Yooooo
Antes de começar a ler, é bom tomar aquela água saborosa e bem líquida para dar aquela hidratada espetacular
Antes duas beiçadas na água do que duas pedras nos rins
Boa leitura ^^
Frio.
Era o que Kleist sentia ao acordar. Estava com seu corpo inerte, sentindo-se nas nuvens. Com as mãos, apoiou-se no solo, mas a sentiu afundar, assim como os pés. Mesmo assim, conseguiu se firmar e erguer.
Ele estava em meio a uma intensa nevasca. De imediato, suas chamas amarelas ondularam pelo seu corpo, protegendo-o do intenso frio. A nevasca era tão furiosa que parecia empurrar o corpo e não era possível enxergar além do que alguns palmos a sua frente, com exceção das formas negras das gigantes montanhas. Então, fechou os olhos, tentando sentir a presença dos Selos, da arcanjo ou de qualquer demônio, todavia nada sentiu. Praguejando antecipadamente pelo tempo que irá perder andando nesta maldita neve, o Selo seguiu adiante.
A cada passo, a neve derretia sobre seus pés. Ele simplesmente era um ponto amarelo e cálido em meio ao todo branco e álgido, emanando luz na escuridão. Não se sabia ao certo o quanto tempo de caminhada já fizera, mas há muito sentia que estava sendo observado. O mais estranho, constatava Kleist, era que não conseguia sentir presença alguma. Jogado em um mundo em que não conhecia e sendo observado por um ser que não sabia distinguir se era demônio ou não, o Selo preferiu fazer nada, pois poderia estar sendo estudado. Não obstante, o que mais o incomodava é o tempo em vão que andava. Não sabia se os outros também percorriam por ali, ou se haviam demônios. "Talvez Lúcifer esteja nós tirando da guerra", pensava Kleist, "e parece estar funcionando."
Eis que uma montanha de neve se ergue na frente dele! Notando imediatamente que era um ser daquele mundo — que poderia ser muito bem um demônio —, Kleist deu um salto para trás e levou a mão a espada. Ao observá-lo por mais um instante, ele desprendeu os dedos do punho da espada e saiu da posição de ataque. A enorme criatura, no entanto, ergueu sua enorme mão e redirecionou a um golpe.
Kleist não moveu sequer um músculo.
A mão subitamente parou a centímetros de seu corpo, esvoaçando a neve ao seu redor. As labaredas amarelas a lambeu, porém não queimaram, porque não era esta intenção de seu portador. A grande mão recuou, e as chamas se intensificou para iluminar mais.
Era um gigante de gelo de oito metros. Seu corpo era robusto, meio humanoide e completamente formado por gelo, com partes lisas, irregulares, encrustadas e, nas costas, com diversas estacas brotando. O formato da cabeça e da face se assemelhava em muito a humano, porém feita de gelo e sem nariz e ouvido. No centro do peito, um brilho azul intenso emana por dentro de todo o gelo. Em um dos ombros, Kleist notou a presença de um pequeno ser de centímetros, arredondado, completamente coberto por pelos brancos e olhos azuis que brilhavam muito.
— Por que não me atacou? — perguntou o gigante, e surpreendeu Kleist por falar sua língua. Era uma voz fina, bela e suave, o que o levou a acreditar que era a criatura pequena no ombro que dizia isto. Em sua cabeça, Kleist o apelidou de ananico.
— Porque não senti nenhuma intenção maligna emanar de vocês.
— Quem é você? Se parece tanto com Lúcifer, mas é tão diferente...
— Eu vim do mesmo mundo que o dele. Porém, sou um nephilim e um dos Cinco Selos, Guerra.
— Sim... Selos... Ouvi falar de vocês. Os demônios os temem. O que lhe traz aqui, Guerra?
— Viemos matar Lúcifer, mas ele nos separou. Agora estou aqui. Sabe onde posso encontrá-lo?
— Não. Ele vive além deste mundo. Porém, Lúcifer deixa seus demônios aqui para escravizar meus semelhantes.
— Para que vocês são escravizados? — questionou o Selo com certa preocupação.
