparar...? – franzi o cenho mais confusa – O que foi que você fez?

    Ele ficou tanto tempo calado que achei que não diria nada.

    - Há cinco anos sequestrei alguém importante para Kurosaki Ichigo. Um nakama. Ele dizia sobre laços, sentimentos. Produtos do que vocês chamam de coração. Isso me intrigava em absoluto, sobretudo por causa daqueles olhos.

    Seus pensamentos estavam distantes, fixos no relato. Ulquiorra parecia um tanto... distraído. Uma mudança bem vinda de ares nesse comodo fechado.

    - No fim entendi o que ela disse, não são apenas ilusões para acalentar os seres humanos. Mas é preciso um laço mais forte para agir daquele modo ao salvar alguém.

    Arregalei os olhos, finalmente entendendo sobre o que disse. A surpresa foi tão grande que cedi ao esforço de me manter de pé. Balancei no lugar, tonta quando me encarou.

    - A Inoue... Você estava falando...

    Pisquei com força com a mão na testa, tentando me manter acordada, mas foi inútil. Meus joelhos finalmente cederam sob meu peso e antes que caísse fui segurada.

    - Durma. A levarei de volta agora.

    Antes que me levantasse direito nos braços, a exaustão cedeu e não vi mais nada.

    KARIN P.O.F.

    Soul Society, momentos atrás.

    HITSUGAYA P.O.V.

    Desordem com pânico generalizado.

    Com tantos focos de incêndios e seus rescaldos espalhados pela cidade, essa era a atual situação de Sereitei. Não era o cenário que imaginei quando falassemos sobre o que estávamos enfrentando, mas não o caos sem extensão que seria. Os cidadãos haviam sido remanejados para uma área segura, enquanto que os feridos levados aos postos médicos. Incrivelmente era um dos poucos lugares intactos no centro da cidade.

    Dentre tantos problemas, um pequeno grupo composto por mim, Abarai e Yoruichi caçávamos o Togabito que fugiu daquela vila. Ulquiorra também estava ajudando e até o momento, não havíamos tido sucesso. Eu tentava me concentrar nesse problema, invés de deixar a preocupação que sentia me tomar. Karin havia sumido desde o almoço e ao perguntar sobre ela com Matsumoto, a mesma se espantou ao não saber onde estava.

    Achei que ela ficaria quieta depois que se consultasse. Apenas o fato de não sentir aquele eco de socorro até agora indicava que ela estava bem. Mas não melhorava meu humor. Kuso, o que diabos estava fazendo? Será que estava segura? E por que não me procurou assim que os incêndios começaram?!

    - Algum problema, Hitsugaya taichou?

    Pestanejei voltando a mim. Abarai me olhava cauteloso e fingi que não percebi.

    - Não. Continue procurando.

    - Hai.

    Assentindo, saltou para uma direção oposta com o shunpo. Havíamos coberto praticamente essa área, já estava me dirigindo para outra próxima à periferia quando senti uma reiatsu. Meus olhos arregalaram em reconhecimento e de imediato surgi no local. Com o barulho da chuva elas não me viram e também como mantinha minha energia baixa não me notaram. No meio da rua e conversando, Karin e uma moça loura ignoravam esse caos ao redor. Fitei o punho dela segurando You Ou liberada e suspirei fundo.

    Não é atoa os ventos terem aumentado de repente.

    Numa analise rápida percebi mais algumas coisas. A fenda no quimono até sua coxa, o apoio precário no pé esquerdo e o tenso equilíbrio de sua reiraku. Eu não sabia discenir o que era maior. O alivio por não ter acontecido algo pior ou a raiva por ser tão imprudente a esse ponto. Quando ouvi a nobre (reconheci naquele instante) a chamando de louca depois que perguntou da gravidez, a raiva pesou e resolvi me manifestar.

    Como imaginei ela levou um susto, até empalideceu. Se não fosse por Abarai e a nobre eu teria discutido ali mesmo. Porem, havia o togabito foragido. Precisávamos do sangue dele antes que sua máscara se rompa de vez. Yoruichi frisou esse fato e deixando as duas aos cuidados de Abarai, afinal apenas as levaria para um local seguro, eis que cometo um erro.

    Não havia imaginado que o Pecador se aproximaria delas, tão furtivo com a reiatsu apagada, muito menos que o arrancar impediria o ataque justo quando a máscara do Pecador despedaçou. Só havia saltado no shunpo uma vez e o eco de perigo me arrepiou inteiro com logo uma passagem de Garganta se abrir gigantesca.

    Não pude chegar a tempo. Antes que surgisse na rua vi as criaturas monstruosas mergulharem na passagem escura e tão logo a mesma se fechou. Encarava perplexo o lugar onde antes estava o rasgo negro, com gelo correndo pelas veias ao constatar que ela havia ido junto. Karin foi sugada para Garganta com àqueles monstros e só Deus sabe o que aconteceu.

    Minha respiração ficou engatada. Não pensei em mais nada. Abri um Seikamon ali mesmo, vagamente ciente de Abarai junto daquela nobre. Ele me gritou alguma coisa, não prestei atenção. Apenas mandei que avisasse os outros sobre o ocorrido e disparei para Dangai assim que os shojis surgiram naquela luz branca, a borboleta infernal saindo dela. Minha intenção era chegar em Karakura, obrigar Urahara abrir uma passagem de Garganta e ir buscar Karin Hueco Mundo. Deveras imprudente, mas dentro de mim não havia como impedir essa compulsão. Nada me pararia... Exceto por uma coisa.

    Assim que irrompi de Dangai nos céus da cidade, algo sobrenatural acontecia. Rajadas de vento e a atmosfera tremulando com a pressão espiritual nociva, demoníaca predominava o ar. Percebi de relance Kurosaki com seus companheiros lidarem com os Konpakus, evitando que fossem levados para a fonte dessa força e olhei na direção. Um rasgo partindo os céus sugava o ar e como em Soul Society as sentinelas de Daí Avici mergulhavam com avidez para dentro.

    Estremeci aflito, sem interromper o shunpo até o terreno de Urahara. A loja estava aberta e entrei sem me anunciar. Saberiam pela minha reiraku que não me importei em esconder. Tessai apareceu no meio do corredor, visivelmente espantado com meu estado.

    - Hitsugaya taichou?

    - Onde está Urahara?

    Minha voz soou baixa e rouca de tão tenso que eu estava. Tessai se recompus afastando um passo me dando passagem.

    - No andar superior.

    Assenti ao seguir caminho, direto para as escadas que via no final dessa passagem. Enquanto subia os degraus, duas energias apareceram de repente acompanhadas de um rasgado de som. Novamente meu fôlego engatou e subi ligeiro invadindo o cômodo ao abrir o shoji. Pelo susto, o louro de chapéu listrado se voltou para a porta, surpreso em me ver.

    - Hitsugaya, o que faz aqui?

    Era bem óbvio pelas suas visitas, mas não joguei essa resposta ácida. Estático no meio do tatame parei para respirar fundo, enquanto assistia o Arrancar parado no ato de entregar Karin para Urahara. Um estupor assumiu minhas emoções e pus uma máscara de calma ao caminhar até eles e encarar o hollow. Ulquiorra entendeu o recado e girando no lugar afastou um pouco dele a garota nos seus braços. Logo estiquei os meus e a envolvi, trazendo Karin para mim segurando-a apertado.

    Um ar de tensão pairava dentro desse cômodo. Era tão carregado que os uivos dos ventos lá fora pareciam fracos daqui. Antes que o questionasse o que aconteceu, um estalo quebrou esse clima. Tanto eu como Ulquiorra olhamos para fonte. Urahara havia acabado de bater as mãos, o sorriso fechado por ter conseguido chamar atenção e então cruzou os braços dentro das mangas ao tombar o rosto. A sombra da aba do chapéu em seus olhos não escondia sua curiosidade.

    - Hai. Agora podemos conversar.

    ~*~*~*~*~

    Cidade de Karakura

    - Surpreendente.

    Urahara comentou fitando o vazio, ecoando os pensamentos de todos aqui. Dentro da uma saleta, estavam sentados ao redor de uma mesa baixa de madeira eu, o louro de chapéu listrado, Kurosaki, Kuchiki e os humanos dotados de poderes que tanto ajudaram Soul Society. Dois deles junto de Kurosaki olhavam para o Espada em pé junto à parede de modo chocado. A garota de cabelos alaranjados era a mais notável. Inoue Orihime tinha os olhos arregalados para o Espada, mais expressivos do que o quincy ao seu lado.

    Levei o tempo em que Ulquiorra explicava o motivo de uma passagem daquele tamanho surgir em Karakura para entender. O sequestro de Inoue Orihime antes da batalha de inverno. Ele foi o executor e pelo o que Abarai disse mais cedo houve luta no resgate entre ele e Kurosaki e o Espada perdeu. Compreensível esse espanto, mas ainda tinha algo diferente nela. Algo que os outros dois não tinham e me intrigou.

