Carmesim

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    18
    Capítulos:

    Capítulo 11

    Hiruiseki

    Álcool, Estupro, Hentai, Heterossexualidade, Linguagem Imprópria, Mutilação, Nudez, Sexo, Violência

    Ningenkai, templo Kasane

    Em pé num galho de uma árvore, uma figura contemplava uma bola de cristal num ar concentrado. Ele foi incumbido de uma tarefa e esperava uma chance de agir. Entretanto, isso estava se provando cada vez problemático. Sem contar da ânsia que sentia a cada vez que lembrava do rastro do cheiro doce, olhando a dona pelo objeto que sustentava na mão.

    Tanto o youkai do fogo como a shinigami mantinham o contato visual sem dizer nada. O mero silêncio era cômodo e desconcertante para os dois. Contudo, observá-los assim o corroía de inveja e raiva. Alimentados pelo simples fato de que Hiei pudesse estar ali, quando outros mal podiam se aproximar dos muros do templo!

    Relanceou o olhar para baixo, encontrando ao pé da árvore dois corpos de demônios decapitados. Pelo ar de choque nos seus rostos nem viram de onde veio o ataque. Voltou a observar o cristal em sua palma, engolindo em seco. Sua atenção focada para o demônio Classe S.

    Kiri não havia dito sobre a ligação da garota com Hiei.

    BOTAN POV

    Ao ouvir aquilo, quase que lhe dei uma boa resposta, no entanto, minha voz sumiu. Não... Para ser sincera perdi a coragem quando lembrei o que aconteceu ontem. Ele teve uma boa oportunidade de me fazer mal e invés disso me ajudou. Hiei percebeu a mudança na minha fisionomia. O ar debochado de seus olhos sumiu ficando neutro e de nervosa me acanhei. Sentindo minhas bochechas esquentarem.

    - Obrigado – hesitei um pouco desviando o olhar, envergonhada – Por ter me ajudado ontem.  Eu estava sozinha e apesar de ter me comportado daquele jeito, você...

    - Não precisa me agradecer, mulher.

    - Mas...

    - Apenas te fiz um favor – então seu olhar ganhou um leve brilho presunçoso -, que futuramente irei cobrar.

    Arfei chocada. A imagem boa que construía dele se quebrou. Agiu de caso pensado. Imbecil. Era bom demais pra ser verdade. O pior era que me sentia uma idiota por corar ainda pouco.

    - O que realmente veio fazer aqui?

    Estava pra lá de irritada. Contudo, ele perdeu todo o ar malicioso assumindo uma expressão neutra.

    - Quero confirmar uma coisa.

    Num borrão ele sumiu da janela. Mal me virei o procurando e um estalo ecoou surdo no instante que meu quarto caiu em sombras.

    Meu pulso acelerou em desespero. Mesmo na penumbra o escuro me deixou em pânico. Girei na direção onde ficava o interruptor e arquejei sem ar, perdendo as forças nas pernas. Um par de luzes vermelhas me encarava. Meu coração martelou, as mãos gelando de medo. Aos tropeços recuei tentando me afastar.

    - Na..não

    - Então é verdade.

    Arfei espantada. A voz me “acordou”, no entanto, não conseguia me acalmar.

    - Hiei! Acenda a luz, por favor!

    Ele apenas me ignorou. Caminhando até mim seus passos soaram cautelosos e estremeci mais forte, assistindo-o me rodear, me encurralando.

    - Fique calma. Ainda sou eu.

    Dando mais um passo entrou na faixa de luar. Ao ver seu rosto expirei forte de alivio. Tanto que minhas pernas trêmulas cederam. Caí sentada na cama atrás de mim ofegando mais sossegada. Acho que empalideci, pelo jorro de sangue fugindo do meu rosto.

    - Por.. Por que fez isso?

    Sem deixar de me observar ele rápido ligou as luzes do quarto e puxou uma cadeira, sentando diante de mim. Tinha a impressão que estava hesitando, mas suspirou afundando as mãos nos bolsos da calça.

    - Soube o que aconteceu na fortaleza.

