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Toda alma com potencial para ser shinigami deve antes de tudo cursar a Academia de Artes Espirituais e aprender as quatro formas de combate que os shinigamis usam: Zanjutsu (habilidade com espada), Hakuda (luta), Hohou (movimentação) e Kidou (magia). O alistamento nos treze esquadrões vinha após a graduação. Contudo, se o aluno apresentar grande habilidade pode fazer parte da Brigada sem terminar o curso. Foi o que Karin descobriu com aquela notícia. Mas mesmo assim...
KARIN POV
- Deve haver um engano.
O Reitor empurrou os óculos sobre o nariz e cruzou as mãos na mesa.
- Não foi engano. O próprio Yamamoto Genryuusai deu essa ordem e o capitão Hitsugaya não fez objeções.
Hitsu... Toushirou!
Por algum motivo fiquei irritada e lembrei de ontem. Ele sequer foi cavalheiro comigo me deixando na porta de casa! Quando vi ao longe aquelas estátuas inconfundíveis, ele parou e me desceu dizendo:
- Muito bem. Agora preciso ir senão Matsumoto vai escapar de novo.
- Toushi...
Ele nem esperou. Sumiu me deixando para andar quase 1 km! Ontem eu tinha até tentado entender, mas agora... Com que audácia ele me escala no seu esquadrão sem ao menos me perguntar?!
- Kurosaki.
- Hein?
O Reitor me olhava incomodado por ter chamado minha atenção.
- Pode ir, está dispensada.
Agradeci e me levantei, guardando o papel na dobra da blusa. Na volta para sala eu nem percebia as coisas ao redor, subia os degraus da minha fileira até sentar na cadeira. A fofoca que havia morrido quando cheguei voltou maior ainda. Estavam esperando que fosse expulsa? Pensei com ironia ao apoiar meu queixo na mão.
- Hei, Kurosaki.
Olhei de canto para o rapaz ao meu lado. Ele era um pouco legal. Afinal de contas, era o único que falava comigo.
- O que foi, Sagashi?
- O que o Reitor queria falar com você?
Toda a sala ficou quieta. Podia jurar que várias cabeças se inclinaram na minha direção. Suspirando, disse num tom monótono.
- Fui aceita no Gotei 13.
Ele pulou da cadeira.
- O QUE?! COMO ASSIM TE ACEITARAM NO GOTEI?!
A sala inteira exclamou, quase morri de vergonha.
- Droga, Sagashi. Tinha que berrar assim?
- M..m.. mas como te aceitaram na Brigada? Só faz um mês que entrou na Academia!
- Eu não...
- É mesmo. Conta logo a verdade, pirralha!
Minha veia saltou. Virei para a loura que tinha ameaçado ontem e ela estava de pé, me dando um sorriso debochado.
- Eu já falei, barbie. E dobre sua língua na próxima vez que pensar em me chamar de "pirralha".
A encarei com um olhar de pura raiva e rapidinho perdeu a pose.
- Vem cá, é sério mesmo?
Olhei para Sagashi, parecia que tinha se acalmado.
- Sim. Ele me chamou para entregar isso.
Tirei o papel do quimono, o olhando confusa. Ele rápido pegou da minha mão, desdobrando e lendo ávido. Muita gente chegou perto para ver.
- Ohhhh! Caramba! Então vai ficar no esquadrão do Hitsugaya Taichou?
- Sim.
Todo mundo passou a me olhar admirado, fiquei surpresa com isso. Um cara que sentava na fileira debaixo se virou.
- Hitsugaya, você disse?
- Sim.
- Que sorte!
Ele se levantou rápido, apoiando as mãos na minha mesa. Me inclinei para trás de susto.
- Sabia que ele é um prodígio? Entrou na Brigada ainda criança e em menos de 20 anos virou Capitão!
- A zanpakutou dele não é a Hyourinmaru? Ouvi falar que é a mais poderosa que existe de gelo.
- Incrível! Ele...
