A promessa que nós trocamos na calada da noite

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    Capítulos:

    Capítulo 1

    Capítulo Único

    Homossexualidade

    Fanfic postada inicialmente no Spirit e no Nyah!Fanfiction em 12/06/2014. Espero que gostem.

    As folhas de outono continuavam a cair insistentemente sob o olhar gélido do homem de baixa estatura, que permanecia imóvel, sentado sobre o batente da janela de sua residência enquanto tragava a fumaça acinzentada proveniente do pequeno palito esbranquiçado que jazia por entre os finos e calejados dedos. Não gostava daquela época do ano, por mais que soubesse que aquela etapa era necessária para a entrada definitiva do inverno. O outono não lhe trazia boas recordações, visto que sempre se recordava dos momentos que havia passado ao lado daquele que tomava seus pensamentos dia após dia.

    Suspirou, tragando outra porção daquela fumaça prejudicial enquanto crispava os lábios, sentindo um desconfortável sabor amargo dominar seu paladar. Era incrível como apenas a lembrança daquela pessoa trazia tantas sensações que pensava estarem enterradas no mais profano labirinto de sua mente. A lembrança daquele sorriso maravilhoso que adornava-lhe a face o fazia sentir-se levemente confortável, visto que sempre que chegava em casa após o trabalho era recebido por aqueles dentes brancos perfeitamente alinhados. A voz infantil que saía de suas potentes cordas vocais o assombrava todos os dias com a lembrança de suas risadas levemente agudas. As ações infantis que tanto apreciava... Mas, talvez o que mais o machucava era a lembrança de seus maravilhosos e hipnotizantes orbes esmeraldinos. Apenas a menção daquele par de preciosidades fazia seu corpo estremecer. Recordava-se perfeitamente do quão extasiado ficava quando percebia o olhar apaixonado que lhe era lançado... Eram tantas as sensações que apenas aquilo lhe trazia... Até hoje sente o peso do olhar que lhe fora dirigido quando viu aqueles olhos pela última vez.

    Não percebeu quando o cigarro terminara. Estava perdido demais em seus devaneios que apenas alguns segundos mais tarde percebera que estava se queimando. Lançou-o longe, observando algumas cinzas escaparem por aquela bituca e se misturarem no ar frio de Paris. Talvez fosse melhor tentar esquecer aquela história por enquanto. Resolveu voltar os orbes acinzentados para o interior de sua residência, semicerrando-os logo em seguida assim que se lembrara do compromisso com sua faxina semanal.

    [...]

    Sentado sobre o confortável banco daquela cafeteria, sorvia outro gole do líquido quente que lhe fora oferecido há momentos atrás. Não era mais necessário que avisasse ou fizesse seu pedido, visto que, pelo tempo em que frequentava aquele estabelecimento, os funcionários já esperavam pelo o que fosse pedir: um café preto descafeinado. Não era um lugar ruim, era um dos poucos onde conseguia encontrar um café barato e de boa qualidade. Além disso, sempre encontrava algum antigo amigo da época em que estudava, apenas passando o tempo ou comprando o que quer que fosse. Era uma espécie de ponto de encontro.

    Não era sua intenção se encontrar com algum conhecido naquele momento, no entanto, não conteve-se em manter silêncio ao avistar uma morena de óculos adentrar aquele recinto ao lado de um moreno alto e um loiro igualmente alto. Ao avistá-lo, o trio rapidamente se dirigiu à mesa em questão. A morena, com um grande sorriso nos lábios, foi a primeira a se pronunciar:

    – Rivaille, há quanto tempo! - Permaneceu com um sorriso cordial enquanto sentava-se ao lado do rapaz.

    – Tsc. Já pedi para me tratar pelo nome, quatro olhos. - devolveu mal humorado, segurando a xícara de café à sua maneira, pelas bordas do bocal.

    – Não seja tão duro com ela Levi. - O homem loiro interveio, atraindo as orbes acinzentadas para si.

    – Não fale como se não a conhecesse Erwin. - respondeu em seu tom indiferente de sempre. - O que fazem aqui?

    – Pesquisas. - O moreno respondeu. - Parece que temos raridades parisienses jamais vistas antes pela humanidade em um sítio aqui próximo.