    Quando um ligeiro rubor apareceu no rosto da garota, a mesma baixando o olhar mirei para o Arrancar notando e entendendo. Ele a havia encarado e a encabulou. A constatação do motivo, fora de contexto pelo assunto da reunião, me surpreendeu e disfarcei não dando importância. Afinal, era bem pessoal.

    - Isso explica o desaparecimento dos Hollows na cidade.

    - Em que sentido, Urahara-san?

    Com o observação de Ishida Uryuu, Urahara voltou os olhos para ele.

    - O que achávamos ser supressão, se tratava na verdade de seleção. As sentinelas de Daí Avici estavam caçando os hollows com pecado mortal. Como não pudemos ver as criaturas, não foi possível perceber o que realmente estava acontecendo.

    - Portanto, não interferiu no equilíbrio do fluxo de almas entre Soul Society e o mundo dos vivos.

    Comentei atraindo atenção de todos e Urahara assentiu.

    - Hai.

    - E quanto aos soldados doentes em Soul Society, Hitsugaya taichou?

    Dirigi o olhar para Kuchiki. Sentada ao lado de Kurosaki, ela me parecia um tanto exausta como os outros. Fazia imaginar o que passaram antes da minha chegada. Suspirando, voltei os olhos para Ulquiorra que observava tudo quieto.

    - Imagino que você saiba a razão.

    Meu tom foi ligeiramente acusatório e percebi que todos notaram, principalmente Urahara. O Espada não intimidou pelo encrustinio, pelo contrário. Voltou os olhos para os demais de modo calmo.

    - Foi pela nutrição das sentinelas.

    De olhos arregalados, encarávamos Ulquiorra aturdidos com a informação. Até Kurosaki parecia engasgado com o próprio ar.

    - N..nutrição? Como assim? Está dizendo que esses monstros se alimentavam deles?

    - Exato.

    O silêncio pesado preencheu esse cômodo. Me fez lembrar do que assisti na vigília da missão de reconhecimento. Fazia todo o sentido, afinal as caudas pareciam drenar a energia espiritual dos soldados Onmitsu Kidou.

    - Então essa é a razão para coletarem o sangue do Togabito.

    Urahara quebrou a choque ao sacudir de leve o frasco cheio em sua mão, analisando o líquido vermelho contra luz. Antes de Kurosaki e os outros chegarem, o Arrancar havia dado para ele explicando parcialmente o motivo. Agora entendo.

    - Acha que consegue?

    Afinal, dependíamos disso.

    - Não é tão difícil. Só preciso de uma amostra de alguns pacientes e logo produzirei uma cura.

    Alivio foi sentido, de tão notável a preocupação presente com esse problema. Ninguém duvidava da competência de Urahara. Antes de continuarmos a conversa, um shoji lateral foi puxado revelando Tessai.

    - Hitsugaya taichou, sua esposa acaba de acordar.

    Todos dentro dessa sala me encararam (exceto o anfitrião e o Espada), numa surpresa muda que simplesmente ignorei. Assentindo e levantando da almofada me dirigi a saída que Tessai mantinha aberta. Antes de entrar no corredor, mirei Urahara. Ele mal escondia o sorriso.

    - Yoruichi provavelmente virá mais tarde, Urahara. Ela explicará o resto quando chegar.

    - Já está indo para Soul Society?

    Quase estreitei os olhos, esse sujeito...

    - Sim.

    Me voltei para a porta, mas antes que entrasse no corredor Kurosaki se manifestou.

    - Matte, Toushirou. Eu vou com você.

    Levantando da almofada, ele me encarava sério sem hostilidade. Apenas respirei enfadado pelo tratamento.

    - Hitsugaya taichou, Kurosaki.

    - Hai, hai.

    A mesma resposta despreocupada. Ele nunca mudaria. Assim que entramos no corredor, Tessai fechou o shoji e liderou o caminho até a escada que levava ao segundo andar. Ao chegarmos lá, seguimos por outro corredor ladeado por shoji de estampas verdes. Abrindo um nos deu passagem logo fechando atrás para dar privacidade.

    No meio do cômodo Karin estava sentada num futon, usando um quimono branco com os cabelos presos numa fita sobre o ombro. Bem ela fez isso, já que quando a deixei mais cedo aos cuidados de Tessai eles estavam soltos. Pelo barulho da porta, ela percebeu nossa presença mirando para cá.

    - Toushirou... Ichi-nii?

    Os olhos negros se arregalaram ao me ver com seu irmão. Pelas mãos trêmulas ela agarrava o lençol em nervosismo. Percebi quando nos sentamos perto do futon e procurei ignorar a irritação. Ao me olhar nos olhos, Karin entendeu e engoliu em seco. Deixei por hora irritação em outro plano.

    - Como se sente?

    Isso a surpreendeu e suspirando a linha tensa de seus ombros relaxou.

    - Bem, só um pouco cansada. Onde estamos?

    - Na residência de Urahara. Ulquiorra te trouxe aqui quando iria busca-la em Hueco Mundo.

    Denso silêncio carregado pela nossa troca de olhares. O dela apreensivo e o meu cheio de cobrança. Pela visão periférica vi Kurosaki nos observar analítico, achei que questionaria sobre isso, no entanto, ele olhou curioso para sua irmã.

    - O que fazia em Hueco Mundo, Karin?

    Empertigando na posição sentada a vi engolindo em seco mais nervosa.

    - Nada demais.

    Óbvio que ele se agitou.

    - Como assim nada demais? Você quase me matou de susto quando te vi desmaiada nesse quarto. – estreitou os olhos – O que aconteceu?

    - Eu...

    - Foi um acidente, Kurosaki. Ela estava muito próxima quando Ulquiorra trouxe o togabito para dentro de Garganta.

    Me dando um olhar aliviado, Karin anuiu encarando seu irmão.

    - Sim, é isso.

    Kurosaki não parecia muito convencido, o semblante desconfiado apenas evidenciou mais.

    - Soa muito suspeito.

    - Mas foi exatamente assim que aconteceu.

    - E por que quando ele te trouxe estava desmaiada?

    Respirando fundo, ela procurou manter uma aparência calma, mas era nítido o quanto estava nervosa por dentro. Resolvi dar um basta no interrogatório.

    - Deixe-a Kurosaki. Karin ainda precisa descansar depois de tudo.

    Me apoiando num joelho escorreguei um dos braços debaixo de suas pernas assim que afastei o lençol. O outro deslizei em suas costas trazendo-a para mim e me levantei ajeitando-a de modo confortável contra meu peito. Karin entendeu enlaçando meu pescoço com os braços e escondeu o rosto entre eles. Pelo leve tremor neles ela estava aflita para quando estivermos sozinhos.

    Levantando os olhos encarei Kurosaki que nos observava de modo pensativo. Parecia um pouco chateado, mas ao contrário do que imaginei não iniciou uma discussão.

    - A zanpakutou dela.

    Piscando ele saiu do devaneio.

    - Claro.

    Se abaixando ele pegou a espada embainhada perto do futon e entregou para Karin que havia soltado um dos braços do meu pescoço.

    - Jya nee, Ichi nii.

    - Realmente já vão embora.

    Assenti já abrindo um Seikamon. Os shoji surgindo e se abrindo para a passagem branca, deram lugar para duas borboletas negras voando ao nosso redor. Segurando contra o peito You Ou, Karin tinha um sorriso um tanto triste para o irmão.

    - Dá um oi pra Yuzu por mim.

    Quase rindo, ele desarmou a carranca de desânimo numa expressão descontraída.

    - Claro. Venha nos visitar depois.

    - Eu vou.

    Sorrindo para ela, Kurosaki lançou um olhar subentendido para mim. Anuí concordando e girei no lugar caminhando para o portal, as borboletas infernais nos seguindo. Assim que entrei na luz branca ouvi as portas se fechando atrás de mim.

    HITSUGAYA P.O.F.

    Soul Society

    No décimo oitavo posto médico uma demanda predominava com tantas pessoas sendo atendidas e os shinigamis do quarto bantai para atende-las. A maioria usava gorros e máscaras brancas, como também luvas e alvas roupas médicas. O tenente do sexto bantai havia levado a moça nobre para o local, seguindo depois de tudo a ordem de Hitsugaya taichou. Tinha um gosto amargo na boca com o peso de consciência. O capitão havia deixado Karin sob sua responsabilidade e aquilo aconteceu. A bem da verdade, ele estava bastante envolvido em consolar a nobre no momento. Ela havia perdido a família inteira nessa noite, natural que estivesse desolada.

    - Algum problema, Abarai-kun?

    Pestanejou se situando. Hirako taichou o olhava analítico e estranhando. Procurou disfarçar, tinha vindo até seu escritório nesse prédio para relatar a operação.

    - Não é nada, capitão.

    - Um.. Entendo. Hitsugaya devia estar uma pilha de nervos pelo sumiço da esposa nessa desordem. Ele não vai culpa-lo depois. A irmã de Ichigo simplesmente estava no lugar errado e hora errada.

    - Hai.

    - Isso é tudo?

    Erguendo os olhos para o taichou do quinto bantai assentiu.

    - Sim, senhor.

