Jóia Rara

Tempo estimado de leitura: 16 horas

    18
    Capítulos:

    Capítulo 13

    Calma Na Alma

    Álcool, Hentai, Linguagem Imprópria, Sexo, Suicídio, Violência

    Yo, meus queridos e queridas! Como vocês estão?

    Bom, demorei dessa vez? Acho que não, né? Viu só como eu sou boazinha? :P

    Sem mais enrolar, boa leitura para todos e até as notas finais!

    E ah, por favor, não me batam ta? HSUAHSAUSHAUHSASUHH CYA!

    Hinata

       Ouvi batidas em minha porta. Eu estava distraída estudando um pouco de biologia e mal notara o quanto o tempo tinha passado rápido. Encarei a madeira, pensando quem poderia estar me chamando. Normalmente, os Sasaki não vinham até mim. Mesmo Hiashi, o tão ocupado empresário, quem havia decidido me resgatar, tirava um tempo para fazer qualquer coisa que me envolvesse. Não que eu me importasse de verdade, antes de conhecer Naruto, aceitava a solidão como algo irrevogável, mas agora eu já enxergava isso de forma diferente. Estar sozinha ou na companhia de um Sasaki, no final das contas, não fazia muita diferença.

           Suspirei.

    - Entre!

    O rosto que apareceu na porta me surpreendeu e eu imediatamente fiquei tensa. Não deveria ser assim, mas ver meu suposto pai parado em minha porta deixava-me mais incomodada do que feliz.

    - Hiashi? – disse, fechando o livro de biologia. Ele tinha uma expressão fechada, talvez pela minha falta de costume em chama-lo de pai.

    - Você não veio jantar outra vez. – respondeu-me. Olhei para o relógio no criado-mudo, constatando que já passava um bocado do horário da janta.

    - Eu me perdi no tempo. – respondi simplesmente, dando de ombros. – Não estou com fome.

    - Deveria passar mais tempo lá embaixo, Hinata. Não se cansa de ficar aqui? – ele mudou o assunto, surpreendendo-me. Olhei para meu edredom roxo, pensando numa maneira rápida de terminar a conversa.

    -  Força do hábito. Gosto de ser sozinha. – respondi. Hiashi adentrou o quarto e eu congelei, nervosa pela atitude. Sem olhá-lo, senti o peso de seu corpo afundar um pouco o colchão. Suas mãos tocaram o grosso livro por um momento e depois o ouvi pigarrear.

    - Mas você tem saído bastante ultimamente.

    - Eu conheci pessoas bacanas, me sinto bem quando estou perto delas. – respondi. Talvez isso o convencesse a parar de me perseguir.

    - Sua irmã me disse que você estava conversando com o menino Uzumaki hoje. – ele começou e eu levantei o rosto, franzindo a testa. É claro que ela havia contado.

    - Mayumi só quer que o senhor arrume algum motivo para me odiar, assim como ela. Eu fiz amigos e estou cultivando-os. Simplesmente. Não faço parte de uma seita, nem de qualquer rivalidade. Esperava que algum dia pudesse entender que eu não sou uma Uzumaki, nem uma Sasaki, não tenho obrigação nenhuma de escolher um lado. – me adiantei a responder, mantendo a calma na voz. Meu tom sério e frio o fez olhar em meus olhos por uns segundos antes de iniciar sua fala.

    - Por que insiste tanto em não se declarar parte desta família, Hinata? Eu tenho a sua guarda legal, você é minha filha. – sua voz soara estranha no final. Tão estranha quanto sua própria insistência em me querer ali, aliás. Hiashi pudera ter amado minha mãe no passado, mas ele não sabia que sua paternidade era real. Esse tempo todo, manter-me ali parecia uma espécie de capricho, eu só não entendia o motivo. Havia vindo com ele para Tokyo, o Conselho me convencera e eu já não tinha nada. Não podia me sustentar e não tinha habilidade alguma com pessoas. Teria morrido de fome e eu tinha prometido cuidar de minha vida.

    Sustentei o olhar de Hiashi. Tinha tantas perguntas, mas ao ver a face rígida do homem, não conseguia sentir confiança. Reparei como seus olhos eram estranhos, duros, não pareciam como olhos normais. Eram de um tom de cinza quase preto, sempre sólidos como rochas, não demonstravam profundidade, só indiferença. E isso me incomodava muito. Hiashi era um livro grosso com cadeados e correntes, impossível de ler.

    - Sua família não me quer aqui. – disse parcialmente o motivo. Ele olhou para a porta semiaberta e depois para mim de novo.

