O Principado de Órion

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    Capítulo 26

    Atentado Consecutivo

    Álcool, Hentai, Heterossexualidade, Linguagem Imprópria, Nudez, Sexo, Violência

    Na estação de Eramar, o fluxo de pessoas àquela hora da tarde tornava o grande pátio movimentado. O trem para a cidade turística Oshibana chiava alto enquanto os passageiros embarcavam constantemente. Mais um apito soou, um dos três avisos para a partida, aumentando sua irritação.

    Ele devia tê-la buscado no lugar do gato.

    Natsu suspirava fundo, apertando os braços cruzados em tentativa de se controlar. O que a essa altura estava difícil. Lucy estava atrasada demais. Pelo grande relógio da estação já passava vinte minutos. Iam perder o trem. Caso ela não aparecer iria buscá-la, nem que arrastasse. Cinco minutos. Se a loirinha não chegar em cinco minutos iria atrás dela. Suspirando fundo procurou se controlar, no fundo sabia o que o deixava assim. Preocupação.

    As pessoas caminhando pelo pátio de pedra e os passageiros embarcando o fez mergulhar mais um pouco nessa cisma. Não era exatamente o atraso dela que o estava deixando nervoso. Tirando o olhos do relógio da estação, pensou nessa tarde. O que aquela curandeira irritadiça comentou o deixou preocupado.

    A loirinha não estava bem. E não era por causa dos machucados. Contra vontade reviveu uma cena e sacudiu a cabeça. Não, não deve ser isso. Ela estava bem. Só era o primeiro trabalho em campo que fez na vida. Então a loirinha estava bem. Os portões dourados. O contrato completo com o zodíaco. Era impressionante, mas... Dentro do normal. Lucy vai se recuperar e como nova dona das doze chaves de ouro nada melhor que a missão que escolheu. Contudo, mordeu o lábio.

    Droga. Seirei Mahou sempre foi um estilo de magia complicado pra ele.

    - Aquela anã... Se me fizer de idiota...

    O que?

    Franziu o cenho. Não, ele ouviu errado. Estreitou o olhar desconfiado e escorregou as costas discretamente esticando o pescoço ao espiar do outro lado da coluna de ferro. O que viu o fez arregalar os olhos, principalmente por se sentir um otário. O cabelo negro e selvagem notou de primeira, mas a surpresa aumentou ao ver o sujeito irritado vigiando o relógio enorme naquela torre. Igual à ele segundos atrás.

    - Nan...?

    O aperto em sua mão o parou, junto ao perfume de gardênia o envolvendo. Atordoado o som agudo do apito anasalado soou mais uma vez e aquela mão pequena o puxou para longe. Virou o rosto encontrando cabelos loiros balançarem na corrida, fazendo assim o cheiro cair como uma bruma nele. Já sabia que era ela, a mão delicada e o perfume de gardênia foram as dicas, mas mesmo assim... Desde quando a loirinha estava aqui?! E por que a correria? Pela palma que agarrava a sua, ela suava frio. Parecia que fugiam de alguma coisa.

    Lucy o arrastou correndo até a porta de embargue. O funcionário de uniforme azul real levantou a sobrancelha para o jeito agitado da garota. 

    - Passagens.

    - Aqui.

    Praticamente empurrou na mão estendida diante dela. Natsu fez o mesmo ao subir os degraus embarcando atrás.

    - Onde é que você estava nanica?!

    O grito assustou o grupo de pessoas que passavam por perto. Pestanejou, mas não se surpreendeu muito. Sorriu de canto. Ah... Agora fazia sentido. Encarou as costas tensas da garota em sua frente, mesmo com a mochila abarrotada dava pra notar. No vagão lotado a cacofonia girava em torno de uma mistura de conversas e a fornalha da locomotiva entrando em vapor. Lucy olhava ao redor procurando assentos, melhor dizendo um lugar para se esconder. Resolver aumentar o nervosismo dela. Parando no vão entre os assentos de estofados azuis e madeira puxou-a pela mão que ela segurava.

    - Oie.

    - Kyahhhh!

    Espantando-a, a garota estremeceu ao de encontro com ao seu peito. Isso atraiu atenção dos demais.

