Os Trinta Colares de Pedra

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    16
    Capítulos:

    Capítulo 7

    Fogo

    Homossexualidade, Violência

    - Vou chamar os senpais - disse Kariya, tirando o celular de seu bolso e começando a mandar mensagens. Hikaru pegou seu celular e começou a fazer o mesmo. Os alunos que eram do terceirão no ano passado não estudavam mais ali, mas moravam perto.

    - O que eles querem com a gente? - Tenma perguntou enquanto observava os grandões que estavam ainda distantes se aproximando.

    - Eles acham que sabemos onde está Mitsuyoshi - Tsurugi respondeu, sem desviar o olhar dos outros dois.

    Tenma o olhou, confuso.

    - Como você sabe? Quem é Mitsuyoshi?

    Tsurugi suspirou, não era desse jeito que queria contar sobre as pedras e Yozakura.

    - Mitsuyoshi é o atacante da Mannouzaka, jogamos contra eles no Holy Road. - Tsurugi disse apenas isso, mas sabia que depois teria que contar o resto.

    - Lembro desse time, não gosto muito deles - Tenma recordava muito bem do que tinham feito ao seu time e, pelo que ouvira falar, não tinham mudado nada. Mas por que estavam procurando por um dos seus jogadores da Mannouzaka na Raimon? Quase perguntou isso em voz alta quando viu que os dois estavam quase chegando. Sentiu vontade de correr.

    - Não podemos usar os poderes do colar - ouviu Tsurugi dizer. - Tem muita gente aqui. Eles vão ver.

    - Tá bom - Tenma sussurrou, percebendo que com isso Tsurugi quis dizer que se ‘a coisa ficasse feia’ não poderiam se defender com seus poderes.

    Os dois jogadores da Mannouzaka pararam na frente deles sob olhar curioso dos alunos da Raimon que estava espalhados pela entrada da escola. O tamanho dos dois causariam uma enorme sombra a quem estivesse em sua frente se o sol não estivesse bem acima deles.

    - Onde ele está? - repetiram a pergunta que já tinham proferido dezenas de vezes antes. O tom usado mostrava impaciência, queriam achar quem procuravam e sair logo dali.

    - Onde está quem? - Aoi respondeu com outra pergunta.

    - Mitsuyoshi - cuspiu, fazendo Aoi recuar vários passos, tremendo. - Shinoyama disse que viu ele entrando aqui.

    - Não sabemos - Tsurugi respondeu cautelosamente. - Não vimos ele.

    Tenma deu um passo à frente, fincou os pés no chão e encarou eles.

    - Vocês não deviam ter entrado aqui assim - Tenma disse. Tsurugi olhou espantado para ele, assim como todos ali em volta. - Deviam ter esperado as aulas acabarem e procurado seu companheiro do jeito certo, sem assustar ninguém - Tenma parecia não ter mais medo, sabia o que estava dizendo e não tinha gostado do ato selvagem dos dois Mannouzaka. - Aposto que seu colega deve estar se escondendo de vocês agora, e com razão. Olhem a cena que fizeram, o futebol não gosta de ser usado para isso.

    Os grandões pareciam se segurar para não cair em cima deles. Mas, pouco tempo depois, olharam em volta e perceberam centenas de olhares com centenas de expressões diferentes em cima deles. Onde quer que Mitsuyoshi estivesse escondido, não apareceria desse jeito,  finalmente compreenderam.

    - Vão embora - Tenma disse.

    Os dois o encararam, com raiva.

    - Ninguém nos manda embora. Já basta Mitsuyoshi ter nos despachado hoje. Da Raimon, não - cuspiu Gamaishi, perto dele um garoto segurava uma bola que foi repentinamente roubada pelo mesmo. - Oosawada, vamos lhes ensinar uma lição.

    - Vamos - Oosawada ecoou.

    Gamaishi jogou a bola no ar antes de chutá-la contra eles, atingindo Shinsuke que foi jogado para trás.

    - Shinsuke - exclamou Tenma, indo até o amigo. Shinsuke se levantou com dificuldade.

