Bom, lá vai... OLÁ MINHAS AMORAS!
Eu sei que estive sumida e que maltratei seus corações com tanto suspense, mas eu voltei. Durante minha viagem, poucos foram os lugares e o tempo em que tive internet e disponibilidade para entrar aqui, responder comentários (lidos e lindos) e também para postar. Mas nos momentos livres, eu escrevi, reescrevi e escrevi de novo este capítulo. Sem sombra de dúvida, este foi o capítulo mais difícil de escrever. Não porque eu não tinha tempo ou qualquer outra coisa, mas porque eu sabia a gigantesca expectativa que existia sobre ele, não só de vocês, mas minha também. Imagino que cada um de vocês tenha idealizado de um jeito, assim como eu, então foi muito complicado me decidir o que deixar e o que tirar, como dizer e principalmente, como narrar. Perguntei pra uma amiga (que também é leitora) se ela achava que eu deveria narrar a visão de um ou de ambos, tentei escrever visto apenas por um, mas no final, não deu. É por isso que, no capítulo de hoje, a primeira parte é narrada em terceira pessoa. Ou melhor, é narrada por dois corações. Hoje eu também não coloquei trilha sonora para vocês, porque também imaginei que se tratava de algo delicado demais e íntimo demais. Não quero recomendar à vocês como se sentir durante a leitura, não desta vez. Portanto, coloquem para ouvir o que mais desperta em vocês AMOR, NOSTALGIA e TRISTEZA, ao mesmo tempo. Se quiserem, é claro. Além deste recado, amorinhas, eu queria dizer que estou muito feliz pela recepção de vocês, mesmo que eu não possa responder, eu leio cada um dos comentários e me emociono sempre, porque me sinto tão próxima! Recebi comentários em que juravam lealdade às minhas autorias e isso... oh, fuck, isso é maravilhoso. Então muito obrigada, de coração, por todos os favoritos e por todos os comentários lindos e cheios de carinho. Espero que tenham uma boa leitura e que eu corresponda, mais uma vez, às suas expectativas. Nas notas finais falarei um pouco sobre o capítulo também, então leiam por favor. Perdão pela enorme nota e até breve! Beijos estalados em cada bochechinha!
Narração em terceira pessoa
O som daquelas três últimas palavras ressoou pelo pequeno jardim. O sol estava se pondo à frente da cabeça dos dois jovens e a natureza quase saudou o garoto por sua bravura. Porque até mesmo o sol sabia que a luz em ambos só poderia brilhar enquanto estivessem juntos. Mas o silêncio que se instalou em seguida foi como gelo ácido no sangue quente de Naruto. E por um momento, só o que ele queria era recuperar esse calor.
Hinata tinha os olhos esbugalhados, descrentes e úmidos. O pesado significado da frase proferida a esmagou, deixou-a totalmente exposta e petrificada. Mas ele não se importava mais, era iminente, tal como o que iria fazer. E por isso não se permitiu pensar muito. Só havia uma chance e ele a agarraria.
- Me perdoe. – ele sussurrou, um segundo antes de aproximar-se e colar ambas as testas, encarando-a em meio ao oceano que ameaçava desabar de seus olhos. Sentia a face dela lhe atrair como imã, fazendo sua respiração pesar e se misturar à de Hinata. A garota sentiu o coração saltar pelo gesto, numa sensação enérgica que lhe percorria o corpo de forma inexplicável, tentando, no fundo, entender o que estava acontecendo. Mas ele só queria lhe provar, lhe entregar um pouco do que o consumia tão ardentemente. Fechou os olhos e pôde senti-la ofegar a milímetros de sua boca. Não suportou. E enfim chocou-se em seus paradoxos, segurando o delicado rosto e emaranhando os dedos nos cabelos púrpuros. Acariciou a pele macia, com o corpo trêmulo e todos os muros demolidos frente a ela. Devagar, Naruto decidiu cair também em seus lábios, tocando-os pelo o que seria, para ele, o único lugar onde queria estar.
E pela primeira vez, ele a estava beijando.
E pela primeira vez, Hinata estava sendo beijada.
Incêndio. Era o que lhes vinham às mentes assim que seus cérebros registraram os fatos. A sensação desencadeada pelo toque dos lábios, não simples como qualquer beijo, mas como a salvação para todo aquele inferno. Insuportável de sustentar, como se beijar arrancasse todo o ar de seus pulmões de uma vez só. Oh, ele precisava respirá-la, fundir-se ao seu gosto, sua textura, seu calor. E ela havia-se perdido em brasas.