    - Por que a pressa?

    - Natsu, para com isso. Vamos logo.

    - Aqui está lotado. Responde loirinha, por que me deixou plantado até agora?

    Em pânico ela mirou a janela e seguiu o seu olhar, franzindo as sobrancelhas. Gajeel discutia com uma garota baixinha toda vestida de preto. A menina de cabelos azulados berrava de volta mais irritada. Leu os lábios dela por uns segundos achando mais graça.  

    "Bruto parvo"

    Gajeel se ferrou com a baixinha.

    - Natsu me solta, todo mundo tá olhando.

    - Hum... verdade.

    Nem reparou no que disse. Ainda observando pela janela viu o comedor de sucata e a amiga da loirinha seguirem para a porta de embargue. Bem, ele não queria se encontrar com Gajeel de jeito nenhum mesmo. 

    - Vamos.

    - Ei.

    Agarrando mais firme a mão dela foi puxando-a até a porta de madeira no fim do vagão, deslizando-a para o lado assim que ouviu as vozes de Gajeel e a baixinha. Droga. Puxou a loirinha para fora, batendo a porta e atravessou a passarela que conectava com o próximo vagão abrindo a porta deste. Numa olhava percebeu todos os assentos ocupados.

    - Saco.

    A maioria das pessoas olhou para eles assim que entraram e de mau humor notou algumas arregalarem os olhos. Puro espanto. Continuou atravessando ignorando os cochichos ao passarem.

    - Não pode ser.

    - É ele.

    - Kyahhh!

    Maldito jornalista. Gray assim que apareceu no dormitório hoje lhe atirou um bloco de papel colorido na cara, o chamando de revista e para seu desgosto a capa era sobre ele. Devia ter quebrado mais a cara daquele loiro naquele dia. Agora não poderia andar direito na rua sem que lhe apontassem.

    - Itai.

    Merda. Tinha apertado a mão de Lucy demais. Atrás de si notou a loirinha arfando desconfortável. Ela tinha razão, arrastava-a de qualquer jeito. Caramba. Ainda tinha visto Gajeel. Queria viajar sozinho com ela sem problemas. O comedor de sucata poderia soltar piadinhas e indiretas do passado. Viu o ar malicioso e debochado enquanto estavam ontem no bar. Isso além que o deixaria possesso faria a loirinha ficar mais estranha com ele.

    Percebeu isso ontem quando a visitou no dormitório das garotas.

    - Ei, Natsu mais devagar.

    Fechou a cara chegando ao fim desde vagão também. Ótimo, agora a garota se irritou.

    - O trem já vai partir e aqui está cheio também.

    - Eu sei, mas...

    Abriu mais uma daquelas portas de conexão, cruzando a passarela de aço. Olhando sobre o ombro viu a garota verificar atrás de si. Preocupada se os outros dois viriam. Logo abriu a porta entrando no terceiro vagão e sorriu aliviado. Primeira classe, cabines reservadas. Soltou a mão dela procurando por uma vazia, enquanto a loirinha vigiava a entrada.

    \\\\\\\\\\\\\\\\\

    O que será que deu nele?

    Natsu oscilava tanto de humor que não conseguia acompanhar. Quando o maquinista deu o terceiro aviso de partida, Levy e ela pensaram logo. Distração e rapidez. Quando o primeiro notasse a presença do outro, uma delas distraía o companheiro de viagem enquanto a outra tiraria correndo dali o seu. Infelizmente sobrou pra ela.

    Natsu quase chamou Gajeel quando o viu e ela mais que depressa correu até ele o puxando para longe. Sorte que Levy e ela haviam se aproximado deles antes que um desastre ocorresse bem ali. De início havia achado fácil demais ele lhe acompanhar, mas depois que embarcaram o mago a arrastou numa ansiedade vagão por vagão até entrarem aqui. Parada no meio do vão, Lucy se viu sozinha ao dar às costas para a porta de acesso.

    - Natsu?

    Silêncio. Aonde será que ele foi?

