Jóia Rara

Tempo estimado de leitura: 16 horas

    18
    Capítulos:

    Capítulo 5

    Memórias

    Álcool, Hentai, Linguagem Imprópria, Sexo, Suicídio, Violência

    Ohayo, minna! Primeiramente, por favor, DESCULPEM! Eu sei que demorei para postar, mas juro que posso explicar. Estive em duas semanas bem corridas e eu acabei ficando sem tempo, porque eram minhas últimas semanas de aula e tinha muita coisa pra finalizar. Iria postar no final de semana, mas no tempo livre que eu tive, fiquei sem internet :(

    Maaaasss, aqui está! E apesar de o capítulo não estar longo, eu senti que era a hora certa de termina-lo. Eu espero imensamente que gostem e queria agradecer à todos os leitores(as) que estão favoritando e comentando, isso me motiva muito, muito mesmo! Hoje nós temos trilha sonora, minna! Eu amo a soundtrack de Naruto Shippuden, desde às instrumentais até alguns openings e endings. Então hoje a música é Early Summer Rain e como é instrumental, não pude colocar um trecho dela para indicar à vocês a hora certa de dar o play. Portanto, vai ter uma pequena interrupção no meio do capítulo, mas foi necessária para orientá-los, está bem? O link da música está nas notas finais. Nos vemos por lá! Boa leitura :)

     Hinata

         Três dias depois, o sol anunciava uma nova manhã de sábado. O relógio dizia que ainda era cedo demais para sair da cama, mas eu já estava sentada na janela, balançando as pernas no ar e deixando a brisa suave pentear meus cabelos. A cidade amanhecia junto com o dia, despertava aos poucos, embalada pelo som dos pássaros. A luminosidade solar se arrastava pelos prédios e casas, as copas das árvores dançavam suavemente e as ruas estavam relativamente calmas. Observei ao longe onde deveria estar localizada a casa do Uzumaki. Era perto dali, eu sabia, e me lembrava de como a residência ampla e bonita aparentava abrigar uma família feliz. Como deveria ser a vida dele? Chegaria em casa depois da aula gritando "tadaima" e seria recebido por seus pais, irmão ou irmã, talvez? Teria cães ou gatos? Era certo que aquela personalidade vinha de uma boa criação. Ou poderia ele ter sido exposto à escuridão? Eram questões bobas, mas ainda assim ecoavam em minha mente.

       Porque eu... eu queria ser como ele.

       De repente, a porta foi aberta e Aiko irrompeu por ela, estagnando logo em seguida ao me ver ali.

    - Hyuuga! - exclamou, assustada. Seus olhos me analisavam como se eu fosse louca. Talvez estivesse pensando que eu pretendia me jogar da janela. O pensamento poderia até soar melancolicamente cômico, se eu ainda achasse graça de algo por ali.

    - A resposta é não - disse. Ela mudou ligeiramente a expressão para interrogativa. - Sobre o que está pensando. Eu não estou.

    - Eu... desculpe, pensei que estivesse dormindo e precisava buscar as roupas sujas. - disse ela, ainda hesitava no mesmo lugar.

    - Eu faço isso. Lavarei minhas roupas. - respondi. Aiko deu um passo à frente, apoiava um o cesto médio na cintura.

    - Não é necessário. A máquina faz o trabalho.

      Dei de ombros.

    - Hai, arigatou. - murmurei, indiferente.

    - Sabe, você deveria descer daí, pode ser perigoso. - Aiko parecia temerosa, se por mim ou por ela, já não sabia dizer.

    - Não tenho medo.

      Algo no olhar dela remeteu à angústia e tristeza. Comprimiu os lábios e deu um suspiro quase imperceptível. Não era uma mulher ao todo ruim, apenas tinha a infelicidade de ser submissa aos caprichos da filha e de ter aquele medo e aversão contidos à mim.

    - Deveria ter. Você pode cair e se machucar, até mesmo morrer.

      Olhei para frente novamente, o sol já brilhava forte no céu amanhecido.

    - Ótimo, Aiko. - mumurei. Fez-se um breve silêncio, mas não procurei saber o que ela expressava.

    - Desça, a refeição da manhã já está servida. - sua voz soou vazia, oca, mas de certa forma cheia de algum sentimento, que para mim podia ser visto como pena. Apenas assenti, apesar do horário, sabia que aquela mansão despertava logo cedo. Não questionei os hábitos daquela família, apenas me infiltrei ali como uma inquilina que raramente dá as caras.