    Parei de respirar, empalidecendo outra vez. Seu olhar ficou mais concentrado confirmando o que quer que seja. Um misto de vergonha e nojo me apossou. Não agüentei encará-lo, desviei o olhar para minhas pernas retraindo o corpo ao lagrimar. Eu não queria chorar, não queria lembrar. Mas foi inútil, logo meus olhos inundaram e me senti mais suja ainda.

    - Por que esse desgosto próprio?

    Ele tinha que ser tão insensível? Limpando as bochechas, procurei me controlar, mas até falar seria difícil.

    - Eu.. Não queria... – então lembrei de algo mais importante – Al.. alguém mais sabe?

    - Não.

    Pelo menos isso era bom. Passado uns minutos, o silêncio se tornou desconfortável.

    Ondas de tremor me percorriam e tentei parar de chorar soluçando reprimida. Um mal estar me tomava tão forte por dentro. Achei que... se ele soubesse me sentiria melhor, mas teve o efeito contrario. Lembrava a cada vez que o chamava, implorando que me ouvisse e me tirasse deles. Os arrancasse de cima de mim. Mas Hiei não me ouviu, como aquele youkai que começou essa tortura me disse.

    Eles foram cruéis ao ponto de irem cada um por vez. Era... tanta dor...

    - Você quer esquecer?

    - Como?

    Levantei o olhar. Sua pergunta me arrancou dos pensamentos. Sem alterar se expressão ele piscou calmo, me explicando.

    - Posso apagar as lembranças.

    Sem ar entendi do que estava falando. O Jagan... Ele estava se oferecendo para tirar as memórias do que sofri. Eu queria muito isso, queria tanto. Pararia de ter pesadelos, deixaria de ficar assustada quando um homem se aproximasse de mim, principalmente meus amigos que eram Youkais, mas...

    - Obrigada, mas meu corpo com certeza ainda vai se lembrar.

    Ouvi um suspiro enfadado. Parecia que ele já esperava que eu recusaria. Confusa o fitei em tempo de se levantar da cadeira, caminhando até mim. A marca ardeu com a aproximação, mas não me assustou. Curiosa o vi enfiar a mão na gola da camisa negra, puxando um cordão prateado. Sem mais Hiei o tirou do pescoço.

    - Fique com isso.

    Segurando minha mão ele a puxou para si e me arrepiei com o toque. A palma era quente e áspera, mas a maneira que seus dedos abriram os meus era calma, sem a menor força. Demorei em notar que havia colocado algo nela, uma bolinha fria e pequena. Piscando confusa e envergonhada baixei o olhar e prendi o fôlego. A pérola azulada brilhava pálida nessa meia luz.

    - M..m..mas isso é...!

    - Se sabe então não precisa ficar gaguejando.

    Hã?! O encarei ofendida e ele me observava entediado. Essa expressão quase me tirou do serio quando vi a maneira real como estavam seus olhos. Eles brilhavam, o carmesim mais intenso e febril.

    Minha boca ressecou.

    - A pedra Hirui tem um poder estranho. – seus olhos abaixaram, fitando a pérola azul em minha mão – Eu costumava ficar olhando para ela por muito tempo. Trazia uma sensação de paz.

    Prendi a respiração surpresa. Hiei voltou a me encarar, sério ao ver minha cara de espanto.

    - O que foi?

    - Na...nada.

    Procurei um canto, uma coisa mais interessante para observar no meu quarto do que o Youkai em minha frente. Sinceramente, essa visita de Hiei no meio da noite era estranha. Essa conversa era estranha e ainda a maneira dele se comportar comigo era estranha! Pareciam aqueles doramas que assisto com a Yukina. Só faltava agora ele segurar meu queixo e...

    Meu rosto pegou fogo.

    - E agora? O que você tem mulher idiota?

    - N..na..nada.

    - Humpf. Só sabe dizer isso?

    Kami. Meu coração disparou louco. Parecia que pularia do peito. Para completar meu estômago vazio se agitava. Era uma sensação engraçada, sentia varias borboletas batendo dentro dele, mas não gostei. Me deixava nervosa, minhas palmas suavam e parecia que toda minha pele se arrepiava a cada respiração dele de tão sensível que estava. O que raios é isso?!