    – Ficamos curiosos. Principalmente Nile. - A morena comentou bem humorada, arrancando algumas risadas de Erwin e do moreno, enquanto Levi apenas observava entediado.

    – E resolveram simplesmente parar para um café matinal ao invés de trabalharem. - concluiu, rolando os olhos com descaso antes de bebericar outra porção do líquido negro que se encontrava em sua xícara.

    – Não seja chato Rivaille. - A morena reclamou.

    – Hanji, essa é a última vez que aviso. Trate-me pelo nome, ou então não respondo por mim. - ameaçou, arrancando apenas uma risada da morena, que ignorou aquilo por completo.

    – E o que você faz aqui, Levi? - Ouviu Erwin perguntar e então voltou os olhos para ele, que o fitava com os azulados fixos em seus acinzentados.

    O homem de baixa estatura demorou-se em responder, repousando a xícara sobre a mesa arredondada daquela cafeteria antes de ponderar seriamente sobre o que realmente estaria fazendo ali. Talvez estivesse a procura de um café de qualidade, visto que fazia certo tempo que não ingeria algo que agradasse ao seu paladar. No entanto, sabia muito bem que esse não era o verdadeiro motivo.

    – Não sei. - mentiu, fechando os olhos por um momento antes de suspirar.

    O trio se entreolhou por alguns segundos, imediatamente percebendo que algo não estava certo.

    – Levi. - chamou Hanji, surpreendendo levemente o dono das orbes acinzentadas. - Aconteceu alguma coisa que não quer nos contar?

    Rivaille então reabriu os olhos, voltando-os para o trio que o fitava surpreso, o que fez com que erguesse uma de suas delineadas sobrancelhas.

    – O que foi? - quis saber, logo sentindo um rastro quente e úmido percorrer-lhe a face. Levou o indicador e o dedo médio até o fino rastro, percebendo apenas naquele momento que estava chorando.

    Foi como uma reação em cadeia. Seus acinzentados encontraram os amigos, que o fitavam com aparente preocupação. Céus, como odiava que o olhassem assim, com pena do caco de ser humano que havia se tornado. Não conseguiu conter as lágrimas que se seguiram, por mais que tentasse parecer impassível, sabia que todos tinham um limite e o seu já estava se esgotando.

    Hanji foi imediatamente abraçar o amigo, que não recusou o gesto. Não retribuiu e também não agradeceu verbalmente. Apenas permaneceu ali, chorando baixinho e expondo o quanto estava debilitado aos seus amigos, que tentavam ampará-lo com palavras bonitas que simplesmente não chegavam aos ouvidos de Levi.

    E ainda dizem que amar é bom.

    [...]

    Terminou de guardar o último livro na prateleira enquanto pensava se chamaria ou não a atenção das pessoas que ali estavam, corrompendo o necessário silêncio daquela biblioteca. Sabia que deveria fazê-lo, era seu trabalho afinal. Porém, deixaria passar apenas por aquele dia, visto que não estava em um de seus melhores humores.

    Resolveu voltar para a recepção, onde se encontravam alguns adolescentes formando uma fila, provavelmente esperando o seu retorno para que pudessem pegar algum livro, o que o deixava levemente surpreso, já que ver jovens com faixa etária entre treze e dezenove anos interessados pela leitura era algo raro naqueles tempos. Posicionou-se atrás de seu gabinete, sentando-se sobre a cadeira - que o fazia ficar cerca de dez centímetros mais alto - a fim de se preparar para atender aquelas crianças.

    Fez todo o procedimento padrão, apresentando-se, apresentando os novos "clientes" à Biblioteca Asas da Liberdade, perguntando se já eram cadastrados ou se já possuíam o cartão do recinto. Trabalhava no local a tanto tempo que esse tipo de tarefa já era considerada algo de seu cotidiano.

    Suspirou, voltando sua atenção para a tela do computador a sua frente enquanto digitava freneticamente sobre o teclado. Até que gostava do emprego, apesar de todos os inconvenientes dos clientes. Era considerado algo relaxante para si, como uma espécie de terapia.

    Estava tão entretido em seus pensamentos que não percebeu a presença de uma pessoa em especial, que parecia esperá-lo há certo tempo.

