Jóia Rara

Tempo estimado de leitura: 16 horas

    18
    Capítulos:

    Capítulo 30

    Holofotes

    Álcool, Hentai, Linguagem Imprópria, Sexo, Suicídio, Violência

    Tenten

    Ele ficou me olhando por alguns segundos antes de abrir um sorriso torto e beber de seu copo. O quente da bebida ainda descia arranhando minha garganta e eu não tinha certeza se me arrependeria disso depois. Mas que o fosse, afinal ele havia dado todas as brechas de que estava interessado, não? Espera... esse pensamento definitivamente era icônico. Quando eu havia me visto num paradoxo entre as coisas que eu queria e o que os outros iram pensar?

    Balancei a cabeça, sorrindo. Esse tal de Neji poderia ser tudo de bom, mas não ia me desestabilizar. Eu era mais forte do que uma simples atraçãozinha. Certo?

    — Então você é do tipo desafiadora, hm?

    Eu soltei um risinho, tentando fazer charme.

    — É necessário. Eu fico entediada fácil – respondi. Neji apontou para o meu copo.

    — Movido à álcool ou esse caráter desafiador é puramente instintivo? – ele inquiriu com os olhos semicerrados e um sorriso brincalhão. Meu deus, que cara lindo.

    — Honestamente, eu nem sei o que estou bebendo. Eu estava com sede. 

    O tom ambíguo da minha frase alargou o sorriso dele, bem como a minha tentativa em fazer parecer que aquilo tudo não tinha absolutamente nada a ver com o líquido marrom em meu copo.

    — É um Bulleit Bourbon. 45% de teor alcoólico, produzido com água filtrada em calcário e deixado em descanso em barris de carvalho. Não desenhe o probrezinho, Tenten. – ele respondeu, aproveitando para tomar o tal whisky de nome chique. Eu revirei os olhos, mas sorri.

    — Então quer dizer que você é do tipo inteligente, hm? – eu imitei seu tom de voz. Neji deu uma risada verdadeira e me olhou com diversão.

    — Prefiro me considerar curioso.

    — E sobre o que você é curioso, Neji?

    Sem perceber, eu havia me inclinado sobre ele. Nossos rostos ficaram subitamente próximos e eu pude sentir o hálito quente e alcoolizado dele soprar em meus lábios.

    — Agora, sobre você.

    Oh-ou. Ok, ele havia me acertado em cheio. Sorri calorosamente, mas me afastei. Ele não ia conseguir me conquistar só com esse papinho de bêbado gourmet. Embora o conjunto todo fosse muito atrativo. Eu tinha minhas virtudes, vai! Além disso, eu não era muito do tipo de brincar por uma noite, por mais que achasse isso a coisa mais normal do mundo. A questão era... bom, eu era vaidosa. E nesse quesito, confesso que era a minha praia o tal do “ligar no dia seguinte”.  

    — Vai precisar de mais para me conquistar, Hyuuga. – arrisquei jogar, vendo o rosto dele se iluminar com seu sorriso branco. Ele me lançou um olhar caloroso, sem perder o charme de seu riso.

    — Você é uma mulher difícil. – ele observou, mas não havia uma nota de lamentação em sua voz. Eu terminei de tomar meu Bulleit não sei mais o quê e desci da banqueta, encarando-o com presunção.

    — Na verdade, Neji, difícil mesmo é viver uma vida sem desafios.

    Com essa, eu saí. Tirei meu time de campo. Andei para a pista de dança, fazendo questão de soar convidativa, mesmo sem olhar para trás. Afinal, como dizem as boas garotas, depois de uma frase de efeito, nada melhor do que uma saída cinematográfica.

    ***

    Hinata

    Eu estava exausta. Meus pés já não respondiam como deveriam e só o que eu podia dizer sobre eles era que havia extrapolado o limite, dançando com um insaciável Naruto. Apesar de o show na boate ter sido relativamente cedo e de não termos chegado tão tarde, eu já estava lamentando o cansaço iminente no dia seguinte. Por isso, nós fomos imediatamente para o quarto, embora estivesse fadada a invejar a praticidade de meu melhor amigo, uma vez que não seria ele quem passaria minutos em frente ao espelho removendo maquiagem com lenços umedecidos.

