Jóia Rara

Tempo estimado de leitura: 16 horas

    18
    Capítulos:

    Capítulo 22

    Órbitas Realinhadas

    Álcool, Hentai, Linguagem Imprópria, Sexo, Suicídio, Violência

    ATENÇÃO! ESTE CAPÍTULO É SEQUENCIAL DO CAPÍTULO 21. O CAPÍTULO 21 FOI EDITADO, ERA UM AVISO E FOI EDITADO PARA ENREDO NORMAL. DESCULPE O TRANSTORNO. VOLTE E LEIA!

    Oi?

    Eu disse... OOOOOOOI!

    Tudo bem, podem atirar as pedras, me odeiem, mas por favor, não desistam ushaushaushauuahs

    Minna! Que saudade, meu Deus. Sei que já faz uma era que não posto e que muitos de vocês talvez nem lembrem mais da fanfic, mas eu sempre lembro daqui. Como alguns sabem, eu faço faculdade e não tenho muito tempo, que dirá disposição cerebral para depois de madrugadas insones projetando, parar e tirar inspiração para qualquer outra coisa além de materiais de construção, modulação de espaços, tendências, linha de móveis, memoriais... hsushuahsauhsauhs enfim, pessoal, não posso prometer quando sai o próximo, porque eu realmente uso e abuso da minha criatividade no curso, então quando eu posso sentar e descansar minha cabeça, eu o faço. Me perdoem pela ausência, obrigada em antecipação para quem já for ler com carinho, quem ficou feliz com a notificação e quem não esqueceu de mim. hahahahaha Eu espero que vocês gostem do capítulo de hoje, que se sintam emocionados e que compreendam o desafio da Hinata. Acho que vocês vão ficar surpresos! Aaaaah, tem um easter egg no flashback de hoje, mas eu só vou revelar daqui alguns capitulos hehehehe. Bom, que saudade, pessoinhas, espero do fundo do meu coração que vocês se sintam amados com cada letrinha. Um beijo!

    Hinata

             Um beijo.

             Por que uma palavra tão pequena representava uma ação tão abrangente? Por que, entre cinco letras cabia uma infinidade de sensações, emoções e até mesmo perspectivas? Eram questões que eu não sabia responder, nem dizer o quanto soavam bonitas, apesar de tudo. Porque a única resposta que me vinha à mente era a imagem do casal Uzumaki na primeira vez em que eu os vira, ali tão sutilmente juntos, com suas personalidades distintas, completando-se como almas gêmeas que nunca teriam uma chance se não pertencessem uma à outra. Fato esse que eu mesma havia julgado certo só de ter o privilégio de conviver com a prole desta união.

              Eu imaginava o quão felizes eles eram e mal podia comparar isso com a discrição do relacionamento que minha mãe tivera no passado. Era, no fundo, como se a felicidade dela tivesse sido ensaiada, apenas para me cegar de toda a verdade dolorosa. Apesar de ser a mulher mais iluminada que eu tenha conhecido, Akemi não tinha uma alma gêmea, porque ela vivera especial e unicamente para me proteger. Eu a vira beijar seu marido por diversas vezes, em sua forma contida e singela, sempre como uma flor frágil que poderia voar com qualquer brisa, seguindo sua vida cautelosamente através de tanta doçura. Um beijo que selava, supostamente, uma relação sutil e adorável. Entretanto, um beijo como o de agora era uma ação entre casais, algo que deveria representar um interesse diferente daquele que eu julgava ter por meu melhor amigo.

            Akemi nunca beijara como se o ar estivesse dentro de seu marido, nunca se perdera de olhos fechados por minutos ininterruptos e intensos, em lábios urgentes e quentes. Ela não demonstrara publicamente, ao menos, estar entregue a esse alguém, nem se completavam visivelmente como a senhora Kushina e o senhor Minato. Era amor, eu achava, mas não era tão… envolvente. Tão perfeito como parecia ser com os pais de Naruto. Tão perfeito quanto parecia ser o encaixe dos lábios dele nos meus naquele momento.