A mão pequena tocou o peito de Naruto, não como se o empurrasse, mas como se apenas o tocasse, o sentisse. Uma reação impulsiva partida tão naturalmente que se assustou consigo mesma. O coração dele deu um solavanco doloroso, seu corpo respondeu ao toque dela como se tivesse esperado por isso há milênios. Era inexplicável para ele; nebuloso para ela. O beijo foi molhado por lágrimas de ambos, seja por medo ou felicidade. Naruto desceu uma das mãos de seu rosto para abraçar a fina cintura, querendo que ela se aproximasse mais, que não o deixasse ali sozinho para carregar o peso de seus sentimentos. Ele entreabriu a boca, encaixando o lábio inferior de Hinata entre os seus, sugando-o, clamando-a. Beijou-lhe com suavidade, apesar disso, ouvindo os estalos mínimos que aquele toque fazia soar, gostando de imaginar que eram eles quem os produziam. Ele queria ser doce, gentil, esperar que ela lhe concedesse mais. Porém, sentia-se enfeitiçado, embriagado pelas sensações que o tomavam, pela realização de um desejo já tão antigo e ardente em seu coração. Um filme corria em sua mente, lembrando-o de cada doce gargalhada que Hinata o havia dado, cada vez em que suas bochechas coravam e cada vez em que seus olhos se encontravam. Em todos os pequenos detalhes que o fizeram se apaixonar e que o faziam querer abraça-la, beijá-la. Oh, ele tinha seus lábios agora, eles eram um só, em um minúsculo infinito em que Naruto podia acreditar existir apenas com ela e nada mais. E Hinata não sabia o que fazer, como reagir, nem por que estava fazendo aquilo. Sua mente havia apagado, entrado em colapso a partir do momento em que seu coração começou a bater desenfreadamente ao ouvir o amigo lhe tocar uma música.
Se eram mesmo amigos, ela já nem sabia. Não lembrava seu nome, não recordava em que lugar estava, não entendia nem como se encontrava de pé. Mas inevitavelmente deu espaço para Naruto toma-la, encaixar suas bocas em algo que mais parecia um soro de vida intravenoso do que apenas um beijo. Sim, não podia negar o quanto sentia-se viva naquele momento, em como todas aquelas sensações a despertavam desse limbo eterno. Sentiu a língua quente dele contornar a linha de seu lábio inferior e estremeceu, sem ordem, querendo gritar ao mundo uma explicação para aquilo. Como diabos estava tendo essa vida? Como ele a amava? Como estavam se beijando como se fossem moldados para isso?
Mas acontecera. Era real, era quente e molhado ao mesmo tempo, era forte e difícil. Era doce, embora salgado pelas lágrimas. E nesse momento Hinata quis desabar. Oh... tinha gosto de mar. Ele a chamava, a abraçava, lhe tomava o ar, lhe afundava em suas águas cristalinas, agora turvas pela carga emotiva que embaçava sua mente. Lhe abrigava como um lar.
Naruto sentiu quando ela o correspondeu com timidez, como se não percebesse o que estava fazendo. Mas sua cabeça movia-se, o acompanhava, o estimulava a acreditar que estava sendo bom para ela como estava sendo enlouquecedor para ele. Essa pequena liberdade atingiu seus sentidos e sem poder interromper-se, já havia ignorado a suavidade. Lhe sugou os lábios com mais força, explorou sua boca, agora livre, com a língua e sentiu-a. Ignorou o leve bater dos dentes, lembrando-se que ele era o primeiro a tocá-la dessa forma e isso só serviu para fazê-lo querer beijar aqueles lábios por todos os entardeceres. Suas pernas ficaram bambas e temeu a própria urgência por um momento. Não... não era como se fosse um garoto ansioso por lhe arrancar as roupas se aquilo se tornasse maior. Era como se ele fosse desmaiar se ela estivesse longe, como se o seu beijo fosse o ar e não a falta dele.
Cambaleou para trás, levando-a junto. Sentiu as costas bater na parede de flores trepadeiras e virou-se para que Hinata estivesse contra elas. Ele estava perdendo o controle de si mesmo, tinha plena consciência, mas não se sentia mal por isso, porque passara tanto tempo contendo-se que não conseguia imaginar escolher distanciar-se. Seus lábios moviam-se firmes, impetuosos, misturados entre os breves arquejos que lhe escapavam, dolorosos porque sabiam que aquilo teria um fim.
