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Vi de longe o vestido branco no meio do mato e entrei para verificar, apavorado, embora meu corpo já não respondesse aos meus comandos, eram apenas meus instintos falando mais alto, ou talvez Rose pedindo para ser encontrada. O vestido, jogado no chão estava manchado de sangue, não muito longe dali encontrei seu corpo. Na altura do peito, a garota tinha um buraco de bala de onde o sangue escorria. Era minha Rose, mais branca do que nunca. Os olhos verdes, miravam o horizonte como antes mas não estavam realmente vendo nada. Jogada um pouco à dentro do mato, mas não tão longe da estrada, quase se podia ver o corpo mesmo da rua. Quem quer que a tivesse jogado ali, provavelmente não tinha tido tempo suficiente para escondê-la direito.
Tremia feito vara verde, demorou mais vinte minutos para que o choque me permitisse pegar o celular e ligar para a mãe de Rose. Disse para virem buscá-la, disse que a tinha encontrado. Viriam buscar Rose, e me buscar também. Pois não podia sequer me levantar. Minhas pernas haviam perdido toda a força, minha mão não parava de acariciar o rosto e os cabelos de Rose, semi-nua no chão. Logo me vi ali, debruçado, tentando inutilmente aquecer o corpo frio de meu amor. Minha cabeça sobre seu peito, e mesmo assim não ouvia seu coração. Seus lábios vermelhos, pareciam dizer meu nome. A lua acima parecia acompanhar tudo numa expressão triste, e sua palidez aquela noite era como a de Rose, tão pura. Exceto pelo sangue.
Gritei. Mesmo sabendo que se alguém me visse ali, acharia que eu a teria matado. Gritei seu nome, gritei o nome de Charles, e o amaldiçoei de todas as formas.
- Não quero mais... Não quero mais ver esse mundo desta forma! - dizia eu, sentado perto à Rose, eu sussurrava agora com o sangue dela em mim ? Eu não quero nunca mais! Nunca mais me sentir tão fraco, tão... Impotente! Não pude fazer nada, mesmo agora eu não poderia fazer nada! Quero que eles paguem... Quero ser aquele que irá fazer eles pagarem! Quero que eles sofram!
Ouvi um som em meio a floresta, não me importei. Nada poderia me trazer mais medo do que o que estava sentindo, de nunca mais ouvir o som da voz de minha Rose. Olhei para o rosto dela, machucado, o corpo com manchas por toda parte, imaginando quanta dor havia sentido antes da morte, enquanto os monstros brincavam com ela. Ela não merecia. O que havia me restado? Nada, apenas a dor. Não queria mais nada daquele mundo, apenas vingança. Ouvi o som de um carro, me levantei por instinto, minhas pernas me obedeceram, pensei ser o carro dos pais de Rose, me enganei. Um Pálio escuro vinha rápido pela estrada. Eram eles, deviam estar voltando, agora tentariam esconder o corpo que antes não puderam fazer. Saltei no meio da rua, agarrei uma pedra enorme do chão e arremessei com toda a força. O carro perdeu o controle após o vidro se quebrar, derrapou, me acertou em cheio. Não me lembro ao certo o que houve depois de ter sido jogado para o matagal novamente, apenas que o som de outro carro vindo assustou os garotos, deviam ser os pais de Rose, e também Tiago que já devia estar sabendo àquela altura. Mesmo com o vidro quebrado, os assassinos aceleraram e desapareceram, me deixando ali, sangrando. Rastejei até o corpo de Rose outra vez. Eles escapariam se eu morresse, negariam o envolvimento. Se eu não sobrevivesse para denunciá-los, ficariam impunes, seus pais pagariam advogados, alguns tinham contatos importantes... Tiago morreria nas mãos deles tentando fazer justiça com as próprias mãos.
- Eu não posso morrer... Se eu me for, tudo estará perdido! - sussurrei. - Minha Rose...
Então, senti alguém me carregar para longe dali, mesmo com o peso de meu corpo, quem quer que fosse, parecia estar correndo muito. Logo, minha visão embaçada já não podia ver sequer o local onde o vestido branco de Rose havia sido deixado. Nada, apenas o som do ar se deslocando a minha volta, estava no meio da escuridão. Mal tinha consciência do que se passava, já não podia sentir meu corpo, apenas enxergava um borrão claro em forma de círculo, a lua, acreditei. Quem me carregava tinha mãos frias, podia perceber isso mesmo sabendo que eu mesmo estava muito frio naquele momento, devido a perda de sangue. Era ainda mais frio do que eu, e me deixou no chão ali por um tempo, me observando, podia sentir.
Respirei com dificuldade por um tempo, sentia a morte vindo mais rápido, então ele me perguntou: ''- Queres continuar nesse mundo, ou queres descansar? Sei que podes me ouvir, não pode se mover ou falar, mas peço que responda-me... Se quiseres descansar, prometo a ti, cuidarei deles pessoalmente, levarei a vida de cada um deles, e poderás morrer tranquilo, se for este o caso, feche os olhos e os mantenha assim para que eu saiba tua decisão. Se quiseres continuar essa vingança, se teu ódio por eles é tão grande, que o faz querer fazer isso sozinho, olhe para mim, fixamente e apenas para mim, e me diga com seus olhos''.
Parecia loucura, mas não pensei nem por um instante, fechei meus olhos fortemente por um breve momento, depois os abri e o encarei. Estava ao meu lado, agachado sobre mim, os cabelos longos esvoaçavam e brilhavam mesmo na escuridão da noite. Seus olhos eram de um vermelho vivo, eram olhos de fogo. Então me mordeu. Senti os caninos afiados quando perfuraram minha pele, em seguida, pouco antes de ter a sensação de que meu corpo morreria enfim, ele me carregou novamente.
Adormeci finalmente, sem saber se acordaria outra vez.