    - Elas gostariam de você se desse oportunidade para conhecê-la. Mas esse não é o caso, você nunca desce para jantar, você não falava nada na mesa e não assiste televisão. Mayumi é filha única há 15 anos, não está acostumada a dividir atenção.

    - Ela não divide nada. Toda a atenção do mundo para ela, todos os jantares e conversas na mesa. Eu posso ser perfeitamente invisível, mas não parece ser a sua preferência também. Contraditório, não? – respondi dura. Detestava que quisesse me culpar pelas atitudes infantis de sua filha.

    - Ela quer que definir o espaço dela, Hinata. É um instinto... – Hiashi começou. Neguei com a cabeça.

    - Não é desculpa alguma. O que o senhor deseja? Veio brigar comigo outra vez porque fiz amigos? Ou veio defender sua filha e me acusar de desnaturada? – interrompi, irritada. Talvez ele tenha se surpreendido pela força em minha voz. Desde que chegara ali, nunca havia levantado o tom, nem imposto minha personalidade. Mas estar enfrentando esta nova vida causou mudanças dentro de mim e, assim como ele acreditava no poder instintivo, eu sentia que deveria proteger meus laços como uma leoa.

    - Gostaria que tivéssemos uma conversa séria. – ele disse, pigarreando. Levantei os olhos, analisando o que aquilo poderia significar. Suspirei, cansada de erguer muros para minha proteção. Se não usasse da ofensiva, jamais conseguiria avançar alguma coisa dentro daquela casa.

    - O senhor pode me falar o que quiser, sabe disso. Mas poderia ouvir também. E bom, enxergar um pouco mais. O que sabe sobre mim? Sobre minha vida e o que acontece aqui dentro? – murmurei, tocando o peito ao dizer. Hiashi permaneceu indiferente nos olhos, mas a expressão endureceu.

    - Não vim até aqui falar sobre sentimentos, Hinata. – cortou.

    - Não? Achei que acreditasse na natureza humana. – respondi com ironia, decepcionada.

    - Pare de me afrontar dessa maneira, Hinata. Se continuar a agir como uma marginal, vou ser mais duro do que planejava neste castigo! – o patriarca descontrolou-se de repente, levantando-se da cama. Algo em sua expressão ligeiramente transmitiu nervosismo e insegurança, mas fora tão rápido que pensei ter sido imaginação minha. Entretanto, me surpreendi pela atitude repentina. Meu coração acelerou e senti medo do que ele queria dizer e o que poderia fazer.

    - O quê? – perguntei, baixo.

    - A diretora da escola ligou, contou sobre um projeto, uma excursão. – disse, mudando de assunto. A lembrança caiu como concreto em minhas costas e isso imediatamente me deixou alerta. Ele não deixaria, sentia como se as palavras estivessem prestes a sair. – Mas nem se anime. Você não vai, é claro.

    Levantei da cama, trêmula. Só de imaginar ficar oito dias longe de Naruto e meus novos amigos, completamente sozinha com os Sasaki, calafrios me assombravam.

    - M-Mas era uma programação ótima, se eu não for, vou perder atividades importantes. – tentei argumentar.

    - Ora, faça suas provas e estude, não faz mais nada além disso. – devolveu, irritado.

    - A viagem vale 50% da nota, os alunos que não forem terão de se adequar à um calendário diferente. Vou perder oportunidades enormes de me... de me localizar na vida! – exclamei, sentindo minha respiração vacilar. Em partes, minhas palavras eram reais. Ainda não havia pensado em um futuro de verdade, em faculdade, emprego e família. Eram coisas longes demais da minha realidade, mas ao estar diante de uma proposta assim, algo dentro de mim começava a aflorar. Havia uma enxurrada de “e se?” passando em minha mente.

    “E se eu fizesse faculdade?”

    “E se eu tivesse que escolher um emprego?”

    - Se localizar na vida? – Hiashi ecoou, arqueando as sobrancelhas.

    Assenti com súplica no olhar.

    - Não sei o que posso fazer depois do colégio. Que faculdade cursar e com o que trabalhar... A Convenção dos Guias Profissionais poderia me ajudar a me encontrar nessas questões. – respondi. Hiashi balançou a cabeça.

    - Você vai terminar o colégio e vai trabalhar na empresa, Hinata. É uma herdeira. – decretou. Abri a boca, oscilando diante de sua frieza. Ele nem sequer se importava em saber minha opinião?

    - Mas eu não quero. – protestei.

    O homem apertou o maxilar, rangendo os dentes.

    - Você e sua irmã trabalharão na empresa. E você não vai viajar. Assunto encerrado. 