    - Já está dispensado.

    - Com licença.

    Fez uma reverência e saiu do escritório para o corredor lotado. A cacofonia das vozes o deixou pensativo. Por hora não havia nada que pudesse fazer. Sem lutas ou batalhas, a maioria do Gotei 13 estava cuidando do resgate dos feridos e buscas de vitimas. Ao divagar sobre isso, lembrou da moça nobre. Kasumiioji Yuuki. Apesar da situação infeliz e constrangedora quando se conheceram ela era uma boa pessoa. Percebeu isso quando foi buscar Karin naquele dia em Shinourijutsuin. Ainda mais quando o procurou, buscando ajuda para visitar Karin no hospital. Como alguém da nobreza ajudaria e se preocuparia com alguém vindo de Rukongai?

    Isso realmente o surpreendeu e o fez olhar de outro modo para a moça.

    Estava tão preso nos pensamentos que demorou um pouco para notar agitação incomum no pronto socorro. Franzindo as sobrancelhas atravessou as pessoas que se amontuavam perto da saída lateral. Ao chegar na fonte, seu sangue ferveu com a raiva súbita.

    Aquele nobre, o mesmo que havia chamado Karin de piranha meses atrás, tinha um agarre de aço no braço de Yuuki. Ela chorava tremendo e não fosse por menos. Quando chegou ao local foi bem no momento que o sujeito a chamou de prostituta. Rangendo os dentes pela cena que armavam, o nobre latiu irritado.

    - Você não passa disso mesmo, Yuuki. Que posição acha que terá na minha família que te acolheu?

    - Me larga! Eu não vou com você!

    Firmando os pés no chão, ela puxava o braço sem conseguir se soltar. Já viu o suficiente. Sumindo no shunpo apareceu bem ao lado dos dois agarrando a mão no braço dela e a soltou. O nobre recuou um passo chocado enquanto que Yuuki correu para detrás de si.

    - O que está acontecendo aqui?

    O rapaz assumiu uma postura serena engolindo a raiva e ajeitou a capa sobre os ombros. Atrás dele dois guardas de escolta estavam de espadas a postos, segurando-as pela bainha. Não o intimidou e o nobre insuportável percebeu pela maneira que os encarou.

    - Isso é um assunto entre nobres, fukutaichou-san. Não interfira.

    - Entendo – relanceou os olhos ao redor, vendo os paramédicos e enfermeiros hesitantes. – De que se trata?

    Com um sorriso duro, o rapaz se empertigou assumindo um ar arrogante. Como isso o irritou.

    - A casa dos Kasumiioji foi praticamente extinta. Yuuki é a única sobrevivente. Como somos colegas de Academia e muito próximos, estou aqui para leva-la para minha casa. Os Sakai vão acolhê-la numa hora tão lamentável como essa.

    Duas mãos agarraram o tecido de suas costas, tão apertado que aumentou seu incomodo no peito. Além do mais, essa história estava muito mal contada. Mais uma olhada para os guardas, o nervosismo nítido neles e entendeu. Cruzou os braços encarando o nobre arrogante.

    - Não.

    O moleque franziu o cenho.

    - O que?

    - Ela não vai com você.

    - Como ousa? Sabe quem eu sou?

    - Sei e não interessa. – tombou o rosto o encarando – Levantar a mão contra uma mulher indefesa te faz um lixo de homem. Saía daqui antes que se machuque.

    O nobre estremeceu, sorrindo arrogante de raiva. Pela energia pulsando dele achava que o iria intimidar.

    - Ah, é mesmo?

    Ele vai ataca-lo. A leitura corporal do mesmo dizia claro e gostou. Quando o moleque sumiu no shunpo apenas levou uma mão às costas, soltando as da moça atrás de si e girou no lugar, esquivando da lâmina e agarrando o punho do  moleque assim que  o mesmo apareceu no alto.

    Sem piedade torceu o braço dele, levando para trás e ergueu num ângulo contrario ao ombro. A espada caiu com um intrépido ao mesmo tempo que o nobre pousou no piso rosnando. Todos ofegavam pela cena.

    - Apanhar de Hitsugaya taichou não foi o suficiente pra você, não é mesmo?

    - Argh! Me solta, seu plebeu imundo!

    Ah... Ele estava pedindo por isso. Uma torção no pulso que segurava e depois um berro rasgou o silêncio desse andar. Caindo de joelhos, o moleque arquejava de dor, gemendo pelo ombro deslocado. Os burburinhos que haviam parado voltaram com força. Pouco se importou. Mantendo a pressão no agarre fez questão de torcer mais provocando outro grito do moleque.

    - Cala a boca, eu nem quebrei seu braço.

    - Você... Vai pagar por isso.

    Quase riu pela audácia. Ainda que esteja suando frio esse fedelho não perdia a posse. Estreitando o olhar, deixou o divertimento de lado liberando sua reiatsu. A pressão que pulsada dele, densa e forte fez esse nobre estremecer, retraindo o corpo numa reação acuada.

    - Escute bem moleque, porque só vou falar uma vez. Não a incomode mais e suma da minha frente. Se eu te encontrar sozinho, sem testemunhas, terá mais que um ombro deslocado.

    Silêncio. Impaciente cravou os dedos no pulso do moleque.

    - Você me entendeu?

    - H..hai.

    Levantando o nobre do chão de safanão o empurrou em direção aos dois guardas que estavam com ele. Os homens seguraram o rapaz aparvalhados e o encarando. Apenas devolveu sério. Rápido levaram seu mestre para longe dali e suspirou retraindo sua pressão espiritual. Os shinigamis que assistiam ao espetáculo evadiam para seus afazeres. Podia ver claramente que gostaram do que viram, mas também o julgavam um louco.

    Foda-se, num estado de emergência desses onde se encontravam, a nobreza não mandava ou tinha influência alguma. Até porque estava no seu direito. Esse moleque maldito o desacatou mais de uma vez. Nada que uma humilhação pública resolvesse.

    - Arigatou.

    Girou no lugar para fonte da confusão. Yuuki o olhava tão aliviada que não pôde evitar sorrir.

    - Não tem de quê.

    Curvando os lábios também, ela se acalmou mais se aproximando.

    - Não apenas por isso, mas por tudo. O senhor sempre foi gentil comigo, apesar de como nos conhecemos.

    Sorriu discretamente ao vê-la ficar rubra desviando o olhar. Observou envolta, percebendo que estavam praticamente sozinhos e sossegou. Era melhor assim depois daquela cena.

    - Aquilo já passou. Aposto que agora aquele moleque não vai se atrever a chegar perto de você.

    Riram descontraídos, afinal era verdade. Se recostando na parede do lado de fora, ela o imitou cruzando as mãos junto ao colo.

    - Arigatou também por aquele momento.

    O rosto pálido da jovem coloriu num tom rosado e suave. E quando ergueu o rosto para ele em seus olhos haviam um brilho, cheio de expectativa. Renji engoliu em seco. Não era a primeira vez que a via o olhar assim. Semanas atrás desde que se encontraram por acaso no comércio da cidade, levou um tempo para perceber, mas assim que entendeu resolveu se afastar. Isso não era bom, nem pra ele e muito menos pra ela. Desviou o olhar respirando fundo, procurando se acalmar.

    - Não precisa agradecer. Eu sei como é estar sozinho.

    - Mesmo assim, arigatou.

    A pausa na conversa o fez ter consciência de como estavam próximos, principalmente no perfume que flutuava em torno dela. Era floral e envolvente. A noção disso evidenciava nas batidas fortes dentro do seu peito e quanto mais os minutos passavam, mais sossegavam ao ponto que ficou confortável. Não era estranho estar perto dela, não havia aquele muro que sempre sentia na casa dos Kuchiki nas visitas do conselho.

    Era... Natural.

    - Abarai-san.

    - Hum?

    - O senhor me aceitaria como esposa?

    Piscou confuso e franziu as sobrancelhas para a garota. Ela mirava firme para frente, serena. Ele ouviu direito?

    - Como foi que disse?

    Ela estremeceu o encarando. Pelos os olhos nervosos e a postura rígida dela, a moça realmente parecia séria. Antes que repetisse a questão a surpresa o abateu como um golpe seco no estômago.

    - Perguntei... Se o senhor me aceitaria como sua esposa, Abarai-san.

    Puta merda, ele não escutou errado. Amortecendo o espanto pela pergunta inusitada ele a encarou por um momento, desarmando a pose de ousadia da garota.

    - Tem certeza?

    - Hã?

    - Terá uma vida simples com o salário que recebo.

    Era bom demais para ser verdade. Seu lado cético praticamente gritava isso.

    - Não me importo.

    Nan..?!

    - Fui criada para ser uma dama, não sei muito como cuidar sozinha de uma casa ou do meu marido, mas eu posso aprender. Vou ser uma boa esposa para o senhor.