    – Levi. - A pessoa chamou e como um choque elétrico, o homem arregalou levemente suas íris acinzentadas antes de se voltar para o dono daquela já conhecida voz.

    Os olhos monocromáticos se encontraram com os brilhosos e extravagantes esmeraldinos. Naquele momento, Rivaille se esquecera de como respirar. Não sabia dizer quanto tempo havia se passado desde aquela fatídica tarde de outono, quando contemplara aquelas preciosidades pela última vez.

    – Eren. - respondeu, a garganta seca dificultava que usasse seu tom monótono normal. Observou a expressão que se desenhava no rosto jovial do moreno a sua frente, sendo obrigado a engolir em seco.

    – Tem um minuto? - Foi obrigado a engolir em seco mais uma vez. Céus, havia prometido à Hanji que não mais cruzaria o caminho do moreno e estava tentando. Porém, o que faria com um pedido feito pessoalmente?

    – Claro. - respondeu arrastado, arrancando um sorriso do outro que fez seu coração palpitar disparado.

    [...]

    Sentado na mesma cafeteria onde havia se encontrado com Hanji naquele dia, Rivaille observava Eren com cautela, este que pedia uma caneca de chocolate quente para acompanhar os biscoitos que havia pedido anteriormente. Não podia mentir, estava curioso por saber o que o moreno queria consigo.

    Já Eren, alternava entre olhar para a paisagem parisiense ao lado de fora, olhar para as próprias unhas sujas de argila - visto que trabalhava com esculturas em argila - e olhar para Levi, que mantinha os acinzentados firmes em si. Queria muito dizer alguma coisa, a fim de terem uma conversa saudável, mas nunca sabia o que dizer quando estava ao seu lado, mesmo depois de todos esses anos.

    – E então? - Levi decidiu começar, cruzando os braços em seguida. - O que você quer?

    Eren suspirou pesado.

    – Acho que... Bom, precisamos conversar. - Levi então fechou os olhos, levando ambas as mãos às têmporas, massageando-as. Temia essa conversa tanto quanto temia ser obrigado a viver em um ambiente sujo.

    – Por que agora? - Foi direto, ainda sem abrir os olhos. - Por que, depois de todo esse tempo, você quer conversar comigo? - O homem de baixa estatura reabriu os olhos, fitando Eren com aparente raiva. - Esqueceu de me dizer algo no dia em que se foi?

    O moreno suspirou outra vez em uma tentativa de organizar seus pensamentos.

    – Levi, poderia fazer isso ser mais fácil? - pediu e recebeu como resposta o olhar incrédulo do outro.

    – Poderia ter feito a mesma coisa no passado, não acha? - perguntou irônico, fazendo Eren rolar os olhos.

    – Ainda pensando naquilo? - perguntou levemente enfurecido. - Deveria aprender a deixar o passado para trás e-

    – E magoar aqueles que eu gosto, assim como fez comigo? - O tom de voz de Rivaille diminuiu e o moreno podia jurar que ouviu sua voz tremer no final daquela frase.

    O silêncio se instaurou entre os dois por longos minutos. Levi abaixou o olhar quando o garçom chegara com o pedido de Eren. Não gostava de ser rude com o moreno, nunca gostou, porém, não queria ser enganado mais uma vez com falsas juras de amor ditas por alguém de rosto bonito. Não queria mais sentir a dor que sabia que iria torturá-lo até o fim de seus dias.

    Ainda não sabia o que havia acontecido para que aceitasse o pedido do outro para esse pseudo "encontro casual". Talvez fosse pela falta que o outro fazia em sua vida, ou talvez...

    – Nunca foi minha intenção magoá-lo Levi. - disse, fazendo o outro rir.

    – Claro que não. - devolveu irônico. - Vá direto ao ponto Eren. Quanto antes terminarmos isso, melhor. Tenho muito o que fazer na biblioteca.

    – Como o que? - perguntou, desafiando-o. - Espantar as traças dos livros? Faça-me um favor, Levi! Sei que quer ter essa conversa tanto quanto eu.

    Sim, ele queria, e odiava a maneira como o moreno usava disso para benefício próprio. Rivaille fechou os olhos com força, sentindo aquele maldito gosto amargo em sua boca mais uma vez. O que poderia fazer para se livrar daquele inferno?