    Ele virou as costas, pronto para deixar a conversa por ali. Corri para alcançar seu braço, desesperada para me soltar das amarras em que tentava me colocar. O olhar que recebi me fez engolir em seco. Ao que parecia, Hiashi não era um pai acostumado a ser contrariado.

    - Não pode fazer isso! Não pode simplesmente me jogar dentro de uma vida que não é minha! – exclamei, elevando o tom trêmulo de voz. Ele se virou para mim outra vez.

    - Eu sou seu pai, posso fazer exatamente o que quiser! – esbravejou.

    - Não é assim que um pai de verdade se comporta. – respondi. Ele se aproximou, irado.

    - E o que você sabe sobre isso? Te encontrei no meio do lixo, sem ninguém e agora você quer me dizer como ser um pai? – gritou.

    - Pois se fosse para viver desse jeito, eu preferiria ficar lá! Ou melhor, eu preferiria mil vezes ter sido adotada pelos Uzumaki! – gritei de volta, perdendo o controle.

    Foi então que Hiashi ergueu sua grande mão e num único, certeiro e rápido tapa, esbofeteou meu rosto, fazendo-me cair no chão. O anel em seu dedo cortou meu lábio inferior e as pequenas gotículas de sangue escorreram pelo lábio agora inchado. Meus olhos encheram de água e meu rosto esquentou, ardendo como se estivesse em chamas. Levantei o rosto, encarando-o com dor e ressentimento.

    O homem me olhava com a expressão transtornada e talvez, eu disse, talvez levemente arrependida. Mas a fúria ainda se via presente naquele rosto sério.

    - E-Eu me descontrolei, Hinata... – ele tentou dizer, pigarreando. Balancei a cabeça, deixando as lágrimas escorrerem.

    - Vai embora. – murmurei.

    - Hinata...

    - Vai. Embora. Agora. – apertei os dentes, tentando não chorar.  Hiashi suspirou pesadamente e se retirou, batendo a porta do quarto.

    Escorreguei pelo chão, abraçando as pernas e deixando o choro correr livre, soluçando dolorosamente. Afundei o rosto entre os joelhos, absorvendo as sensações de ter sido tratada daquela maneira estúpida.

    O que eu fazia ali? Porque eu sentia um medo crescente me invadir e uma dúvida fortíssima acerca de minha segurança?

    Deixei as horas passarem, enquanto eu secava meu corpo em lágrimas e assim permaneci a noite, afogada em sentimentos que só conseguiam me afundar mais e mais em perguntas sem respostas.

                                                    ***

    Acordei no dia seguinte com dor de cabeça e por todo o corpo. Estava estirada de mal jeito no chão de madeira, com o tronco encostado à cama. Havia passado a noite chorando e nem tivera forças para me levantar. Sentia-me encurralada. Se não conseguisse a permissão de Hiashi, ficaria presa em casa por oito dias. E ainda tinha Mayumi, se ela continuasse a contar para seu querido pai que eu ainda mantinha contato com Naruto, as coisas só piorariam para mim. Suspirei, levantando-me com dificuldade e indo para o banheiro. Eram sete horas e vinte minutos da manhã e eu deveria estar dentro da sala de aula às oito em ponto. Olhei-me no espelho e me assustei com a visão: eu parecia um zumbi.

    A pele branca de sempre, estava funda abaixo dos olhos e sombreada por olheiras, minhas pálpebras estavam inchadas e rosadas, assim como um lado do meu rosto e meu lábio inferior estava sujo de sangue seco, ardendo em um corte já levemente roxo.

    Como apareceria na escola desse jeito?

    Respirei fundo e decidi tomar um banho rápido, tirando um pouco do cansaço de meus ombros. Teria que me arrumar rápido e não possuía nenhuma maquiagem para cobrir um pouco das olheiras. Escovei os cabelos ao sair do banho e depois os dentes, tomando cuidado para não encostar demais o creme dental no ferimento. Após terminar tudo, vesti a farda escolar, peguei um casaco, a mochila e desci devagar, sentindo as pernas ainda tensas por ter ficado no chão por tanto tempo.

    No andar debaixo, o silêncio prevalecia. Meus pés ecoaram nos degraus da escada junto com os sons de deglutição dos três seres à mesa. Analisei curiosamente o comportamento estranho, o modo como Mayumi tinha o rosto tenso e jamais erguia os olhos e a expressão incomodada de sua mãe. Já Hiashi lia um jornal enquanto engolia um pouco de arroz.