    - Não mostre a ninguém.

    - O que?

    O olhei e Hiei me fitava apático. A falta daquele brilho febril no seu olhar me desanimou. Meus ombros cederam e pelo visto, ele nem se importou ou mais provavelmente, nem notou.

    - A pedra Hirui.

    Ah!

    - Você tá preocupado que os meninos vejam comigo?

    Estremecendo de raiva ele se afastou de repente. Engoli em seco. Por que fui abrir minha boca?

    - Ouça garota. Não me faça arrepender de te ajudar.

    Arregalei os olhos em pânico e vendo, esboçou um sorriso de canto. Malicioso e cínico.

    - Ótimo.

    Se virando ele seguiu direto para a janela. As cortinas esvoaçavam com a brisa. Não sei o que me deu, mas engatinhei apressada no colchão, levantando desajeitada enquanto ele ia embora.

    - Espera Hiei.

    Ele parou sem se virar. Nem acredito!

    - O que foi?

    - Por que está me dando? Essa não é lembrança...

    - Não seja estúpida. – olhou sobre ombro tão desinteressado. Cara esquisito. – Não é um presente, estou emprestando a você.

    Justo nesse instante, minha porta se abre dando passagem para Hinageshi.

    - Botan. Eu fiz oden pro jantar. Você...

    A bandeja caiu quando ela viu Hiei parado bem diante da janela. Os olhos esmeralda aumentaram de choque e antes que interviesse ela soltou um berro. Materializando seu remo ao se colocar diante de mim.

    Tudo o que Hiei foi apenas levantar a sobrancelha.

    - M..mas o que ele tá fazendo aqui?!

    - Eu não sei.

    Não queria dizer sobre nossa conversa. Rápido escondi a pérola de lágrima na palma, enquanto Hinageshi ficava mais histérica.

    - Botan, ele é um demônio! – apontou o remo para ele - Você é um demônio!

    - Isso é óbvio.

    Assumindo um ar cínico, a observou atravessado. Hinageshi estremecia demais.

    - Como conseguiu entrar aqui? As barreiras que eu coloquei são fortíssimas. Elas repelem qualquer youkai que quer machucar a Botan!

    Um momento de silêncio se estendeu. A tensão suspensa no ar. Hiei a fitava entediado até Hinageshi engolir o fôlego. O remo caiu num baque sonoro enquanto que o tédio se evidenciou mais no rosto dele.

    - Não é possível.

    - Acredite no que quiser.

    Senti que estava perdendo alguma coisa. Eles se encaram sem desviar o olhar um do outro. Hinageshi o olhava assombrada e Hiei devolvia enfadado. Passado um longo minuto, ela sussurrou pálida.

    - Como?

    - Do que estão falando? Hinageshi?

    A olhei aflita e ainda encarando Hiei ela me explicou.

    - To..todos os youkais machos sentem uma atração irresistível pelo sacrifício do rei Emmah. O instinto de acasalar clama mais alto que qualquer outro, como se fosse a temporada para os demônios. Só alguns não se afetam, mas... Mas ele...

    - Eu também não sei.

    Me olhando de soslaio, Hiei me sondou num ar estranho. Causando arrepios na minha pele.

    - Mas você não é marcado com fêmea alguma.

    Seus olhos voltaram para Hinageshi, endurecendo num ar feroz.

    Isso não é da sua conta.

    Caramba, ele não disse. Mas sua expressão demonstrava claramente isso. Eu tinha que fazer alguma coisa. Essa tensão pareceria se quebrar a qualquer e do pior jeito possível.

    - Olhe Hinageshi, está tudo bem. Ele já vai embora, não é?

    O fitei para confirmar, mas Hiei apenas fez um som enfadado virando o rosto. Porem, ele me parecia estranho. Seus olhos tremiam, como se esforçasse em mantê-los abertos.

    - Tem certeza?

    Mordi o lábio nervosa. Essa desconfiança toda dela o estava irritando. Eu sinto isso.

    - Claro. Deixe que eu limpo aqui.