    Não percebeu a aproximação do garoto, que deixara os lábios a uma distância perigosa de sua orelha. Sentiu os pelos de sua nuca de eriçarem pela aproximação repentina daquela respiração quente.

    – Heichou... - sussurrou, obrigando o outro a morder o lábio inferior. - Lembra quando te chamava assim? Sempre de mansinho, quando você menos esperava...

    – Para com isso Eren. - pediu em um fio de voz, com a respiração descompassada, usando de todas as forças que conseguia para não se permitir ter uma recaída.

    – Heichou... - continuou, com o mesmo tom de voz. - Lembra quando me chamava de "pirralho idiota" sempre que fazia algo que gostava?

    – O que diabos você quer? - quis saber, sem se importar se a voz saia trêmula ou não.

    – Volta 'pra mim, Levi. - Ah, aquela voz... Aquela maldita entonação que o fazia perder o juízo.

    Talvez, se fosse em qualquer outra ocasião, poderia até mesmo ponderar sobre esse retorno. Já perdera as contas de quantas vezes perdeu noites de sono apenas sonhando com o dia em que o moreno o pediria para reatarem. No entanto...

    – Eu fiz uma promessa Eren. - disse por fim, erguendo o olhar mais uma vez. - Você se lembra?

    O moreno se afastou por alguns segundos, retribuindo o olhar que lhe era lançado.

    – Claro. - respondeu, crispando os lábios.

    – Então por que está aqui me infernizando desse jeito? - perguntou, já visivelmente alterado.

    – Porque eu amo você. - O moreno se assustou com a risada que recebeu como resposta.

    – Não me faça rir garoto. - Levi balançou a cabeça negativamente antes de se levantar. - Não irei cair nessa uma segunda vez. Então, se me der licença, voltarei ao meu trabalho.

    – Hey, Levi! - chamou quando o outro se levantou, rapidamente tirando um trocado qualquer do bolso para pagar o lanche que acabara por não ter degustado.

    Já Rivaille, estava vergonhosamente fugindo de seus problemas. Tinha total consciência disso, mas mesmo assim, resolveu ignorar todos os seus princípios. Afinal, tudo era válido quando se tratava de Eren Jaeger.

    Olhava vez ou outra para trás apenas para ter a certeza de que não estava sendo seguido. E infelizmente não estava.

    [...]

    Naquele dia faria, exatamente, uma semana desde que se encontrara com Eren. Não contou sobre o ocorrido à Hanji, pois sabia que a mulher não ficaria nem um pouco satisfeita em saber que não havia cumprido o que havia sido combinado.

    Estava em casa, apoiado sobre o batente da janela, tragando a tão conhecida fumaça prejudicial característica de seu cigarro. Queria poder parar de fumar, no entanto, era a única forma que havia encontrado para se acalmar desde que fora abandonado. Tinha medo dos próprios pensamentos e aquilo o ajudava a esquecê-los. De certa forma, havia começado a se viciar para se libertar do vício que era pensar em Eren.

    Percebeu que a paisagem típica do inverno já estava quase totalmente formada. O céu, tingido por um cinza escuro, começava a criar leves resquícios de uma possível nevasca. Levou uma das mãos até o cachecol azul que estava usando, ajeitando-o ao redor de seu pescoço fino. Não tinha aquecedor em casa, mas conseguia resolver a situação se agasalhando.

    Tragando mais uma vez aquela fumaça, correu os olhos pela paisagem parisiense ao redor de sua casa, franzindo o cenho ao voltar o olhar para a árvore ali perto. Podia jurar que...

    Sacudiu a cabeça negativamente, fechando as janelas e puxando as cortinas. Talvez devesse descansar um pouco, estava pensando demais em Eren e isso o estava fazendo perder o foco em coisas mais importantes. Correndo os olhos pela sua sala impecavelmente limpa, resolveu sentar-se sobre a poltrona que havia comprado há cerca de três semanas. Ainda precisava terminar seu trabalho para o dia seguinte e, como um bônus, deixaria de pensar constantemente no moreno.