    Minha chegada atraiu os olhares e logo pude ver diversas reações. A mais nova parecia entre um misto de surpresa, medo e pesar, Aiko demonstrou irritação e o grande patriarca apenas arqueou as sobrancelhas e arregalou os olhos frios, pigarreando logo em seguida.

    - Você está bem para ir à escola, Hinata? – perguntou-me, sério. Olhei na direção de Mayumi e dei de ombros.

    - Estou ótima. – menti. Jamais deixaria que ele tivesse poder sobre meus sentimentos. Aiko se levantou, com as mãos juntas à frente do corpo.

    - Hinata, você deveria fazer um curativo. – disse, estranhamente solidária.

    - Eu disse que estou bem. – repedi, impaciente. Ela encarou o chão e Hiashi suspirou, levantando-se também e largando o jornal na mesa.

    - Vão para o carro as duas. – disse simplesmente. Apressei-me para fora da mansão e entrei na porta que o motorista segurava para mim. Mayumi veio logo atrás e Hiashi fez um sinal negativo ao serviçal, indicando que não precisaria dele para nos levar. O velho homem apenas assentiu e voltou à garagem.

    Encarei a vidraça durante todo o trajeto e nem sequer esperei por qualquer coisa ao ver o carro sendo estacionado. Mas Hiashi apurou-se para sair do veículo e segurou meu braço, parando-me. O encarei nos olhos, com medo no fundo, mas ao mesmo tempo em chamar pela raiva que suas atitudes me despertavam. Sua filha mais nova nos lançou um olhar e depois correu para os portões do colégio.

    - Se comporte. – murmurou.

    - Me deixe ir, Hiashi. – respondi. Ele suspirou outra vez, soltando-me e massageando as têmporas.

    - Só faça o que eu estou pedindo, onegai. – disse, com os olhos fechados e a testa franzida. Apertei o maxilar, recusando-me a dar continuidade àquilo. Apenas virei-me e apressei o passo para o colégio. Lembrei-me de colocar o capuz, a fim de esconder um pouco de meu lábio cortado e o rosto inchado.

    Suspirei. Sabia que teria de responder muitas perguntas naquele dia. Consegui entrar na sala de aula com alguns minutos de sobra antes das oito horas e vi que meus amigos ainda não estavam em seus lugares. Me sentei na cadeira e abaixei o rosto, fitando o chão enquanto esperava o relógio andar.

    Não demorou muito e pude ouvir a sala preenchendo cada lugar vazio.

    - Ohayo, Hinata-san! – disseram Sakura e Ino ao passarem por minha carteira.

    - Ohayo! – respondi, corando por não poder encará-las nos olhos. Mas elas pareceram não notar, estavam entretidas em sua conversa, seguidas por Tenten e Temari que discutiam algo sobre os leques chineses.

    Ouvi passos se aproximando e então a cadeira à minha frente sendo tomada por seu dono, que eu conhecia muito bem. Naruto ainda falava com Sasuke e Shikamaru, mas os dois morenos foram para seus lugares rapidamente. Podia jurar que os olhos do loiro estavam sobre mim assim que seus amigos saíram.

    - Ohayo, baixinha! – disse alegremente. Mordi o lado bom do lábio inferior, temendo o que ele diria quando visse. Devia inventar algo? Um acidente doméstico? Não... meu rosto entregava que havia chorado por horas, seria difícil lhe explicar um motivo de verdade. E além disso, eu era péssima quando o assunto era mentir para pessoas com quem me importava.

    - Ohayo, Naruto-kun. – respondi um pouco tarde. Talvez ele tivesse notado que havia algo errado. Havia usado o sufixo, estava envergonhada e nervosa e de alguma forma, Naruto conseguia me ler como se estivesse com todas as páginas de um livro abertas em sua face. Sua mão tocou meu capuz gentilmente e tentou tirá-lo, mas me encolhi, esquivando-me involuntariamente.

    - Hinata? Algum problema? – ele perguntou, preocupado. Neguei com a cabeça.

    - Estou com dor de cabeça. – respondi, era verdade, afinal. Ele suspirou.

    - A luz te incomoda? Você parece tão estranha. – disse. Sua voz indicava que ele não iria dar-se por vencido enquanto não pudesse fazer algo a respeito. Assenti, concordando. Alguma professora entrou na sala, que pela voz doce julguei ser Kurenai. Era uma boa deixa para mim, então abri o caderno e dei o assunto por encerrado. Notei o corpo de Naruto virar-se para frente e depois disso ele só puxou assunto comigo poucas vezes, que eu imediatamente me limitei a responder com assenti de cabeça e frases pequenas. Detestava não poder olhar em seus olhos, nos oceanos tranquilos que sempre me faziam ficar calma. Só de não poder erguer o rosto para encará-lo, sentia uma saudade estranha. E isso, mesmo depois de tudo o que já havíamos passado juntos nessa amizade turbulenta, ainda conseguia me surpreender. É... uma coisa eu não podia negar: Naruto não era o tipo de mar em que se podia nadar com liberdade. Era o tipo que nos engolia e nos prendia em cada gota com a dependência de um peixe, de modo que estar fora dele pudesse nos levar todo o ar da vida.