    Esse lado da vida vaidosa feminina era um que eu não gostava muito.

    — Então, você notou o entrosamento do seu primo com a Tenten? – Naruto me assustou ao aparecer na porta de seu banheiro, já de pijama. Ele riu da minha cara quando levantei a cabeça, exibindo o borrão preto que meus olhos haviam se tornado.

    — Eles não se desgrudaram durante a festa toda. – eu respondi e finalmente consegui me livrar de toda aquela maquiagem. — Mas ela foi firme, os dois não saíram da conversa.

    Naruto ergueu as sobrancelhas, sorrindo.

    — Te ver falando assim é engraçado, sabia?

    Eu lhe encarei confusa e me afastei para pegar um pijama em minha mala.

    — Por quê? – eu lancei a pergunta antes de entrar no banheiro de novo e fechar a porta, a fim de me trocar. Ouvi a risada dele do outro lado e depois seus passos se afastando. Quando voltei ao quarto, ele já estava deitado sobre o colchão no chão, ao lado de sua cama, com os braços atrás da cabeça e uma expressão risonha.

    — Porque antes você não se importava muito com o que acontecia na vida das outras pessoas e agora você até está aí alimentando fofoca comigo. – zombou. Eu corei e joguei o vestido em seu rosto.

    — Idiota! Não estamos... fofocando. Eu só... ah, você sabe, Naruto, para de me deixar constrangida.

    Ele gargalhou contido para não fazer tanto barulho e pegou o vestido nas mãos, descaradamente cheirando-o. Eu fiz uma careta de vergonha e me sentei na cama, abraçando os joelhos.

    — Estou só brincando, boba. – ele disse, enquanto dobrava a roupa e colocava em cima do criado-mudo. — Ei, você fica bem vestida assim, sabia? Combina com sua personalidade.

    Eu arqueei as sobrancelhas, sem entender onde exatamente aquela “outra Hinata” que Sakura construíra poderia combinar mais comigo.

    — Ah, combina?

    Naruto riu, talvez pela hesitação no tom da minha voz.

    — É bem isso aí que você ouviu. – ele respondeu, me puxando para baixo para que eu me sentasse perto dele. — Você pode pensar que é tímida, sem graça ou qualquer coisa descabida, mas na verdade você tem um brilho único. Todo mundo pode ver o quanto você é uma mulher forte, que tem clareza quanto aos próprios interesses e que não precisa nem se esforçar para ser linda desse jeito.

    Eu balancei a cabeça ante aqueles absurdos, mas ele continuou:

    — Você acha que seu passado é um defeito, que as coisas que pensava e almejava antes eram apenas coisas ruins. Mas você persistiu nisso, com muita garra, aguentou firme todas as consequências, não foi? Pois bem, isso significa que você é determinada. E transparece em sua aparência, no seu olhar cheio de mistério e intensidade.

    Ele me trouxe para perto de si e eu me sentei entre suas pernas, apoiando as costas em seu peito. Suspirei, incrédula daquela realidade. Era contraditório, porque minha vida havia virado de cabeça para baixo, mas quando eu estava com Naruto, parecia na verdade que tudo fora colocado nos eixos. E ele era tão maravilhoso... tão generoso... como eu podia me impedir de ser contagiada por sua essência? Isso era impossível, e óbvio, afinal eu já sabia disso desde nossa primeira conversa, apenas estava entorpecida demais para admitir.

    Mas apesar da doçura de suas palavras, resolvi mudar de assunto, uma vez que eu preferia lidar com o aconchego de seus braços do que com questões que ainda me dividiam. Além de que, ao sentar-me com ele, senti a dureza do colchão no qual dormiria e inevitavelmente lamentei estar roubando-lhe o conforto de sua cama.