             E quando falo de perfeição, não entendo como um lado romântico facilmente visto entre os Uzumaki mais velhos ou entre minha mãe e meu padrasto, mas sobre como não soava errado, lá no fundo de meu âmago escuro, num sussurro quase distante demais, porém estava ali, insistindo que beijá-lo era… a melhor coisa que eu já havia provado. Além disso, havia uma nova perspectiva para enxergar e o inserir, agora que o tinha sobre mim, com seus braços fortes, o corpo emanando calor, a respiração quente no meu rosto, os lábios apertados firmemente contra os meus. Toda sua expressão corporal imposta de forma masculina e sedutora, mesmo que tão naturalmente, pois seduziam aquele breve sussurro a soar mais forte do que os gritos de meu carma, lembrando-me de minhas correntes.

             Eu não sabia por que não resistira, por que quisera ser tão egoísta. Eu só conseguia me lembrar de seus pais, de como eles eram felizes e como eu amava isso. Só conseguia me lembrar do sorriso de Naruto brilhando sempre que me via, sempre que eu o deixava por perto. E mais do que isso, eu não lembrava de dor alguma. Nada doía, nada me trancafiava em poços escuros e horríveis. Porque seus longos dedos seguravam meus cabelos carinhosamente, porque seu corpo me aquecia naquele frio insistente, porque seus lábios eram macios e me acarinhavam. Porque apesar de não sermos um casal, apesar de eu não poder correspondê-lo e apesar de não merecer nada disso, nós estávamos nos beijando por egoísmo. Egoísmo em tudo isso. Egoísmo meu por saber que isso iria feri-lo; egoísmo meu por aproveitar esse momento de esquecimento e de leveza; egoísmo meu por ser estúpida o suficiente para não ter ideia do que sentir e ainda assim querer que aquilo acontecesse.

                Mas acontecia, seja por tais motivos ou não. Seus lábios tocavam os meus, se abraçavam apertado, enquanto nossas línguas dançavam e a respiração pesava como notas musicais. Eu lembrei de nossa primeira dança e eu repuxei o canto da boca num breve sorriso involuntário, que pausou levemente o contato, cuja recuperação fora ligeira pelos dentes de Naruto, puxando meu lábio inferior de volta para a coreografia. Sua carícia mudou o ritmo por um breve momento, enevoando meus pensamentos quando seus dedos apertaram-se nos meus cabelos e sua boca sugou o lábio mordido com uma força que me surpreendera. Ele respirou pesadamente e o soltou, afrouxando os dedos e voltando à dança suave de antes. Minhas mãos ficaram trêmulas em sua nuca e deslizaram para seu rosto, ao mesmo tempo em que ele passou a me beijar em toques apertados e entre pequenos intervalos, fazendo soar estalos mínimos. Naruto beijou minha boca, passou os lábios em um rastro manso para minha bochecha, minha testa e então meus dedos, que desceram por sua face.

                  Ele soltou um suspiro e enterrou a cabeça em meu ombro, abafando o som em meu cabelo. Meu coração pulsava dolorosamente e meu rosto ardia, queimava pelo contato. Eu abri os olhos, respirando devagar e enxerguei a lua iluminando os fios loiros e rebeldes que cobriam parte de minha bochecha. Levantei a mão, tocando-os, um pouco insegura pela forma sôfrega como ele respirava. Naruto soltou o ar de uma vez pela boca e levantou-se, apoiado nos braços de forma meio tensa. Seus olhos alcançaram os meus, o azul do mar agitado, parecia nostálgico, diferente de seu brilho alegre corriqueiro. Eu sustentei o olhar, ainda com os dedos trêmulos desajeitadamente tocando seus cabelos. Um sorriso pequeno nascia no canto de seus lábios sutilmente inchados e avermelhados e ele manteve o contato visual por uns segundos antes de uma gota do oceano escorrer daquela imensidão azul, em queda livre até minha bochecha. Molhou-me quente, deslizou com suavidade, era como uma chuva pura num terreno seco. Naruto fechou os olhos e saiu de cima de mim devagar, apenas para sentar-se com as pernas flexionadas ao meu lado. Seus braços apoiaram-se nos joelhos para que as mãos pudessem amparar a cabeça e ele ficou daquela forma por um tempo, até suspirar baixinho e, sem virar-se para trás, buscou meus dedos.