Continuaram os comentários. Toushirou era tão famoso assim? Os rapazes até me esqueceram. Pedi o documento de volta e Sagashi me entregou logo voltando para conversa. O assunto? Os capitães. Olhei ao redor e flagrei aquela loura me encarando. Senti um involuntário frio na espinha. Era puro ódio o jeito como me olhava?
Acho que sim.
KARIN POF
HITSUGAYA POV
- Taichou?
Não levantei os olhos. Estava assinando um documento importante.
- O que foi, Matsumoto?
- Por que pediu que Karin-chan entrasse no esquadrão?
A encarei com essa pergunta. Matsumoto estava quase debruçada em cima de mim. Tirando o fato que já fui acertado vezes sem conta por aqueles seios, ela me olhava desconfiada. Não gostei disso.
- O que está querendo insinuar?
Ela se afastou olhando para o alto e gesticulando.
- Ah, nada demais. Só achei muito estranho o senhor fazer uma coisas dessas e ainda por cima entregar a ordem pessoalmente na Academia.
Suspirei deixando o documento de lado.
- Não tem nada de estranho na minha atitude e outra coisa. O fato que Kurosaki destruiu três adjuchas sem uma zanpakutou é bem impressionante. Tem que reconhecer.
Ela cruzou os braços pondo um dedo no queixo.
- É verdade. A reiraku dela não é nada mal.
- No nível de um sexto posto senão me engano. Também, sendo irmã de quem é nem me surpreendo.
Voltei aos documentos. Era dia de assinar a papelada e dessa vez, não tinha como Matsumoto me ajudar.
- Ah, taichou.
- O que foi?
- Não acha que Karin-chan ficou linda?
Errei o traço borrando a autorização. Fechando os olhos para controlar a raiva, encarei depois minha tenente que se assustou com meu olhar.
- Taichou?
- Que tipo de pergunta é essa, Matsumoto?
- Mas eu...
- Esqueça! Saia antes que acabe me atrapalhando.
- Capitão!
A olhei de novo e não discutiu mais. Sumiu do gabinete me deixando sozinho, mas não consegui me concentrar. Larguei o pincel e me reclinei na cadeira, lembrando.
De todas as maneiras que poderia encontrá-la, a vi caída naquele estado. Foi como daquela vez que joguei futebol no seu time. Só que ela não tinha o cabelo comprido e não estava ensopada. Sacudi a cabeça. Por que me apego ao fato que ela estava molhada e o quimono colava seu corpo por inteiro?
Esse último pensamento fez meu sangue esquentar e a sensação de carregá-la nas costas voltou. Que cheiro será que era aquele? Era bom e impregnava o ar em minha volta. Quando dei por mim, estava fantasiando sobre coisas que fariam o irmão dela me matar.
- Maldição, Matsumoto. Por que me perguntou aquilo?
Suspirei. Agora estou falando sozinho.
- Preciso de banho frio.
HITSUGAYA POF
KARIN POV
Ao chegar em casa, me deparei com uma surpresa. Tinha descido as escadas e ia direto para meu quarto quando, de repente, abriram a porta da sala e me abraçaram.
- Karin!
Me espantei. Empurrei a pessoa, a encarando sem acreditar.
- Ichi-nii?
Ele só me puxou de volta, me abraçando mais forte e me apertando contra seu peito. Sem querer um bolo obstruiu na minha garganta e devolvi o abraço, enterrando o rosto em seu quimono negro. Ele se curvou até sussurrar no meu ouvido.
- Sinto muito.
- Tudo bem.
Minha voz estava embargada, só ele mesmo para me fazer chorar.
- Certo, certo. Deixa a garota respirar. A baixinha mal chegou e você ataca ela desse jeito, Ichigo?
Ganju se aproximou, fazendo meu irmão se endireitar e encará-lo de mau humor.
- Ela é minha irmã, idiota. O que faço ou deixo de fazer não é da sua conta.
- Hei! Que tom é esse? É assim que trata o cara que deu um teto pra sua irmã?
Ichigo bufou.
- Deu um teto? Pelo o que entendi você 'tava era fugindo, animal!
