Jóia Rara

Tempo estimado de leitura: 16 horas

    18
    Capítulos:

    Capítulo 27

    A Liberdade é um Acalento

    Álcool, Hentai, Linguagem Imprópria, Sexo, Suicídio, Violência

    Oii, pessoas! Tudo bem?

    Bom, cá estou eu com a segunda parte da confissão de Hinata. Eu quero dizer primeiramente que escrever esse capítulo não foi nada fácil, mas eu estou orgulhosa, estou feliz por ter conseguido. Eu nem sei como tive forças hoje. Pelo dia que tive, a insônia severa e minha 1h30min de sono apenas me segurando em pé kkkkkkkkk Mas enfim, meus queridos e queridas, o capítulo não ficou muito extenso porque ele ta muuuuuuuuuuito carregado, muito sentimental. E eu criei uma playlist no youtube pra vocês ouvirem enquanto leem. Foram as músicas que eu ouvi, de uma playlist que achei no spotify e separei pra vocês as que me inspiraram. Espero que gostem e espero mesmo que estejam felizes com essa nova fase. Eu depositei muito da minha própria carga emocional, da minha relação com a perda, então eu espero ter conseguido transferir pra vocês as emoções da Hinata de um modo que toque esses coraçõezinhos e iluminem vocês para entender porque é que nossa personagem se condena tanto assim.

    O link estará nas notas finais, por favor, ouçam, vale a pena. Espero que gostem e um grande beijo!

    Hinata

    — Foi um acidente... – eu balbuciei, após verbalizar aquela memória fúnebre. Meus olhos despejavam lágrimas, que cuspiam fora das esferas opacas e entristecidas. — Eu só estava tentando acabar com aquilo. Ela... Ela acabou me puxando de um jeito que... oh, deus...

    O choro convulsionou meu corpo inteiro e eu enterrei o rosto nas mãos, deixando-me ser conduzida pela dor e o desespero contínuo que rastejava em minha mente. Ter aquela lembrança sendo exprimida em voz alta era como libertar todos os mostros de mim para fora, contaminando o mundo que existia além das barreiras da minha percepção psicológica. E agora parecia que tudo tinha um contexto real de novo, como se eu pudesse sentir outra vez aqueles cheiros e ouvir o choro dela, junto de seu arfar implorando pela vida que esvaía de seu peito.

    Eu podia lembrar perfeitamente de tudo e uma vez despejado para fora, parecia que eu não conseguia mais parar. Como se precisasse dessa justificativa, desse julgamento.

    — Eu a puxei para o meio da sala, gritando desesperadamente que ela ficasse comigo. Mas seu rosto, o modo como chorava, inesperadamente não era apavorado e nem magoado. Ela tinha entrado num estado de espírito tão calmo e conformado que eu fiquei absurdamente assustada. – suspirei, engolindo o nó em minha garganta. Minha voz tremia muito, assim como meu corpo e a sensação do meu coração rasgando enquanto a verdade era dita, de certa forma... era libertador. — Eu não sabia o que precisava fazer, estava paralisada, insegura sobre onde segurar: se o seu rosto ou sua barriga. E tinha tanto... tanto sangue. Eu não tinha coragem para tirar a lâmina, ela parecia perfura-la mais a cada respiração e eu quis muito fazer alguma coisa... qualquer coisa. E então eu finalmente lembrei que existia um telefone. Eu quis pegar para chamar uma ambulância, mas ela segurou minha mão... e eu pude perceber que já estava feito, ela estava partindo. Ela... elas estavam morrendo, Naruto...

    Eu fechei os olhos, lembrando com exatidão da textura derretida de seus olhos nos meus, o sorriso fraquejando, o rosto sujo de sangue, do sangue em minhas mãos. A expressão corporal que dizia adeus, mas o fazia com todo... todo o amor que existia nesse mundo.

    Flashback

    — Filha... – ela balbuciou. Sua mão ergueu com lentidão e tocou meu rosto. — Não chore, meu pequeno anjo. Eu sei... eu sei que a mamãe precisa ir. Mas entenda que isso é como a vida é, pequena. Um dia ia acontecer.

    — Não... não, mamãe, me perdoe. Por favor, me perdoe. Eu vou melhorar, eu prometo, mas fique comigo, não me abandone, mamãe. – eu chorei com a voz quebrando acima dela, com o corpo latejando em desespero. A sala parecia rodar, a vida parecia em câmera lenta e o ar parecia me enlouquecer, conforme invadia meus pulmões.