E enquanto a urgência embriagava Naruto, Hinata sentia-se totalmente fora de si. Uma chama queimava em seu interior, a fazia sentir um calor indescritível, como se estivesse morta e fosse ressuscitada à choques e ondas calorosas feito o próprio fogo. A vida lhe invadiu tal como a língua do garoto alto, que a cobria por inteiro ali, envolvida entre lábios, mãos, lágrimas, fios loiros e flores. Nunca se sentiu tão pequena, tão maleável e frágil. Tão... entregue. Mas algo a cutucava no fundo, com ironia, zombando dela. O seu velho eu escuro, abandonado nas profundezas de seu âmago, dizendo-lhe o quando era idiota por acreditar que aquilo fosse possível. Não... em um mundo como o dela, isso não existia. Amor não lhe era permitido. Ou não devia ao menos ser.
Mas então por que Naruto a amava? Seria verdade? E como poderia duvidar dele, depois de todas as coisas que fizera por ela? Ninguém a olhara com tanta ternura, nem a arrancara risos tão felizes. Ninguém além de sua mãe. Naruto era a única pessoa que poderia amá-la, depois de Akemi. Então no fundo não duvidava de suas palavras, nem seria justo fazê-lo. Ele podia ser tudo, menos ingênuo, a ponto de enganar-se. Entretanto, ela não o merecia em nenhum mísero raio de sol.
E mesmo assim, a sensação de tocar seus lábios aos dele não cabia em suas descrições. Lembrava-se de quase o ter feito há um tempo atrás e que até sentira-se curiosa. Mas estar de fato consumando aquilo fugia de todas as suas expectativas. Era tão surreal, tão estranho e ao mesmo tempo tão... bom. Ela arfou entre os lábios carnudos de seu melhor amigo, sentindo o ar lhe ser arrancado com fervor. Estava errada, terrivelmente errada. Mas então por que o correspondia? Precisava encontrar forças dentro de si mesma para impedir que aquilo prosseguisse, que se tornasse ainda mais real.
Mas só o que conseguiu foi perder a linha de raciocínio quando Naruto soltou sua cintura e, mesmo que a estivesse beijando intensamente, acariciou sua bochecha, abraçando a face com a mão, enquanto a outra ainda se enrolava em seus cabelos. Isso a deixou tão corada, tão quente, que pensou que desmaiaria. O ritmo dele diminuiu, transformou-se de intensamente caloroso para carinhoso e devagar, com leveza, Naruto lhe deu selinhos mais longos, sentindo a maciez e textura da boca de Hinata, levando a consciência dela junto com cara pequeno estalo em seus ouvidos. Ele respirou pesadamente entre cada delicado beijo e seus dedos se enroscaram mais nos longos cabelos. Hinata sentiu a nuca arrepiar, dividida entre se incomodar por isso ou gostar demais. Os lábios dele sugaram o seu inferior e prenderam-no com os dentes, fazendo-a tremer. Seu corpo amoleceu, os dedos que ainda repousavam sobre o peito do garoto começaram a deslizar, perdendo força. Naruto pegou sua mão rapidamente e a segurou contra o tórax, permitindo-a sentir o próprio coração saltando, querendo tocá-la também, instruindo-a a não o deixar. E quando ela percebeu o quanto aquilo era desesperador para ele, recuperou a razão e aproveitou para empurrar o corpo para longe do seu. Os lábios desgrudaram-se sôfregos, inchados, ardidos e as respirações ofegantes foram o único som para se ouvir.
Quando os olhos se abriram, Hinata enxergou um azul profundo, agitado, iluminado, mas estranhamente assustado. Seu rosto ardia, queimava pelo contato da barba por fazer. Os lábios dele ainda estavam muito perto e parte dela quis beijá-los de novo. Conteve a si mesma, balançando a cabeça, negando-se a se entregar àquela tentação que mal podia compreender. Mas assim como começara, o beijo havia terminado e ainda havia um depois. O que faria agora? Sentiu o desespero lhe travar a garganta, porque percebera que não tinha ideia do rumo que tomaria a partir dali. Só o que a preenchia, além da confusão de sentimentos, era a óbvia conclusão de que não poderiam mais ser amigos depois daquilo.
A percepção doeu. Em ambos. Porque Naruto soube a ler direitinho assim que pousou seus olhos nela. E esperava tal reação, na verdade. Hinata estava nitidamente apavorada, as pérolas não negavam. Ele havia imposto seus desejos a ela, tomado a boca para si e despejado seus sentimentos sobre sua cabeça. Tinha consciência de que possivelmente a perderia, se por um tempo ou para sempre, mas sabia que teria perdido a própria razão se não revelasse a verdade. Estava sendo egoísta, porém, verdadeiro.
A verdade era mesmo dolorosa. E o amor, um tremendo sacana.