- Como disse cabeça de girassol?!
- Isso mesmo que ouviu, piloto de porco!!!
- CHEGA!!!
Kuukaku gritou. Ela tinha se levantado e quando percebi, agarrou a gola de cada um pela mão e os atirou para o outro lado da sala! Ichi-nii e Ganju caíram estatelados no chão e gemeram doloridos.
- Itaiiii.
Kuukaku estava uma fera.
- Os dois são idiotas?
Se aproximou deles que rápido se sentaram e engoliram em seco. Até o Ichigo tem medo dela? Dessa eu não sabia.
- Você, moleque, fez a pobre da garota chorar! E quanto você, irmão inútil, não é assim que se trata as visitas!
- Mas é que...
Tentaram se explicar, mas ela não deixou.
- Calados! Ou vou por fogo em vocês!
- Sim, senhora.
Satisfeita, ela voltou para onde estava sentada e os dois se olharam torto. Kuukaku se voltou para eles e rápido disfarçaram, quase ri.
- Karin, por que não entra?
Ichi-nii me olhava super feliz, isso me fez bem.
- Depois. Só vou me trocar.
Ao me arrumar voltei para sala e dei a notícia chocante aos três. Cada um reagiu de um jeito diferente. Ichigo tinha um tique nervoso no olho, como se não tivesse entendido. Ganju conseguiu arregalar os olhos quase os saltando pra fora e Kuukaku soltou um grito. Ela se inclinou para frente sorrindo travessa, cheia de orgulho de mim.
- Eu sabia, garota. Seu potencial é grande como de um Shiba!
Ganju se virou para ela.
- Nee-chan!
- Quieto, estúpido. Devia seguir o exemplo dela.
Como se fosse possível, Ganju ficou mais chocado ainda. Nesse momento, Ichi-nii acordou.
- Espere um pouco, é sério? Vai mesmo entrar no Gotei?
- Sim, me entregaram hoje a ordem dada pelo próprio Comandante.
Ele assobiou impressionado. Que bom, pensei que teria um ataque. Coçando a cabeça, ele suspirou.
- Se é assim, tudo bem. Menos mal que caiu no esquadrão do Toushirou. Ele é legal, só é meio chato.
Nem me fale. Ainda não engoli a caminhada de 1 km. De repente, Ichi-nii se levantou.
- Bem, 'tou indo nessa. Tenho que me encontrar com a Rukia e o Renji.
- Mas já?
Ele sorriu para mim. De uns anos para cá fazia muito isso. Influência da Rukia, com certeza.
- De vez em quando venho te visitar. Tá, baixinha?
- Hei!
Bagunçou meu cabelo, detesto quando faz isso. Bati na sua mão afastando, fazendo ele rir.
- Até mais, Karin, Kuukaku-san.
Ao se despedir de Ganju, porém, estreitou os olhos.
- O que foi, girassol?
Ganju também tinha se levantado e cruzou os braços.
- Só vou falar uma vez. Fica longe da minha irmã.
Meu queixo caiu. Não acredito! A reação do Ganju foi igual à minha.
- Como é que é?
- Você ouviu, porco do mato.
O encarei. Ichi-nii estava mesmo falando sério.
- Peraí. Acha mesmo que vou mexer com a baixinha?
O olho de Ichi-nii tremeu.
- É a segunda vez que chama a Karin assim.
Agora o Ganju se irritou.
- De quê? De "baixinha"? É só um apelido carinhoso, otário! Vai bater em todo cara que chamar ela assim?!
- O que disse, maldito?!
Eu queria me enterrar. Kuukaku que até então escutava tudo quieta, quebrou seu cachimbo em puro stress. Viramos para ela, assustados. Ela exalava uma aura maligna e francamente, morri de medo.
- Omoe-ra...
Vi seu punho brilhando. Foi minha deixa. Saí correndo a tempo de ouvir ela berrar da sala.
- SÃO RETARDADOS, BAKAMONO?!!!
O cômodo explodiu com os dois imbecis gritando.