    E para falar a verdade, até que se afogar podia ser uma coisa boa.

    Naruto

    Após incessantes aulas de tortura na parte da manhã, finalmente o sinal tocou e fomos liberados para o horário do almoço e intervalo de descanso. Ainda teríamos educação física no próximo horário e eu me via estressado como um idiota. Não tinha um real motivo pessoal, mas estar diante daquele silêncio todo de Hinata estava me matando. Não podia cobrar-lhe nada, nem importuná-la com perguntas, mas a verdade era que eu queria com todas as forças lhe arrancar aquele maldito capuz e sugar seus olhos com os meus. Ou os seus lábios, mas bem, isso já era assunto para sonhos.

    Suspirei, levantando e esticando o tronco. Ficávamos tempo demais no colégio e a maior parte dele, sentados, onde a coisa mais fofa que amaciava o atrito das costas com o encosto do assento era o protetor de cabeça para terremotos. Sasuke passou por mim, segurando a mão de sua namorada – e minha melhor amiga – e confesso, o invejei por isso. A felicidade que podia ver fazer brilhar aqueles olhos estupidamente negros sempre me fazia divagar sobre como o mundo podia dar voltas realmente revolucionárias. Dentre todas as pessoas que conhecia, a que menos imaginava se apegando, apaixonando-se e pedindo alguém em namoro sério, era Sasuke.

    Bom, não que ele fosse um idiota, mas de certa forma, o Uchiha era como eu. Amar nunca fora uma palavra do nosso dicionário e tampouco se encaixava em partes fáceis da vida, como víamos em filmes de amor com Sakura em seus dias de TPM, às vezes. Tudo bem que geralmente nós dormíamos, mas era aguentar isso ou apanhar até a morte.

    A questão é que romance não é uma coisa muito fácil para nós, garotos. E pensando nisso, principalmente hoje em dia, sinto-me um babaca. Acho que complicamos muito as coisas quando o assunto é deixar a independência de lado e se prender em uma pessoa. Até por que, querendo ou não, as meninas esperam o romance, sonham e também estão acostumadas a ver o amor não dar certo. Faz parte da força delas, amar, perdoar e compreender a vida. Afinal, que ser mais sensibilizado à existência humana do que uma mulher?

    E eu podia enxergar isso nos olhos das mulheres da minha vida. Mesmo na fria e distante (mas insuportavelmente incrível e linda) Hinata. E apesar de o amor não ser fácil para pessoas como eu e Sasuke, vê-lo apaixonado meio que me descongelou também. Eu era o tipo de garoto cercado por afeto feminino, tinha muitas amigas, uma mãe extremamente coruja e uma irmã de coração que vive dentro da minha casa desde que me entendo por gente. Havia aprendido de um jeito errado, no passado, como sustentar um sentimento dentro do peito. Associei com a dor e resolvi deletar de todos os planos futuros me apaixonar novamente.

    Mas como algum ditado por ai deve dizer, a vida é uma tremenda sacana. Ao mesmo tempo em que eu me afastava do amor, todos os meus amigos se descobriam apaixonados. E quem diria, que em uma segunda-feira normal eu encontraria minha pérola e nunca mais conseguiria desgrudar os olhos de si?

    E era exatamente por isso, por eu ser um idiota apaixonado que não conseguia tirar os olhos da pequena Hinata, que a impaciência me assombrava como um demônio naquela manhã. Eu não podia olhar para ela! Podia me contentar em andar ao seu lado até o refeitório, puxar assunto com meu bando de malucos e almoçar, deixando-a em paz? Não, não podia.

    Mais do que meu ataque de saudade adolescente injustificada para minha idade física e mental (não sou tão idiota como aparento), sentia uma coisa estranha vindo dela. Não era só um pressentimento, pois me incomodava tanto como se estivesse escrito em letras grandes nas paredes. Havia algo de errado com Hinata, algo que a fizera congelar cabisbaixa e distante do mundo.