- Naruto... – ela sussurrou, arquejante e assustada. Ele fechou os olhos, sentindo outras lágrimas virem. – I-Isso... Isso, oh... Kami, isso é tão errado.
O primeiro soluço rasgou seu peito e o garoto permitiu-se chorar. O corpo inteiro tremia, os lábios doíam e sua cabeça começou a latejar como se seus pensamentos o apunhalassem de dentro para fora.
- Me perdoe. .. – repetiu, quase inaudível. – Eu não podia mais esconder. Isso dói... Vai doer e eu sei disso.
Hinata ofegou, tocando a face do garoto. A agonia em suas palavras uniu uma peça faltante ao quebra-cabeça que ela inconscientemente montara e a conclusão a apavorou. Doeu, como ele mesmo disse. Assombrada, soltou-o bruscamente e deu a volta em seu corpo, respirando com dificuldade. Naruto se virou, de ombros arriados, derrotado. E mais uma vez sentiu como tudo aquilo ultrapassava suas expectativas tolas. Vendo-a soluçar, agarrar o próprio moletom como se tentasse arrancar o coração do peito lhe perfurou como se estivesse em uma caixa de espinhos. Sua verdade a torturava e o matava. Feria a ambos. Ela se afastou, correndo, chorando, sumindo de sua vista. Fugindo de sua vida.
Naruto descobriu que nem todo fim precisa de um começo. E Hinata descobriu qual era o problema dele, o que o machucava. Mas o que mais doía para os dois não era o amor.
Era amar.
***
Hinata
A vida passava como um borrão a minha volta, tudo girava, enojava-me. Era uma tempestade de granizo sobre minha cabeça, uma chuva de ácido. E nem assim, doeria mais do que a perda. E por falar em perda, eu havia acabado de deixar o pedaço restante de meu coração com outro alguém. No final, era o que o amor fazia comigo. Fazia-me crer que os verdadeiros paradoxos são aqueles que possuem moedas de lados opostos, mas que se completam, sejam bons ou ruins. Porque no caso do amor, para ser real, é preciso ódio, dor. No caso da vida, a morte. O yin/yang era sempre o equilíbrio entre os extremos opostos. Eu me sentia em queda livre no abismo entre cada um.
Porque naquele momento, eu havia caído. Feito um anjo sem asas, em desesperança com o mundo. Perdida. Afogara-me no oceano azul de minhas lembranças felizes e pela segunda vez em minha não tão longa vida, sentia-me completamente destruída. Impotente, num inferno emocional. E em meio a isso, a estranha percepção contraditória, meu tipo altruísta esquisito, que insistia em preferir sofrer toda a dor do mundo, se pudesse salvar aquele sorriso. Por quê?
A grande verdade era que eu não podia salvar nada. O mundo não é um filme e livros nem sempre têm finais felizes. Corações enferrujam, flores de papel rasgam e pessoas... Bom, pessoas morrem.
O amor está onde a dor é mais forte e onde a felicidade é mais corrosiva. Como doer o maxilar de tanto rir ou como chorar ao olhar para o sol. Antíteses. Amor é poesia demais para algumas realidades. E para mim, simplesmente impossível. Enquanto corria para longe de onde eu queria estar, enterrava-me em sensações desconhecidas, arrebatadoras. Desejava mergulhar em álcool, esquecer, apagar, sumir. Qualquer coisa que arrancasse aquela ardência, aquele sofrer doloroso que fazia um nó em minha garganta, que rasgava meu peito em soluços, que me liquefazia no ralo sujo de meu subconsciente.
Eu o machucara sem a intenção e o machucaria simplesmente por estar em sua vida. Não deveria nem o ter envolvido em minhas escuridões, ainda que houvesse descoberto todas as inúmeras mentiras de minha vida graças à sua generosidade. Devia ter agradecido e sumido, como sempre fiz. “Seja uma boa menina e desapareça”. Estava impregnado em meu destino apenas não ser, não existir. Minha primeira lei, a regra inicial de sobrevivência.
Tinha vontade de voltar até lá, lhe roubar toda a dor e dizer que tudo ficaria bem. Ser responsável por corrompê-lo era insuportável, ardia em todo o meu ser, gritava para que eu resolvesse. E ao mesmo tempo, uma triste e quente saudade, seja do que for naquele garoto; se de estar bem com ele ou de simplesmente estar com ele. Agora havia estado nele, em sua boca, havia respirado seu ar, provado seu gosto agridoce. E em relação a isso, não sabia reagir. Não queria. Era demais para suportar, ultrapassava linhas demais de meus limites, deixava-me tonta. Entretanto, era tão inegável que chegava a me faltar o ar: O agridoce gosto de Naruto era o gosto de vida. Salgado, molhado, quente, sôfrego, feliz, ansioso, gentil, urgente, insano, certeiro e... apaixonado.