    Há um minuto estava bem aqui com ela. O trem deu um tranco, entrando em movimento enquanto saía da estação e foi caminhando, sentindo os tremores no piso de madeira encarpetada. As portas envernizadas das cabines davam um ar mais sofisticado, como as lâmpadas à óleo penduradas na parede em ambos os lados.

    - Tem certeza que é por aqui?

    Prendeu o fôlego. Olhou para trás em tempo de um casal entrar nesse vagão. Levy encarava um livro enquanto o exterminador de dragão fechava a porta. Entrou em pânico. Achou que ele fosse como Natsu, mas o mago estava normal, nem pálido. Droga. Assim que os olhos da amiga levantaram, um deslizar suave a sua direita a distraiu enquanto uma mão quente cobriu sua boca, puxando rápido para o lado. Quase gritou de susto e o sujeito a encostou na parede, fechando a porta da cabine.

    - Shssss

    O chiado a paralisou e levantou os olhos, encontrando outro divertido e convencido. Com o ar malicioso para ela, Natsu passou o ferrolho os trancando e deu um passo, se aproximando ainda mais dela. Estremeceu sem querer, seu coração martelando na garganta ao mesmo tempo em que ele tombava o rosto para o seu. Fechou os olhos, esperando e esquecendo de tudo. O calor era tão forte vindo dele, mas era como aqueles sonhos. Não iria se queimar.. Sem ar ficou tonta, esperando o momento quando ele retirasse a mão de sua boca, mas... Não aconteceu.

    Confusa, sentiu o encostar o rosto no seu. Demorou um tempinho para notar que Natsu esperava. Quieto e atento do casal que andava no corredor passar pela cabine deles.

    - Eu disse que não tinha lugares por aqui.

    - Já entendi. Você é muito séria, nanica.

    Um suspiro irritado seguido de gemido abafado de dor. Em sua orelha, escutou um sorriso. Natsu se divertia ouvindo conversa alheia enquanto que ela não sabia se ficava com raiva ou vergonha. Arrepios a varriam inteira com a respiração morna batendo em seu pescoço.

    - Meu nome é Levy. Por que não me chama assim?

    - Gehe.

    - Eu mereço.

    Quando as vozes ficaram mais abafadas, Natsu afastou o rosto do seu retirando a mão de sua boca. Ele segurava um sorriso. Aumentado pelo ar divertido ao lhe fitar. Suas bochechas ardiam tanto, e não era de vergonha. Não em grande parte. Tratou de fingir, mesmo sob olhar quente dele.

    - V..Você sabia.

    - Claro que sim.

    - Desde quando?

    Remexeu as mãos. Ele ainda continuava muito perto dela. Isso a fazia lembrar mais dos sonhos.

    - No instante que me arrastou pra cá.

    Estreitando o olhar, ele quase riu.

    - Você tá vermelha.

    - É o calor. Tá abafado aqui dentro.

    - Sei.

    A expressão dele só ficou mais convencida. Desviou o olhar. Calor? Natsu não era nenhum idiota. Se xingando sentiu a temperatura aumentar. Arfando voltou a encará-lo no instante que ele se debruçou nela, apoiando as mãos na parede prendendo-a no lugar. Seu coração acelerou, quente e nervoso. Sua pele parecia formigar, ansiosa e sabia bem do que. Queria que ele a tocasse. Seu rosto queimou mais e o olhar dele escureceu ao ver. Sem malicia, apenas... sedento. Seus joelhos amoleceram. Dessa vez se ele não for ela faria.

    Tombando o rosto na direção do seu, ela entrou numa especie de transe. Era igual ao sonho. Ele a encurralando contra parede, seus braços impedindo qualquer passagem. Estremeceu esperando o próximo passo, já erguendo as mãos para agarrar o colete. No entanto... De repente a respiração ofegante sumiu do seu rosto, até o calor a envolvendo. Atordoada tentou pega-lo as cegas encontrando nada. Frustrada virou no rosto no instante que ouviu um baque. Natsu jogava a mochila no chão agindo como.. como se não tivesse a ponto de agarra-la! Que ódio!

    Mago cretino, imbecil, convencido. Suspirou chateada. Grande idiota. Por que ele não agia como na viagem àquela vila? Isso era muito frustrante. Bem, ela era uma idiota também. Não tomava uma atitude.