    Ainda enviando olhares cautelosos para ele, Hinageshi saiu desmaterializando seu remo e ficamos sozinhos outra vez. Soltei o ar mais aliviada catando a louça quebrada no chão.

    - Desculpa. Ela é muito preocupada comigo.

    - Se nota como age.

    Franzi a testa. Que tom sonolento é esse? O olhei sobre o ombro confusa, em tempo de um tremor o percorrer inteiro. Larguei tudo no chão outra vez, indo até ele.

    - Hiei, o que você tem?

    - Não é nada.

    Se afastou um passo, mas mesmo assim insisti.

    - Como não? Você tá pálido.

    Tentei verificar sua nuca, se estava gelada e rápido meu pulso foi agarrado. A marca ardeu mais forte. No entanto, de tão perto assim vi realmente que tinha algo estranho nele. O olhar exausto, o tremor o percorrendo num espasmo..Além disso, é uma cicatriz na sua bochecha?

    - Você lutou?

    - Não.

    Quase sorrir. A negação foi tão forte que soou uma mentira. Mas ele percebeu. Arfando estreitou o olhar irritado.

    - Do que... está sorrindo... sua... tola?

    Mal ouvi a ultima palavra. Não se agüentando mais em pé ele caiu para trás me levando junto. Prendi um grito ao desabar em cima dele, sentado no chão. A parede o impediu nos fazendo escorregar e acabei com o rosto enterrado no seu peito. O rubor me subiu forte e rápido me afastei nervosa.

    - Des..desculpa. Eu não queria. Foi sem querer. Você está bem, não é? Não se machucou.

    Levantei o olhar me surpreendendo. Ele está dormindo! Piscando cheguei mais perto observando melhor. A respiração leve, a expressão relaxada. O toquei no rosto, mas nem se mexeu. Incrível! Até meu pulso que agarrava ele o soltou. De gatinhas entre suas pernas o fitei mais tempinho. Distraída com seu rosto adormecido. Era... tão diferente. Parecia mais acessível com esse ar tranquilo. O que será que ele fez para ficar tão exausto assim? Além disso, o observando assim suspirei sem querer, a sensação de quentura e revoadas no estômago me confundindo.

    - Ele é mesmo bonito.

    - Botan?

    Dei um pulo.

    - Já, já vou.

    Rápido me levantei, saindo de perto e peguei as louças quebradas do jantar. Ao sair do quarto torci que não estivesse com as bochechas coradas. Estava com vergonha, principalmente porque não entendi o motivo de me sentir assim.

    Droga.

    ~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~*~

    Não sei quando dormir depois do jantar. Deitada na cama encarei o demônio ainda adormecido e aos poucos a sonolência me veio, e com ela o pesadelo. Tão forte e confuso. Meus gritos misturados os gemidos e os xingamentos. Quando percebi, sentei no colchão. Suando frio com o coração acelerado.

    Arquejando, encarei o vazio até enxergar normalmente. Meu quarto ainda estava na penumbra, mesmo assim não conseguia parar de tremer. Ainda por cima chorar. Engoli em seco, tentando me acalmar, mas era difícil. Eu... eu tinha muito medo. Observei mais em volta até encontrar uma figura de preto sentada no chão. Meu pulso acelerado disparou.

    Hiei.

    Ele ainda estava aqui.

    Sem pensar direito, levantei da cama agarrada ao lençol e caminhei até onde estava. Parada diante dele tive um pouco de receio. Será que ficaria bravo? Isso é invasão de espaço, não é? Mas... eu não conseguia dormir e além disso, ele também estava dormindo. Não é como se estivesse incomodando.

    Mordi o lábio.

    Quem eu quero enganar? Hiei cortaria meu pescoço se fizesse isso, contudo... Aquilo, eu não quero reviver se fechasse os olhos. Criando coragem, me abaixei devagar até ficar ajoelhada entre suas pernas. Meu coração martelava seco na garganta e engatinhei me aproximando timidamente, vigiando o todo tempo se continuava adormecido.