Suas palavras ecoaram em minha mente e automaticamente me lembrei de tudo o que ele fizera por mim até ali. Eu o julgava como um ser de luz, por tanta bondade e nobreza, mas agora podia imaginar um significado além de sua personalidade. Porém, era quase impossível acreditar que alguém como ele havia se apaixonado por mim. Simplesmente incabível que isso fosse real. Não que eu desdenhasse este fato, muito pelo contrário, era porque eu justamente não o merecia, não podia dar à ele nada do que com tanta naturalidade me dá, porque não sou íntegra comigo mesma, não sou inteira, nem mesmo compreendo direito minhas metades, então como poderia ter alguém como ele?
Quanta ingenuidade a minha por acreditar que eu podia viver em um mundo onde Naruto vive, que nossa amizade poderia mesmo existir forte e completa. Ainda que este sentimento não tenha sido quebrado por razões ruins, é claro que o carma daria um jeito de me colocar de volta em seus trilhos. E fizera do pior jeito: magoando-o. Oh, como eu queria sumir, desaparecer desta e de qualquer outra vida em que eu tenha pisado neste planeta. Era demais destroçar os melhores corações que tive a graça de conhecer, era demasiadamente doloroso saber que fui eu quem os decepcionara quando ambos depositavam suas mais honrosas esperanças em mim.
Irrompi a porta do dormitório enquanto os soluços irrompiam meu peito e preenchiam o silêncio vazio do cômodo. Agradeci mentalmente por isso e me permiti cair sobre a cama para enfim o choro me rasgar ao meio, trêmulo e contínuo, tal como a dor que sentia. Algo dentro de mim sofria de uma maneira desconhecida, ardia pela distância, pela culpa e pela vontade de estar ao lado dele, secando as lágrimas de seus lindos olhos azuis e estimulando-o a sorrir como eu sempre gostei. Sorriso este que agora já não me era mais pertencente, muito menos digno. E a culpa era minha. Era isso que o machucava tão ardentemente, agora estava tão claro, tão nítido quanto a verdade em todas as suas palavras, em seu canto, seu dom, seu jeito... Oh, como ele era infinitamente melhor do eu, como conseguia ser tão bondoso e generoso com alguém que sabia que o deixaria? Quanta coragem precisou para dizer tudo aquilo, sabendo que eu não poderia lhe permitir ficar?
Eu não podia. Não podia deixa-lo permanecer neste emaranhado de dor, dúvidas e mentiras, carregando um fardo que não merecia, aguentando sofrimentos e tendo que se esconder pelos cantos apenas para poder conversar comigo. Eu não podia envolve-lo mais em minhas inconstâncias, não podia deixa-lo entrar ainda mais em meus muros, derrubá-los e explorá-los. Porque ainda que seu sentimento houvesse mudado, eu não podia manchá-lo com a única e pútrida verdade sobre mim. A única coisa que movia a minha droga de mundo, o que me qualificava para ser exatamente esse poço imundo e escuro.
Mas eu queria. Sim, eu queria que ele ficasse. Eu havia prometido no passado e queria poder cumprir, queria que isso fosse real, que eu tivesse esse direito e que nada disso passasse de um mal entendido. Queria sanar todas as minhas dúvidas crescentes e poder enfim ser sincera com ele, merecer sua amizade, merecer fazer parte de suas ideologias. E saber que isso não seria possível doía mais do que eu esperava. Uma estaca fincada diretamente em meu peito, assim como deveria ter sido há tanto tempo atrás. Assim como costumava ser. Quando todas as dores me matavam aos poucos e me enlouqueciam, me faziam perder os sentidos. Agora elas me engoliam, riam de mim e sussurravam zombarias, gozavam de minhas esperanças tolas.
“O que pensou que aconteceria, garotinha?”, diziam todas as vozes. Elas voltavam com tanta força, azucrinavam meus ouvidos como o faziam antigamente, torturavam-me e faziam minha cabeça girar. Eu pensei ter me livrado de todas elas, pensei ter superado, pensei ter sido salva dessas maldições... quando conheci Naruto. E agora eu o deixara. Abrira espaço para toda a escuridão retornar e podia senti-la me engolindo, mesmo agora, depois de ter reencontrado sorrisos sinceros.