    Suspirando pesado, esticou os braços até alcançar seus óculos - que estavam sobre a mesa de centro - colocando-os antes de voltar-se para a pilha de papéis também dispostos por ali. No entanto, ouviu o som da campainha antes mesmo de tocar os papéis, o que o deixara levemente enfurecido por ser obrigado a se levantar em um espaço de tempo curto demais.

    Caminhou até a porta com o cenho franzido, preparando-se para receber quem quer que fosse. Não gostava de receber visitas e por este mesmo motivo, julgara que a pessoa que ali estaria fosse Hanji, visto que a morena não se importava com as ofensas e ameaças que recebia. Com a mão na maçaneta, Levi crispou os lábios cerca de três vezes antes de abrir a porta, arregalando levemente os acinzentados ao se deparar com a visita.

    – Eren? - perguntou surpreso, recebendo o sorriso do outro como resposta, que levou ambas as mãos à cintura.

    – Oi Levi. - disse cordial. - Não sabia que ainda morava aqui.

    – É. - respondeu apenas, cruzando os braços. - O que você quer?

    – Continuar a conversa daquele dia. - Foi direto, fazendo com que Rivaille crispasse os lábios outra vez. - Você saiu tão de repente.

    Eren ergueu uma das mãos a fim de aproximá-la do rosto fino do outro, que recuou um passo.

    – O que mais precisa ser dito? Eu não quero mais nada com você, não entende? - Levi fechou os olhos, apertando o nó em seus braços. - Eu não te... Não te amo mais Eren.

    O dono das esmeraldinas franziu o cenho enquanto o homem de baixa estatura crucificava-se mentalmente por ter deixado a voz fraquejar no final daquela frase. Queria, com todas as forças, que o moreno se contentasse com aquela falsa declaração e saísse de sua vida de uma vez. No entanto, Eren apenas fechou ambas as mãos em punho.

    – Já que não me deixa escolha... - disse, levando uma das mãos à porta com brusquidão, impedindo assim que o outro fechasse a porta quando adentrou a casa alheia em passos rápidos.

    – O que voc-

    Não conseguiu terminar a frase, pois o moreno segurava firmemente em seu braço, fechando a porta atrás de si com a perna enquanto puxava o corpo de Levi para próximo ao seu. O homem de baixa estatura apoiou ambas as mãos sobre o peito de Eren em uma tentativa de afastá-lo, quando o moreno envolveu a cintura de Rivaille, erguendo o pequeno corpo e aproximando seus lábios, selando-os em um beijo.

    Levi arregalou os olhos, catatônico, sentindo a língua alheia percorrer-lhe os lábios em busca da tão esperada brecha, que não foi recusada. Sabia que não conseguiria controlar-se após uma ação como aquela, por isso, fechando os olhos e enlaçando o pescoço do moreno, deixou-se levar por aquele embalo que tanto sentia falta. As línguas brincavam no mesmo nível, sem nunca aprofundar demais aquele contato, apenas saciando o desejo uma da outra. O homem de baixa estatura sentiu a pressão em sua cintura aumentar e então puxou delicadamente os fios castanhos da nuca do rapaz enquanto suas respirações misturavam-se na medida em que começavam a ofegar.

    O primeiro a se afastar foi o dono das esmeraldinas, selando os lábios do outro várias vezes antes de voltar a tomar o fôlego necessário. Reabriu as íris para fitar a face levemente corada do homem enquanto também endireitava a coluna, visto que havia a arqueado para beijá-lo, suspirando logo em seguida.

    Já no caso de Rivaille, milhões de pensamentos lotavam sua mente, que deixaram suas pernas levemente trêmulas, ao mesmo tempo em que o gosto amargo e a característica falta de ar cooperavam para as lágrimas que começavam a se formar no canto de seus olhos. Céus, por que aquilo estava acontecendo novamente?

    – Seu russo de merda... - murmurou, abaixando a cabeça e encostando a testa sobre o peito do rapaz, que abraçava o pequeno corpo de Levi. Conseguia ouvir o som das batidas do coração de Eren, que estavam tão descompassadas quanto as suas, o que o surpreendeu por breves momentos. - Por que só agora?

    O moreno apertou mais o abraço ao sentir o corpo do outro mais trêmulo, logo sendo retribuído.