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No dia seguinte era quando devia me apresentar no esquadrão. Não vou mentir, senti um frio na barriga quando saí da Academia e seguia pelas ruas de Seireitei. No caminho, ia perguntando a direção para os shinigamis que me olhavam confusos por causa do uniforme. Mas não me importei. Antes assim do que perdida. De repente, dei de cara com um brutamontes que trombou comigo me jogando no chão. Caí sentada naquele piso duro.
- Olha o que temos aqui?
Levantei a cabeça, para meu azar o idiota não estava sozinho. Mais quatro feiosos de barba e cabelo ralo gargalhavam de mim.
- Hei, pirralha! Não errou de caminho, não?
Encarei esse grosseiro de sobrancelhas peludas. Minha vontade era de chutá-lo bem entre as pernas, mas me controlei. Me levantei do chão batendo a poeira da calça e fui passando por eles, ignorando.
- Hei, moleca! Espera!
Continuei meu caminho. Antes que me afastasse, porém, uma mão pesada segurou meu ombro direito.
- Não ouviu, pirralha?! Eu mandei você esperar.
O encarei fria, enquanto ele ria de mim junto com seus colegas.
- Me solta.
- O que?
Se fingindo de surdo apertou mais meu ombro à ponto de doer. O canalha queria me ver chorar. Com certeza deve ser daquele batalhão onde só tem gente estúpida.
- Me solta, babaca.
Ele me encarou surpreso pela ousadia e empurrou com mais força para baixo. Meus joelhos quase dobraram, mas continuei fria.
- Ou o quê? Vai me bater?
- Acertou.
Segurei sua mão pelo pulso e aumentei minha reiatsu, o espantando. Girei enganchando a perna no seu braço e puxei para baixo. O cara soltou um grito quando senti um estalo e me largou segurando o braço quebrado.
- Pirralha, maldita! Peguem ela!
Ah, merda! Saí correndo com os outros quatro atrás enfurecidos. Eles sacaram suas zanpakutous berrando o que fariam quando me pegassem. Ótimo, Karin! Simplesmente ótimo! A sorte foi que ainda não usaram o shunpo. Dobrei a uma esquina e ao ganhar distância, sumi aparecendo em outra rua mais movimentada. Andei rápido, tentando achar o caminho para o esquadrão quando ouvi um grito.
- Hei! Olha ela ali!
Girei e lá estavam eles. Corriam brandindo suas espadas fazendo os outros shinigamis reclamarem e abrirem caminho. Droga! Voltei a correr. Também o que eu queria? Meu uniforme vermelho-branco se destacava num mar de quimonos negros. Olhei para trás, checando se estavam perto quando bati de novo em alguém, só que dessa vez o cara me segurou antes de cair.
- Oe. Tudo bem, garota?
Levantei a cabeça. Espera, eu conheço ele. Cabelo vermelho, bandana roxa e tatuagens.
- Renji?
Ele arregalou os olhos surpreso e sorriu.
- Hei, você é a irmãzinha do Ichigo, não é? O que está fazendo por aqui?
Espiei sobre o ombro desesperada. Os caras estavam chegando perto.
- Algum problema?
Olhei para ele. Renji percebeu minha aflição e viu adiante os sujeitos que queriam me lixar, entendendo. Com uma expressão séria me colocou atrás de si. Suspirei de alivio quando os caras pararam derrapando.
- Abarai Fukutaichou!
- O que o 9º esquadrão quer por aqui?
Seu tom foi sério. Ah, me lembrei. Ele é um tenente, do sexto esquadrão acho. Espera um pouco. Renji disse "9º esquadrão"?
- Estamos perseguindo essa garota, senhor. Ela agrediu o Umesada-dono sem motivo.
Me encararam com ódio. Peraí, eles que provocaram. Renji me deu uma olhada e se virou para eles estalando a língua.
- Umesada? E cadê aquele inútil que não está com vocês?
Eles se mexeram constrangidos.
- Ele foi para o 4º esquadrão... Consertar o braço.