    A olhei de canto. Sabia que ela vinha atrás de mim no caminho para o refeitório e podia enxergar o maldito casaco cobrindo-a como um manto. Hinata tinha essa coisa de se esconder em roupas maiores do que ela. Distraído, não vi quando um cara à minha frente parou de andar e esbarrei nele, interrompendo a caminhada e fazendo a desligada morena tropeçar em minha e cair no chão, como um efeito dominó ao contrário. Virei-me de prontidão para lhe pedir desculpas, mas ao finalmente enxergar seu rosto, tive todo o corpo paralisado.

    E bem, eu estava furioso.

    Todos os meus músculos ficaram rígidos e um instinto de proteção me assolou ao ver os olhos perolados inchados e levemente vermelhos por algo que eu sabia exatamente ser devido ao choro excessivo. Além de um lado de sua bochecha estar estranhamente esfolada e vermelha, juntamente com um corte no canto de seu lábio inferior, agora vermelho e inchado na região.

    - H-Hinata? – sussurrei, assustado. Meu coração acelerou dolorosamente. Teria... Teria ela sido agredida? Não, eu não conseguia lidar com isso, só o pensamento me deixava em chamas. Não podia lidar com o fato de vê-la ferida, isso era como uma estaca diretamente enfiada em meu peito.

    Ela se apavorou ao ver que estava sendo encarada por mim e tentou recolocar o capuz caído, mas eu me inclinei, segurando seu pulso. Preguei meus olhos nos seus, puxando-a para se levantar e a levei dali, seguindo uma direção oposta às portas do salão de refeições. Hinata tentou protestas atrás de mim, mas suavizei, escorregando os dedos para suas mãos e afrouxando o aperto em seu braço fino. Encontrei um corredor vazio, perto das salas e parei, virando-me para ela.

    Eu queria lhe tocar, queria lhe puxar para meu peito, obter respostas e lhe tirar toda a dor que pudesse ter lhe feito chorar. Mas eu só conseguia encarar aquela face corrompida pelo medo e sentir a raiva fechar minha garganta.

    - O que deu em você? – ela murmurou, encolhida. Eu não queria ter lhe assustado, mas... droga, será que ela não percebia como eu estava estupidamente caído aos seus pés?

    - O que aconteceu, Hinata, por que você está machucada? – perguntei, rouco, respirando fundo para conter o bruxulear de emoções complicadas. Ela abaixou o rosto, claramente não queria entrar no assunto e talvez tenha sido por isso que fugira de mim a manhã toda. Toquei sua bochecha boa, devagar e com calma para não lhe transmitir minha inquietação.

    - Hina, conversa comigo, onegai. – sussurrei, aproximando meu corpo. Ela se virou, fungando uma vez e eu notei suas costas tremer em soluços silenciosos. Meu peito se apertou em dor e ódio por vê-la daquela forma.

    - Gomennasai, Naruto-kun, gostaria de ficar sozinha. – ela respondeu sôfrego e baixo. Levantei a mão, trêmulo e com medo de lhe tocar, mas ao mesmo tempo cheio de vontade e necessidade de confortá-la. Afaguei seu cabelo longo e macio, aproximando-me com cautela outra vez e me abaixei para roçar meu rosto em sua bochecha sem ferimento, puxando os fios lisos para trás. Encostei meus lábios em seu lóbulo, quase sem estar realmente em contato. Eu sabia que com ela nunca podia avançar demais, mesmo no mais singelo movimento.

    - Sozinha é uma palavra excluída de seu dicionário, minha pequena pérola. – sussurrei carinhosamente, transmitindo meus sentimentos do modo mais fraterno e gentil que conseguia. Ela parecia tão perturbada, tão assustada, tinha medo de lhe deixar ainda pior. Depositei um beijo na maçã de seu rosto alvo e delicado e a senti virar-se para mim, enterrando-se em meu peito e permitindo que os soluços ganhassem um som cada vez mais alto e torturado. A abracei com ímpeto no coração, mas suavidade nos braços e deixei que as lágrimas molhassem minha camisa, me pacientando em seu próprio tempo.

    Inspirei o cheiro do topo de sua cabeça. Aquela garota assemelhava-se tanto às formas mais puras de um anjo, de uma verdadeira jóia, uma representação celestial da mais doce Hime, que tinha o poder de me curar por completo. Todas as bobagens de adolescente, toda a pressa dos instintos masculinos e todos os erros que podia cometer. Com ela, mesmo com tanta obscuridade a cercando e poluindo, sentia irradiar uma bondade, uma luz tão pura que era como se magoá-la ou desrespeita-la fossem proibições feitas para se aplicarem à parte mais natural do meu ser.