    - Sonho idiota.

    - O que?

    - Não te interessa!

    Nem olhou para ele. Jogou a mochila também no chão, sentando no assento. Pra completar a ferida na sua perna ardia um pouco e sibilando pôs as pernas em cima das mochilas como apoio.

    - Ainda tá doendo?

    - Ahn?

    Sentando-se ao seu lado, Natsu ignorou seu espanto reparando em seus arranhões a vista. O olhar preocupado dele causou um calor reconfortante em seu peito, morno e calmante.

    - Só um pouco, mas o remédio já fez bastante efeito.

    - Que bom. Até chegarmos vai melhorar.

    Mal disse isso se afastou no banco, a confundindo até virar de costas para ela e deitar. Sem acreditar o assistiu se acomodar descansando a cabeça nas coxas dela. Deu um pulo de susto e Natsu  nem se importou. Apenas se ajeitou fechando os olhos ao suspirar.

    - M...mas o que tá fazendo?

    - Não é óbvio? Pegando seu colo emprestado.

    E a pergunta ainda pouco se sentia melhor?!

    - Natsu, ainda nem me recuperei direito. Além do mais...

    - Vou ficar aqui até chegarmos à cidade. Pode esquecer.

    Piscou espantada até estremecer de raiva. Uma hora irritado, outra sedutor e agora isso.

    - Você é muito folgado.

    Rindo leve, ele subiu uma perna pisando no banco. Travou os dentes se irritando ainda mais. Uma vontade enorme de empurrá-lo cresceu. Aumentando ao se lembrar que desejou isso na outra vez quando viajaram. Parecia que Natsu adivinhou pois resmungou sonolento. 

    - Se me jogar daqui - bocejou - eu escolho todas as missões daqui pra frente e pode esquecer a barganha.

    - Que barganha?

    Franziu a testa confusa e irritada.

    - Sobre te ajudar na magia das estrelas. Não me diga que esqueceu?

    Entreabriu os olhos, risonho ao ver seu choque. Parecia tão distante, mas então era aquilo? Achou que ele estava blefando naquele dia. A vontade de derrubá-lo apenas aumentou, no entanto, reprimiu num esforço enorme. Não era seria infantil. Ele estava só brincando. (preferiu acreditar)

    - Pode ficar.

    Encarou enfadada a paisagem pela janela. Todo escurecia num tom anil, a noite caindo. A cadeia montanhosa parecia agora distante. Em questão de minutos ficaria tudo escuro lá fora. O lacrima no teto de madeira acendeu nesse instante, iluminando aqui dentro. No silêncio momentâneo ouviu um quase riso e mirou para baixo. Natsu havia fechado os olhos, mas parecia tenso e... Frustrado? Isso a confundiu.

    - O que foi?

    Natsu quase riu outra vez.

    - Você não faz ideia.

    - Do que?

    - Do quanto me controlo por você.

    Abriu os olhos, fitando entre as mechas de um modo sereno e sério. Seu coração martelou com o impacto das palavras. Sem querer sua boca ficou seca e entreabriu os lábios arfando leve. Natsu direcionou o olhar para eles e estremeceu, seus olhos escuros daquele jeito e sentiu os lábios formigar. O olhar era negro e intenso. Parecia entorpecido, mas então ele soltou o ar mais frustrado fechando os olhos. A quebra do contato a desconcertou.

    - P...por que disse isso?

    Seu coração disparou mais ansioso pela resposta. Até esqueceu a frustração de antes. Natsu ficou uns segundos quieto até suspirar.

    - Conhece sobre Metsuryu no Mahou?

    - Um pouco.

    - Então entende que quando não faço certas coisas é por não estar acostumado. Posso exagerar, ficar sem controle.

    Seu corpo entrou numa onda de calor ao entender. Chocada lembrou de algumas coisas. Especialmente sobre ontem à noite. Ele havia dito que tinha bebido para sossegar algo. E aquela aproximação toda com ela, sem se aproveitar... Natsu não dormiu com outra como imaginou.

    Esse algo... Seria anseio, nesse sentido? E se for, então, o que aconteceria se Natsu perdesse o controle com ela?