Renji ficou em silêncio por um momento e depois caiu na risada. Alguns shinigamis que pararam pra ver também riram, fazendo aqueles quatro corarem de vergonha.
- Estão dizendo que essa menina quebrou o braço dele?
Perguntou entre um riso e outro. O do meio olhou pros lados constrangido.
- Sim, senhor.
- Não acredito!
Depois de mais um acesso de risos, ele se controlou um pouco.
- Podem ir agora e esqueçam o que houve.
O cara achatada se revoltou.
- Abarai fukutaichou! Não podemos ir embora sem dar uma lição nessa cadela.
Arregalei os olhos.
- O que disse?
Uma pressão espiritual começou emanar de Renji causando um silêncio pesado na rua. Segurando a bainha da espada, ele inclinou a cabeça, olhando bem dentro dos olhos do cara que me chamou de cadela.
- Ela é irmã do meu amigo, idiota. Quer morrer?
Os quatro a essa altura estavam se borrando de medo. Quando Renji fez menção de sacar a zanpakutou eles saíram correndo gritando.
- GOMENNASAI!!!!!
A reiatsu dele voltou ao normal enquanto o bando de idiotas fugia. Suspirei mais calma e Renji ao se virar pra mim, me olhava de canto.
- O que foi?
- Quebrou mesmo o braço dele?
Virei a cara cruzando os braços.
- Não tive culpa. Aquele troglodita não queria me soltar.
Ele balançou a cabeça e começamos a andar, atraindo um pouco de atenção devido ao quase barraco.
- É irmã mesmo daquele cabelo laranja.
- Já disse que não foi culpa minha.
Ele riu e revirei os olhos.
- Tudo bem e o que faz por aqui? Não devia ir para casa dos Shiba?
Shiba? Ah, o Ichi-nii deve ter falado para ele.
- Hoje não. Preciso me apresentar no 10º esquadrão.
- É mesmo, você entrou no Gotei 13. Estava indo para lá quando se meteu em confusão?
- Eu não...
Me virei reclamando, mas ele só me olhou nada convencido. Credo, parecia meu irmão.
- 'Tá, foi. Mas agora não sei aonde ir.
- Eu te levo.
- Sério? Valeu.
Renji quis me dar uma carona para ir com o shunpo, mas recusei. Alguma hora tinha que aprender aquele troço e também não queria que outro me carregasse. É vergonhoso, mas passei duas noites seguidas sonhando com Toushirou me levando nas costas, mas no sonho ele me levava até em casa e antes que eu entrasse, me puxava para um beijo. Um beijo longo com gosto de hortelã.
- Chegamos.
Saí do devaneio. A nossa frente um grande portão duplo de madeira em vermelho estava aberto e no letreiro acima, o símbolo kanji de dez. Me despedi de Renji e fui entrando. Acho que os guardas não me barraram porque era esperada. Lá dentro tinha um conjunto de prédios de paredes brancas e telhas de barros, ladeados por passarelas de madeira lisa. Vários shinigamis passavam conversando ou correndo, com certeza atarefados. O que achei legal eram as áreas verdes. Nos espaços abertos entre os conjuntos estavam gramados com duas ou mais árvores e canteiros de flores.
Pulei da passarela indo até uma flor que achei bonita. Era grande e viçosa. Branca como um copo de leite. Seria uma orquídea?
- Está atrasada, Kurosaki.
Alguém disse às minhas costas. Dei um pulo, girando com a mão no peito.
Toushirou estava à alguns passos, de braços cruzados e me encarando sério. Pelo seu olhar fazia tempo que me esperava. Ai...
- Que susto, Toushirou!
- É Hitsugaya taichou, agora. Por que demorou tanto?
Caramba, ele estava mesmo irritado.
- Vim o mais rápido que pude, mas me meti em confusão e se não fosse por...
Calei a boca. Falei demais, falei demais. Ele franziu as sobrancelhas.
- Confusão? Está dizendo que se envolveu numa briga?
Ainda bem que estava anoitecendo, senão ele notaria meu rosto vermelho de vergonha.
- Não foi bem assim.