    — Shhh... Hinata! Você já é uma moça tão crescida! Não fique tão chateada consigo mesma. É tudo culpa da mamãe, está bem? Acredite em mim. Não foi você quem fez isso, não foi você quem fez nada, meu anjo. – ela sussurrava com o sorriso no canto dos lábios e eu quis berrar em agonia, não podia suportar o absurdo daquele discurso.

    — Me perdoe...

    Aquela era a única frase que eu podia proferir, embora houvesse tantas coisas que eu precisava dizer. Um filme passava em meus olhos, enquanto eu via os seus perdendo o brilho gradativamente. É tão revoltante como conseguimos ser falhos nesse sentido, como tudo parece encher nosso peito de palavras e necessidades latentes envolvendo a pessoa que perdemos. Como a vida conseguia passar tão rápido antes de perdê-los? E de repente, acabar. Sem que possamos proferir mais nada além do choro resgante e da dor incessante que deturpa a realidade.

    O seu último toque em meu rosto, puxando-o para beijá-lo na bochecha, bem como seu último olhar acompanhavam o teor de sua última frase: de despedida, de entrega e ao mesmo tempo de uma leveza indescritível.

    — Me prometa que vai viver, filha. Prometa para mim que nunca tirará sua própria vida. É difícil, eu sei, mas você é mais forte do que isso, Hinata. Você tem uma grande luz dentro do seu coração... só precisa encontrar. E eu sei que vai, eu acredito fielmente em você, meu pequeno girassolzinho... – ela soltou meu rosto para tocar a superfície de sua barriga. O soluço rasgou meu peito de um jeito insuportável, mortal. — Nós cuidaremos de você. Nós sempre olharemos por seu caminho. Por isso não tenha medo, Hinata, não ficará sozinha...

    Toquei seu rosto, manchando-o de sangue ainda mais. Meus olhos imploravam que ela parasse com isso, que parasse de se despedir, que parasse de ser tão boa comigo. Eu queria que ela me olhasse com raiva, que gritasse comigo por fazer aquilo com ela e com Hanabi. Era insuportável a sua bondade e lealdade enquanto a culpa caía sobre mim como um manto de ferro.

    — Prometa – ela balbuciou fraquejando, os olhos quase fechando. A culpa, tão pesada que me fazia cair para baixo, só me deu uma certeza, enquanto o desespero de vê-la fechando os olhos me abraçava feito correntes: a certeza de que a única coisa que jamais me deixaria só era o eterno e imutável remorso. Por isso eu assenti e como a sentença de meu pior castigo, eu concordei.

    — Eu prometo, mamãe.

    E com essa frase, tal como se fosse necessário para ela se permitir ir, Akemi simplesmente... foi.

    O vazio da perda era um silêncio estridente. E eu descobri ser ainda mais estridente do que o silêncio que me fizera querer estar ali, no lugar dela. Porque era para ser eu, afinal de contas. E mais do que isso, jamais, em hipótese alguma, ela deveria ter partido daquela forma. O grito, alto e agonizando, seguido de outro e mais outro, era pouco para o que eu desejava expressar. E mesmo que eu gritasse com todo pulmão, não podia alcançar ninguém. Eu estava sozinha, ainda que Akemi houvesse prometido nunca me abandonar. Era apenas uma doce mentira, que por doce demais, não conseguia aplacar o azedo da solidão.

    Flashback off

    — Eu fiquei lá por uns dois dias. – murmurei, rouca, olhando as flores do jardim, lembrando dos acontecimentos seguintes. E só então Naruto finalmente se pronunciou, após um silêncio imóvel que eu não conseguia nem encarar.

    — V-Você ficou com o corpo dela sozinha por dois dias? – perguntou num fio de voz. Eu finalmente olhei para ele, encontrando seus olhos banhados por lágrimas e um rosto devastado, muito sentido. Eu levantei os ombros, suspirando e piscando para afugentar o choro que embaçava minha visão.

    — O que eu podia fazer...? Eu não tinha ninguém para chamar, não tinha nem forças para me mover... – eu sussurrei, com o choro entrecortando minha fala. Naruto fechou os olhos e balançou a cabeça devagar, o peito tremia e suas mãos arrancavam gramas do chão.

    — Meu deus... – ele balbuciou. — Meu deus, amor...