— Há um minério, cujo demônios chamam de vidro-falso, que é essencial para nossa sobrevivência, pois nos alimentamos de sua energia. Os demônios, porém, descobriram que é um minério formidável para forjar armas. Para extraí-los é um trabalho pesado, e os meus semelhantes são escravizados para este afim.
— E por que não lutam para libertá-los?
— Não gostamos de guerra. Apesar de ser escravidão, eles não nos maltratam e deixa nos alimentarmos. Para nós, é o suficiente. Além disso, há uma barreira que nos impede de entrar e sair.
— Pois bem. — Kleist encarou o ananico, e seus olhos amarelos cintilaram ainda mais intensamente. — Eu irei guerrear contra eles. Leve-me até lá.
Kleist subiu na palma da mão do gigante e foi colocado sobre o ombro livre. O gigante virou o corpo e começou a andar em direção aos demônios. O Selo perguntou se as chamas iriam derretê-lo, mas o ananico respondeu que o calor não era o suficiente para isso.
— Quem são vocês? — perguntou o Selo.
— Sou simplesmente um ser deste mundo. Os demônios, porém, chamam-me de parasita.
— Por quê?
— Eu e meus semelhantes controlamos o corpo destes gigantes e sugamos sua energia.
— Isto não é diferente de escravidão — observou Kleist. — Não é diferente do que os demônios fazem.
— Mesmo que estes gigantes nos devorassem? Eles guerreavam entre si em busca de alimentos... dos vidros-falso, nos devoravam e até praticavam canibalismo. Como eu disse, não gostamos de guerra — dizia o ananico, mantendo a voz serena. — Então, esta foi a única solução. Eles não guerreiam mais, nem nos devoram ou a si mesmos. Alimentamos eles e depois nos alimentamos da energia de seus corpos.
— Mas isto é errado — contrapôs o Selo. — Todos devemos ter liberdade, independente do estilo de vida.
— Por que me julgas errados, Guerra? Vocês, de outro mundo, guerreiam e matam centenas... desde quando isto é certo? Vocês adoram guerrear. Nós, por outro lado, odiamos. Vocês guerreiam para diminuir os números dos inimigos, de ameaça; por alimentos, terras. Nós parasitamos estes gigantes para preservar meus semelhantes e eles mesmos; para nos alimentarmos e ter lugares para ficarmos sem medo de ser devorados. No fim, nós e vocês queremos o mesmo: equilíbrio e, consequentemente, sobrevivência. Então por que me julga errado? Só porque faço diferente algo com mesma finalidade? Ora, apesar de diferente, nossos atos não são todos cruéis?
Kleist não respondeu, pois concordou com a observação do ananico. Todos eram iguais. Anjos, demônios, humanos, nephilins — todos acabavam atraídos e maculados pelo sangue. E lá estava ele mais uma vez, trilhando um caminho que o levaria até os demônios, nos quais irá matar sem um pingo de dó ou remorso. Mais um dia que terminaria sujo da cabeça aos pés de sangue, e não desejava nem um pouco fugir disto. Kleist notou que a diferença entre ele e o parasita era imensurável. Enquanto o parasita suga a energia e controla o gigante, ainda vivo, ele irá trucidar o quanto de demônios que conseguir e irá se divertir com isto. "Então", pensava, "não... não tenho direito nenhum de julgá-lo como errado."
— Como consegue falar minha língua? — perguntou o Selo, por fim.
— Tecnicamente, não estou falando. Estou enviando ondas telecinéticas e seu cérebro, inconscientemente, as traduz de uma forma que entenda.
— Uma linguagem universal... Impressionante. Sua raça é poderosa.
— E o que define ser poderoso para você, Guerra?
— Ter a capacidade de ir muito além do que os outros normalmente conseguem.
— Neste caso, só seria questão de ponto de vista, não? A habilidade telecinética é normal em minha raça, porém não lutar com uma espada.
— Mas vocês conseguem controlar um gigante de gelo.
— E você cortar este gigante ao meio.
— Exatamente.
— Hmm... Então, apesar de sermos poderosos por causa disto, você é ainda mais?
Kleist apenas riu.
***
O ananico carregou o Selo pelo mundo congelado, passando por caminhos sinuosos, estreitos, declives, penhascos e planícies. Haviam encontrados outros desta espécie, inclusive um gigante de gelo selvagem, onde Kleist o derrotou facilmente. Tudo isto, para finalmente chegar na barreira mágica, que dividia a liberdade da escravidão.