    – Desculpa Levi. - disse finalmente, controlando-se para não deixar a voz fraquejar. - Desculpa... Eu estou aqui agora. - As orbes esmeraldinas se arregalaram levemente ao ouvir uma fungada vinda do homem de baixa estatura, que agarrava-se com mais firmeza ao seu corpo. - Levi?

    – Eu sou apenas um fardo 'pra você, não é? - E então Rivaille desabou, obrigando Eren a encostar as costas sobre a parede atrás de si e escorregar levemente o corpo até sentar-se no chão, sem desfazer o contato com o outro. - Se você voltou e disse que me ama, por que disse aquelas coisas horríveis?

    Ouviu o moreno suspirar pesadamente mais uma vez antes de seus fios negros serem acariciados por suas grandes e quentes mãos. Permitiu-se relaxar levemente com aquilo, aquele corpo sempre foi tão quente...

    – Desculpa Levi, eu não tive opção. E era isso o que eu queria explicar naquele dia e você fugiu. - começou, recebendo outra fungada como resposta. - No dia anterior, quando você saiu 'pra trabalhar, recebi uma ligação dos meus avós dizendo que meus pais haviam morrido em um acidente de carro. - Deu uma breve pausa ao sentir o aperto em seu corpo se afrouxar. - Até então, a minha família não tinha conhecimento do nosso relacionamento. Ainda não sei como eles descobriram tão rápido, mas fui ameaçado pelos meus avós por isso e praticamente obrigado a voltar para a Rússia.

    Rivaille havia parado de chorar àquela altura, apenas ouvindo atentamente cada palavra que saía dos lábios do moreno.

    – Por que não me disse isso antes? - quis saber, sentindo a raiva começar a crescer dentro do seu peito. - Poderíamos ter encontrado uma solução juntos.

    Voltou os acinzentados para Eren, franzindo levemente o cenho pelo olhar que lhe fora lançado e por perceber as grossas lágrimas que escorriam pelo seu rosto jovial.

    – Eu fui obrigado Levi. - A voz fraquejou por completo ao fitar as íris do baixinho, que moveu-se levemente apenas para encaixar o rosto por entre a curvatura do pescoço de Eren, depositando também um beijo ali. - Eu precisava acabar com isso e precisava ser convincente. Meu celular estava ligado no bolso naquele dia, eles queriam ouvir tudo.

    – Hm. - Foi tudo o que disse, fechando os olhos mais uma vez ao se lembrar daquele dia, sentindo aquele maldito aperto no peito.

    – Por favor, não me odeie. - pediu, também ocultando as orbes e encostando a cabeça sobre a parede, fungando vez ou outra no processo. - Eu não tive escolha.

    – Conte-me o que aconteceu depois. - pediu, fazendo o moreno suspirar pesado.

    – Quando cheguei à Rússia e resolvi todo o assunto do velório, fiz o pedido de emancipação, já que ainda era de menor. - tornou a explicar, reabrindo levemente os olhos, fitando o chão. - E consegui, porém... - Deu uma longa pausa, fazendo Levi erguer levemente a cabeça e voltar os acinzentados para Eren. - Eu deveria ter recebido o dinheiro que meus pais teriam deixado para mim em testamento e isso não aconteceu. Foi quando descobri que, antes de morrerem, meus pais foram obrigados a me deserdarem.

    – Como? - Rivaille se pronunciou, indignado, erguendo o corpo para fitar o moreno nos olhos. - Eu não acredito...

    – É. Meus avós são muito gananciosos. - Sorriu cordial para o homem de baixa estatura. - Se não fosse por isso, teria voltado na mesma semana e te explicado as coisas o quanto antes, mas como não tinha dinheiro para pagar o advogado que cuidou do meu pedido de emancipação, precisei trabalhar.

    Levi, ainda com o cenho franzido, abaixou levemente o olhar, processando toda aquela informação. Queria, realmente queria acreditar em tudo aquilo que lhe fora dito pelo moreno, mas e se estivesse mentindo para si outra vez? Caso o aceitasse de volta, iria sair magoado mais uma vez?

    E como se estivesse lendo seus pensamentos, Eren apertou com mais força os braços ao redor do corpo do homem de baixa estatura acima de si.