    De repente seus braços me puxaram, clamando um abraço, enterrando seu rosto entre meu ombro e pescoço. Eu fiquei paralisada, incerta sobre aquilo, de certa forma... incrédula. Por que ele estava me abraçando? Ele não deveria estar... assustado demais, enojado com aquela história?

    Mas era bom, combinava com a sensação de liberdade de finalmente contar aquilo. Eu queria ser confortada por ele. Queria poder mudar o tom de minhas lembranças, agora que havia enfim deixado-as sair. No fundo eu sempre achei que manchar as memórias de minha mãe com a culpa era uma forma muito ruim de honrá-la. Ao menos eu deveria ter sido capaz de não deixar que a escuridão em mim tomasse conta até mesmo disso.

    — Eu sinto muito, eu sinto muito mesmo – sussurrou. O corpo dele tremendo no meu embalou nosso abraço e eu apertei os olhos com força, sentindo o conforto me invadir, o compadecimento de alguém que real e finalmente podia compartilhar de minha dor. — Eu nunca imaginei que houvesse sido isso... acho que nunca tinha imagino o quão quebrada você poderia ter sido e isso é uma das coisas que mais dói em toda essa revelação.

    Eu me afastei para olhá-lo, confusa.

    — Por quê?

    Naruto tocou meu rosto com a mão, os olhos azuis tremiam sobre os meus e seus lábios se retorciam conforme ele buscava suas palavras em meio ao seu tormento.

    — Porque isso era a única coisa que fazia ela se martirizar, Hinata. Ficou claro para mim o quanto ela viveu tentando apaziguar a própria culpa por ver você se perdendo dia após dia. Me parece... que ela se sentiu em paz por poder finalmente fazer algo por você quando morreu, como se ela aguardasse poder fazer aquele discurso, achando que te libertaria. E eu sinto muito que você teve de passar por tudo isso, eu... – sua testa encostou na minha e sua respiração tornou-se mais densa — Eu nem consigo imaginar como foram absolutamente horríveis esses dois dias. E nem como você conseguiu ficar lá.

    Eu me afastei dele, atordoada por sua opinião. Era completamente fora do que eu esperava. Me deixara tonta e de repente eu me perdi entre suas frases, incerta sobre o que dizer, o que responder, o que defender. Ele não podia falar sério sobre a culpa de Akemi. Era loucura!

    — E-eu...

    — Como você conseguiu, amor? Como conseguiu ficar lá? Por quê? – ele se adiantou, angustiado, procurando desesperadamente sanar suas interrogações como se elas o tomassem o ar.

    Meus olhos encheram de lágrimas e eu gaguejei, subitamente muito nervosa, sentindo meu coração falhar a batida de um jeito doloroso, como se saltasse errado e entalasse em minha garganta.

    — Eu entrei em choque... – comecei, segurando o rosto com as mãos, desordenando os cabelos e molhando a franja com as lágrimas. — Num estado de petrificação, eu não sei. Eu apenas desabei ao seu lado e de repente os dias passaram. Não houvera percepção da passagem do tempo, porque o tempo tinha sumido para mim. O vazio... era como se eu estivesse no escuro, sem sentidos, vegetando sem propósitos, sem consciência. Minha mãe tinha morrido em meus braços. Ou eu havia morrido e ficado presa naquele pesadelo como castigo?

    Naruto tinha o olhar de pesar mais intenso sobre mim que qualquer um havia dado. E era um pesar cheio de carinho, de cuidado, de um amor incondicional estonteante e impossível. De repente, eu me perguntei se estava sonhando com aquilo também.

    — E o que aconteceu depois? – ele me despertou daquele devaneio, olhando para suas mãos cheias de rasgos de grama. Eu fiquei tonta, em dúvida sobre o olhar de antes, em dúvida sobre há quanto tempo eu estava naquele desabafo. Conforme eu adentrava nessas memórias há tanto aprisionadas, eu ia espiralando no paradoxo entre a liberdade e o terror.