    Ela estava quase hiperventilando de tão afobada. Deu mais uma olhada ao redor, aqui era uma área de livre circulação. Sem dizer nada escorregou um braço sobre os ombros estreitos e sumiu dali. Ao chegar aonde queria se afastou uns passos, assistindo Yuuki olhar ao redor espantada. Não fosse por menos. Havia os levado para um canto mais distante do posto médico, dentro de uma saleta. Ela o fitou esperando e suspirou.

    - É isso mesmo que você quer? Porque agora é o momento de voltar atrás.

    - Fui sincera, Abarai-san. Eu realmente quero ser sua mulher.

    Quase gemeu. Ela queria o enlouquecer? Pois estava conseguindo. Fitando os olhos azuis viu quase escondido na determinação que ela queria passar o medo de rejeição. A vontade de quebrar o braço daquele moleque ardeu. Entretanto, a moça em sua frente merecia atenção. Atenção e uma resposta. Há quanto tempo estava lutando contra o que sentia? Dias? Semanas? Nem fazia ideia e não era apenas isso. Se fosse seria mais fácil dizer “não”. A vendo tão vulnerável desse jeito, desistiu.

    Desistiu porque a garota tinha mais coragem que ele em se arriscar.

    Dane-se as consequências.

    - Droga, você é muito baixa.

    Mal ouviu o arquejo ofendido da moça. Enlaçou a cintura fina, debaixo do laço do obi e a ergueu do chão num movimento fluido e rápido. As mãos dela o agarraram pelos braços, tanto de susto como para não cair e o aperto delas o deixou mais atiçado. Assim que ela ergueu o rosto debruçou-se nela, vendo por uns instantes os olhos azuis arregalados antes de fechar os seus, cobrindo a boca rosada com a sua. Um gemido foi abafado, ecoando entre seus lábios e soltou um grunhido rouco ao prender o lábio inferior macio, movendo a boca sobre a dela.

    De rígido o corpo dela amoleceu contra ele. Apenas a segurou mais firme, dando um passo a prendendo contra a parede. A nobre soltou outro gemido, dessa vez mais alto e resolveu aprofundar o beijo buscando a língua dela, a sugando sinuoso e sem pressa. O gemido soou bem mais abafado dessa vez e deixou de se preocupar. Agora com certeza ninguém os ouviria.

    As mãos pequenas mergulharam nos seus cabelos, o puxando para ela ao mesmo tempo em que Yuuki enroscava os braços no seu pescoço. O cheiro de lavanda ficou mais forte, o inebriando tanto como o calor do corpo pequeno junto ao seu. Era uma loucura. Nunca gostou da nobreza, mas ali estava ele com alguém assim... E não se importava nem um pouco.

    Ela respondia tão bem ao seu toque que nem se importava em se sujar de fuligem, se estava suado ou não. Não importava para essa garota. Quando deu por si ela conseguiu soltar seu cabelo criando uma cortina sobre eles, as respirações soavam tão ofegantes que seus pulmões gritavam por ar. Mas o que realmente o fez parar foi uma certa parte do seu corpo bem desperta e afastou o rosto uns centímetros apoiando a testa na dela. Merda, tinha se empolgado demais.

    Dessa mínima distância assistiu ela entreabrir os olhos confusa, tão ofegante como ele.

    - O que foi?

    Roçando os lábios pelo rosto dela, se exultou ao vê-la suspirando ao tombar a cabeça lhe oferecendo o pescoço. Bem mais que desejo, sentia um conforto por dentro ao afogar o rosto na pele macia. O cheiro de lavanda não só o entorpecia, era aconchegante. E aproximando a boca da orelha delicada sussurrou.

    - Aqui não.

    Por um momento, ela não havia entendido até que a fez sentir a prova evidente entre eles. Ignorou o gemido quase sôfrego afastando o rosto do pescoço dela para olha-la. A expressão encabulada, lânguida no rosto rosado quase o fez mudar de ideia, mas se segurou. Ela merecia mais que isso e afinal, devia mais respeito a sua futura esposa. Curvando os lábios, a fitou escorregando o outro braço para segura-la na cintura junto dele.

    - Se não se importar de esperar um pouco mais, nos arranjo um lugar melhor. Depois conversamos mais sobre o casamento.

    Ela ficou o encarando, sem reação com os olhos grandes e brilhantes. Brilhantes até demais. Droga, iria chorar? Disse algo errado com certeza. Antes que consertasse, ela quase riu o pegando de surpresa tanto pelo largo sorriso que abriu como por abraça-lo apertado no pescoço. Pelos rostos juntos sentiu um fio de lagrima na bochecha e franziu o cenho a aninhando mais em si.

    - Oe...

    Ela meneou a cabeça suspirando e sorriu, conseguiu ouvir.

    - Não é nada. Só estou feliz.

    Sorriu com isso. Mas que coisa... Enterrando o nariz atrás da orelha dela fechou os olhos, aconchegado tanto pelo cheiro floral como pelo roçar dos dedos dela em sua nuca.

    Eu também.

    KARIN P.O.V.

    Toushirou não havia dito nada. Enquanto andava na passagem escura de Dangai o único som era das correntes restritas se movendo e o eco nesse túnel. Esse silêncio estava me deixando realmente agoniada. Por que ele não dizia nada? O que estava esperando? A dúvida fazia meu coração bater acelerado em nervosismo.

    Como havia enterrado outra vez o rosto em seu pescoço, só percebi que estávamos em Soul Society quando seu corpo inclinou um pouco e os golpes de ventos vieram. Shunpo. E pela direção que tomava não íamos para o Esquadrão.

    - Para onde está indo?

    - Logo vai saber.

    Apertei mais o punho em suas blusas. Poxa, custava dizer? Esse mistério adicionado com meu nervosismo só me deixou mais aflita. Durante o caminho, procurei respirar fundo checando as batidas cardíacas onde o segurava na roupa. Seu coração pulsava forte, um pouco acelerado, mas seu corpo não estava tremendo. Toushirou parecia que tinha se acalmado um pouco e parei pra pensar aonde estava nos levando, o lugar parecia longe.

    Quando cogitei em perguntar outra vez, os ventos pararam de súbito. Caminhando devagar, ouvi um silvo suave sob seus passos, como se andasse sobre cascalho e levantei o rosto de seu pescoço, me surpreendendo. Boquiaberta, olhava ao redor para um terreno gramado. A relva aparada cobria o chão como um tapete e a direita, perto do muro baixo de pedras uma árvore quase curvava ao chão pelos galhos grossos e carregados.

    Próximo dela havia um lago pequeno, rodeado de pedras cinzentas e uns caniços de bambu. Olhei mais amplamente, medindo o terreno e percebi que não era tão grande. O espaço era suficiente completado pela construção bem no centro dele. Uma casa japonesa tradicional. Toushirou seguia para ela, logo subindo na pedra grande e chata para entrar na varanda de madeira polida. Ele sequer pausou seguindo direto para o shoji esverdeado.

    Puxando para a lateral e deslizando a porta, arfei mais quando ele entrou na sala. Mesmo que estivesse na penumbra vi nitidamente os moveis nivelados ao chão, como uma mesa e almofadas, além de um painel de madeira ornamentado por ganchos. Suspeitei na hora serem suportes de katanas. Toushirou havia parado no Genkan, sem ter tirado as sandálias e me deixando observar o cômodo com cuidado.

    - Onde estamos?

    - Em casa.

    Prendi o fôlego, amortecida pela resposta e calmamente ele bateu os calcanhares nas correias das sandálias, retirando-as. Ao entrar no tatame caminhando pela sala o olhei área. “Em casa...” Então quer dizer que aqui era nossa casa? Com o coração martelando, assisti quieta quando ele acendeu a luz da sala e depois abriu mais um painel florido de cerejeiras entrando em outro cômodo. Observei curiosa ao redor, emocionada pelos detalhes. Os tatames pareciam novinhos, os papeis de arroz nos shojis e nos painéis que dividiam o interior da casa também. Olhei para cima, admirando as frestas desenhadas nos painéis de madeira acima dos shoji e suspirei. Era tão bonito. Simples e confortável.

    Na minha exploração superficial enquanto Toushirou atravessava a casa cômodo por cômodo, haviam partes inacabadas. Estavam cobertas com lençóis brancos do teto ao chão e senti o cheiro de madeira cortada. A remodelação... Lembrei de dias atrás quando disse a razão de ainda não termos nos mudado e senti uma ardência suave nas narinas, com os olhos levemente úmidos. Tombei a cabeça no seu ombro, com o coração aquecido por dentro. Quase me esqueci que Toushirou estava bravo comigo.

    Quando ele finalmente parou num cômodo, assim que me pôs sentada numa superfície de madeira me situei. Olhei para ele, quieta, enquanto Toushirou manejava uma perdeneira agachado perto de mim. Quando acendeu e as chamas fulguraram suaves num tom alaranjado arfei. Olhei envolta para as paredes de madeira polida e me virei para a direita encontrando uma banheira de bom tamanho também de madeira.

    - Volto já.