    Oosawada pegou a bola e preparou outro ataque. Muitos dos alunos que observavam a cena se afastaram, temendo serem acertados, enquanto outros simplesmente fugiram dali, aos tropeços e empurrões, pensando serem os próximos alvos. A bola de Oosawada quase acertou Kariya e Hikaru, que se esquiram por pouco do golpe. Essa mesma bola bateu no tronco de uma árvore ali perto e acertou Kageyama pelas costas. Hikaru caiu em cima de Kariya que estava na sua frente. Kariya, surpreso e atordoado, tentou se levantar.

    Tenma correu até onde a bola estava e a pegou, a aprisionando fortemente contra o peito.

    - Não vou ver você machucando meus amigos - disse com firmeza. Tsurugi se pôs ao lado dele.

    Gamaishi e Oosawada se aproximaram de Tenma com o intuito de pegar a    bola de volta, mas pararam ao verem que Shinsuke, Aoi, Kariya e Kageyama se juntarem a eles. Os dois riram, achando a resistência engraçada, e voltaram a andar na mesma direção. Tenma continuava a apertar a bola contra o peito, enquanto platéia só olhava, sem poder fazer nada.

    Kageyama estava apoiado em Kariya. Suas costas ainda doíam por causa do impacto de antes, mas não recuou ao ouvir o som dos passos sinistros se aproximando. Apesar de Kariya o segurar, ainda tinha medo, que aumentava cada vez mais. Hikaru também tinha um colar e queria muito usá-lo, mas não sabia como. Mas quando Gamaishi e Oosawada chegaram e pararam na frente de Tenma e pegaram a bola à força, Kageyama, sem perceber, ergueu a mão num impulso e dela fez sair um pequeno e quase invisível relâmpago que atingiu a grama. Foi rápido e ninguém percebeu. Poucos segundos depois, no lugar onde o pequeno trovão havia caído, o fogo começou e foi aumentando para todos os lados.

    Os alunos que ainda estavam lá saíram em disparada para fora da escola. O sinal de incêndio tocou e um tumulto começou. O fogo causado pelo relâmpago havia crescido rapidamente e tomou conta de diversas árvores que tinham ali. Os dois jogadores da Mannouzaka ficaram confusos quando viram o fogo, mas logo jogaram a bola no chão e saíram dali, carrancudos.

    Quando Tenma e os outros estavam prestes a sair dali, uma árvore caiu e jogou Kariya no chão, com o tronco prendendo sua perna. Kariya cerrou os dentes, com raiva. O topo da árvore queimava em brasas e descia pelas folhas, e o tronco, por enquanto, estava salvo.

    - Me ajudem - chamou Kageyama, tentando levantar o tronco. Prontamente Tenma, Tsurugi, Shinsuke e Aoi foram ajudar, mas a árvore caída sequer se mexeu.

    - Façam mais força - Tenma gritou. Segundos depois, estavam todos sem forças para tentar de novo.

    - O que está acontecendo?

    A voz conhecida fez Tenma e os outros olharem para cima. Shindou, Sangoku e todos os outros estavam lá, em meio à fraca fumaça que pairava no ar. Vieram rapidamente para onde estavam.

    - Nos ajudem aqui. Kariya está preso - chamou Tenma, gesticulando para a  árvore.

    Amagi, Kurumada, Kurama, Hamano, Hayami e Nishiki foram imediatamente ajudar a erguer o tronco da árvore, enquanto Sangoku controlava o fogo para impedi-lo de se aproximar mais.

    Principalmente com a força de Amagi, o tronco foi movido e Kariya puxou a perna debaixo. Correram para fora dos portões, com tenma e Tsurugi ajudando um manco Kariya a andar.