    — Um... colega de trabalho notou o sumiço. Notaram na escola também. Eu só lembro da luz, me cegando de repente como se um anjo estivesse vindo busca-la para o paraíso. Mas eram policiais. Só então eu percebi que eu estava viva, seca, desidratada e envolta pelo cheiro da morte. Eles tentaram fazer perguntas, mas eu não lembro, não conseguia escutar. Senti ser levada para algum lugar, mas o desmaio me levou para longe. Acordei três dias depois, de volta no hospital psiquiátrico. – eu parei de falar, ouvindo minha própria voz num tom automático tomado pela memória e pelo torpor do medo. Suspirei, notando como assustava Naruto cada vez mais. Procurei limitar às coisas que importavam, tentando acabar logo com aquilo. Ter a verdade dita não era necessariamente ter todos os detalhes. — Eu depus para a polícia e para os médicos, contei que tive uma crise e tentara o suicídio, mas que ela impedira se lançando contra mim. Foi o máximo que pude dizer e os aparelhos da polícia não me condenariam mentirosa, bem como o meu antigo laudo médico de esquizofrenia. A doença que inventaram para justificar aquele maltido dom. Depois disso eles me levaram para visitar o túmulo, fora gentileza deles. E então a assistente social declarou que eu ficaria em observação do Conselho Tutelar, porém nas dependências da clínica de psiquiatria. Até que... bem, até que um dia Hiashi apareceu e assumiu os cuidados por mim.

    O fim do relato fez um silêncio pesaroso existir entre nós. Eu me preparei psicologicamente pela hesitação dele, pelo medo e pela dificuldade em absorver tudo. E principalmente, pela Hinata que eu estava o obrigando a conhecer. Com coragem, inflando os pulmões com ar, eu lhe encarei. E vi seus olhos perdidos, vagando por pontos do meu rosto, ondulando e transbordando.

    Sustentei seu olhar e apertei os lábios. Queria transmitir minhas desculpas, sinceras e dolorosas, porém agora eu precisava deixa-lo assimilar aquilo tudo e por isso esperei pela sentença sem muito lhe cobrar, afinal, Naruto era apenas um garoto. Um garoto lindo, de alma jovem, pura e extraordinária, mas passível mesmo do mais fraquejar humano.

    A resposta era visível em construção através de seus olhos e do modo como engolia à seco os nós do choro entalados em sua garganta. Eu não podia ignorar o medo crescente a partir dali, mas tampouco era imperceptível a liberdade tomando forma dentro de mim, se expandindo, se adaptando à nova realidade, agora livre de todas as mentiras e segredos e eu me senti forte, apesar de todo o pavor. Forte, porque não importava o que Naruto dissesse, eu tinha uma esperança agora de conseguir honrar minha amada mãe, de fazer a coisa certa, de salvar nossa família, de enterrar comigo de uma vez por todas esse pesadelo de ligação amaldiçoada.

    — Hinata – ele começou. Eu suspirei, esperando e desde já me apegando ao som de sua voz, antecipando um possível adeus. Naruto procurou minhas mãos e entrelaçou nossos dedos, apertando com força, esquentando meus dedos frios e duros. — Você não matou sua mãe. Não, longe disso. Você também não amaldiçou a vida dela com seu nascimento, tampouco a impediu de viver durante todos os anos em que padeceu pendurada entre as realidades que a ti foram impostas por terceiros antes mesmo de ter nascido. Nada disso, mesmo seus pequenos erros ao longo do caminho, foram fortaleza do destino cruel que sua mãe teve. Exceto ela mesma. Exceto nossas famílias. Você precisa entender que essa história, por pior e mais aterrorizante que seja, só existiu porque ela decidiu salvar você, nós, por amor. E Akemi sempre, meu amor, sempre soube disso. É muito claro agora. É claro como os olhos de vocês, que em seu leito de morte ela estava lhe confessando a verdade, mesmo sem conta-la. A verdade que minha mãe terminou de dizer.

    Ele soltou minhas mãos para segurar meu rosto e forçar meus olhos a encará-lo. Mas não era necessário, pois ele tinha conseguido me congelar as pálpebras bem abertas.

    — Akemi foi extraordinária! Ela salvou todo mundo, cumpriu seu objetivo e não temeu mesmo no final. Sim! Mas não foi culpa sua, Hinata. Por Deus... aguentar o que você passou já é além do imaginável, além do aceitável para alguém tão linda, tão doce, tão cheia de carinho como você. Ter você mesma se condenando a viver sem de fato estar viva, como se houvesse se julgado culpada por tudo é um absurdo. Isso, nunca mais. Nunca mais, você me entende?

    Eu balbuciei uma negativa, pasma, mas ele forçou ainda mais meu rosto, prendendo-me como aço em seus explicativas.