    Ao ficar tão próxima assim dele, baixei o olhar para a gola de sua camisa antes que me envergonhasse outra vez. Afinal, seu rosto relaxado era totalmente diferente de quando estava acordado. Engoli em seco e bem devagar me virei de lado ao sentar entre suas pernas, rezando que não estivesse fazendo barulho algum. Agora vem a parte mais embaraçosa. Tensa e nervosa me reclinei bem devagar, sem movimentos bruscos até meu braço encontrar o peitoral sob a camisa. Parei de respirar, esperando Hiei se mexer. Nunca segundos foram tão longos pra mim.

    Contudo, ele continuou quieto. Soltei o ar mais aliviada e larguei meu peso sobre ele, relaxando completamente. Soprando em meu rosto, a respiração calma balançava leve minha franja. Igual quando despertei do desmaio no templo da mestra Genkai.

    O corpo dele é quente mesmo e tem um cheiro tão curioso. Calmante. Fazia meus olhos pesarem como se estivesse caindo num torpor. Me aninhei mais nele e ouvi um suspiro profundo. Isso me causou uma sensação gostosa na pele, esquentando meu peito...

    - O que está fazendo?

    Arregalei os olhos, agarrando sem querer a blusa dele. Isso.. Isso não pode ta acontecendo, certo? Eu... Eu imaginei essa voz. Antes que me mexesse, uma respiração banhou minha orelha, deixando hiper sensível com o gesto.

    - Eu te fiz uma pergunta, mulher.

    Se antes o nervosismo era grande agora definitivamente a tensão tomou conta de mim. Acabei acordando-o do mesmo! Desconcertada por ser pega no flagra, não pude me mexer, nem virar o rosto para fita-lo. Minha pele ardia sob seu olhar. A tranqüilidade que senti há uns segundos se perdeu. Contra vontade tremores me percorriam, com medo dele me afastar pra longe.

    Se eu disser a verdade, ele ia entender, não é? Afinal, ainda não fez movimento algum, me empurrando de perto.

    - E..eu tive um pesadelo.

    - O que eu tenho haver com isso?

    A aflição me tomou.

    - Por... Por favor, Hiei. Não consigo dormir sozinha, então... Achei que não teria problema se...

    Estremeci ainda mais, retraindo o corpo para perto do dele. Hiei não disse nada. Apenas continuou me olhando analítico, bem considerando o quanto sou boba e idiota, como sempre me chama. O silêncio aqui dentro era ensurdecedor, mesmo ao som dos galhos lá fora no bosque balançando no sabor do vento. Ele vai me enxotar daqui.

    Suspirando fundo, o ondular do seu peito me distraiu um segundo antes da ordem.

    - Durma.

    Arregalei os olhos. Entendi bem?

    - O.. o que?

    - Você me entendeu.

    Se recostando melhor na parede, ele esticou uma perna debaixo das minhas enquanto o braço direito escorregou pelas minhas costas, subindo ao descansar sobre o joelho da outra perna levantada. Meu coração guinou espantado. Por um momento, achei que fosse me abraçar.

    - Só não se mexa tanto.

    - H..hai.

    Suspirando sonolento, ele se reclinou de um modo que as abas do casaco me encobriram um pouco. O súbito aumento de calor diminuiu meus tremores, distanciando da sensação de desespero que eu sentia. Nem havia percebido que estava tão gelada. Relaxada, me ajeitei melhor apoiando a cabeça no seu ombro e virei o rosto ao enterrar no seu pescoço.

    Hiei ficou tenso num instante e me xinguei. Achei que tinha voltado a dormir.

    - Desculpa.

    - Para alguém apavorado com demônios, está bem acomodada nos braços de um.

    Arquejei chocada. O tom dele tinha um quê de malícia queimando meu rosto de embaraço. Eu tinha que sair da situação, mas me sentia tão melhor aqui, junto dele e esse calor. Meu rosto apenas corou mais enquanto fechei mais os dedos na camisa dele.

    - É diferente. – que vergonha, por que ele tinha que dizer aquilo? -, eu...

    - Não precisa explicar. Apenas durma.

    Emudeci. Surpresa ao entender. Ele sabia e mesmo assim me deixou ficar aqui. A pérola de lágrima escondida dentro da minha blusa me deu a impressão de pesar de repente, aumentando essa consciência de consideração, do real efeito que sua presença tinha.