    — Sinto muito que tenha de dormir no chão... eu posso trocar com você, se quiser. – murmurei. Ele riu baixinho e me apertou mais em seu abraço.

    — É melhor do que o sofá, eu garanto. Eu não cabia direito por lá.

    — Mas não é melhor que a cama. – insisti. Naruto inspirou o ar em meu pescoço, escondendo o rosto em meus cabelos.

    — Na cama não cabe nós dois e eu jamais deixaria minha namorada dormir no chão. Eu já dormi em lugares piores, viajando com o Jiraiya, quando era mais novo. Está tudo bem.

    Resolvi deixar para lá. Ele não iria mudar de ideia, conhecia muito bem aquela cabecinha loira e teimosa. Em vez disso, resolvi me concentrar nos acontecimentos daquele dia, rebobinando cada parte em minha mente. A chegada de Neji representava muita coisa naquele atual momento, uma vez que, há pouco tempo atrás, eu havia embarcado para o Canadá pensando em tentar encontrar alguma área profissional de interesse para pode ludibriar Hiashi, mas voltara do Ocidente namorando, descobrira que toda aquela excursão não passara de um plano forjado especialmente para me livrar de meu suposto pai e que em breve eu iria morar com um primo desconhecido.

    Foi um pouco mais de uma semana. Tudo o que o destino precisava para causar essa revira volta. Em apenas alguns dias todas as verdades existentes na minha vida caíram por terra e agora eu buscava refúgio no abraço apertado e nos beijos molhados daquele que eu anteriormente nem julgava ser merecedora de ter como amigo.

    Era estranho, porque esses dias não apenas mudaram o curso da minha vida, como mudaram também minha visão dela, do mundo, de tudo. E agora a rotina continuaria, eu e os outros retornaríamos à escola e tudo continuaria a ser como era antes. Exceto que para mim nada estaria nos seus devidos conformes antigos e arranjados. Mas como eu chegaria no colégio outra vez, agora que não era mais a mesma pessoa dentro deste corpo? Como tudo seria agora que já não tinha mais a mesma história?

    Suspirei. Pensar sobre isso interferia diretamente em minha relação com Naruto. Afinal, apesar do seu vasto grupo de amigos que se mostravam felizes por nós, ainda havia outras pessoas não muito amistosas quanto a isso. Pessoas influentes em nossas vidas de forma direta.

    Shion e Mayumi.

    O nome da ex dele me provocava reações ainda estranhas e desconhecidas. Que Naruto havia intitulado graciosamente como “ciúme”, mas que eu subentendia muito mais para o lado auto preservativo real de vida do que qualquer outra coisa. Não que perdê-lo no âmbito romântico não fosse despedaçar parte praticamente integral da minha vida, mas eu me referia à um risco elevado, planejado a sague frio por interesses de Hiashi, que claramente poderia manipular sua filha caçula e esta igualmente buscar apoio em alguém cuja ambição seria o meu término com Naruto.

    — Você está tensa. O que foi? – Naruto me assustou, arrancando-me subitamente dos pensamentos. E mal havia percebido o quanto retraíra os músculos divagando sobre aquilo. Tentei relaxar em seu abraço, mas ele prontamente se ajeitou e me virou para que pudesse obter visão total de minhas feições.  — Ei, me conta, vai?

    Sua expressão carinhosa me fez sorrir um pouco, embora o medo não abandonasse meus olhos.

    — Voltar à rotina vai ser estranho. Não sei... exatamente... como agir.

    Naruto suspirou e acariciou meu rosto.

    — Não precisa se sentir forçada a mudar seu jeito, minha baixinha. Aliás, eu até achei que isso estivesse se tornando natural para você. Tem algo especificamente errado?

    — Nem todas as pessoas naquele colégio vão gostar de ver que você está comigo.

    Ele sorriu, balançando a cabeça e me deu um breve selinho.