- Uma briga é uma briga, Kurosaki. Mas vamos deixar isso de lado, venha comigo.
Se virou andando até um caminho de cimento e o segui quieta. O humor dele oscila tanto assim? Enquanto passávamos, os subordinados dele o cumprimentavam e nem me encaravam pelas minhas roupas. Acho que sabiam de mim.
- Já tem uma zanpakutou?
- Hein?
Toushirou me olhou sobre o ombro.
- Sua espada. Já tem uma?
- Ah, não.
Se voltou para frente. Ele deve tá pensando que sou uma idiota, droga.
- Tudo bem, vou providenciar uma. Quanto ao seu uniforme, Matsumoto vai arranjar um para você.
- Falando nisso, cadê ela?
Olhei em volta procurando. Ao entramos num prédio e no hall, novamente se curvaram cumprimentando Toushirou. Ele suspirou.
- É o que eu gostaria de saber.
Segurei um riso. Já tinha percebido a disposição dela em trabalhar no escritório.
- Hein, Toush... - ele me olhou, rápido corrigi - Hitsugaya taichou, para onde está me levando?
- Logo vai saber.
Continuou andando. Poxa, não custa nada falar. De repente, ele parou em frente à uma porta. Abriu e esperou que eu entrasse. Quando cruzei o beiral, ele entrou e fechou a porta, indo direto até o outro lado do cômodo. Aqui era muito parecido com a sala de treinamento da Kuukaku. Tinha almofadas num canto e mostruários embutidos com espadas de madeiras. Ainda não entendi por que ele me trouxe aqui.
- Hã... Taichou.
Me virei pra ele e prendi o fôlego.
Toushirou tinha se livrado da zanpakutou, do cachecol e do haori. Agora estava tirando a parte de cima do seu quimono negro.
O que ele tá fazendo?! Não. Por que ele tá fazendo isso?!
Comecei a ofegar entrando sem querer em pânico. Quando pensei que ia tirar mais uma peça de roupa ele se virou. A blusa branca mostrava um pouco do seu peito e bom, engoli em seco com a visão.
- Oe.
Ele me jogou uma coisa. Segurei no susto e vi que era uma katana de madeira.
- Pra que isso?
Olhei para ele. Estava segurando uma também e andava até mim. Tentei ao máximo não encarar sua blusa meio aberta.
- Quando fui até Academia pedi que me mostrassem seu histórico nas quatro formas de combate.
Ah, então era ele o Capitão que foi lá outro dia? Nem tinha me tocado.
- E...?
- E que era como eu imaginava. Em Kidou e Hakuda suas notas são excelentes, mas em Hohou e Zanjutsu é bem fraca, Kurosaki.
Parou apoiando a espada no ombro. Eu inflei de raiva. Que tom era aquele? Arrogante! Ainda mais quando levantava a sobrancelha daquele jeito. Então, estreitou os olhos.
- Você não sabe usar direito o shunpo.
Não estava perguntando e sim, afirmando. Argh! Queria arrancar aquele sorrisinho sem dentes com essa espada! No entanto...
- Sim, senhor.
Falei num sopro controlando a raiva. Ele é meu capitão agora, devo respeito.
- Dominar essas técnicas é essencial para o shinigami. Isso evita que fique indefeso numa batalha.
- Eu sei!
Ele quase riu. Sério, essa explicação tava me dando nos nervos.
- Já que entende, agora vou te testar um pouco na habilidade com espada.
Ficou sério e virou um pouco de lado, as pernas meio afastadas e segurando a katana de madeira nas mãos rente ao rosto. Senti um frio na barriga.
- Espera, v.. v.. você tá brincando, não tá?
- Claro que não. Em posição, Kurosaki. Senão vou te atacar assim mesmo.
Tirei a mochila jogando-a no canto e segurei a espada como o professor ensinou. Um pé a frente, outro de apoio e os punhos abaixados com a katana levantada. Tentei me concentrar, só prestando atenção na respiração, então ele se mexeu. Um instante estava parado e no outro girava a espada à dois passos de mim! Ia me acertar nas costelas! Bloqueei o golpe e ataquei, mas ele rebateu. Que força! Meu ombro que aquele brutamontes apertou doeu.