    No meio das folhas grossas de uma árvore afastada que não ardia em fogo, Mitsuyoshi observou a saída dos jogadores da Raimon. Desde o início tinha visto tudo e sentido muitas emoções diferentes. Primeiro sentiu impaciência por ter que esperar os portadores das pedras saírem da aula; e quando viu seus colegas Mannouzaka, assustou-se, sentiu temor e receio; mas quando viu eles machucarem a Raimon, teve raiva. Assistiu tudo, querendo descer da árvore e mandá-los pararem, mas não conseguiu se mover.  Os colegas haviam criado uma confusão na entrada da escola, todos olhavam. Apenas pode ver, apreensivo e impotente, o desenrolar da trama que acontecia por sua causa. ‘Por sua causa’, o que piorava a situação.

    Mas se perguntava o por que de estarem ali o procurando. Foi juntando as peças. Gamaishi falou que Shinoyama disse que o tinha visto entrando na Raimon, o goleiro da Mannouzaka com certeza havia fofocado na orelha de Isozaki, pois Gamaishi e Oosawada não estariam lá, procurando por ele, se não tivessem sido ordenados. E se tem alguém que eles obedecem sem questionar, esse alguém é Isozaki, o capitão.

    Então era Isozaki quem realmente queria vê-lo, os dois defensores eram apenas peões. Mas por que assim, desse jeito? Usando a força e machucando pessoas? ‘Por que essa é a Mannouzaka’ lembrou.

    Mitsuyoshi não conseguia pensar em nada que pudesse fazer com que o capitão quisesse falar com ele tão urgentemente. Não devia ser por causa de ontem.

    - A não ser… - pensou em voz alta. - Que ele saiba sobre as pedras.

    Seus pensamentos foram interrompidos por uma nuvem de fumaça que alcançou o topo da árvore. Mitsuyoshi tossiu e se pôs a descer pelos ramos até o chão, com movimentos hesitantes e calculados de quem tem um pulso machucado. Pulou o último metro, se encontrando em meio a um matagal de fogo, tinha esperado até todos sumirem para enfim sair de seu esconderijo, agora o lugar se encontrava deserto. Andou até a saída com as mãos na frente do rosto protegendo-se do calor, da fumaça e das faíscas do fogo.

    Mitsuyoshi pensava que ninguém mais estaria na frente da escola, mas se enganou. Por sorte Gamaishi e Oosawada tinham sumido, mas o time inteiro da Raimon ainda estava lá, ao lado do muro, conversando. E quando Mitsuyoshi saiu, todos os olhares se voltaram para ele, os olhares que tinha tentado evitar. Mitsuyoshi congelou. Não sabia se eles sabiam quem era, ou se sabiam que ele era o motivo dos grandões terem invadido o colégio, mas se encontrando naquela situação, parecia que todos sabiam da verdade. Percebeu que os jogadores com quem tinha jogado reconheciam-o.

    Viu olhares de raiva, de inquietação, de curiosidade, de desagrado, de irritação; pensou até vislumbrar alguns olhares de desprezo, o culpando pelo incidente. Apesar disso, conseguiu perceber olhares de preocupação vindo de alguns, o que era ainda pior, não suportava que sentissem pena dele. Os fitou apenas por apenas alguns segundos que pareceram séculos, até não conseguir mais aguentar esses olhares. Sentiu-se culpado ao ver Amagi, lembrou que o tinha roubado, mentido. Virou-se bruscamente, sentindo lágrimas quentes escorrerem pela face, e correu, sentindo dezenas de olhos em suas costas, onde suas tranças batiam de um lado para o outro.

    Quando virou a esquina, não diminuiu o passo. Alguns carros de polícia passaram fazendo um barulhão de doer os ouvidos, logo atrás veio um caminhão de bombeiro, com os homens já preparando a mangueira para apagar o fogo. O barulho da sirene ficou martelando na cabeça de Mitsuyoshi até depois do som sumir.

    Na metade do caminho para casa, quando estava um pouco mais calmo e sem mais lágrimas para cair, viu alguns de seus colegas da Mannouzaka conversando. Tinha bastante gente por ali, Mitsuyoshi se escondeu atrás de uma árvore para escutar.

    - Por que estamos procurando ele mesmo? - Perguntou Busujima, enfiando a  cabeça dentro de uma loja para espiar.

    - Foi uma ordem do capitão - Shinoyama respondeu, revirando os olhos.