                   Eu me sentei perto e entrelacei nossas mãos num aperto leve, atenta ao fato de que ele havia chorado. Sua expressão facial, apesar disso, não era entristecida, era apenas… serena, pacífica, mas transpassava um cansaço sutil, embora aceito. Em geral, eu sabia como decifrá-lo muito bem, tanto as suas linguagens corporais quanto mesmo a cor de seus olhos para cada sentimento e momento. Já fazia parte de mim passar meu tempo lendo-o como se fosse o livro mais interessante do mundo. Não porque ele era a pessoal mais incrível que conhecia, e sim porque ele era a única pessoa que eu queria, de fato, conhecer. Cada minúsculo detalhe de sua essência nobre e singela. Entretanto, o garoto-homem que eu via à minha frente silenciava-se de uma forma indescritível. E diante da angústia crescente que isso fez nascer em mim, decidi puxar algum assunto, qualquer coisa que me pudesse proporcionar o entendimento.

    - Naruto? - sussurrei, incerta se deveria fazê-lo. Ele virou o rosto na minha direção e olhou intensamente dentro dos meus olhos, sereno, embora também sério. Parecia refletir sobre algo importante, como se estivesse espiralando em um impasse interno. Sua boca abriu, querendo dizer algo, mas seus olhos incertos tremiam nas órbitas, inundados por gotas duvidosas, buscando por todo o meu rosto. Sua mão apertou ao redor da minha, como um pedido literalmente palpável de ajuda, talvez para organizar as próprias ideias. Era estranho vê-lo perdido, trocando de papel comigo, sendo sua vez de não ter as respostas ou de não conseguir nem formular perguntas. Porém, pensar assim era um tipo de egoísmo ainda pior do que eu havia cometido anteriormente. Naruto não era um superherói, não era fictício, ele era uma pessoa real, sujeita a todos os tipos de coisas, sejam ruins ou boas, assim como eu. Tinha a mania terrível de exaltá-lo dessa forma, mas era errado. Era o mesmo que tirar dele o direito de ser humano, de errar, de sofrer, de chorar e bom… de amar.

          Um sentimento parecido com compaixão me tomou. Parecido porque era mais do que apenas isso, ultrapassava  esta singeleza, embora não minimizasse a sua carga. Eu me importava demais com cada feição feita por Naruto, lembrava de cada mínimo sorriso e implorava internamente todos os dias por minha dose particular de sua alegria. Por isso, quando ele desabou ao meu lado, segurando minha mão, senti que a gravidade me puxava junto. Um pedaço de mim caía junto com cada lágrima que rolava de seus lindos olhos. Os soluços ecoavam de seu choro, faziam o corpo encolhido tremer e impulsionar ondas de dor dentro de mim. O rosto dele estava apoiado em seu antebraço, que segurava as pernas compridas e incrivelmente, naquela posição, o fez parecer pequeno. Olhá-lo daquela forma me fez mergulhar outra vez dentro de minhas próprias memórias…

    flashback

               Doía. Era a única coisa que conseguia pensar enquanto me encolhia, frágil e fria. Era tão pequena, tão maleável e inocente, perdida em uma imensidão que não condizia com meu tamanho. Meu âmago estendia-se vasto em mim, queimando todas as barreiras de proteção enquanto aquela percepção me inundava. Tinha tantas vozes, tantas faces e tantas coisas nas entrelinhas da realidade… era atordoante. Me apavorava, porque eu não era capaz de compreender ou carregar esse saber. Mais uma vez eu olhava para o céu, sentada no gramado ligeiramente congelado, sentindo o mundo me engolir, sentindo meu próprio eu consumido por esse emaranhado, essa constelação ininterrupta… sequências desastrosas. Abracei minhas pernas e me segurei, perguntando-me por que eu ouvia tantas coisas, por que minha mente apenas não descansava? De quem era a voz pesada em meus sonhos à noite, clamando minha presença, imperativo sobre mim? E por que essa voz me deixava tão tonta, como se cada letra solta consumisse um pedaço da minha alma? Seria isso o que o mundo faz? Seríamos a refeição da natureza, em devolutiva carne, e também seria nossa alma o alimento, a moeda de troca do carma?