    — Hinata! Não vê que eram as vozes do shinigami tentanto te enganar esse tempo todo? Não percebe que a maldade que acredita existir em você, não é sua, mas sim dele? Hiashi te aprisionou ao maldito, como um garantia de que conseguisse o que queria. Mas jamais foi você, meu amor. Jamais! Suas memórias estão filtradas por essas vozes, pela confusão e pela mágoa de não entender o mundo, mas eu só consigo visualizar Akemi tentando aplacar a culpa por ter deixado isso acontecer e compensar isso sendo a melhor mãe que conseguia. Não por você, mas por ela. Porque essa era a única coisa que restava para ela. Ser sua mãe era o mundo dela, Hinata, era a vida dela. A morte, isso ela mesma tinha sentenciado. Não você. Mesmo que tenha sido por você, não tem razão nenhuma para se culpar por isso. É incabível, porque não controlamos os outros e é ainda pior manchar essa escolha, movida por amor, pela sombra suja do arrependimento de amar.

    — Naruto! – eu exclamei, arfando. Meus olhos ardiam e eu senti algo irromper em meu peito, como um soluço que me revirava do avesso. Eu lhe encarei, os braços flácidos, tão entregues quanto eu estava à surpresa, ao sentimento insano despertado pelo o que ele me dizia. Incrivelmente, ele sorriu e me apertou num abraço, esfregando as mãos em meus cabelos de forma frenética, tirando-os do meu rosto, limpando minhas bochechas com os dedos, buscando em meus olhos um jeito de me atingir.

    Mas ele tinha conseguido. E numa sensação estranha de rebobinagem, eu recordei do dia em que a luz me cegou, quando os policiais abriram a porta e me ressucitaram. De repente, no lugar deles, eu podia ver Naruto. Seu toque transformando minhas lembranças como mágica, como uma espécie de cura intravenosa que irradiava para todo o meu corpo. Eu me senti amortecida e ao mesmo tempo supersensível.

    — É impossível que você consiga ver as coisas desse jeito, eu... o que eu acabei de te contar, não pode ser... – eu proferi atordoada, chorando copiosamente. Meu coração acelerado aqueceu meu rosto e uma vontade crescente e estranha, chegando a ser absurda, de sorrir começava a brotar nos cantos de meus lábios. Naruto acariciou meu cabelo, fitando-me com exímio afeto.

    — O que é impossível mesmo é você achar que eu te abandonaria. Ou ainda pior, impossível para mim é aceitar que você continue a se sentir assim, culpada, inferior, condenada. Hinata Hyuuga, por acaso você sabe a única coisa a qual é condenada nessa vida? – eu o encarei assustada, confusa e ele sorriu aquele sorriso grande e cheio de covinhas, cortando o rosto inteiro e me desestabilizando. — A ser amada. Apenas isso. Eu te amo, minha baixinha teimosa e carrancuda. Eu te amo, nós te amamos. Todo mundo que realmente importa, te ama.

    A nascente do sorriso veio do canto esquerdo, tremendo fraco com a inocência e timidez, mas logo tomou todo o resto, vindo com a enxurrada de sentimentos, elevando meu ritmo cardíaco. De repente, nascia. Eu estava sorrindo. Verdadeira e completamente, pela primeira vez em toda a minha vida. Sendo acariciada pela liberdade de enxergar, de ouvir, de sentir. As palavras dele adentraram meus sentidos como fogos de artifício, trazendo tumulto e beleza, que incendiavam todas as aberturas e faziam a luz penetrar meus poros num calor insuportável, que dançava na pele como se eu fosse um formigueiro.

    O brilho nos olhos de Naruto foi o estopim para a minha decisão. Era agora ou nunca. Eu havia mudado. Por aquele menino-homem que me revirara e renovara, que me fizera eu. Era verdade, todos que importavam, amavam. E havia muito mais deles do que eu pensava. Pessoas que eu ainda nem conhecia e que zelavam em segredo por mim. Pessoas que planejaram minha fuga, meu bote salva-vidas sem eu nem ter pedido por isso. Pessoas que amaram nós duas, eu e minha mãe, com o dom ilustre de sua amizade. E eu podia dizer então que havia aprendindo algo sobre isso que gostaria muito de poder te contar, mamãe, minha melhor amiga:

    A liberdade é um acalento. Uma poesia que passeia sorrateira nos ideais oníricos daquele que nada contramaré. E agora lá estava eu, parando de lutar contra a correnteza e finalmente sendo acariciada pelas ondas do meu caminho. 


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