Saltando para o chão, Kleist se aproximou da barreira translúcida. Com um simples toque, ele foi repelido alguns centímetros, deslizando os pés sobre a neve.
— É melhor você ir embora agora. — O Selo olhou por cima dos ombros. — Obrigado por me trazer até aqui, ananico.
— Ananico — repetiu o ser daquele mundo, parecendo se divertir. — Nós que agradecemos, Guerra. A partir de agora, nos chamaremos de ananicos e teremos nomes próprios. Irie me chamar de Aalm. Se futuramente você ou outros Selos precisarem de ajuda, é só me procurar.
— Sim, Aalm.
"Só espero que o mundo deles não se fragmente ao matarmos Lúcifer", pensou o Selo, observando o ananico Aalm se afastando e sumindo em meio a nevasca.
Ele ergueu a espada sobre a cabeça e envolveu-a em chamas amarelas. Disparou um poderoso corte revestido pelo calor, que, ao brandir contra a barreira, fora repelido e dissipado de imediato. Com indiferença, intensificou ainda mais suas chamas e disparou múltiplos cortes em sequência, e ainda sim continuava a ser infrutífero. Repentinamente, Kleist moveu sua espada para sua direita.
— Espere! — soou uma voz.
A lâmina parou a centímetros do pescoço de um demônio, que estava com as mãos erguidas. Ele era esguio, de pele vermelha e haviam sulcos em seu corpo que cintilavam incandescentemente — o que lembrava muito o Dante. Suas mãos detinham dedos compridos e unhas grandes, coberto por uma pelagem negra até os antebraços. Seus pés tinham apenas três dedos, longos e espessos. Em seus lábios, um sorriso malicioso com dentes afiados e bem enfileirados. Seus olhos ardiam como lava, assim como a ponta de seus chifres, que subiam levemente curvados. Suas asas eram de membrana com coloração carmesim. Tiras de couro se cruzavam em seu peito e circulavam sua cintura, cheia de frascos, ferramentas e pergaminhos.
— O que você quer, demônio? — perguntou Kleist.
— Eu... posso lhe ajudar a passar por esta barreira...
Ambos ficaram em silêncio. Com cuidado, o demônio se afastou da lâmina e ajeitou a postura, juntando as duas mãos.
— Chamo-me Azason — retomou ele —, e, como disse, estou disposto a abrir uma passagem para você... por um preço, naturalmente.
— E por que você faria isto? — Kleist não recuou a espada.
— Beem... eu não me importo com Lúcifer, nem em guerrear, anjos; entre essas coisas típicas de um demônio — explicava-se Azason, gesticulando com as mãos sem parar. — Na verdade... tenho um grande apreço pelo conhecimento, e é por isso que o busco. Desejo ser um livro vivo. Portanto... — olhou para espada do Selo —, devo admitir que ver de perto a espada viva do grande deus da guerra é um tanto quanto tentador. O que nos leva a proposta feita.
Após um tempo pensando, Kleist cravou a espada no chão e o demônio se aproximou dela, sedento. Azason percorreu os olhos pela lâmina, observando o metal, as caveiras. Sentia uma presença maligna e sede de sangue emanando dela. Cada detalhe era observado minuciosamente.
— Incrível espada forjada pela nephilim Vida! É como se fosse literalmente uma prisão, e não que Odin tenha sido transformado nessa espada... Fascinante! — Ele levou as mãos para perto da lâmina, mas Kleist afastou-a dele. — Sem graça...
— Agora faça sua parte.
— Sim... sim. É claro, deus da guerra.
Azason se aproximou da barreira com o punho esquerdo fechado erguido em sua direção. Sussurrou algumas palavras e abriu os dedos da mão, emanando uma runa e fazendo uma abertura na barreira, por onde Kleist imediatamente passou.
— Cuidado com o Dedo deste andar — avisou o demônio. — Za'elronan é um grande titã.
— Isto é irrelevante. Não importa o tamanho do demônio, no fim sempre irá estar com a cabeça tocando o chão.
Azason gargalhou enquanto o Selo se distanciava.
Continua <3 :p