“Tola”
“Deveria ter sido você”
“Você não o merece”
“Venha, garotinha, venha para nós”
“Venha e suma”
“Morra”
O grito que escapou de meus lábios quis calar todas as vozes em minha cabeça, ao mesmo tempo em que eu tentava cobrir meus ouvidos com as mãos, abraçando meu rosto, tentando me proteger, tentando entender porque elas haviam voltado para me dizer o que fazer outra vez. Eu já não queria... eu não podia mais, eu precisava ficar. Não, eu não posso ir, eu prometi. Eu prometi...
O choro incessante fez meu coração disparar dolorosamente, engasgando-me, tirando-me o fôlego e levando embora minha consciência. Meus braços ficaram moles, escorregaram de meus cabelos, esqueceram de me proteger. Eu gritei, eu clamei ajuda, eu o clamei sozinha, descrente e desmerecedora. Ele não veio e eu fui. Perdi-me no caminho, deixara-me ser levada pela escuridão. Talvez eu estivesse destinada a perder minhas rédeas de vista, tal como todo o amor que ousasse habitar minhas terras. E antes dessa concreta realidade me esmagar e me impedir de ao menos sentir esperança uma última vez, só o que pude ver foram pares de olhos castanhos alarmados, distantes... opacos...
E o vazio. Me esvaziou.
“Morra”.
***
Naruto
Entre todas as coisas que pude pensar, jamais havia imaginado que a machucaria tanto. Uma dor verdadeira, ardente, que perfurava. Era tão visível que eu sentia aquilo me corroendo junto, queimando. Não em arrependimento, exatamente, porque apesar de todo o inferno emocional causado, eu sentia que não havia feito a escolha errada. Talvez parte dessa sensação viesse da conversa insistente de Sasuke e Sakura, enquanto eu me permitia enfiar a cabeça no travesseiro feito um garotinho. É claro que eles achavam exagerada a reação de Hinata, e de fato, fora demasiadamente alarmante. Mas eu a conhecia, certo? Ao menos era o que pensava. E vê-la assim desencadeou outra série de questionamentos que eu pensei ter deixado para trás naquele dia depois do maldito baile.
Agora eu me perguntava novamente que tipo de dor ela havia experimentado em seu passado. Pois nada justificava tanto pavor, tanta aversão à ideia de ser amada. Por que ela sentiria tanto medo e tanta negação com um sentimento tão nobre? Não fazia sentido, não encaixava no que ela havia me contado, por maior que houvesse sido o bullying que sofrera, por maior que houvesse sido o trauma naquela clínica e por maior que fosse a perda de sua mãe. Depois disso tudo, sentir-se amada novamente deveria fazê-la feliz, deveria ser uma novidade acolhedora, como se ela pudesse finalmente ser aceita no mundo, sem paranoias, sem preconceitos.
Mas ao contrário do que a lógica queria dizer, Hinata havia, mais uma vez, desafiado minhas expectativas. Estava perdido em pensamentos, afogado em lágrimas e esmagado em dor quando Tenten invadira o quarto, apavorada ao dizer, de forma embolada e brusca, que Hinata havia ficado louca e desmaiara. Sakura arfara, aturdida, Sasuke expirou com irritação e eu saltei da cama num pulo, correndo com os dois em meus calcanhares, até encontrá-la inconsciente em sua cama, os olhos ainda molhados e as bochechas pálidas com rastros de lágrimas. Eu a carregara até o dormitório dos professores e agora estava sentado em uma cadeira de plástico, na Emergência do Hospital mais próximo, com Sakura e Sasuke ao meu lado.
Uma fila de pessoas queria vir para ficar ao lado dela. Ino, Tenten, Ayame, Temari e Kiba. Todos queriam estar presentes para quando Hinata acordasse, mas Kakashi permitiu que apenas eu o acompanhasse, junto com os outros dois que estavam comigo ao socorrê-la. Mas tudo isso porque, segundo a garota Ayame, Hinata havia gritado meu nome. Agora sua voz ecoava em minha imaginação, enquanto meu cérebro tentava calcular sua dor e meu coração aguardava angustiado por notícias de Kakashi.
- Naruto. – chamou Sakura. Eu acenei com a cabeça baixa, apoiada em meu punho. Ela afagou meu cabelo com suavidade e suspirou. – Eu não sei o que acontece com essa garota, mas você não tem culpa de nada disso.
Suas palavras eram carinhosas, porém eu já estava destroçado. Meu lábio inferior tremeu e eu tentei endurecer o maxilar, mas de nada adiantou. Eu estava chorando, outra vez, como se agora essa fosse ser uma ação corriqueira. Escondi o rosto entre as mãos e apertei os dedos nos cabelos, numa tentativa vã de extrair aqueles pensamentos e toda aquela dor estúpida. O que eu havia feito de errado? Eu só queria vê-la sorrindo, só queria poder demonstrar o que eu sentia, porque, porra, era algo lindo. Algo que herdara a beleza do seu rosto, dos seus olhos, do som de seu riso e de todo o conjunto, de dentro para fora, que se derramava por seus poros e enchia todo o vazio que também habitava meu coração com todas as coisas mais puras que eu já havia sentido. E, no entanto, esse sentimento parecia estar estragando toda a delicada relação que custosamente consegui estabelecer com ela.