      Olhei para meu quarto bagunçado e suspirei. Não diferia de minha vida, mas sabia que deveria ajeitá-lo. Saí da janela com um andar pesado e comecei o trabalho. Aiko com certeza mexeria em tudo se decidisse atribuir a missão. Juntei meus materiais escolares do chão e fui até o armário para guardar. Ao jogar a mochila no fundo, ouvi um baque mínimo e um chacoalhar. Voltei os olhos para o canto escuro de onde o barulho viera. Ali, escondida sob a sombra das roupas penduradas, estava uma caixa que havia enterrado ali com a decisão de esquecê-la.

      Minha respiração tornou-se pesada. Queria ignorá-la, mas um sentimento estranho me tomou. Dei-me por vencida e apanhei a caixa, sentando-me na cama. Ergui a tampa e as milhares de fotos e papéis quase saltaram para mim. Um baú de memórias. A primeira foto que meus olhos alcançaram me fez mergulhar no tempo.

    *FLASHBACK*

       " - Hinata! - exclamou Akemi. Ela chamara para receber o grande sorvete italiano que comprava no carro de sorvetes. O dia estava ensolarado e eu brincava no parque.

    Dificilmente saía de casa, mas naquele dia Akemi estivera preocupada e fez de tudo para me convencer. Apenas oito anos eu tinha, minúscula e frágil, pálida como uma boneca de porcelana. Brincava delicadamente com flores de papel, origamis feitos pela matriarca. Olhei em sua direção, sorri. Os olhos dela brilharam de excitação quando viram meus lábios repuxados para cima. Entregou-me o sorvete e eu o lambi, sujando a  ponta do nariz. Akemi deu um sorriso maternal e apontou para a própria narina. Fiz uma cara emburrada e ela riu.

    - Vem cá, minha pérola, vamos registrar seu primeiro sorvete no parque. - disse com doçura. Ergueu sua câmera, esticando o braço e sorrindo amplamente. Na foto, eu saí lambendo o sorvete. - Está gostando? Não é legal passear? - continuou a dizer.

       Eu balancei os ombros pequenos, distraída.

    - E as suas flores? - insistiu.

    - Elas dormem. - murmurei, fitando o sorvete já pegajoso em minhas mãos. Akemi sorriu.

    - E elas possuem nomes?

      Olhei para ela, pensativa.

    - Deveriam? - perguntei com preocupação. Senti as bochechas corarem ligeiramente. Ela deu outro sorriso maternal.

    - Quer ajuda para escolher?

      Assenti timidamente. Akemi pegou as flores de origami e as analisou.

    - Gosto dessa amarela. - comentei.

    - Que tal algo relacionado à sol? - disse. Franzi o cenho.

    - Acho que ela gostaria de algo mais exclusivo, okaasan.

      A matriarca exibiu um sorriso orgulhoso. Afagou meus cabelos com delicadeza. A máquina já havia cuspido a fotografia e ela a pegou para me mostrar. Eu ri com timidez do sorvete em meu nariz e segurei-a com a mãozinha firmemente.

    - Tenho certeza que encontrará o nome certo. - afirmou, tocando minha bochecha com o dedo indicador.

      Continuei meu sorvete, entretida. Akemi segurava as flores e me fitava. Sabia de seus esforços para me alegrar, mas aquela quietude a preocupava. Era uma criança silenciosa demais.

    - Filha? - chamou. Olhei para cima, curiosa. Sorriu-me de modo hesitante. - Não quer brincar com as outras crianças ali? - apontou para um grupo próximo que corria na grama e brincava nos diversos brinquedos coloridos. Segui seu apontamento e neguei rapidamente.

    - Por que não, algum problema? - insistiu. Abaixei os olhos.

    - Não gosto de brincar com as outras crianças, elas me chamam de "doida". O que isso quer dizer, okaasan? - questionei baixinho. Akemi suspirou.

    - Não quer dizer nada, querida, não se preocupe. Mas... por que elas dizem isso, você sabe o motivo? - perguntou. Sua voz soava preocupada e carinhosa ao mesmo tempo.

    Dei de ombros.

    - Eu não entendi. Eu queria chamar uma menina para brincar, porque ela estava sozinha. Mas as outras começaram a me chamar de "doida" e disseram que não tinha ninguém ali. - falei com inocência. Mordi a casquinha do sorvete. - Elas não enxergam direito, okaasan?

      O olhar de Akemi parecia congelado. Ela deu um sorriso amarelo e afagou meu cabelo outra vez. Terminei de comer e passei as mãos sujas na grama.