                  Mas qual era o meu preço? E a que preço eu pagaria? Eu era tão pequena... Não havia vivido nada, nem conhecido todas as possibilidades que poderia arquitetar para minha existência nesse planeta. Uma carreira, uma filosofia, um propósito. Nada. E no entanto, sentia como se todos os erros de reencarnações passadas estivessem nos meus ombros, pressionando-me contra o solo frio, enterrando-me viva no meu próprio eu. Era cruel… porque eu era só. Parecia não haver uma sequer pessoa que também fosse ouvinte como eu. Era como estar em outra sintonia, que só correspondia ao sinal do meu rádio e de mais ninguém. Imaginava se cada um tinha uma forma de pagar, se talvez uns pagariam mais tarde. Mas eu vinha sendo cobrada desde tão cedo, sem sequer poder escolher. A fraqueza que me margeava era inquebrável, um obstáculo que impedia aproximação, que isolava. Porque cada vez que eu me sentia feliz, cada vez que eu tentava dar um passo para longe dessa barreira, quando eu me tornava menos perceptiva, menos ouvinte e expectadora de coisas que só os meus sentidos reconheciam, eu tinha a impressão de que estava orbitando. Que todas as órbitas estavam realinhando. E esses momentos eram tão ilusórios, porque tudo no final voltava. Era o que eu mais sabia: a cada 360, um novo 360. E esse ciclo era interminável. O desespero da solidão, em meio a tantas pessoas, tantas vozes… uma única garota em duas realidades. O alívio do esquecimento, as vias obscuras de obtenção, a sensação de poeira sobre a pele, de sujeira na consciência. A surpresa pelo silêncio, a alegria pela paz adquirida, a esperança agarrada à beira do penhasco. A respiração normalizada. Oito horas de sono. Sem sonhos. E então… 360. O desespero. A solidão consumidora. Era interminável, irrevogável e eu era fraca.

                     Era por isso que eu precisava acabar com cada um desses quadrantes, destas etapas, destes dados e números. Porque eu não estaria nunca em órbita, não enquanto eu continuasse espiralando em direção a esse limbo. Eu sabia que seria um fardo ainda maior, porque faltavam três meses para que Hanabi chegasse e ela não merecia um buraco negro sugando toda a energia positiva do seu lar. Era um bebê, uma luz que vinha para salvar Akemi. Eu sentia. Hanabi era a compensação. O equilíbrio na balança, uma tranquilização, uma válvula de escape, um propósito. Era o que eu podia fazer por ela, talvez fosse isso o que as vozes queriam. Não havia nada para orbitar ali, porque eu tinha apagado todas as estrelas no céu.

                          E agora eu precisava me unir a essa escuridão.

    Flashback off

                         E no entanto, depois de espiralar infinitamente, quando Akemi e Hanabi se foram, alguma coisa mudou na balança. As vozes foram cedendo, as visões foram enfraquecendo, eu fora vagarosamente desacelerando. E não tinha entendido o porquê, não tinha compreendido uma razão, nem qualquer coisa que justificasse essa injustiça. Por que tudo mudara quando eu já não tinha para quem sorrir? A espiral não teria fim, porque não era a outra realidade que sugava-me em força centrípeta? Não… agora eu sabia, ao ver Naruto sentado na grama fria, abraçando as pernas e espiralando dentro de si mesmo. Mas o céu hoje tinha estrelas, porque eu não havia desacelerado para chegar ao fim, eu havia entrado em órbita.