    Era como se ele tivesse me dito: “estarei aqui” . Finalmente pude me acalmar e fechei os olhos tranqüila.

    BOTAN POF

    HIEI POV

    Uma energia estranha me acordou. Abri os olhos, fitando o vazio tentando sondar quem era. O youki de nível considerável, rondando as cercanias das barreiras espirituais desse templo. Mas não era Kiri. Maldito. Depois de largar Egar morto no salão que destruí, recuperei minha katana e fui até meus aposentados na fortaleza.

    Quem me encontrava nos corredores estremecia horrorizado e com razão. Minha aparência sangrenta e fria era de alguém que saiu de um campo de batalha. Eu irradiava morte e evitavam até fazer contato visual. Ainda mais sem o talismã que lacrava o dragão negro das chamas mortais em meu braço.

    A tatuagem voltava a surgir já que usei o ataque somente uma vez. Porem foi imprudência demais. Ao procurar Kiri descobri que havia três dias que esse cretino não aparecia na fortaleza. Meu sangue ferveu. Ainda mais de ódio. Foi a mesma época do ataque no santuário. Apertei mais o braço, segurando firme algo macio e quente. Não dei importância do que era, tentava controlar essa raiva.

    Ele ainda a queria. Só poderia ser.

    Antes disto eu o mato. Não irá conseguir escapar dessa vez. Saber seu alvo era uma vantagem, mas não havia percebido o quanto de youki havia gastado hoje. Alias, sequer dormi. Não foi um espanto eu cair quase desmaiado de cansaço. O pior que foi diante da onna. Espero que não tenha feito um escândalo.

    Foi somente nesse instante que me dei conta do peso sobre mim. Lembrando de momentos atrás. Virei o rosto discretamente, baixando o olhar até onde meu braço estava. No susto de acordar de repente, enlacei a cintura dela. Firme o suficiente para a garota acordar, mas ela sequer se mexia. Intrigado, olhei melhor seu rosto, encontrando o que já suspeitava.

    Rastro de lágrimas.

    Ela deve ter sonhado com o ataque. Não... Pelo comportamento é bem provável que sempre tenha pesadelos sobre isso. Deve ser esse o motivo por não ter acordado ontem quando mexi em suas memórias. Por algum motivo, isso me perturbou e desviei o olhar. Sentir culpa não era do meu feitio. Lidar com isso era completamente estranho pra mim.

    Sinceramente, por que razão eu entrei nesse quarto? De onde estava na floresta seria o suficiente para vigia-la. Sem contar que ouvi a conversa toda com a outra shinigami disfarçada de miko. A menção da falta de youki no estigma de sua perna atraiu meu interesse. Quando a shinigami ruiva cogitou o assassinato do canalha sorri satisfeito. O espanto da onna apenas me divertiu mais. Ao dar por mim entrei pela janela, me acomodando na mesma. Esperando a garota notar minha presença.

    Excitação e algo a mais. Ao me agradecer um espasmo estranho me percorreu por dentro. Acho... Que queria contar do que fiz. Saber como reagiria.

    Tolice, não teria serventia alguma. Apenas mencionei que soube do que lhe aconteceu e a onna empalideceu em segundos. Ainda mais quando confirmei seu pior medo. O brilho vermelho de olhos na escuridão.

    Olhos de youkais.

    E a tola ainda recusou a retirada dessa memória. Em parte, detesto admitir que ela tem razão. Em algum momento iria acabar retornando e o gatilho poderia ser esse brilho escarlate. Contudo, ainda estava confuso com algo. Nesse cômodo coberto na penumbra eu devia representar uma ameaça para ela no momento em que acordou.

    Sua voz balbuciando ao me chamar no pesadelo foi o suficiente para me despertar. Contudo, fiquei quieto. Se a encarasse seria pior como foi ontem quando invadi aqui. Mas invés de fugir ela procurou “abrigo” em mim, literalmente.

    Essa mulher me surpreende cada vez mais.

    Segurando um sorriso procurei dormir. Ignorando o efeito que essa atitude dela me causava.


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