    Pestanejei o encarando, mas Toushirou já havia se livrado do haori com minha zanpakutou na mão junto da sua. Balbuciei um “tá” quando ele saiu. Soltei um suspiro. Um ofuro. Nossa casa tinha um ofuro! Wow.. O que será que ele pretendia me deixando aqui? Como se fosse resposta, Toushirou entrou carregando um balde cheio d’água. Assisti admirando ele despejar dentro da banheira e sair voltando minutos depois com o balde cheio outra vez. Sendo sincera, o admirei enchendo a banheira, notando que nem reclamava pelo esforço.

    Assim que terminou, Toushirou fechou a porta para então me encarar de soslaio. Engoli em seco, saindo da bolha romântica que criei desde que chegamos. Caramba, é agora que vem as perguntas.

    - Não tem nada para me dizer?

    Me retraí no lugar.

    - C..como assim?

    - Sobre o fato que saiu sem avisar para ninguém essa tarde.

    Engoli em seco. Puxa vida, ele estava mesmo irritado. Esse olhar inflexível, a linha tensa do seu corpo eram sinais de que Toushirou sentia vontade de gritar comigo, mas se segurava. Sinceramente, me causava um mal estar com esse ar reprovador no seu rosto.

    - Eu não iria demorar.

    Seus olhos se estreitaram.

    - Aonde foi?

    - Visitar Yuuki.

    Franzindo o cenho levou apenas um instante para ele entender e me encarou mais irritado. Seu corpo estremeceu e Toushirou suspirou. Engoli em seco de novo quando ele saiu de perto da porta, caminhando até onde eu estava e se apoiou num joelho diante de mim. Esticando os braços, um em cada lado do meu quadril suspirou forte outra vez de cabeça baixa.

    - Que droga, Karin.

    Me encolhi no lugar.

    - Não foi nada demais.

    Levantando a cabeça, Toushirou finalmente deixou a raiva transparecer mais.

    - Nada demais? Você está grávida! Não pensou no nosso filho quando foi investigar por conta própria?

    - Já disse que não ia demorar, mas acontece...

    Calei a boca tarde demais. Toushirou pegou minha hesitação e estreitou os olhos.

    - O que houve?

    A determinação em seus olhos me fez falar, quase num balbucio tímido.

    - Um shinigami do 12º bantai me abordou.

    - Nani?

    Ele se espantou como imaginei e respirei fundo desviando o olhar.

    - Já estava voltando para o quartel quando percebi que estavam me seguindo. Consegui lidar com ele de todo modo.

    - Lidar?

    Toushirou levantou a sobrancelha cético, me fazendo retrair entre seus braços. Por que me sinto tão culpada?

    - Eu não lutei, juro.

    - Como fez isso então?

    O fitei fingindo serenidade, mas por dentro estava tremendo.

    - Kidou e shunpo. O sujeito era bem fracote.

    - O que ele queria?

    Tomei fôlego. Parecia um interrogatório. Com um olhar analítico sobre sim, ele se atentava a cada reação minha e por isso, procurei não mentir. Não queria irrita-lo ainda mais.

    - Me levar... para o 12º bantai. Kurotsuchi taichou... queria me ver.

    Toushirou ficou um tempo calado e me apressei em me explicar.

    - Eu incapacitei ele, mas enquanto mais uma vez voltava para o esquadrão um grupo maior me cercou. Não me fizeram nada, nem me machucaram. Apenas me levaram até o quartel do Centro Tecnologico, para o laboratório do capitão Kurotsuchi.

    Desviei o olhar lembrando desses momentos. Um arrepio me percorreu e suspirei trêmula.

    - Toushirou ele... Aquele homem é um louco. Sabia de tudo sobre meu sequestro, tinha até meu quadro médico. Ele... sabia sobre as criaturas vagando pela cidade. E ainda...

    - O que?

    Engolindo em seco, ergui os olhos para ele encontrando seu olhar mais sereno, menos irritado. Isso me acalmou de uma maneira que relaxei por completo.

    - Tirar amostras dos meus olhos.

    Pestanejando, ele me encarou aturdido e aos poucos vi que estremeceu. Ao lado dos meus quadris suas mãos fecharam em punho ao mesmo tempo em que seus olhos escureceram. Segurei seu rosto, o acordando do que seja que estivesse pensando.

    - Está tudo bem. Não aconteceu e consegui fugir.

    Fiz um carinho singelo em seus cabelos, escorregando as mãos para sua nuca e sob meu toque ele suspirou. Me fitando resignado, suas mãos espalmaram envolvendo meus quadris. O gesto me causou uma onda de calor, principalmente pelo toque firme.

    - Imagino que agora vai me explicar o resgate de sua amiga.

    Ops. Toushirou não deixaria mesmo isso passar. Droga. Encolhi os ombros temerosa.

    - Karin.

    - Por favor, não fica bravo.

    Seu encrustinio apenas aumentou.

    - Diga logo o que fez.

    Respirando fundo, me preparei para a bronca que com certeza ganharia. O que eu tinha a perder?

    - Rasguei meu quimono para correr melhor, também me livrei das sandálias pra não me atrapalhar. Pus uma sequência de bakudous em forma de barreira envolvendo meu útero e atravessei a cidade correndo no shunpo pelos telhados até a propriedade dos Kasumiioji.

    Expirei de uma vez e completei, afinal, ele queria saber.

    - Quando consegui fugir com Yuuki acabei torcendo o tornozelo. Por isso estávamos andando pelas ruas quando nos encontrou.

    Apertei os lábios, esperando sua explosão que não veio. Toushirou continuou me encarando de modo intenso e respirando fundo se inclinou sobre mim, encostando a testa na minha. Finalmente um tremor o percorreu ao mesmo tempo que agarrou meus quadris com força.

    - Até completar os três meses está proibida de sair de casa.

    Arregalei os olhos.

    - O que? Ficou louco, Toushirou?!

    - Não discuta. Você mesma provocou sendo tão imprudente.

    - Eu salvei uma amiga!

    - Correndo perigo, podendo se ferir gravemente. Quando o risco de aborto passar, pode ir aonde quiser desde que me avise ou à Matsumoto.

    - Ma...

    - Karin, vocês podiam ter morrido!

    Me entalei, muda pela constatação. Um bolo obstruía minha garganta e sem querer funguei com as narinas ardendo. Droga de hormônios. Toushirou suspirou me puxando para junto do seu corpo até estar entre minhas pernas, me abraçando apertado. Com o fôlego morno banhando minha orelha, procurei me acalmar respirando trêmula com o rosto enterrado no seu ombro.

    - Desculpa.

    Apertei os braços envolta do seu pescoço. Eu não havia pensado nisso, sobre como Toushirou se sentiria se acontecesse alguma coisa comigo e o bebê e me senti pior. Suspirando seus braços me estreitaram ternamente.

    - Daijoubu. Apenas não faça mais isso.

    - Unhum.

    Ficamos quietos por uns momentos. O estalar das achas que aqueciam a banheira preenchiam o silêncio confortável. Tinha praticamente sumido aquela vontade de chorar e suspirando, senti bem consciente o laço do meu quimono ser puxado, desfazendo. Já iria me afastar para ajudar quando Toushirou me beijou demorado no pescoço. A sensação dos lábios mornos e úmidos me fizeram revirar os olhos e tombei a cabeça, oferecendo mais.

    Num suspiro baixo ele deslizou os lábios pelo arco da minha garganta, beijando e sugando sem pressa minha pele, até chegar onde meu pulso latejava forte. Pressionando a ponta da língua no local, Toushirou escorregou as mãos pela lateral das minhas coxas até agarrar um monte de tecido. Num movimento rápido empurrou o pano até minha cintura, ao mesmo tempo que levantei um pouco pra ajudar.

    A roupa se abriu, me dando um frio pelo golpe súbito de ar e mordisquei seu pescoço também, puxando suas blusas para fora do hakama. Óbvio que não consegui e estalei a língua, o empurrando nos ombros um pouco e peguei o laço do seu obi. Ouvi seu quase riso, não disfarcei a pressa em soltar aquela faixa e tão logo eu consegui empurrei tanto a blusa negra como a branca pra longe dos seus ombros. Deslizei por seus braços, sentindo na palma a pele quente e arfei. À luz dourada das chamas ele parecia mais bonito, me causava um calor que latejava meu sexo e o olhei entorpecida.

    Toushirou não me fitava, ele olhava para baixo e arfei mais tonta do porque. O quimono se pendurava solto pelos meus ombros, as abas abertas revelando meus seios. Pelos olhos verdes, enegrecidos e vidrados ele arfava hipnotizado. No instante seguinte, me agarrou pela cintura se debruçando em mim ao ponto que deitei aonde estava sentada. Com ele sobre mim, Toushirou foi me mordiscando no colo, descendo o rosto até chegar ao meu seio onde escorregou os lábios por ele e abocanhou o mamilo. Estremeci gemendo, o agarrando pela nuca com uma mão ao jogar o pescoço pra trás.

    Um arrepio me varreu quando sugou meu seio, demorado e respirando fundo fazendo com que me molhasse mais. Ele enlaçava minha cintura num aperto firme, já que estava meio fora desse balcão de madeira e para pegar apoio enganchei uma perna no seu quadril. Gemendo baixinho baixei os olhos para seus cabelos. O rosto dele está praticamente enterrado na minha mama e estremeci ao sentir seus dedos puxando os laços da minha calcinha. Por ser atada foi fácil pra ele puxar o pano fora do meu corpo, jogando às cegas pra longe.