    — Ninguém pode me separar de você, Hinata, só você mesma. E eu não me importo com que os outros vão pensar. – ele respondeu com convicção e eu corei, porque na verdade esse não era bem o ponto. Embora o que ele tenha dito me causava um certo temor, com “só você mesma”. De outro ponto de vista, apenas a minha existência poderia implicar em outros tipos de separação, que iam muito além de um término causado por mim, na falta de uma reciprocidade. E era exatamente com esses outros tipos que eu me preocupava.

    — Tem outra coisa que pode nos separar.

    — Tipo o quê?

    — Tipo a morte.

    Minha resposta o fez rir e eu percebi que ele não estava entendendo o meu ponto. Ou talvez estivesse tentando não entender.

    — Bom, sim, naturalmente. Mas eu estava planejando dizer isso quando te pedisse em casamento.

    Seu tom brincalhão me fez sorrir involuntariamente. E eu enrubesci ante a menção de nos casarmos, mais uma vez. Ele parecia realmente convicto de que esse dia chegaria, como se nada no mundo fosse capaz de desmanchar esses planos. Porém, eu era capaz de entender, não especificamente o motivo de ele querer se casar comigo, mas o porquê de ele não sofrer por algum suposto efeito dominó que nosso namoro poderia causar. Afinal, não era ele quem impunha risco de vida para alguém simplesmente por ter nascido.

    — Vamos dormir – eu resolvi deixar o assunto por ora, tentando não estragar seu sorriso com minhas divagações pessimistas. Embora eu sentisse um fogo ardendo dentro de mim a cada vez que chegava mais perto de conclusões como aquela, eu achava melhor não exteriorizar a todo momento para ele.

    Naruto fora aquele que havia lutado por mim até ali e que seguia lutando há cada segundo para continuar me protegendo, cuidando e amando. E o fato era que eu o amava também, mais que a minha própria vida, então apesar de estar amedrontada com tudo o que estava por vir, eu podia deitar minha cabeça tranquila no travesseiro quanto à única convicção boa e irrevogável: eu lutaria até o fim por ele também.

    ***

    Eu senti a atmosfera mudar assim que ele abrira a porta do carro para mim.

    Todo mundo olhava.

    E quando eu dizia todo o mundo, eu me referia exatamente a toda as pessoas presentes naquela instituição. Incluindo funcionários.

    Não era bem o que eu esperava quando imaginava algumas pessoas avessas ao nosso relacionamento, porque eu não havia contabilizado àquelas que ficariam curiosas. E de repente, eu estava sob um interminável holofote apenas por ter posto as pernas para fora do Altima e ter aceitado de suas mãos a minha simples mochila.

    — Hinata, vamos? – Naruto me descongelou de minha posição encolhida e eu segurei a mão que ele oferecia, envergonhada. Respirei fundo uma vez, e depois mais uma. Não importava o quanto adentrássemos o campus do colégio, as pessoas nos acompanhavam olhando. E, inesperadamente, quando aquele vasto estacionamento se tornou num corredor apertado, eu me senti irritada com tanta atenção.

    — Por que estão encarando a gente desse jeito? – cochichei e ele acariciou a parte interna de minha mão com o polegar, soltado um breve suspiro.

    — Culpa minha. Me perdoe. – sussurrou de volta. Eu lhe encarei confusa e ele sorriu de canto. — As pessoas não estavam acostumadas a me ver com uma garota... assim. Desde que... bom, desde que eu terminei o meu último relacionamento.

    Ele parecia a contragosto por conversar aquilo comigo. Mas eu ainda estava apegada ao porquê de as pessoas estarem tão vidradas nisso. Não conseguia assimilar simplesmente ao motivo de que ele era popular, ou sei lá o que toda aquela multidão o nomeava. Eu nunca havia concordado com todo aquele endeusamento superficial, porque o conhecia e sabia que ele era muito mais do que um homem bonito. E presenciar aquilo na pele me despertara um incômodo nauseante.