                 Realinhada ao redor de Naruto. De sua força descomunal, de seu sorriso indestrutível, sua energia incomparável. Era o egoísmo doce que ele representava na minha frustrada idealização de merecimento, pendendo em compensação na balança. Sutilmente adentrando minha vida, como água em meus poros, enchendo-me de suas convicções, de suas memórias e saberes, de sua essência curandeira. Aos poucos, assim como o cair de seu corpo nos meus braços, de sua cabeça em meu colo, seus membros encolhidos na grama gélida e suas lágrimas quentes no tecido que cobria minhas pernas arrepiadas. Ele tinha os olhos fechados, o rosto encoberto por rastros arenosos de seu choro desafogado. Eu suguei o ar, sentindo todas as minhas terminações nervosas enlaçadas às dele. Que amigo era esse? Que ser agraciado… que humano lindo. Eu nunca poderia medir sua magnitude, por suas atitudes e pelo que elas representaram, no contexto inteiro, no processo de cura que, mesmo sem um pedido meu, ele tenha iniciado por conta própria. Nós havíamos escorregado um sobre o outro sem nem mesmo tomar nota disso. E agora estávamos embaraçados. Éramos um emaranhado.

                         Eu toquei sua bochecha com os dedos e ele abriu os olhos azuis, ligeiramente mais chamativos pela coloração avermelhada de seu globo ocular. Sua mão cobriu a minha, enquanto um suspiro pesado escapava. Ele se pôs a me fitar, dançando os olhos por todo o meu rosto, escorregando demoradamente nos lábios, mas sempre hipnotizados por maior tempo no par de pérolas, como chamava, agora inundadas por aquele oceano.

    - Eu não estava esperando por isso que estou vendo em seus olhos. - sussurrou. Sorri com o canto da boca, ciente de que deveria estar olhando-o com derretimento, extravasando toda minha gratidão e emoção.

    - Eu não estava esperando toda essa emoção também. Mas além disso, eu não esperava que fosse querer isso agora com tanta compreensão. – disse em resposta, baixinho, com a voz embargada. Ele ergueu uma mão e acariciou minha bochecha com os dedos delicados.

     - Dê uma chance para si mesma. Para fazer o que tem vontade, sem desencadear uma crise de ansiedade, sem sentir que tem culpa ou coisa do tipo. Não há nada pior do que apenas existir, Hinata, num corpo e alma vegetativos.

    Sua sugestão me fez suspirar, nostálgica, presa. Era exaustivo acompanhar essa rotina incessante de desgostos, decepções e culpas, mas havia uma necessidade crescente em mim, que gritava pelo salão vazio do meu âmago, ecoando em todas as direções. A última vez em que eu tomei uma decisão sobre minha vida, uma que de fato mudaria drasticamente, eu havia decidido por um caminho contrário. Agora eu estava prestes a decidir viver. Tinha uma alma maravilhosa dentro de um corpo radiante, que jazia deitado em meus braços, a mercê de meus quereres, puramente por livre e espontânea vontade – e decisão – portanto eu sabia, em definitivo, que ao menos eu deveria começar a pagar minha dívida fazendo-o sofrer menos.

    Naruto tinha razão sobre dar uma chance. Não exatamente para mim, porque eu duvidava que conseguiria fazer algo por mim, não ainda. Mas uma chance de conseguir fazer alguma coisa feliz por outra vida, o que eu deveria ter feito melhor por minha mãe, por Hanabi. Além disso, tinha sim uma boa parcela de desejo em minhas intenções, acho que de forma involuntária, porque era impossível não gostar disso, não sentir essa paz e esse carinho. Apesar de tudo, eu ainda era uma frágil e comum humana, afinal.

    O meu silêncio era pacífico também, mesmo que ele estivesse esperando ouvir alguma coisa. Eu o espiei, ponderando e Naruto soltou um riso gutural, enquanto um olhar sapeca tomava seu rosto arenoso recém coberto por lágrimas.