    - Gomennasai... Gomennasai... – ela sussurrava em meio ao choro. Suspirei, acariciando seu cabelo. Desfiz nosso abraço e segurei sua mão.

    - Vem cá, vamos conversar. – disse, puxando-a até nossa sala e a levando até sua cadeira. A baixinha se sentou, cabisbaixa e eu me abaixei à sua frente, tomando sua outra mão na minha também. – Agora respira e me diz o que aconteceu, meu anjo.

    Ela levantou o rosto, olhando-me com hesitação.

    - Por que você existe? – sussurrou, balançando a cabeça. Arqueei uma sobrancelha.

    - Como assim?

    - Por que você é tão gentil desse jeito, tão... impecável? Você é o único anjo aqui, eu não consigo olhar dentro dos seus olhos e mentir. – sussurrou, fungando. Sorri, um pouco tímido, mas feliz de que ela guardasse um sentimento assim sobre mim, mesmo que não correspondesse ao meu sentido romântico.

    - Então me diga a verdade. Eu sabia que tinha algo errado contigo, eu senti. Mas eu preciso saber, preciso ouvir de você o que aconteceu. – murmurei pacientemente. Hinata suspirou, apertando meus dedos.

    - Tudo bem... Gomen por estar desse jeito, Naruto, eu... eu estou sofrendo com isso. Foi algo que me machucou de verdade, me assustou e me fez pensar sobre o que estou fazendo aqui, o que eu fiz quando aceitei ser tutelada por meu pai... – começou, ligeira com as palavras.

    - Shh, Hina-chan, só respire e me diga. – disse, afagando as costas de sua mão esquerda. Ela fechou os olhos, deixando duas lágrimas escaparem, assentindo.

    - Hiashi me bateu.

    As palavras saíram tensas, a respiração presa e o coração duro pela dor que aquilo transmitia. E eu vi ali que aquilo não era um castigo, tampouco um sermão paterno cabível, era uma agressão física imoral que fizera uma garota indefesa chorar uma noite inteira e sangrar de verdade.

    E então o ódio me corroeu como ácido outra vez. Me levantei, expirando e esfregando as mãos no rosto. Ele havia batido nela.

    O maldito Sasaki havia batido em Hinata.

    - Mas que droga! – exaltei-me, chutando a cadeira ao lado da dela. A baixinha se encolheu, não por medo, mas por compartilhar de minha indignação.  – O que esse infeliz tem na cabeça? Porque eu não consigo administrar essa reação, Hinata, eu não consigo ver aonde ele enxerga paternidade em suas próprias ações.

    - Ele ficou nervoso porque discutimos. Eu não desci para o jantar porque não faz parte de meus costumes ali e depois o ouvi bater na porta. Ele queria me cobrar e acabamos entrando no assunto “sua família”. É claro que ele defendeu aos seus e eu lhe disse que não estava tentando roubar o espaço de ninguém, não tinha razão para Mayumi me perseguir como faz. E bom, isso o irritou, levou como uma resposta insolente. Começou a berrar, disse que Tsunade já havia ligado para promover a viagem e já se adiantou para me dizer que não iria. – ela parou de falar e suspirou pesadamente. – Eu tentei argumentar, nós brigamos e eu disse que preferiria ter sido adotada pelos Uzumaki.

    Encolhi os ombros, olhando-a com pesar.

    - E então ele te bateu. – concluí, vendo-a assentir. Suspirei, puxando-a para outro abraço. – Ah, Hinata, eu sinto muito. Não sabe como gostaria de dizer à ele toda a frustração que me incomoda aqui dentro.

    - Você não tem culpa, Naruto. Nem você e nem seus pais. Sabe disso, não é? – murmurou, tímida. Olhei em seus olhos e enxerguei sua súplica silenciosa. Sorri com o canto dos lábios.

    - Se um dia Hiashi fizer mal à você por culpa dessa rixa idiota outra vez, eu juro que vou te tirar de lá, Hinata. Nem que eu tenha que me esconder com você, nem que tenhamos que encontrar o modo mais difícil de lhe tirar o poder de tutor, mas eu o farei. Eu juro, Hinata, eu não vou deixar nada de ruim acontecer com você. É uma promessa de vida. – disse, olhando-a intensamente. Toquei sua face machucada, fazendo um carinho lento para que não ardesse. Meu dedão roçou seu lábio, puxando-o bem sutilmente. Eu vi que sua testa se franziu, ela sentira dor pelo mínimo toque. Levei dois dedos aos meus próprios lábios, depositando um selinho e depois toquei seu corte, como se enviasse o beijo.