    — Não se preocupe, ignore isso, amor. Já vai acabar. – ele murmurou próximo ao meu ouvido. Suspirei e assenti, não tinha como negar nada a ele quando me chamava daquele jeito. Embora fingir que aquilo não estava acontecendo fosse quase impossível.

    Quando chegamos à sala de aula, eu pude minimamente relaxar. Pois todas aquelas pessoas já tinham conhecimento de que estávamos juntos, pelo o que eu podia imaginar. Embora houvessem alguns olhares que não me faziam menos desgostosa. Olhos que, incrivelmente, não eram só femininos.

    — Bom dia, casal! – disse Ino, assim que entrou. Eu quis me encolher, pois seu cumprimento alto demais havia despertado alguns murmurinhos ao redor da sala. Ela se sentou em minha mesa e imediatamente se inclinou para mais perto.

    — Amiga, o que foi aquele teu primo na festa? – cochichou de modo sapeca. Eu ri baixinho, sentindo-me estranha como se cada movimento meu estivesse sendo monitorado. Bom, estava.

    — Acho que ele gostou da Tenten, mesmo. Mas não conheço ele para dizer que tipo de pessoa ele é. Ao menos por enquanto. – respondi num tom mais baixo ainda. Ino mordeu o lábio inferior.

    — Deve ser estranho ir morar com alguém assim, de repente.

    Eu assenti, não muito entusiasmada para começar aquele assunto de novo. Mas por ora havia escapado, e ficara aliviada no começo, se não fosse imediatamente direcionada ao poço da vergonha, quando o expansivo professor Gai entrou na sala e disparou, sem nem perceber, a sentença que me levou aos braços do desespero:

    — E ai, Naruto, quando é que vão marcar o casório?

    O intervalo não fora menos inquietante, ainda que eu mantivesse esperança de que toda a surpresa já havia acabado. Mas não, lá estavam todos os pares de olhos cravados em minhas costas. Enquanto isso, Naruto não parecia notar aquela atenção demasiada e passei a me perguntar se deveria mesmo fingir que estava tudo perfeitamente bem. Era surreal, porém talvez isso desencadeasse a perda de interesse das pessoas ao longo do dia.

    Ele me puxou pela mão, engatado numa conversa com Gaara, até a fila do buffet e, num movimento natural, me deixou à sua frente, com uma mão repousando tranquila em minha cintura. E eu só pude suspirar e me deixar levar, sem tem muita alternativa quanto aos olhares insistentes e meu incômodo ainda mais crescente. Pensava ser apenas uma fase, apesar disso, porque embora eu não fosse o tipo de pessoa que concordasse com tamanha adulação, podia compreender que o mundo a qual Naruto pertencia tinha esse tipo de glamour infundado. Mas era justamente por não compartilhar esse mundo que não conseguia me acostumar, muito menos compactuar com a naturalidade do fato.

    E o que aconteceu no momento seguinte só confirmou isso.

    — Ei! – um garoto moreno chamou, voltando da fila com sua bandeja pronta. Ao seu lado, duas garotas traziam suas bandejas cheias, com os olhos vidrados em minha direção. Demorei um minuto para assimilar que eles estavam realmente querendo falar comigo.  — Hinata, não é?

    Eu só pude assentir, embasbacada. Nunca havia visto aquelas pessoas antes e tinha certeza de que não pertenciam à nossa turma.

    — Então, a gente vai dar uma festa esse fim de semana. Você devia vir! – a menina ao lado dele exclamou com entusiasmo. Eu pisquei, atônita, e num movimento mecânico olhei para trás, buscando encontrar Naruto.

    Ele e Gaara mudaram o rumo da atenção para aquela abordagem, o ruivo com um sorriso presunçoso e Naruto cheio de marcas de expressão no meio da testa.

    — Você também, Uzumaki, é claro. – o garoto se adiantou, um pouco nervoso. Ele suspirou atrás de mim e sorriu com o canto dos lábios.