    - Vejo sua luta aí dentro. Eu posso te ensinar isso também, baixinha. – brincou, lançando uma piscadela. Balancei a cabeça, um sorriso dançando em meus lábios.

    - Acho que eu te nocautearia de tanto rir do quão desajeitada eu consigo ser em atividades esportivas. – respondi.

    Ele riu, ajeitando-se em meu colo, esticando as pernas na grama gelada e alongando-se, animado de repente.

    - Você já me nocauteou há muito tempo, senhorita Hyuuga. Minhas bochechas enrubesceram e ele achou mais graça disso ainda.  – Você devia ver como fica linda assim. – seu elogio potencializou a reação e ele alargou o sorriso branco, fazendo pequenas linhas de expressão diminuírem seus olhos.

    - Há um minuto atrás estava todo chorão e agora está aí tirando sarro da minha cara. – alfinetei de brincadeira, fingindo indignação, infelizmente muito mal.

    Ele gargalhou.

    - É verdade, você me pegou. – disse, divertindo-se. Eu encolhi os ombros, porque lembrei do fato triste que o levara a perder o controle de suas emoções. Naruto era muito feliz, alegre e agitado, não era como se ele não tivesse direito de chorar, mas como se ele mesmo não quisesse perder tempo com isso. Entretanto, era justamente esse o motivo que me levara a tornar-me tão antitética, por mudar o rumo de minhas decisões e tentar fazê-lo feliz pelo o que ele queria, não pelo o que eu achava que ele precisava.

    - Por que chorar por mim...? Não chore assim, ok? Eu não sei como proceder, não consigo suportar a dor estampada no seu rosto. – extravasei, suspirando. O olhar melancólico dele me fez crer que ele ainda imaginava que eu fugiria. Mas o medo de mostrar-lhe que eu ia tentar me fazia beirar um precipício enorme. Havia uma infinidade de coisas envolvidas e, além disso, eu não tinha ideia de como dar o que ele queria.

    - Porque eu me sinto... um peso. Acho que em circunstâncias normais da vida, eu ficaria magoado contigo. Triste, nervoso, provavelmente perderia a esperança e ficaria um bom tempo sem me apegar em outra pessoa novamente. Já... já aconteceu antes. Mas é que quando se trata de você, não existe fim pra minha disposição. É literalmente como se nossas vidas nunca estiveram desprendidas e como se fosse impossível fazê-lo. Então quando eu me vejo transbordando minhas emoções por você, me sinto um peso. E isso me machuca, porque eu queria que você soubesse o quanto podia ser leve.

    Sua confissão me trouxe uma agonia crescente. Quase o interrompi, pois soava absurdo além da conta ele se sentir um peso. Por Deus, não havia nada que o fizesse ser um peso. Balancei a cabeça em negativo, descrente e dolorosa. A expressão em seu rosto era séria demais, profunda e honesta. Senti uma vertigem estranha, causada, provavelmente, por quão grande a sinceridade do amor dele podia ser. Como ele podia se sentir mal por não poder me dar algo, quando quem esteve fazendo tudo fora sempre ele?

    - Não existe nada no mundo que te torne um peso na minha vida, Naruto. Sem chances! – respondi, quase sibilando, estava nervosa demais.

    Ele suspirou e seu queixo tremeu, o maxilar ficou rígido e eu li a tristeza voltando aos seus olhos.

    - Não posso te cobrar nada, Hinata, eu prometo que vou ser mais forte, é sério. Não é você quem tem que me consolar, não tenho nada para ser consolado. Estou sendo egoísta.

    Eu me desesperei, expirando e tremendo os dedos.

    - Não! – exclamei, sem ar. – Não se diminua assim, não se sinta mal desse jeito. Seja egoísta, seja muito egoísta, grite seus problemas, reclame, explore suas mágoas, deixe-as sair de dentro de você, extravase suas vontades, sei lá, mas não se reprima assim por minha causa. Não faça isso, Naruto. Viva! Por favor, viva. Eu estou aqui, não vou sair, eu vou tentar, eu vou...