- Naruto... – Sakura disse outra vez, sua voz sentida e chorosa, porque eu tinha uma melhor amiga incrível que tomava as dores dos outros para si. Eu levantei os olhos para ela e toquei sua mão, apertando-a. Sasuke suspirou e passou os braços em volta de sua namorada, olhando para mim com seu jeito introspectivo, mas eu podia ver naqueles conhecidos olhos negros, sua amizade explícita, o sentimento indignado que o tomava por estarmos naquela situação inesperada.
- Parece que você também achou a sua irritante, hein, irmãozinho chorão. – ele brincou, sorrindo de leve, na tentativa de me fazer sorrir também. E funcionou, ainda que fosse sol e tempestade ao mesmo tempo. Sakura riu um pouco, balançando a cabeça e Sasuke encostou sua cabeça na dela.
- É, irmão, parece que sim. – concordei, entendendo o que ele dizia ser por “irritante”. Era a maneira torta de ele expressar seu amor, porque meu bronco amigo tinha um jeito estranho de definir seus sentimentos. Quanto ao que sentia por Sakura, ele sempre costumava dizer quão irritante era perder o controle de si mesmo e se render à ela toda vez que olhava em seus grandes olhos verdes. E agora, isso me fazia rir, porque ah, meu caro irmão, você tinha toda razão.
Era de fato uma situação que me irritava, deixava impotente e frustrantemente apaixonado. Ainda que a doçura e a pureza revestissem o sentimento, era mesmo plausível a história de que o amor e o ódio andam lado a lado. Talvez não da forma como geralmente se é interpretada, mas com certeza cabia dentro de todos os significados restantes.
Enquanto eu me deixava perder em devaneios outra vez, Kakashi surgiu no corredor, as mãos nos bolsos e aquela expressão estranha em seu rosto fez uma dúvida brotar. Ele parecia genuinamente preocupado, mas introspectivo, ao mesmo tempo. Exatamente como quem guarda um segredo. Entretanto, por maior que fossem a curiosidade e a suspeita, tinha perguntas mais importantes. Endireitei-me na cadeira e o olhei sugestivamente.
- Bom, a srta. Hyuuga passa bem agora. Ela teve uma queda de pressão causada por razões emocionais. O Hospital sugeriu uma avaliação psicológica, mas ela negou. Em minha opinião, acho que deveriam deixa-la sozinha por agora, mas como sei que o Naruto não vai dar a mínima para isso, podem entrar, se quiserem. – comunicou e deu de ombros. Eu olhei para Sakura e ela assentiu, dando-me apoio, embora eu ainda tivesse dúvidas sobre ir ou não até lá. Eu queria, mas tinha medo de isso ser pior para Hinata. Ayame dera a entender que ela me queria perto no momento em que passara mal e eu, de certa forma, tinha uma suspeita do porquê. Movido pela lembrança de que ela havia me chamado antes de desmaiar, levantei-me e acenei para meus amigos antes de seguir rumo ao pequeno quarto onde ela havia sido posta.
Não bati na porta, apenas entrei devagar para não assustá-la. Hinata estava sentada na maca, com as pernas cobertas por um lençol branco e em sua mão esquerda estava a agulha do soro intravenoso. Seu olhar era perdido em um ponto aleatório e sua face estava pálida, sem vida, sem emoção. Era como estar diante de alguém corrompido pelo próprio vazio. No fim, talvez fosse exatamente isso.
- Hinata... – chamei, cauteloso. Ela virou o rosto de forma meio mecânica e isso me assustou. Mas quando seus olhos encontraram os meus, eu vi, ela estava devastada. Me aproximei dela e sentei na beirada do colchão, sentindo o coração palpitar e os olhos queimarem novamente. Estranhamente, sentia vergonha de olhar para ela, porque de certa forma, estar ali era culpa minha, mesmo que eu tivesse feito tudo para fazê-la feliz desde que a conhecera.
- Elas querem que eu afunde outra vez... – ela murmurou, distante, baixo e rouca como se estivesse gritando há horas. Eu ergui a cabeça e a olhei, sentindo um calafrio percorrer minha espinha.
- Elas quem? – perguntei. A baixinha encolheu os ombros.