    - Deve ser, querida, deve ser... Mas não diga mais sobre essas pessoas que só você pode ver, está bem? Isso é algo especial, meu amor, mas nem todos podem compreender. Posso contar com sua palavra? - ela disse com ternura. Assenti. Puxou-me para seu colo e eu me aninhei ali.

    - Okaasan? - chamei.

    - Sim, Hinata?

    - O que é... amigo? - perguntei. Senti o corpo de minha mãe ficar tenso. Endireitei-me para poder vê-la melhor. Seus olhos eram cálidos e ternos, mas levemente tristes.

    - Amigo é alguém que zela por você sempre e que te ama. Eu sou sua mãe e sua amiga, não, sua melhor amiga! Que tal? - respondeu, abrindo um sorriso suave. Eu sorri para ela de volta e a abracei outra vez.

    - Legal! - exclamei. Akemi riu baixo e se levantou comigo nos braços. Apesar da idade, sempre fora pequena demais.

    - Vamos para casa, querida, farei um delicioso zenzai para minha melhor amiga. - murmurou carinhosamente. E nós voltamos para o aconchego do lar, onde nada nem ninguém poderia arrancar de mim a luz que seu olhar me proporcionava.

      Exceto eu."

        Suspirei pesadamente. Atrás da foto estava escrito "sorvete no parque com minha melhor amiga". Akemi fora a primeira e imaginava que seria a última. Mas... agora eu tinha um novo amigo. Pensar nele me fez lembrar dos dias anteriores, das inúmeras tentativas de me fazer rir, das palhaçadas e brincadeiras, mas também dos sermões e dos momentos malucos em que ele parecia meu irmão mais velho preocupado com meu bem estar. Sorri. Sim, ele era meu amigo. Talvez Akemi o aprovasse se pudesse conhecê-lo. Guardei a foto na caixa e peguei outra, analisando-a. Nela, eu era só um bebê de um ano de idade. Estava admirando um dango que minha mãe segurava com a mão livre. Uma risada escapou de meus lábios. Sempre fora amante dos doces, característica herdada de Akemi. Atrás da foto, ela havia escrito "Muito dango e pouco dente, não é, filha?". Uma lágrima solitário desceu pela minha bochecha, enquanto eu pegava outra fotografia. Era a última que tiramos e estávamos no hospital, quando soubemos o sexo do bebê. Eu havia levado a câmera e a tirei ao lado do monitor que revelava a ultrassom. Akemi tira um sorriso de orelha à orelha e eu estava tímida. A única fotografia de nós três: okaasan, Hanabi e eu.

      Apertei o papel antes de virá-lo para ler sua legenda. A caligrafia era minha, que dizia "Primeira de muitas". A lágrima que escorria derramou sobre a frase, silenciosa e fria. Deixei a caixa ao meu lado e voltei para a janela. Fechei os olhos, lembrando-me desse dia como se tivesse acabado de vivê-lo.

             *FLASHBACK*

        "- Bom dia, minha pérola! - exclamou Akemi, massageando meus cabelos para me acordar. Abri os olhos devagar, encontrando-a sorrindo. Meu quarto escuro estava uma bagunça e cheirava a cigarro. Assustei-me por ela ter entrado ali. Apesar de saber que mais cedo ou mais tarde ela faria isso, não gostava de chateá-la. Me sentei na cama e cocei os olhos, em seguida me espreguicei e voltei a atenção para seu rosto ansioso.

    - Okaasan? - perguntei, querendo saber o porquê da visita. Ela riu, revirando os olhos.

    - Hinata! Você já é quase uma mulher, deveria ser mais responsável com seus compromissos! - exclamou. Assenti, tentando manter os olhos abertos. - Ei, a consulta, lembra?

      Assim que ela proferiu as palavras, arregalei os olhos e saltei da cama. Como poderia ter esquecido? Ela riu, satisfeita.

    - C-Claro! Eu perdi a hora, não esqueci, okaasan. - desculpei-me. Seu olhar maternal caiu sobre mim com amor, mas logo foi substituído pela preocupação. Seus dedos finos tocaram uma mecha de meu cabelo e a levou até as narinas, inflando o peito com o cheiro a ser inalado. Fiquei tensa. O suspiro que saiu de seus lábios rosados me fez sentir culpa.

    - Outra vez...? Hinata...

    - Gomen. - interrompi. Saí de perto dela, dando-lhe as costas. Olhei para minha escrivaninha devastada com os papéis rasgados, pitocos de cigarros e vestígios do espelho quebrado. Parecia que um furacão havia passado por ali na noite anterior. Akemi suspirou outra vez.