    – Por favor Levi, vamos começar de novo. - pediu, escondendo a cabeça sobre a curvatura do pescoço de Rivaille, que apenas suspirou pesado antes de levar uma das mãos até os fios castanhos do jovem Jaeger.

    – Lembra da promessa que fiz naquele dia? - perguntou e o moreno assentiu.

    – Que se eu te abandonasse, você nunca mais iria confiar na minha palavra novamente. - disse e Levi crispou os lábios. - Mas, você lembra da promessa que fiz nesse mesmo dia?

    O homem franziu o cenho, afastando a mão dos cabelos de Eren para que este pudesse erguer o olhar, fitando-o nos olhos.

    – Eu prometi que nunca iria te abandonar e se um dia isso acontecesse-

    – Independente do motivo, você iria voltar para me buscar. - interrompeu, logo engolindo em seco ao se lembrar daquelas palavras.

    – Entende agora? - Eren ergueu uma das mãos, acariciando levemente a face do homem de baixa estatura, que escondia os acinzentados com as pálpebras. - Eu nunca iria te deixar Levi. Você é único para mim e eu sempre vou te amar.

    Sem esperar um segundo a mais, o moreno aproximou seus lábios outra vez, sendo imediatamente correspondido por um Rivaille trêmulo, que segurava firmemente sobre os fios da nuca do jovem Jaeger enquanto deixava sua língua trabalhar. Talvez estivesse cometendo outro erro, mas não queria pensar naquilo agora.

    Afinal, seu pirralho idiota estava de volta.

    [...]

    Resmungou palavras desconexas antes de abrir os olhos, sentindo a brisa gélida que atravessava a janela daquele quarto e se chocava contra seu corpo nú. Sua cabeça latejava levemente e sentia que ainda não havia se recuperado totalmente da noite passada. Suspirando pesadamente, resolveu se levantar. Coçou a cabeça algumas vezes antes de voltar o olhar para o outro lado da cama, sentindo falta de alguém que deveria estar deitado ali.

    – Tsc. - resmungou, sentindo o nó em sua garganta sufocar-lhe. - Deveria saber que estava blefando.

    Flexionou os joelhos e apoiou ambos os braços sobre os mesmos, fitando um canto qualquer do quarto enquanto tentava colocar os pensamentos no lugar. Era um completo idiota por pensar que o moreno estivesse realmente falando sério. A única coisa que podia fazer naquele momento era odiar a si próprio por ser ingênuo àquele ponto.

    Iria se levantar, não fosse o barulho de algo caindo no corredor que o fez se exaltar por alguns segundos. Levi franziu o cenho, carrancudo, observando a porta do seu quarto ser aberta e revelar um Eren caminhando mancante em sua direção com uma bandeja de café da manhã caprichada, que sorriu amplamente ao encontrar o outro acordado.

    – Levi! Já acordou. - disse bem humorado. - Bom dia!

    O homem de baixa estatura nada respondeu, apenas continuou a observar o moreno se aproximar com certa dificuldade pela dor em sua cintura. Eren deixou a bandeja sobre o criado mudo ao lado da cama e sentou-se ao lado de Rivaille, depositando um beijo sobre a testa do mesmo.

    – Tomei a liberdade de fazer o café da manhã, se não se importa. - continuou, ainda dirigindo aquele sorriso que fazia com que Levi perdesse todas as suas forças.

    – O que está fazendo aqui? - perguntou por fim, atraindo a atenção do outro que ficou sério por breves momentos.

    – Você ainda não entendeu. - disse, aproximando-se ainda mais antes de envolver o corpo menor. Logo depois, em um tom sereno, cantou o trecho de uma música em especial. - Я так хочу, чтоб так было всегда! Кто-то не верит, но это возможно.

    Rivaille crispou os lábios por breves momentos, revirando os olhos em desistência antes de retribuir o abraço que lhe fora oferecido.

    – Detesto quando fala comigo em russo. - comentou, o que fez o moreno rir nasalmente. - Mas essa música...

    – Combina tanto com a gente, 'né? - disse, arrancando um pequeno riso de Levi.

    – Cante mais. - pediu, fechando os olhos por breves momentos enquanto apenas ouvia o som da respiração de seu Eren. Sorriu discretamente, "seu Eren" soava tão bem aos seus ouvidos.