    - Já que não tem sua mãe para fazer e a minha está longe, vou me responsabilizar pelo poder do “beijo curativo”, embora você tenha se machucado num lugar meio complicado. – murmurei, coçando a parte de trás da cabeça, envergonhado.

    - Não se preocupe, todo o seu ser já me cura. – ela disse, inocente de que eu havia mentalizado a mesma coisa, mas aplicada à mim. Sorri, abobalhado e fazendo-a corar.

    - Tá, ótimo, mas não seja tão kawaii, porque senão eu vou ter que te apertar ai nas bochechas até você implorar por socorro. – ameacei, fazendo um bico teatral. Hinata sorriu amplamente, tímida ao balançar a cabeça e abaixá-la.

    Talvez sorrir assim doesse, pelo corte, mas ela o guardou para mim mesmo assim. Toquei sua mão, sentindo-me levemente ousado por fazer aquilo várias vezes. Mas eu ainda estava em horário de almoço e não podia deixar que ela ficasse sem comer outra vez. Hinata era o tipo de ser tão tímido e acostumado ao congelamento de si mesma que podia esquecer até mesmo de se alimentar. Eu via isso nela, no modo como agia, principalmente quando estava triste. A depressão que um dia a assolara ainda tentava vagar em seu âmago, assombrar e tirar-lhe a pequena vida que levava.

    E isso era o que mais me entristecia. Podia vê-la me rejeitar, podia aguentar anos de amor platônico, mas não podia aguentar aqueles olhos perderem o brilho. Era pesado demais, me corroía, me deixava um caos, feito o pó. De alguma forma, cuidar daquela frágil e ao mesmo tempo extremamente forte garota era como uma missão dada desde meu nascimento para esta dimensão.

    - Vamos voltar agora, baixinha, nada de ficar sem comer outra vez. – disse, tentado soar divertido para lhe quebrar um pouco da tensão. Funcionou por uns segundos, mas ela logo balançou a cabeça.

    - Estou horrível, não posso aparecer assim. – protestou.

    - Eu te acompanho até a porta do banheiro, você lava esse rostinho e depois nós inventamos uma desculpa. Podemos dizer que você tentou brincar de luta-livre na rua e acabou apanhando feio. – brinquei. Ela riu. – Ou podemos simplesmente dizer que você caiu da escada em casa, bateu o rosto e chorou a noite inteira porque sua cabeça latejava como o inferno.

    Hinata levantou o rosto, ponderando.

    - Dramático. – zombou, após um tempo. Eu ri, dando de ombros. Ao menos ela havia cedido. Saímos da sala e eu cumpri com o prometido, esperando-a ao lado da porta. Sua expressão já estava bem melhor depois de lavar o choro e rir um pouco. Certifiquei-me de não lhe deixar encapuzar-se de novo e de passar-lhe confiança com um braço passado ao redor de seus ombros e enfim fomos para nosso almoço atrasado.

    É claro que isso nos gerou perguntas e preocupação por parte das meninas sobre o rosto de Hinata, mas até que minha desculpa foi realmente dramática o suficiente para cegar todo mundo da verdade. Eu lancei uma piscadela para a baixinha quando desencanaram de lhe importunar com perguntas e ela sorriu, grata. Eu me concentrei em comer, sorrindo também.

    Era incrível como eu podia sentir tanto em tão pouco tempo. Tanta raiva por vê-la sofrer e tanta alegria por lhe curar. Sentia-me tão maduro perto dela, tão cheio de responsabilidade, de vontade de cuidar e abraçar sua vida como se fosse acorrentado ao seu sorriso. Era uma doce dependência, tímida... suave... natural e pura. Diferente de um desejo, diferente de uma decepção e diferente de qualquer coisa ruim que pudesse colocar em prova o que preenchia meu coração. Ao lado dela, eu tinha mais do que tudo isso, eu tinha a calma na alma.

    Bom, talvez isso fosse o amor. A capacidade insana de perdoar, de cuidar e de querer por perto, apenas para poder sentir o calorzinho que irradiava da pele ou como o som da risada podia eriçar os pelos dos braços. Singelo, fraterno e ao mesmo tempo desejoso, quente e forte.

    Eu sabia que não era imediato para ela como era para mim, mas algo me dizia que Hinata também podia sentir essa ligação entre nós, tal como destino, como se estivesse escrito nas estrelas. Eu estava preparado para contar cada uma ao seu lado durante todo o tempo que nossas vidas durassem. Mas naquele pequeno momento da eternidade, eu só precisava guardar uma única frase, um único sentimento e uma única razão:

    Eu te amo, Hyuuga Hinata. 


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