    Sua imaginação fértil a deixou tão vermelha e afogueada que nem reparou nos risinhos debochados e abafados acima dela. Se fosse, teria visto o gato azul deitado no bagageiro acima segurando as risadas com as patinhas.

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    Depois de uma hora pararam numa estação remota. Ficava a beira da estrada de ferro e a paisagem ao redor só haviam campos e prados secos.  A única iluminação por perto era os lacrimas nos postes da estação. Lucy encarou o sujeito dormindo em seu colo. Natsu não teve uma crise desde que a viagem começou, no entanto... Ele tinha que ficar dormindo o tempo inteiro?

    - Lucy.

    O que? De onde veio essa voz?

    - Ei Lucy. Sei que está aí dentro.

    Piscou surpresa. Encarou a porta  no instante que deram três batidinhas. Não era possível. Espiou o mago sonolento em seu colo e depois a porta. Devagar, segurando a cabeça de Natsu escorregou para fora do assento e colocou com todo o cuidado de volta. Verificou se ainda estava dormindo, na respiração relaxada, mas nada diferente. O sono dele deve ser bem profundo. Suspirou menos tensa. Não sabia o por quê, mas preferia ir sozinha ver o que Levy queria.

    Tirando as pernas de cima das mochilas, se levantou do assento sem fazer barulho. Ao se afastar, uma mão agarrou seu pulso. Prendeu o fôlego de susto olhando sobre o ombro.  Como...? Não. Ele só sentiu falta do "travesseiro". Segurando a mão dele afrouxou o aperto, logo soltando seu pulso. Natsu deixou o braço cair resmungando alguma coisa. Parecia que disse "loirinha" e sorriu se sentindo toda boba.

    - Lucy, por favor.

    Pestanejou. Droga, tinha esquecido de Levy. Destrancou a porta, ficando tensa no ruído metálico ao puxar o ferrolho. Olhando sobre o ombro, viu o mago adormecido, então abriu a porta  numa fresta encontrando a baixinha mordendo a unha em nervosismo.

    A garota ao vê-la suspirou de alivio, afastando um passo.

    - Levy o que..? - sacudiu a cabeça sussurrando - Como sabe que estamos aqui?

    - Depois te explico. Precisamos conversar.

    Mordeu o lábio.

    - Pode ser rápido? Natsu...

    - Vamos logo.

    - Mas...

    Ela nem esperou. Agarrando sua mão, puxou-a da cabine para o corredor levando-a até o final do vagão abrindo uma porta. Entraram na área de desembarque. Muitos passageiros, principalmente burgueses e casal de idosos as olharam enviesados, atentos às suas roupas. Procurou ignorar, seguindo Levy que, para sua surpresa, arrastou-a para o terminal. No fluxo de desembarque nem viu direito ao redor. Apenas o vento noturno e as vozes das pessoas e condutores de diligencias.

    A baixinha a levou até o lugar mais distante da plataforma de pedra e de lá pôde reparar em volta. Realmente só havia campos. As sombras ao longe deviam ser as montanhas, mesmo assim... Estavam no meio do "nada".

    - Por que me trouxe aqui fora?

    - Lucy, temos um problema.

    - Como assim?

    Numa rajada de vento, segurou as pregas da saia rápido. Levy suspirou sem se importar com as mechas de cabelo no rosto. Foi só nesse instante que reparou o tamanho do nervosismo dela.

    - Gajeel sabe.

    - O..o que?

    Engoliu em seco e a amiga arfou tremula. Agitando as mãos no ar.

    - Gajeel sabe que Natsu e você estão aqui. Não me pergunte como, mas ele descobriu.

    - E o que ele pretende fazer?

    - Eu não sei. Aquele cara não me diz nada. Meu Deus, Lucy, ele parece um cão de guarda. Atento a tudo, encarando os outros. Os passageiros no vagão nem chegaram perto da gente. Um até foi corajoso o suficiente pra me pedir emprestado os ósculos, mas aquele bruto o espantou.

    Expirou com força desnorteada. O que será que aconteceu? O Dragon Slayer não só falou com o cara, não com esse ar desolado em Levy.