    Foi a primeira vez não rasgou e engatei o fôlego quando ele passou a me acariciar no sexo. Não foi provocante, foi objetivo com dois dedos mergulhando entre os lábios a essa altura molhados e prendendo entre eles meu ponto inchado de prazer. O arranhei com a mão livre nas costas, gemendo lânguida ao afastar mais as pernas. Toushirou ainda sugava meu seio parecendo guloso. Ele gosta muito de fazer isso e me revirava na sensação erótica do barulho junto com sua respiração.

    Quando ele se satisfez por hora ergueu o rosto me encarando, assistindo enquanto me agarrava nele desesperada com seus dedos. A sensação de acumulo, do calor latejante numa doce agonia me fez puxa-lo para baixo, exigindo um beijo. Eu só queria descontar essa pressão que me tomava e sem pudor mergulhei a língua na sua boca, sentindo ele fazer o mesmo com seus dedos. Dois deles afundaram dentro de mim e soltei um gemido choroso quando os moveu. Ele sorriu no meio do beijo e me irritei. O empurrei rompendo a união dos nossos lábios, um fio de saliva os ligando e ofeguei afobada.

    - Roupas... demais.

    A luxúria nublou seu rosto e sem dizer nada, Toushirou me atendeu. Tirou meu quimono enquanto eu terminava de livra-lo das suas blusas. Ao se levantar enrosquei as pernas no seu quadril e ouvi o som abafado do hakama indo ao chão. Arfando e excitada o puxei de volta pro beijo molhado, as mãos enterradas nos seus cabelos enquanto ele girava no lugar nos levando para a banheira. Dois degraus e depois Toushirou se abaixou sentando comigo no colo, o atrito de nossos sexos excitados no movimento junto com a água morna me fez vibrar. Se acomodando na banheira, ele foi se recostando até a lateral com as mãos descendo para minhas nádegas.

    Eu achei que me levantaria para me penetrar, mas apenas me ondulou no seu membro rígido me dando um choque de prazer. Rompi o beijo soltando um gemido ao mesmo tempo que ele grunhia. Caramba, a glande tinha pressionado meu clitóris deslizando entre os lábios. A água ondulou com o movimento e me apoiando de joelhos no fundo segurei seus ombros continuando o atrito. O tempo todo não desviamos o olhar, analisando a expressão de deleite um do outro enquanto gemíamos extasiados.

    Sério. Estrear a nossa casa assim foi muito melhor do que imaginei e para melhorar parei de rebolar no seu colo me afastando. Ele quase protestou e o beijei com paixão, deslizando uma mão por seu peito, seguindo a linha do abdômen definido até segurar seu membro. Toushirou arfou me agarrando pela nuca e me afastei devagar fitando seus olhos. Não disse nada, ele pareceu entender e distribuindo beijos e mordiscadas pelo caminho que fiz com a mão mergulhei na agua deslizando os lábios no seu membro até engoli-lo. Os dedos nos meus cabelos agarraram forte e me senti poderosa quando ele estremeceu.

    Quando pedi que tirássemos a roupa, quase havia pedido para que ficasse de pé e fizesse isso com ele, o enlouquecer, mas na banheira seria mais excitante e não me enganei. Segurei o fôlego controlando, sugando seu membro com vontade ficando mais molhada. Não ia rápido, mas também não ia devagar. Roçava os dentes de leve na extensão, sugando a glande um pouco para depois abocanha-lo. Quando o senti pulsando dentro da minha boca fui puxada pra fora d’água arquejando. Toushirou me encarava com fome, logo me tascando um beijo ao me agarrar pelas nádegas e me endireitar.

    Ao sentir que encontrou minha fenda me desceu enquanto se empurrava. Prendi o fôlego, trêmula com a sensação quente... Me dilatando para acomoda-lo e enrosquei os braços no seu pescoço. Me erguendo outra vez ele se afundou dentro de mim, indo devagar até que quando dei por mim a água da banheira sacudia espirrando para os lados. O beijo foi ficando bagunçado, ofegante ao ponto que afastamos um pouco o rosto, roçando a pele um do outro.

    Eu ouvia sua respiração forte, os gemidos misturados à grunhidos me arrepiando inteira enquanto me agarrava forte nos seus ombros quase em desespero. Entorpecida olhava o vazio de olhos entreabertos, vendo o cômodo banhado nessa luz dourada. A atmosfera e a noção que havia só nos dois nessa casa, sem ninguém por perto acabou com minha vergonha. Tanto que quando aquela pressão latejante, quente que me escaldava por dentro se rompeu de um jeito bruto e forte gritei alto. Caramba eu gritei lagrimando, suada e tremendo no colo dele com Toushirou chupando forte meu pescoço. Eu não vi mais nada por uns segundos, entalada com a sensação aguda me varrendo e pulsando do meu sexo.

    Quando desci dessa exultação, meu corpo estava mole. Piscava lentamente ouvindo um gemido rouco e longo no meu ouvido e apertei os olhos arquejando. Pulsante e quente, me sentia cheia e escorregadia. Rocei o rosto no de Toushirou até apoiar a testa na dele. Mesmo de olhos fechados sabia que estava suado, rubro por se satisfazer segundos atrás. Afagando seus cabelos o trouxe para um singelo beijo, praticamente um roçar de nossos lábios e um suspiro seu veio.

    Com o torpor nevoando minha cabeça gemi sensível quando ele se retirou de mim. Continuei sentada no seu colo sem forças para uma posição mais confortável e ofegante, Toushirou se recostou outra vez na lateral da banheira. Seus braços estavam apenas enrolados na minha cintura, sem apertar e deitei o rosto no seu ombro. Letargia e cansaço me abateu e pelo jeito quieto dele também se sentia assim. Molhando os lábios, Toushirou respirou fundo ao roçar os dedos na minha coluna.

    - Foi bem... intenso.

    Sorri preguiçosa.

    - Eu gostei.

    Ouvi seu sorriso também e depois um suspiro cansaço. Não precisávamos dizer nada. Esse silêncio era tão confortável, calmo. Me faria dormir se não fosse os dedos afagando minhas costas. Faziam um padrão circular e deslizante, como se seguisse um desenho que só ele próprio via. No entanto, com o relaxamento do orgasmo já cedendo a realidade veio e abri os olhos fitando o vazio.

    - Toushirou.

    - Um?

    Parecia sonolento e me ajeitei devagar para sentar entre suas pernas. Seus braços apenas me puxaram contra seu peito e suspirei pelo carinho.

    - O que vai acontecer agora?

    Tomando fôlego para me responder, Toushirou respirou fundo e relaxado.

    - Kurotsuchi terá o que merece.

    Pisquei sonolenta e entendi. O Gotei o julgará por seus atos.

    KARIN P.O.F.

    Dias depois.

    HITSUGAYA P.O.V.

    As portas duplas de madeira se abriram devagar, revelando o capitão do 12º Bantai nos olhando incomodado. Todos os líderes da Brigada o observavam enquanto ele entrava nesta sala, parando entre as fileiras paralelas dos capitães. Ninguém dizia nada, apenas encarávamos esse sujeito numa muda reprovação. As portas se fecharam com um som surdo e abafado e no instante seguinte, Yamamoto Genryuusai abriu minimamente os olhos.

    - Kurotsuchi Mayuri, faz ideia do porque está aqui?

    - Humpf. Não entendo o que uma reunião extraordinária teria haver comigo, Comandante.

    - Tem certeza? Não se faça de idiota, Kurotsuchi.

    Zaraki cuspiu, visivelmente irritado. Mayuri apenas rangeu os dentes estalando a língua com desgosto.

    - Um sujeito acéfalo como você me acusando. Seja mais claro Kenpachi.

    - E tal que você seguir o exemplo. Conte-nos sobre as pesquisas com o Togabito.

    Soifon interpelou o encarando de soslaio. O silêncio predominou nesta sala e vi com clareza Kurotsuchi tremendo com os olhos ligeiramente arregalados. Todos nós esperávamos explicações e ele as tinha que dar nesse momento. Recuperando a compostura ele arquejou estreitando o olhar.

    - Como foi que disse, capitã?

    - Você me entendeu.

    Um taichou à direita avançou um passo.

    - Desembucha logo, Kurotsuchi!

    Dessa vez, ele apenas encarou Kensei e voltou os olhos para frente. Observando os capitães, ele percebeu finalmente a gravidade do assunto aqui tratado. Depois dos incêndios generalizados dias atrás, Hirako juntamente comigo e Yoruichi nos reunimos com o Comandante em seu gabinete do 1º bantai. Os relatos embasados teoricamente, juntos com as provas foi o fato que gerou essa reunião.

    Não era a defesa dos delitos de Kurotsuchi e sim a execução por eles. Diante de todos aqui, ele deveria se explicar porque deliberadamente expôs Soul Society e outros mundos em perigo com as sentinelas de Daí Avici.