    - Tome um banho, a consulta é em uma hora. - murmurou ela. Caminhou para a porta, mas relutou antes de sair. Fitei-a pelo canto do olho. - Comprei dangos para você.

      Assenti.

    - Arigatou. - respondi. Ela saiu sem dizer nada e eu desabei na cama, expirando. Enterrei o rosto nas mãos e afugentei as lembranças. Decidi acatar ao pedido de minha mãe, a única pessoa que eu tinha em todo o mundo. Tomei banho, livrando-me daqueles trapos. Estava realmente ansiosa para pôr os dangos em meu estômago vazio.

      Quando entrei na cozinha, Akemi estava sentada à mesa, lendo o jornal. Uma de suas mãos repousava sobre o grande ventre e ela parecia concentrada. Sentei-me em uma das cadeiras. A refeição levantava um cheiro delicioso.

    - Itadakimasu. - murmurei. Ela levantou os olhos, fitando-me enquanto me servia da comida e do chá.

    - Vamos almoçar fora hoje, o que acha? - perguntou. Olhei para ela.

    - Está cansada para cozinhar? Eu faço, okaasan. - respondi, sorrindo-lhe de leve. Akemi franziu os lábios.

    - Na verdade, seria bom sair um pouco, Hinata.

    - Mas vamos na consulta, isso já é sair. - respondi, bebericando o chá quentinho.

    - Hinata...

    - Okaasan. - interrompi-a outra vez. Seu olhar transmitia insegurança. - Eu não gosto de sair de casa, você sabe. Eu farei o almoço para nós duas, será bem melhor assim. Você é minha melhor amiga, lembra? - falei. Akemi baixou os olhos e assentiu.

      Odiava vê-la tão desanimada. Suspirei, tentando pensar em algo que pudesse tornar o clima mais ameno.

    - Ei, o que acha que vai ser? Uma ou um pestinha? - perguntei. Um sorriso abriu-se em seus lábios e me senti satisfeita.

    - Sinceramente, algo me diz que é uma menininha. - cochichou. Um breve gritinho de empolgação escapou-lhe. Eu ri.

    - E como ela se chamará, caso isso se confirmar?

      Akemi exibiu um sorriso maior.

    - Seu nome será Hanabi. - contou. Sorri minimamente. Era um lindo nome.

      A matriarca estava tão apressada que tomou sua refeição rapidamente. Eu peguei nossa velha câmera, a acompanhei e logo saímos porta afora. Me esgueirei no banco do passageiro e nós iniciamos a corrida para o hospital. O trânsito nos complicou um pouco, mas nada que o bom humor de Akemi não pudesse suavizar. Ao chegarmos, tive que segurá-la no lugar, ou então sairia quicando de alegria. Aquilo me fazia rir. Sua empolgação era tão grande que não conseguia entender como ela poderia aguentar alguém tão quieta feito eu. A médica nos recebeu com um sorriso gentil no rosto e me deu um banco para sentar, enquanto Akemi se deitou sobre a maca.

    - Ansiosas para saber o sexo? - perguntou a doutora, vendo o assentir animado de minha mãe. Fiquei olhando para o monitor, imaginando como a mulher decodificava aquele negócio. A imagem que se formava na tela aos poucos foi ganhando forma, enquanto a médica esfregava o aparelho no gel sobre o ventre elevado de Akemi. Parou um minuto, analisando e então um sorriso profissional se formou em seu rosto. Nossos olhares, meu e de minha mãe, tentaram ver por trás daquele sinal. Ela já havia identificado a resposta.

    - Parabéns, Akemi-san! Você está esperando uma linda menina! - exclamou.

      Os olhos de minha mãe encheram-se de lágrimas e ela deu o sorriso mais feliz que já vira. Sua expressão era tão contente que remetia à face de um anjo de luz. Fiquei hipnotizada por aquela cena. Juntou as mãos ao peito e uma risada, sua risada especial, preencheu o cômodo. Senti meu coração acelerar e enfim notei que também possuía lágrimas. Akemi olhou para mim e seu sorriso pareceu só aumentar.

    - Venha, minha pérola, fotografe isso! Vamos tirar nossa primeira foto com Hanabi. - disse. Assenti, vasculhando a bolsa a procura da máquina. Me levantei, secando os olhos com as costas da mão. A doutora se ofereceu para tirar a foto e eu aceitei, posicionando-me ao lado do monitor. O clique soou e senti a mão de Akemi tocar a minha. Nossos olhos se encontraram e suas próximas palavras fizeram todo o meu corpo se aquecer, ao mesmo tempo em que, por um instante, toda a escuridão de mim se esvaiu:

    - Eu amo vocês."