    - Caramba.

    - Você não sabe nem da metade.

    Suspirando, a baixinha olhou ao redor cansada, intrigando-a mais. Alias, desde que viu Gajeel na estação de Eramar estava curiosa sobre essa parceria deles.

    - Por que vão a Oshibana?

    - Nani?!

    A garota pestanejou. Só ficou mais desconfiada.

    - Levy...

    - Eu não posso te explicar.

    Franziu o cenho chateada.

    - Mas por quê?

    Mordendo o lábio, a azulada desviou o olhar em nervosismo.

    - É complicado.

    - Não mais que nós duas tentando evitar uma briga de magos, eu duvido - estreitou o olhar - Gajeel Redfox te obrigou?

    - Não!

    Levy a espantou. Agora não entendia mais nada.

    - Mas então...?

    - Olha, acontece que ele está com um problema e por acaso a única pessoa disponível na guilda que ele encontrou para ajudá-lo fui eu.

    Isso estava soando mais que a obrigou mesmo.

    - Mesmo assim ainda não entendo esse...

    - Ela já disse tudo, loira.

    Prenderam o fôlego, pulando de susto. De olhos arregalados, giraram no lugar encontrando a poucos metros delas o objeto da conversa. O terminal estava praticamente vazio àquela altura, a locomotiva soltando vapor e o vento cortava a noite com rajadas fortes. O rapaz vestido de preto e cinza parado à cinco metros delas intimidava só com o olhar. Ela engoliu em seco, vendo o Dragon Slayer caminhar até elas, o tinir de metal de suas botas a cada passo.

    Por que será que todo Matador de Dragão tem esse ar selvagem em sua volta, intimidante? Mal dava pra se acalmar.

    - Sabia que chamaria sua amiga, pequena.

    Levy acordou do choque.

    - Ei, já disse que meu nome é...

    - Levy, eu sei. Mas eu gosto de "pequena".

    A brincadeira não amenizou em nada o clima pesado. Em momento algum ele desviou o olhar sobre ela. A tensão só aumentou entre eles, deu pra sentir. 

    - Onde está Salamander?

    Piscou com a pergunta repentina.

    - N..na cabine. Dormindo.

    - Ótimo.

    Sorrindo debochado, ele inclinou o rosto. Era bem mais alto que ela e sem querer recuou um passo. Gajeel não deu mostras de se incomodar tampouco.

    - Diga para ele não se meter nos meus assuntos que farei o mesmo com os dele.

    Isso estava ficando cada vez mais sério e estranho.

    - M..mas vocês não são amigos? Por que então...?

    - Não me venha com essa, loira. - pulou de susto e o mago endireitou o rosto a olhando de cima -, e nem diga que ele não sabe sobre mim. Se eu senti o cheiro irritante dele, com toda certeza ele notou o meu.

    Quanta hostilidade! Agora entendeu o quanto Levy estava quieta, sem dizer uma única palavra. O stress da amiga tinha toda razão, mas mesmo assim era um absurdo.

    - Isso é ridiculo.

    O mago estreitou o olhar surpreso, mas ficou sério outra vez. Apenas a irritou.

    - Vocês são companheiros. Tanto na guilda como foi na guerra. Não tem motivo pra se tratarem como... Como se fossem...

    - Rivais?

    O meio sorriso a fez engasgar com o ar. Se aproximando um passo Gajeel a encarou profundamente ao sussurrar.

    - Salamander pelo visto não te contou nada ou praticamente alguma coisa daquela época. Nem do que fazia pela Bunny Girl original.

    - Gajeel!

    Levy o chamou indignada, mas ele nem deu ouvidos. Seu coração apertou e afundou vendo o vermelho debochado enquanto o Dragon Slayer segurava um sorriso.

    - Bem, isso não é da minha conta. De qualquer jeito, eu não quero ver a cara daquele...

    Segurou o fôlego, se calando e olhando o nada. A súbita mudança de expressão dele as confundiu até ele arquejar.

    - Pro chão!!!