    - Como chegaram à essa conclusão?

    Franzi o cenho enfadado. Ele quer mesmo ludibriar o assunto?

    - Havia um togabito detido nas celas do meu esquadrão na Prisão Central. Ele desapareceu e desde então por coincidência os soldados apareceram abatidos de missões externas.

    - Isso não prova nada, Hitsugaya taichou.

    - Temos relatos, provas de seu laboratório mesmo desativado e a ligação com os incidentes.  Ainda quer negar?

    Hirako observou cruzando os braços por dentro das mangas do haori. Com o silêncio entalado, o Comandante bateu o cajado chamando a atenção de todos.

    - Sem tentativa de defesa ou esclarecimento?Kurotsuchi Mayuri, por obstrução na investigação do incidente dos soldados enfraquecidos de reiraku, violação de hierarquia por jurisdição e exposição ao perigo os cidadãos e habitantes de outros mundos é condenado ao Cárcere de Reclusão Especial.

    - Nani?! Não podem fazer isso!

    - Já aconteceu.

    Kyouraku apontou aumentando a histeria do outro. Hiperventilando de agonia, Mayuri rangeu os dentes segurando o punho de sua zanpakutou. No mesmo instante, cinco dos capitães o encurralaram, as espadas desembainhadas apontando para cada ponto vital dele. Kensei apertava a ponta de sua zanpakutou na jugular de Kurotsuchi. Kuchiki entre as costelas do lado direito, Kyouraku e Hirako ameaçando seguidamente as costas na coluna vertebral e a testa do ex-capitão. Soifon era a única que havia liberado sua shikai. Com o braço direito esticado e mirado para o peito de Kurotsuchi ordenou.

    - Largue a espada.

     De queixo erguido por uma das lâminas no pescoço, Kurotsuchi obedeceu rígido de tanto ódio. Assim que aconteceu, sua arma foi retirada por Kensei e todos se afastaram um passo. Quando a capitã fez isso, um desenho de uma borboleta negra surgiu no peito de Kurotsuchi. Por isso que ele cedeu. No momento seguinte, soldados Onmitsu Kidou apareceram rodeando Mayuri, nos pulsos um par de algemas inibidora de reiraku foi posta. Quando a porta dupla se abriu ele foi escoltado para a Prisão sem dizer nada.

    Apesar de louco, ele era orgulhoso. Escândalo não era sua preferência e assim que novamente essa sala foi fechada, o Soutaichou se endireitou na cadeira.

    - Agora continuaremos a reunião.

    ~*~*~*~*~

    Meses depois

    Com a condenação de Kurotsuchi Mayuri para o Cárcere de Reclusão Especial algumas medidas foram tomadas. Primeiro, as razões do afastamento bem como a localização de Kurotsuchi são de caráter sigiloso. Apesar da gravidade que fez nos expondo à um perigo daqueles era ainda um shinigami de grande valia para a Brigada, portanto, no futuro podíamos precisar de sua ajuda. E os membros de sua equipe de laboratório também foram condenados à essa prisão, com exceção do fato que teriam mais livre arbítrio do que o próprio Mayuri.

    Com as equipes de investigação de reishi atuando nas semanas seguintes, foi possível identificar com exatidão os locais de abates das sentinelas. Como pontos de frequências de reiraku distorcidas, barreiras foram erguidas para restaurar o equilíbrio. Havia uma chance considerável de novos aparecimentos dessas sentinelas e evitar foi a melhor solução. Com quatro meses depois a rotina em Seireitei havia retornado e por esse motivo, Karin e eu faríamos uma visita para sua família em Karakura.

    - Ah, taichou. Por que eu não posso ir?

    - Alguém precisa se responsabilizar pelo esquadrão durante minha ausência.

    - Capitão, o senhor é muito malvado comigo.

    Reprimi um suspiro de enfado, ignorando o muxoxo de minha tenente ao esperar o Seikamon oficial terminar de se abrir. Karin sorria compreensiva para Matsumoto tentando, mas sem sucesso esconder seu divertimento.

    - Rangiku, vai ser só uma visita. Nem ficaremos o dia inteiro. Logo, logo estaremos de volta.

    - Hai. Mas e as suas costas? Ainda estão doendo?

    Franziu as sobrancelhas preocupada e observei Karin afagando a barriga saliente sobre o quimono. Ainda não deixo de possuir um sentimento de adoração toda vez que a observava. Os olhos negros e brilhantes, a pele viçosa e rosada. Apesar de ser nossa primeira criança, Karin estava lidando muito bem com as particularidades de uma gravidez. Sequer reclamava.

    - Já estão melhores, agora temos que ir.

    Olhei para frente. O portal já estava totalmente aberto e me aproximei de Karin. Dando um aceno para Matsumoto, nos encaminhamos para a luz branca com as borboletas infernais pairando ao nosso redor. A travessia em Dangai foi tranquila e como eu havia pedido, a saída foi dentro da loja de Urahara. O mesmo já esperava por nós e sorrindo amistoso nos ofereceu os gigais que o mesmo havia aprontado. Depois que nos arrumamos, vestidos como humanos saímos de sua loja e no caminho segurei a mão dela.

    Com o tremor que senti, a olhei curioso e vi que fitava a rua respirando fundo.

    - O que foi?

    Pestanejando ela me olhou espantada, para logo sorrir acanhada de nervosismo. Apenas apertei sua mão levemente e Karin suspirou, bem mais calma.

    - Não é nada. Só que... faz mais de um ano.

    - Entendo.

    Faz mais de um ano que Karin morreu. Desde esse dia ela não havia visto sua irmã, por isso usávamos gigai. Como ela não possuía uma energia espiritual tão forte, não poderia nos ver se estivéssemos na nossa forma natural. Karin estava nervosa com o reencontro, mas valeria a pena. Eu tinha certeza, ainda mais que não seria uma surpresa. Todos já esperavam por nós.

    Durante o caminho até a residência dos Kurosaki percebi que recebíamos olhares de transuentes. O surpreendente foi que não se tratavam de olhares julgadores. Usando um vestido branco de alças e decote discreto, com sapatilhas, Karin aparentava ter mais idade do que uma adolescente. Provavelmente pelo ventre arredondado de seis meses. Quanto a mim escolhi uma camisa de linho e azul, uma calça de lavagem escura. Havia dobrado as mangas da camisa até os cotovelos. Mesmo que seja inicio de outono não deixa de ser um pouco quente.

    Acho que aos olhos dos outros aparentávamos ser um jovem casal. Jovem até demais, mas pouco me importava. O que interessava era estar fazendo isso, uma visita à família. Quando chegamos, Karin retorcia as mãos nervosa, indecisa se apertava a campainha ou não. Resolvi o problema apertando eu mesmo e ela me lançou um olhar acusatório. Já estava acostumado ao longo desses meses, então não era um problema.

    - Eles chegaram!

    Piscamos surpresos pelo grito. Quem era essa pessoa?

    No instante seguinte a porta da frente foi aberta de rompante e dela saiu um homem de meia idade atarantado. Karin endureceu ao meu lado, principalmente quando o homem, seu pai, saltou por cima do portão de ferro a abarcando num abraço apertado. Só pude assistir essa interação incrédulo.

    - Ah, Karin-chan, minha filhinha. Está tão crescida e essa barriguinha? Veio finalmente me apresentar meu netinho?

    - Pai. Me. Solta!

    O empurrando com força, ela conseguiu se desvenciliar de Shiba-san que sorria tolamente para ela. Karin tinha as bochechas coradas de raiva, mas também de embaraço. Me segurei muito para não sorrir. Pegando minha mão ela foi entrando na casa e ignorando seu pai.

    -  Vamos Toushirou, senão minha pressão vai aumentar com esse velho maluco.

    Não disse nada, apenas a acompanhei e assim que entramos na sala depois de calçarmos os sapatos internos, um grupo de pessoas se levantou do conjunto de sofás. Eles sorriam e sabiamente soltei a mão dela assim que uma moça ruiva de cabelos curtos se aproximou com lágrimas nos olhos.

    - Karin?

    Olhei para minha mulher e a mesma sorria emocionada.

    - Oi Yuzu.

    Quase rindo, elas finalmente se aproximaram mais e se abraçaram. Logo risos explodiram, principalmente por Yuzu comentar que Karin havia sido bem mais rápida que ela. Já estava casada e teria um filho. Curvei os lábios, feliz e com um sentimento que ia de amor à ternura, observando a interação familiar ao longo desta tarde. Kurosaki e seus amigos estavam aqui. Durante as conversas, percebi que a pessoa que havia gritado nossa chegada tinha sido Inoue Orihime. A garota parecia brilhar de felicidade e estranhei. Olhei para um canto perto da cozinha Kurosaki conversando com Kuchiki. Ambos corados durante uma acalorada conversa até o substituto beijar suavemente o rosto dela. Desviei o olhar, isso não era da minha conta.

    - E então? Como está Soul Society?