    — Obrigado por convidar, Koji. Mais tarde eu confirmo se nós dois vamos. – Naruto respondeu amigavelmente, mas eu notei como sua frase determinava que eu só iria se ele também fosse – e vice-versa. Os três saíram dali aos cochichos e então imediatamente eu ouvi a risada de Gaara soar.

    — Como diz o ditado: o produto só fica interessante depois da divulgação.

    Seu comentário fez Naruto bufar e eu não conseguir entender. Talvez aquilo era algum tipo de piada interna entre eles. Suspirei, sentindo minhas bochechas queimando, mas a minha vez na fila finalmente chegou e pude escapulir à procura de meu almoço, embora aquilo tudo já houvesse dado um jeito de revirar o meu estômago. E tornara-se ainda pior quando voltei para a mesa sozinha e esbarrei em alguém que para meu infortúnio constatei ser ela: a garota da café-da-manhã. Aquela que se aproximara de Naruto durante a viagem no Canadá.

    Ela me encarou por um momento longínquo e então pigarreou.

    — Oi.

    Meu coração acelerou e eu não sabia bem o que dizer. Havia acontecido tanta coisa em minha vida em um único fim de semana que os acontecimentos canadenses quase pareciam estar num passado distante, pelo modo como minha mente passou a funcionar e enxergar o mundo desde então.

    — Oi. – eu devolvi. Ela era um pouco mais alta do que eu e tinha olhos redondos, bonitos, num tom de verde.

    — Se eu fosse você... e acredite, eu queria, iria aproveitar muito tudo isso. Tem muita gente que gostaria de estar no seu lugar.

    A mensagem saíra de sua boca tão rápido quanto meu queixo caiu. As palavras demoraram para se encaixar em minha cabeça e eu simplesmente não podia acreditar que aquela desconhecida estava mesmo me dizendo aquilo, assim, de repente.

    — Desculpe... o que disse? – minha voz soou envergonhada, estranha, tal como eu me sentia diante de tantas abordagens extra esquisitas.

    — Você está namorando com ele, não está?

    Eu soltei o ar, sentindo as orelhas esquentarem. Certo, eu estava mesmo vivendo aquilo. A vergonha me inundou num ato grandioso e eu estava prevendo que logo iria hiperventilar.

    — Com licença...  – tentei pedir num fio de voz, ignorando sua indagação acusatória, mas ela segurou meu braço e eu imediatamente congelei.

    — De todo jeito, parabéns. Você deve merecer. – disse num tom estranho. Educado, porém cheio de uma tristeza contida. E então apenas se retirou, caminhando para longe.

    Eu corri para a mesa abarrotada com nossos amigos e sentei-me às pressas, expirando pesadamente, sob o olhar analítico de Sakura. Já nem sentia mais fome para comer, com tanta ansiedade se revirando em minha barriga e o calor ardente em meu rosto. Tentei respirar normalmente e fechei os olhos. Estava realmente nervosa, relembrando em flashes toda aquela bajulação desde que pisara naquele colégio mais cedo e sentindo o temor me invadir naquela sensação antiga e sorrateira.

    Não era tão diferente do que faziam comigo no passado, ainda que nesta época só houvesse maldade envolvida. Mas ali, a sensação de tantos olhares estranhos, desconhecidos e investigatórios sobre mim era tão desconcertante e esmagadora quanto o bullying fora um dia.

    — Hinata, está tudo bem? – Sakura perguntou. Abri os olhos para lhe enxergar e ela sorriu compadecida.

    — Só... um pouco sufocada e... surpresa. – murmurei. Ela assentiu, como se compreendesse perfeitamente.

    — Eu sei. Quando eu e Sasuke começamos a namorar foi mais ou menos assim. Ninguém acreditava que nós dois estávamos juntos, acho que porque éramos muito amigos. – confidenciou. Eu sorri um pouco, agradecida por seu carinho e não pude comentar nada a respeito, pois logo Naruto e Gaara voltaram e eu achei melhor não o preocupar com essas coisas.