    Se jogando nelas, o mago as derrubou um instante antes de um estouro reverberar no ar. Olhando de cima, ela viu uma rajada de fogo, atravessando uma janela do vagão até atingir um prédio do terminal, explodindo. Os gritos apavorados e os estouros cortaram a noite. Berrou apavorada, mal notando o sujeito em cima delas se levantar e as carregando para o fim da plataforma. Mal chegaram e outra explosão estourou em cadeia destruindo todos os vagões. As ondas de choque os jogaram para longe nos campos, os separando enquanto tudo brilhava num intenso clarão.

    Aterrizaram na grama, rolando até pararem. Atordoada pela queda, se ergueu tossindo da poeira e tremula encarando as chamas do trem e o terminal destruído. Mesmo nesse estado, dolorida e tonteada se endireitou cambaleante. O trem, os vagões. Tudo sendo engolindo pelas chamas incinerando quem estiver dentro deles. O desespero tomou conta dela.

    - NATSU!!!!!

    Ele ainda estava lá e Happy também. Viu o gato no bagageiro da cabine.

    - Fique exatamente onde está, loira.

    Piscando atônita olhou para pessoa, ou melhor, para o braço que lhe barrava o caminho. De tão nervosa nem percebeu  que corria e agarrava uma chave de sua pulseira. O objeto brilhava esquentando,

    - Ele está lá dentro!

    Tentou passar por ele, mas Gajeel lhe segurou pelo braço. Se estremeceu lagrimando de raiva. Pouco se importava na força ou que tipo de mago ele era. Esse idiota não ia lhe segurar. Reparando nisso, Gajeel estreitou o olhar, incrivelmente calmo.

    - Preste atenção. Um fogo ordinário desses não vai matá-lo.

    Arquejou espantada. Claro, ela... devia ter lembrado disso. A adrenalina se esvaiu num instante que nem mais sentia a chave brilhar. Havia pensado em usar Scorpio. A rajada de areia dispersaria as chamas. (Natsu havia dado para ela algumas chaves das nove, para se acostumar aos poucos)

    - Itai.

    Virou na direção da voz. Levy se erguia do chão cambaleando, uma mão segurando a testa. O remorso a abateu, tinha esquecido da amiga.

    - Levy...

    Foi até ela verificando o machucado. Um corte cortava perto da têmpora. Arfando, a baixinha se afastou.

    - Estou bem. O que foi isso?

    - Eu não sei.

    Olharam para longe, chocadas e tremulas. Foi quando notaram a postura estranha de Gajeel. Ele se mantinha diante delas, tenso e em defensiva. Será que... Olhou ao redor. A sensação de ser vigiada a amorteceu. Levy percebeu também, pois arquejou mais forte observando em volta.

    - Lucy... Esse acidente...

    - Aquele baka.

    Viraram os rostos para Gajeel bem no instante que  uma explosão estourou do trem. De um dos vagões, algo foi atirado voando de uma das janela sem vidraças e ia direto até onde estavam. Lucy arregalou os olhos ao ver melhor a forma na massa em chamas. A figura de uma pessoa girar no ar se endireitando. Caindo curvado na grama, Natsu se arrastou tentando frear, parando perto deles. As chamas envolta do seu corpo apagando. Ele ofegava e tossia, abraçando algo. Ao ver a cauda azul seu coração apertou e correu até eles.

    - Happy! Natsu, ele...?

    Ele negou com a cabeça.

    - Só desmaiou.

    Caiu de joelhos diante dele e sem dizer nada Natsu lhe entregou o gato azul. Estava coberto de fuligem como eles, embora mais forte como em Natsu. Ainda respirava e isso era que contava. Se levantando o Dragon Slayer deu a volta por ela encarando o trem e o terminal em chamas. Tão altas que iluminava tênue ali. No entanto, a expressão séria que viu nele a arrepiou.

    - É a segunda vez.

    Arregalou os olhos.

    - O que?

    A olhando por um momento ele voltou a encarar a destruição fatal.

    - É a segunda vez que explodem o trem onde estávamos.

    Ficou sem ar. Pela visão periférica viu Levy se espantar trêmula como ela e o outro exterminador de dragão se voltar estupefato para o "amigo".

    - Como foi que disse, idiota?!


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