    Pestanejei com a pergunta e olhei de soslaio a pessoa. Shiba-san me observava calmo, sem o comportamento com que recebeu sua filha. Suspirando mirei o vazio. Seireitei depois daquela confusão finalmente estava entrando em dias calmos e rotineiros.

    - Está bem mais tranquila. Os prédios e lugares destruídos já foram restaurados, barreiras místicas levantadas neste mundo e nos demais por causa da interferência espectral das sentinelas. A maioria dos shinigamis afetados pelas criaturas já retornou à ativa. Poucos ainda estão se recuperando.

    - Hum... Os anciões da Central 46 devem ter feito algo sobre Kurotsuchi. Apesar de tudo ele é o mais qualificado para liderar o 12º bantai.

    - Creio que não.

    Ante à sua duvida esclareci.

    - Nomearam Urahara Kisuke como Presidente interino do Centro de Desenvolvimento Tecnologico.

    Shiba-san quase riu sob um copo.

    - Kurotsuchi com certeza deve ter explodido de ódio.

    - Nem faz ideia.

    Escondi um sorriso ao lembrar da reação do ex-taichou numa reunião para inventário e nomeação do novo encarregado. Era meio que óbvio a escolha, afinal de contas Urahara Kisuke foi o fundador em primeiro lugar.

    - Karin parece bem saudável. Está de quantos meses? Sexto?

    O encarei com essa pergunta.

    - Achei que fosse médico agora, senhor.

    Ele devolveu o olhar de modo desdenhoso.

    - Não seja assim. Mal dá pra ver a barriguinha da minha filha. Você que fez ela usar aquele vestido, não foi?

    Estreitei o olhar incomodado pela pergunta e ele percebeu.

    - Sugeri, na verdade.

    Seu sorriso apenas aumentou. Eu mereço.

    - Toushirou... Essa mania de proteção exagerada ainda te deixará velho.

    Simplesmente não respondi, afinal ele não deixa de ter certa razão. No entanto, havia algo que devia tratar logo com ele. Era justo que o avisasse.

    - Shiba-san.

    - Hum, o que foi?

    Ele estranhou meu tom reservado... Sério.

    - Por algum tempo, Karin provavelmente não poderá vir para o Mundo dos Vivos.

    Ao meu lado apenas escutei um suspiro e pela visão periférica vi que observava as filhas na sala de estar. O semblante que sustentava era de um ar contemplativo.

    - Sim, eu sei, regras de transição. Por isso a trouxe hoje?

    Assenti afundando as mãos nos bolsos do calça.

    - Ela queria muito visitar o senhor e a irmã. Como se tornou uma shinigami pouco depois de sua morte, ainda é muito cedo para que visite o Mundo dos Vivos, principalmente o local da vida terrena.

    - Deve ter tido muito trabalho para conseguir uma exceção hoje.

    - Nem tanto.

    A observando sorrir discretamente de um comentário de sua irmã senti algo reconfortante, um acalento dentro do peito ao vê-la assim. A expressão relaxada, suave em seu rosto valia a pena por ter gastado horas de conversas e outros favores.

    - Bem, isso não quer dizer que eu não vá visitar vocês em Soul Society.

    Franzi as sobrancelhas voltando os olhos para ele. Shiba-san sorria debochado para mim e sinceramente, tive vontade de gemer com o ar jovial do meu ex-capitão.

    - Claro que não.

    - Hã... Que tom foi esse? Não está empolgado por seu sogro ir vê-lo de vez em quando? É meu direito de pai, sabia? Não pode negar.

    - Sei bem disso, senhor.

    - Além disso, com toda certeza estarei lá quando Karin der a luz. Sou médico afinal de contas, claro que não deixarei minha filhinha sozinha num momento tão importante desses.

    Subitamente imaginar a cena me deixou preocupado.

    - Tem certeza?

    - Mas é claro que sim.

    O encarei com certa duvida, depois observei Karin de soslaio. Pelo modo como reagiu mais cedo, ela não lidava bem com as atitudes exageradas do pai. De qualquer modo, estarei ao lado dela no dia e assim ficaria tudo bem.

    - Então já escolheram o nome?

    - Hum?

    Sorrindo mais calmo ele perdeu o ar de brincadeira. Parecia mais normal, com um semblante de maturidade.

    - Karin está esperando uma menina, não é?

    Involuntariamente, curvei os lábios lembrando do dia quando descobrimos. Karin chorava mais emocionada por ouvir o coração da nossa filha do que pela noticia que esperava uma menina. Eu, por outro lado, imaginava numa euforia contida a criança que fantasiava desde que tivemos nossa primeira vez.

    Ainda sem responder, voltei os olhos para o quadro na parede atrás de mim. O homem ao meu lado seguiu meu olhar e vi que se surpreendeu quando notou para onde exatamente eu olhava. Gravado numa letra elegante, o nome em kanji da mulher na fotografia seria uma ótima opção. Afinal, era o nome da mãe de Karin.

    Suspirando, encarei Shiba-san que ainda fitava a foto da sua falecida esposa de modo nostálgico.

    - O senhor se importaria?

    Curvando os lábios, ele me encarou sem palavras e vi algo que não esperava. Olhos serenos de alguém que compreendia profundamente a vida.

    - Não precisa disso, Toushirou.

    O olhei ainda meio duvidoso.

    - Tem certeza?

    - Claro, Masaki ficaria emocionada, mas não seria uma homenagem perfeita, sabe? O nome precisa significar mais que isso, ser especial para ambos os pais.

    Contemplei sua resposta.

    - Nunca cogitei isso.

    - Pois é, vivendo e aprendendo.

    Me dispensando com a mão, ele sorriu com presunção pelo conselho.

    - Agora vá ficar perto da sua esposa. Pela cara dela com certeza Yuzu está fazendo uma enxurrada de perguntas indiscretas.

    Mirei na direção e realmente, Karin parecia desconfortável a cada pergunta de sua irmã. Assenti para ele e me encaminhei até a sala. Assim que me viu Karin suspirou de alivio e escondi um sorriso.

    - Cansada?

    - Hai. – se virando para a irmã, sorriu acanhada – Yuzu posso usar seu quarto um pouco? Meus pés estão meio inchados.

    - Claro.

    Ajudando-a a levantar do sofá, fomos até as escadas subindo para o segundo andar. Karin atravessou o corredor até a porta de madeira no final deste. Ela estava aberta e suspirando se sentou numa cama de casal balançando os pés.

    - Ah... Finalmente.

    Quase ri e logo me apoiei num joelho em sua frente, pegando um de seus pés e massagea-los. Seu suspiro de alivio foi audível na quietude do quarto.

    - Há quanto tempo estava sentindo essas dores?

    - Desde cedo.

    Baixei os olhos para a massagem que estava fazendo. Circulava os dedos, apertando os pontos de pressão para relaxar os músculos.

    - Devia ter me dito.

    - Você adiaria nossa visita aqui.

    Verdade. Pegando seu outro pé, ouvi um suspiro cauteloso. Estranhei isso, mas esperei ela iniciar o assunto.

    - Nee, eu sei sobre o que conversou com meu pai. – ergui os olhos para ela, encontrando um ar sereno em seu rosto – Ele tem razão, nossa filha não precisa ter o nome da minha mãe, Toushirou.

    - Tudo bem mesmo pra você?

    - Unhum. Além disso eu já pensei em um.

    A curiosidade me aguçou e pousei os pés dela no chão, me sentando ao seu lado.

    - E em qual você pensou?

    Com minha pergunta, ela desviou o olhar ruborizando encabulada. A fitei instigando.

    - Karin...

    - Hisame.

    Pisquei com a escolha. Mas esse é...

    - O nome da entidade de nossas zanpakutos?

    - Hai. Ela é uma mistura de nós dois, não é? Eu não sei por que, mas enquanto pensava em nomes pra ela me lembrei deste. A união das nossas espadas, uma combinação dos nossos poderes é algo tão incrível, Toushirou. Eles sempre serão assim, lembra? – me fitando serena, seus olhos negros pareciam brilhar – Você me disse uma vez que nossos poderes sempre fluíram entre nós, em união. É como ela, nossa filha é parte de nós e sempre será assim.

    O sorriso alegre que me brindou foi definhando com meu silêncio.

    - Que foi? Não gostou? Droga, eu sabia. É uma bobagem mes...

    - Não. Você tem razão.

    - Tenho?

    A empolgação em seu olhar me fez chegar mais perto dela, tombando o rosto para seu mais rosado do que antes.

    - Sim. Hisame seria perfeito.

    Cobrindo seu sorriso terno num beijo, lembrei da fantasia que tive ao imaginá-la grávida. De olhos fechados pude perfeitamente enxergar. Karin de costas para mim, embalando um bebê em seus braços. Ao chegar perto, a abracei pelas costas tombando o rosto e encostado no seu. Enquanto ela se apoiava em mim, olhei para a criança balbuciando em seus braços. A menininha era igualzinha à ela em sua aparência, de pele pálida e suaves cabelos negros, mas os olhos infantis que nos observavam curiosos eram de um tom de verde como os meus.


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