    — Os urubus já estão em volta, hein. – Gaara zombou, assim que sentou à mesa. Eu encolhi os ombros, desgostosa com a insistência do assunto. Ainda podia sentir o pavor gerado pelo olhar esverdeado e urgente daquela garota.

    — Que nada, eles só estão nesse blá blá blá todo porque agora é oficial. – Sakura respondeu. Naruto soltou um suspiro e beijou meu cabelo carinhosamente, com seus olhos azuis preocupados em meu rosto. Eu sorri, comprimindo os lábios e encostei a cabeça em seu ombro, buscando refúgio em seu abraço quentinho e esperando, ansiosamente, que aquele dia letivo acabasse.

    ***

    — Vou te levar até o endereço de Neji. – Naruto comunicou enquanto andávamos para fora da sala. Eu levantei os olhos para ele, curiosa. Não sabia que ele já estava instalado em algum lugar.  — Dona Kushina mandou mensagem, com a localização. Acho que eles querem te familiarizar com o apartamento, antes de fazer a mudança definitiva. – explicou. Assenti, pois seria mesmo bom poder ver como seria essa junção enquanto ainda não estava com as malas prontas.

    Embora, na situação atual, eu estivesse disposta a aceitar qualquer coisa. Só o que importava era que eu estaria um passo à frente de Hiashi, logo livre para proteger Naruto ao meu modo. E proteger a nós dois também.

    — Parece bom. Eu só preciso ir ao banheiro antes. – respondi. Todo aquele nervosismo me deixara com sede e eu havia bebido toda a minha garrafa d’água e a de Naruto também depois do almoço. Ele me acompanhou até o banheiro feminino e esperou do lado de fora, segurando minha mochila e eu tentei não demorar muito.

    Olhei-me no espelho quando saí da cabine, enquanto lavava as mãos e suspirei. Estava corada, com resquícios de sangue por baixo da pele que não tiveram a chance de sumir durante todas as aulas. E mesmo ali, ainda se faziam presente, conforme o fluxo de meninas no banheiro crescia, junto de seus olhos famintos. Me apressei para fora, incomodada, mas estanquei no lugar quando vi Naruto conversando com ela.

    Shion.

    A garota estava perto dele, com as mãos na cintura e um sorriso sacana. Enquanto ele se mantinha impassível, ainda que fosse possível notar certa irritação na forma como seus lábios se moviam. Sorrateiramente – ainda que me sentisse estúpida por tal – me aproximei e tentei escutar a pauta daquele encontro.

    — Está mesmo apaixonado, amorzinho?  - ela perguntou num tom irônico. Meu estômago se apertou pela forma como ela o chamou. Soava... particular demais.

    — Isso não é da sua conta, Shion. Por que não me deixa em paz? Eu já segui em frente, siga você também. – ele sibilou. A garota riu docemente e estalou a língua três vezes, de forma sedutora.

    — Eu acho estranho. Será que seguiu mesmo? Ela não é... um tanto parecida comigo? Você sabe, o cabelo... os olhos claros, a baixa estatura... – insinuou. Eu franzi a testa e pela primeira vez reparei de verdade nela, buscando tais semelhanças e... encontrando.

    Meu coração deu um solavanco doloroso. E Naruto começou a rir, descruzando os braços e se aproximando dela, olhando-a de cima.

    — Shion, não tente plantar essas intrigas para cima de mim. Foi você quem quis assim e eu até te agradeço, porque se não fosse a sua atitude, talvez eu não estivesse livre hoje para enxergar Hinata como eu enxergo. – ele parou por um minuto, pensando. — Ou talvez eu não precisasse disso. Afinal, eu me apaixonaria por ela de qualquer forma.

    Shion arqueou as sobrancelhas e sorriu com escárnio.

    — Não conte vitória muito cedo, Naruto. – avisou e eu julguei ser uma ameaça real.

    — Ninguém aqui está numa competição. Agora, por favor, vá embora.

    — Hmmm, está bem. Vamos ver, amorzinho... vamos ver.