    As palavras saíram num suspiro pesado, na falta de ar que toda aquela aglomeração de nervosismo causara. Tinha exposto meu novo plano, tinha lhe dado a passagem livre, porque agora ainda mais do antes, era hora de mudar essa conexão desajeitada que tínhamos. Precisava tomar um gole de coragem, de vergonha na cara e de iniciativa. Não dava mais para usá-lo assim, à toda hora, ao meu dispor, como um escravo de minhas vontades e dos próprios sentimentos. Estava absurdamente errado e era minha culpa.

    Os olhos azuis tremiam, me olhavam num misto de descrença e melancolia recente. Eu segurei sua mão de forma apertada, sentindo um nó subir e travar minha garganta tão fortemente que quase pensei ser irrevogável. Mas é claro que minha decisão tinha consequências, e uma delas era contornar uma família inteira de Sasaki nervosos e impiedosos.

    - Eu só... não sei o que vou fazer com Hiashi... – sussurrei, entrelaçando nossos dedos. Naruto abriu a boca, querendo dizer, mas nada saía.  – Ainda preciso buscar um jeito de fazer com que ele esteja seguro comigo, talvez assim ele esqueça essa rivalidade comercial estúpida.

    - Hinata. – ele chamou enfim, com a foz um pouco rouca. Eu o encarei em expectativa e nervosismo aparentes. – Você está... dizendo que não vai mais evitar nosso relacionamento, quer dizer... você vai ficar comigo? – a descrença em sua voz seria cômica se eu não estivesse começando, em pleno frio canadense, a suar nas mãos. Assenti, mordendo o lábio inferior, sentindo como se a gravidade estivesse me forçando a enterrar no chão e sumir para sempre. Ele expirou de um jeito engraçado, quase risonho e agarrou minhas duas mãos. – Que se dane o Hiashi, a empresa, sua irmã, todo mundo. Se você diz que vai ficar, ninguém pode impedir. Ah, porra... Hinata?!

    A agitação dele me fez estremecer, ainda mais ansiosa. Eu o olhei, esperando que falasse tudo, que derramasse toda sua chuva de sentimentos sobre a minha cabeça e que se sentisse melhor. Ele estava atrapalhado, a descrença transformando-se em empolgação, tirando o brilho molhado de seus olhos, trocando de cena, como se de repente eu tivesse saído da tempestade e encontrado um novo cenário ensolarado.

    - Pode dizer... – permiti, encolhendo os ombros, sentindo o medo me comer pelas beiradas. O sorriso dele alargou-se de um jeito estonteante, rasgando o rosto todo, quase fechando os olhos. Seu peito parou de subir e descer tão ligeiro, o ar parecia ter voltado aos seus pulmões e a serenidade de sua expressão, por mais risonha que fosse, me transmitiu a certeza de uma decisão que não lhe presenteava com nada além da mais pura paz. Eu o invejei ao mesmo tempo em que sua boca descarregou a necessidade latente em seu âmago.

    - Por Deus, garota, vem namorar comigo?

    Havia um sacolejar inquietante nas paredes de meu estômago, como se o órgão caísse em espiral. O nó em minha garganta ficou mais apertado ainda, mas nada se comparava ao calor que subiu pelo meu corpo, concentrado no peito que batia desgovernado e surpreso, incrédulo de que a decisão estava concretizada, mas absurdamente levada para um lado que eu não havia, de fato, botado em letras numa frase. Agora eu estava diante das consequências como uma gazela indefesa, mas sentindo-me, inesperada e irracionalmente como um leão. E só havia uma coisa passando pela minha cabeça, levada pelas ondas da empolgação, remexida pelo tremeluzir do nervosismo e transtornada pela ansiedade: uma única reação plausível e alcançável diante do meu corpo externamente paralisado, mas internamente em desconstrução caótica.

    No meio disso tudo, ah meu Deus, eu sorri. 


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