    No entanto, Levi era tirado de seus devaneios pela melodia acapela que lhe era oferecida pelo moreno.

    Мы лежим и над нами мчат года (Mentimos sobre nós mesmos, a corrida)

    Мы летим и под нами города (Nós voamos pela cidade e por nós)

    Мы молчим, но и это все любовь (Estamos em silêncio, mas é tudo por amor)

    И ее ни к чему измерять словами (E suas palavras são medidas, inúteis)

    Мы лежим и над нами мчат года (Mentimos sobre nós mesmos, a corrida)

    Мы летим и под нами города (Nós voamos pela cidade e por nós)

    Мы молчим, но и это все любовь (Estamos em silêncio, mas é tudo por amor)

    Что упала нам в кровь (Isso nos deixou no limite)

    Пролетая над нами... (Estamos voando sobre o mundo)

    Пролетая над нами... (Estamos voando sobre o mundo)

    – Russo idiota. - Levi interrompeu, erguendo o corpo a fim de fitar os esmeraldinos de Eren, que sorria encabulado enquanto recebia o selinho que lhe era oferecido.

    Deveria admitir, era um fato que não importaria o tempo que fosse obrigado a ficar longe de Eren. No fim das contas, nunca deixaria de amar aquele moreno.

    – Sinto falta do "pirralho idiota". - reclamou, recebendo um tapa no braço, cortesia de Rivaille. - Vamos comer? - perguntou o jovem Jaeger ao se afastar. - Fiz torradas com geleia de amora como você gosta.

    – Não fez mais do que a obrigação. - respondeu ríspido, fazendo o moreno suspirar e sorrir ainda mais ao ver que o Levi que havia conhecido há anos atrás estava de volta. - Pegue a bandeja, vamos.

    – Ah Levi... - reclamou infantil, deitando-se sobre a cama e escondendo o rosto sobre o travesseiro. - Estou cansado! Você pegou pesado comigo ontem!

    – Foi você quem disse que poderia fazer o que quisesse. - respondeu em seu tom de sempre, mas sem deixar de achar aquela situação engraçada. Resolveu, por fim, pegar a bandeja que estava ao seu lado e colocar em seu colo. - E não era para menos!

    – Pensei que fosse ser mais gentil... - comentou e ergueu a cabeça a tempo de ver o homem morder a torrada. - Sou seu namorado, preciso de carinho!

    Rivaille ergueu uma de suas delineadas sobrancelhas antes de se voltar para o moreno.

    – Quer dizer... Somos namorados, não é? - perguntou relutante, sentindo o rosto esquentar com aquilo. Levi deixou a torrada de lado para dar atenção à Eren, que parecia na expectativa.

    – Claro. - respondeu, fitando o brilho que se formava sobre as esmeraldinas que tanto admirava. - A menos que queira fazer uma viagem até a Dinamarca comigo.

    – Dinamarca? - Franziu o cenho por breves momentos, até que sentiu todo o seu rosto esquentar violentamente, o que fez Levi rir pela coloração avermelhada da pele do moreno. - É sério?!

    – Sim. - Voltou sua atenção para a torrada. - Depois poderíamos viajar em uma pseudo lua de mel.

    – Que tal Alemanha? Sempre quis visitar Berlim! - comentou Eren animado, sentando-se rapidamente sobre a cama. - Ou então a Finlândia! A Suécia, ou... ou...

    – Hey, vá com calma garoto. - repreendeu, erguendo uma das mãos na direção do moreno, que mal conseguia conter a empolgação. - Mal fiz o pedido oficial e já está assim?

    – É que... Eu... Estou feliz!

    Levi sorriu sinceramente para o garoto a sua frente, levando uma das mãos até a face esquerda do moreno, acariciando-a antes de aproximá-la e depositar um leve selinho sobre os lábios de Eren. Ah, queria que aquilo desse certo! Iria lutar para que aquilo desse certo!

    – Para onde quer ir? Noruega? Portugal? - voltou a perguntar eufórico e Rivaille balançou negativamente a cabeça. Gostava daquele lado infantil de Eren.

    – É... Noruega parece bom para mim.


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