    E com sua deixa, simplesmente desfilou para longe, encontrando a garota ruiva que a esperava com uma expressão curiosa. Respirei fundo e saí da sombra de onde estava, me aproximando dele. Naruto tinha uma feição séria, pensativa, que logo tratou de melhorar quando me viu, abrindo um sorriso brilhante.

    — Ei, você demorou! Está tudo bem?

    Eu não consegui evitar, meu rosto era muito translúcido para ele. Além disso, Naruto era um ótimo leitor. E mesmo que eu tivesse assentido, sabia que seria interrogada outra vez. O fato era que, bom, aquela conversa havia sido desconfortável. E o ciúme irracional se fazia presente, tentando obstruir minha visão clara, embora eu tivesse plena consciência dos sentimentos de Naruto e jamais, em hipótese alguma, seria capaz da injustiça de duvidá-lo. Ainda assim, aquele fatídico dia havia provado que eu estava sendo ingênua, ao contabilizar meras duas garotas interessadas em nos ver bem longe um do outro. E isso me causava um medo crescente de perder o que tínhamos, de perder a única felicidade genuína que havia conquistado.

    E mais uma vez, é claro, eu fora abordada por sua pergunta, antes de embarcarmos em seu carro. Eu podia notar seus olhos preocupados e me senti mal por ser tão sensível.

    — O dia foi estranho para mim. As pessoas estão agindo estranho comigo e tem também... bom, algumas garotas que...

    — Hinata – Naruto interrompeu, segurando meu rosto com as duas mãos. Seus olhos agitados em órbita, olhando-me com anseio. Eu me calei, sentindo o coração palpitar. — Essas pessoas são fúteis. Vivem de uma aparência, de uma procura incansável de ter a fofoca mais interessante. Elas não têm significado algum na nossa vida, muito menos poder de voz nas minhas decisões. Você é a minha namorada, não elas. Está tudo bem, minha baixinha, eu estou aqui. – murmurou cheio de carinho e eu me senti enrubescer, dessa vez por motivos felizes. O modo como ele disse aquilo me fez estremecer e me esforcei para não estranhar tanto aquela situação.

    A verdade era que agora não era mais tão estranho e eu sentia outras necessidades surgindo, conforme os dias avançavam. Era fato que eu amava aquele homem. Que era completamente apaixonada por tudo que havia nele. E eternamente grata por ser tão intensamente correspondida. Era inevitável com suas palavras e gestos que meu coração se acalmasse e logo o restante do mundo se apagasse ao nosso redor.

    E de repente, eu entendi o que ele quis dizer quando me pediu para ignorar aquelas pessoas. Porque, de fato, não tinha relevância real qualquer olhadela em nossa direção, quando havia os olhos dele sobre mim. Num suspiro longo, eu assenti e lhe dei um sorriso tímido, sentindo a vontade gritante de lhe dizer aquelas coisas.

    — Eu te amo. – me limitei às 3 breves palavras que mais obtinham peso no mundo, e que mesmo tão pequenas numa frase tinham o poder de demonstrar todo o turbilhão interminável de coisas que eu tinha para falar sobre ele.

    Seus olhos ficaram liquefeitos e seu sorriso cresceu no rosto, cheio de um amor explícito. Inclinou-se sobre mim e seus lábios capturaram os meus num beijo apertado, como um selinho longo que produziu um estalar suave e uma sensação gostosa de seu carnudo e molhado lábio inferior contornando o meu.

    — Eu também te amo, meu bem. – sussurrou, sorrindo, quando apartou o beijo. Eu respirei no pequeno espaço entre nossos rostos, absorvendo a ansiedade que me tomava sempre que nos beijávamos. Como se eu estivesse correndo contra o tempo perdido e necessitasse com a minha vida recuperá-lo. — Agora vamos, sua nova vida nos espera.

    Bom, por era, era aquela parte do tempo que eu iria retomar. Mas desde que eu o fizesse ao lado de Naruto, não importava quanto pudesse demorar. Porque eu retornaria feliz para seus braços em qualquer uma das rotas desse meu destino.


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