    - Eu sei, eu sei. Mas por que mandar o time inteiro atrás dele? Que exagero! E a gente estava em horário de aula, poxa. - queixou-se Busujima com um suspiro de preguiça. -  Era só esperar a aula de amanhã, ou mandar uma mensagem, ligar, sei lá.

    - Pare de resmungar e faça o que o capitão mandou - Shinoyama exclamou, repreendendo o colega. - E aliás, não sei se se esqueceu, mas Mitsuyoshi não tem celular.

    ‘Não preciso de um celular’ Mitsuyoshi pensou. ‘Celulares viciam e não me renderei paras as tentações dele’.

    Busujima bufou, sempre se esquecia, devia pensar que só um maluco não tinha um celular.

    - Espera - Busujima parou de procurar e virou-se para o goleiro. - Será que tem haver com o que aconteceu ontem?

    Mitsuyoshi arregalou os olhos, atônito. ‘Eles sabem o que aconteceu ontem?’, se perguntou.

    - Sobre ele ter entrado na floresta? - Shinoyama perguntou. - Isozaki ficou esquisito quando soube disso. Claro que é estranho Mitsuyoshi ter entrado lá, mas…

    Eles começaram a andar novamente e sumiram de vista, assim Mitsuyoshi não conseguiu mais ouvi-los. Mas suspirou aliviado por eles não saberem da outra coisa que tinha acontecido ontem, então Isozaki não tinha contado, felizmente.

    Ontem, quando correu para a floresta, tinha certeza que os colegas não o tinham visto, mas viram e contaram para o capitão. Isozaki também estava na lista do pergaminho. Será que ele tinha conectado as informações e achado que Mitsuyoshi tinha haver com a pedra que tinha? Isso explicaria Gamaishi e Oosawada terem ido até a Raimon e o time da Mannouzaka estar à sua procura. Mas essas informações eram muito poucas para ele chegar a tanto.

    Mitsuyoshi percorreu o caminho restante para sua casa se escondendo e fugindo dos seus colegas de time. Ao chegar, trancou a porta e decidiu desistir da tarefa que o velho das pedras tinha lhe dado, essa missão tinha sido impossível desde o início mesmo. Para começar, nem a devia ter aceitado. E por que o tinha feito? Só por causa de um desejo? Foi para o seu quarto e jogou a bolsa de pano em cima da cama.

    Só quando se olhou no espelho percebeu o quanto estava sujo de fumaça. Tomou um longo e demorado banho, e depois de secar o cabelo, deixo-o como estava antes: trançado, tinha gostado assim. Deixou-se jogar na cama pensando que teria que encarar a escola no dia seguinte, ver Isozaki, ver todos. Olhou angustiado para as hora.

    - Quatro e meia - murmurou.

    “Toc Toc” Alguém bateu na porta. Sua mãe entrou com um sorriso gentil, ao mesmo tempo confuso e surpreso.

    - Filho, tem uns garotos lá fora querendo falar com você.

    Mitsuyoshi pulou da cama. Seria Isozaki e os outros? Não podia ser, eles não sabiam onde morava. Na verdade, ninguém sabia onde ele morava, nunca tinha trazido ninguém até sua casa. Teria sido seguido?

    - Diga a eles que já vou descer - Mitsuyoshi disse à sua mãe.

    - Claro, não os deixe esperando - Sua mãe sorriu e fechou à porta do quarto.

    Mitsuyoshi ficou andando de um lado para outro pelo quarto, inquieto e ansioso. Enfim fingiu que havia tomado coragem e desceu as escadas relutantemente para o primeiro andar da casa.

    - Eram muitos, então eu disse para eles ficarem lá fora - ouviu sua mãe dizer da cozinha quando o viu.

    Mitsuyoshi engoliu seco. ‘São muitos?’ repetiu, quase tremendo. Abriu a porta que dava para o quintal para encarar seu time.

    Arregalou os olhos, espantado. Não era o time da Mannouzaka, e sim todo o time da Raimon que estava ali, na porta da sua casa.


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