- As vozes. – sussurrou. Hinata inspirou o ar e então, inesperadamente, chorou. Flashes do dia em que ela se abriu comigo vieram em minha mente, as coisas que me contara sobre seu passado, sobre seu estranho dom de ver e ouvir o que ninguém mais podia, fatos que transformavam parte de sua história em sobrenatural, que a manchavam em sombras obscuras demais. Eu segurei sua mão e a apertei, querendo salvá-la. De repente, percebi que o fato de ela ter me chamado significava o que minha mente sem esperança ainda não havia percebido: Hinata podia estar frágil demais para entender o que é ser amada, mas nós tínhamos uma carga de tempo juntos, nós éramos amigos, nós éramos parceiros e juramos estar um com o outro sempre. E acima de qualquer sentimento que eu pudesse nutrir além disso por ela, a amizade que construímos era genuína, era maior, era valiosa demais. Era irrevogável.
- Ei... Não importa o que elas dizem, certo? Porque você não vai afundar em lugar algum, baixinha. Eu ainda sou o seu guia, lembra? – murmurei. Ela ergueu o rosto, sôfrega, aos soluços.
- Estou com medo, Naruto... – sussurrou, fraca. Eu suspirei e me permiti puxá-la, abraçando-a com delicadeza. Afaguei seus cabelos, deixando que ela chorasse em minha camiseta.
- Não precisa sentir medo, minha baixinha. Eu não vou soltar sua mão nunca, eu prometo. Eu prometo com todo o meu coração, ele já é seu. – respondi. Seu braço livre me apertou e ela soluçou mais alto.
- Estou te machucando... eu só machuco as pessoas, eu só sei perde-las. Eu só sei perder tudo, não mereço estar aqui, as vozes estão certas. Eu não vou conseguir viver e olhar para você sabendo que eu te provoco dor. – sua voz soou abafada pelo choro e a frase soara rápido demais, confusa, mas eu havia entendido. Soltei a respiração aos poucos, ciente do quanto aquilo estava doendo nela. Existiam segredos ocultos demais no interior de Hinata e talvez ainda não fosse a hora de desvendá-los. Independentemente do que fosse acontecer agora, ao menos eu estava leve, ao menos ela sabia que meus braços estavam abertos esperando pelo momento em que ela conseguisse aceitar a si mesma. Era um saber doloroso, porque eu já estava nesta espera sem a garantia de que fosse haver um fim.
Mas eu era o seu guia. Eu era seu melhor amigo. E era disso que ela precisava no momento. Eu podia ser o que Hinata quisesse, eu podia ser apenas o seu sol ou o seu mar. Qualquer coisa. Desde que eu pudesse ser a sua cura. Por isso sorri e me afastei, puxando seu queixo para que seus olhos estivessem nos meus.
- Hinata... Você não tem que ir para lugar algum e nem eu. Continuaremos aqui, seguiremos a partir daqui, como sempre fazemos. Eu só queria lhe dizer a verdade, eu só queria que você soubesse e que tivesse a chance de sentir, de saber a sensação. Mas não importa o quanto você demore para responder ou mesmo que não o faça, eu ainda assim estarei aqui. A única coisa que você me faz sentir, baixinha, é amor. E amor é exatamente isso, é difícil, é pesado e forte, justamente porque saber sentir, é raro. – murmurei, acariciando sua face. Ela arregalou seus olhos para mim e devagar foi se rendendo, acalmando-se. – Raro como você.
Hinata fechou os olhos e ergueu sua mão, tocando-me no rosto. Eu descansei a bochecha contra sua palma e sorri, contagiando-a.
- Me desculpe assustar você, querida. Prometo guardar isso para mim se você não se esquecer de guardar isso aí dentro também. – murmurei. Ela assentiu e puxou meu rosto para encostar nossas testas.
- Eu chamei e você não veio, eu achei que não viria. Mas eu estava errada, você veio sim. Você sempre vem. Eu prometo, enquanto você continuar vindo, nunca mais ir.
- Não se preocupe, nós vamos juntos. Nós podemos ser o que quisermos enquanto estivermos aqui um pelo outro.
- Nós somos mar, céu, joias, sol e flores...
- Muito mais que isso, baixinha. – sussurrei, sorrindo, lembrando-me de tudo, enchendo-me com todos os momentos que vivemos, de tudo o que pensei ser e sentir desde que a vi pela primeira vez. A vida que flui, a dor que se esvai, o sorriso que se liberta e o amor que constrói. O tempo que gira não é o tempo que vai, é o tempo que faz tudo continuar vindo.
- Nós somos o mundo.