Dei uns passos para trás e Toushirou foi pra cima de mim. Balançou a espada para direita, esquerda, acima e abaixo. Eu só bloqueava sem conseguir contra atacar. A essa altura, atravessamos a sala e minhas costas iam bater na parede, me encurralando. Fugi para direita e rápido ele girou, torcendo o punho fazendo a espada descer e subir, indo direito para minha garganta. Dei um chute na sua perna direita fazendo ele cair, mas se recuperou rápido e apoiou a mão livre no chão me dando uma rasteira.
Caí estatelada largando a espada. Ainda atordoada senti de leve a ponta de madeira roçar meu pescoço e arregalei os olhos. Toushirou estava em cima de mim, apoiado num joelho, me apontando a espada.
- Numa luta séria, estaria morta.
Disse um pouco ofegante. E eu não sei? Meu coração batia seco na garganta, assustado. Tão assustado que nem me importei que a blusa dele estava totalmente aberta agora e seu cabelo desalinhado. Eu teria ficado como um tomate, mas estava pálida feito cera. Por que pra mim foi real até demais?
Toushirou piscou confuso porque continuei muda e se levantou. Tirando a espada do meu pescoço e me oferecendo a mão. Agarrei sem dizer nada.
- Daijubou-ka?
- Hã? Claro.
Levantei e meu ombro pulsou de dor pelo movimento.
- Itaiiii.
- O que foi?
- Ah, nada.
Fui andando para pegar minha bolsa, mas ele me parou aparecendo em minha frente.
- Kurosaki. Se machucou, não foi?
- Não é nada, Toush... - revirei os olhos - Capitão, estou bem.
Passei por ele, o que só o deixou irritado.
- Oe?
Segurou meu ombro dolorido e gemi, me encolhendo. Ele franziu a testa.
- Matte.
Antes que eu protestasse, afastou meu cabelo e puxou a gola da minha blusa, alargando. Com meu ombro exposto, o espiei de canto e tinha os olhos arregalados. Não precisei ver, sabia do hematoma gigante que aquele imbecil me deixou.
- Quem fez isso?
- Eu sei lá.
Ele me encarou com raiva.
- Kurosaki!
- 'Tou falando sério, eu nem conheço o cara. Agora com certeza ele não vai se esquecer de mim.
- Por que?
- Quebrei o braço dele.
Ele levantou as sobrancelhas surpreso e depois deu um risinho. Isso foi novidade pra mim. Eu nunca tinha ouvido o Toushirou rir.
- Fique quieta.
- O o que vai fazer?
Não me respondeu. Vi um brilho claro e girei o pescoço um pouco. Toushirou estava curando meu machucado com kidou. Sua mão segurava meu braço enquanto que a outra, curava aos poucos meu ombro. Lentamente, a dor foi sumindo até desaparecer.
- Pronto. Melhor, não?
Ajeitei a blusa, girando o braço pra lá e cá. Me virei e sorri.
- Incrível. Obrigada, Toushirou.
Ele, que até estava sereno, fechou a cara.
- É Hitsugaya taichou, Kurosaki.
Revirei os olhos pegando a mochila.
- Tá, tá. Que seja. Amanhã, venho que horas?
- À tarde. Já conversei com o Reitor.
- Sério? Que bom. Até amanhã, taichou.
Saí correndo, deixando ele lá. Não sei porque, mas estava super feliz. No portão, um guarda me esperava dizendo que foi designado para me levar em casa e fiquei mais contente, risonha até. Quando cheguei em casa Kuukaku me esperava acabando com minha alegria, mas ela só me avisou que tinha guardado um pouco do jantar e foi dormir.
Suspirei aliviada e fui direto para meu quarto. Ao deitar no futon, pensei no gesto do Toushirou, preocupado comigo, mas logo adormeci. E foi quando tive aquele sonho pela primeira vez.
KARIN POF