        O vento mais uma vez penteou meus cabelos e fez os vestígios de lágrimas gelarem em minhas bochechas. Voltei para dentro e guardei a caixa outra vez no fundo do armário. Lembrar doía. Me arrastei até o banheiro e liguei o chuveiro, sentando-me sob a água. Deixei que ela me lavasse, que me tirasse aquele gosto de nostalgia. De olhos fechados, procurei descansar a mente. Tinha um longo dia naquela casa, embora ultimamente a estadia ali tornara-se insuportável. Massageei as têmporas, cansada.

    De repente, escutei meu celular apitar. Abri os olhos, encarando o aparelho em cima do balcão. A tela piscou por uns segundos e então voltou a apagar. Lembrei-me instantaneamente do Uzumaki. Seus olhos azuis brilharam em meus pensamentos, seu sorriso amplo, seu grande tamanho estendendo-se sobre mim de modo orgulhoso e seus fios dourados que emolduravam o rosto másculo. Podia até mesmo ouvi-lo murmurando "baixinha", como sempre fazia, na tentativa de me fazer sentir alguma coisa, reagir às suas conversas e brincadeiras.

      Acelerei meu banho, vendo-me ansiosa para saber o que fizera o celular tocar. Assim que me sequei e vesti, peguei o aparelho, sentando-me em minha cama. Eram duas mensagens do número salvo como "Grandalhão". Sorri minimamente. A primeira dizia "Bom dia!" e a outra "Acordei muito cedo, baixinha! Você me perseguiu de noite outra vez". Intriguei-me com a insistência de seus sonhos sobre mim. Não sabia muito o que responder. A única pessoa com que trocava mensagens, era Akemi. Digitei "bom dia" e então poucos risadas. Pensei que me desculpar seria o certo e então o fiz. Não demorou muito e o celular me devolveu suas respostas.

    Grandalhão: Yo! Acordou cedo também.

               Hinata: Não consegui dormir.

               G: Ta tudo bem ai, Hinatinha?

               H: Uzumaki.

               G: Ta, ta, você nunca está bem. Acertei?

               H: Não dá pra expressar nada por esse negócio. Não sei usar isso.

               G: O quê? Você não usa a caixa de mensagens?

               H: Não. E não gosto disso.

               G: Certo.

      Para minha surpresa, o telefone berrou, apontava o número do loiro. Minha testa se suavizou, estava me sentindo estranha por conversar daquele jeito. Atendi no segundo toque. Sua risada soou imediatamente do outro lado da linha. Fiz uma expressão emburrada.

    - Baka! - exclamei.

    - Quanta gentileza, baixinha! - disse ele, divertido. Revirei os olhos.

    - Você está me ligando e não são nem dez da manhã. - apontei.

    - Quem é que estava resmungando que não gostava de mensagens? Are, Hinata, sua velha.

      Bufei.

    - Francamente.

    - Olha só, bom humor em pessoa, vamos sair. - ele afirmou.

    - O quê? Não. - bufei outra vez. Ele riu.

    - Claro que vamos. - insistiu.

    - O que te faz pensar isso, garoto?

      O riso dele ainda se estendia do outro lado.

    - Porque meu dia está feliz demais e para dar uma equilibrada na balança, nada melhor do que ver uma rabugenta como você! - zombou.

    - Uzumaki! - exclamei. Sua gargalhada me fez sorrir um pouco.

    - Não quer sair dessa casa chata? - perguntou. Pensei por um minuto. De fato, queria, mas com ele? Não havia cogitado a possibilidade ainda. Suspirei, dando-me por vencida.

    - É. - respondi simplesmente.

    - Claro que quer, eu sei, eu sei. Sou o melhor, sempre acerto. - brincava. Queria lhe mostrar a língua, se a conversa fosse pessoalmente.

    - Baka. - murmurei tediosamente.

    - Kawaii. Nos vemos logo então, vou comer um pouco e depois vou te buscar. Hoje o dia vai ser bom, Hinata, eu prometo. - ele disse. De repente, ouvi um grito agudo de uma mulher chamando o nome dele, pronunciando-o de forma longa.

    - BAKA! DESÇA IMEDIATAMENTE, MOCINHO! - berrava a mulher.

    - Estou indo, okaasan! - ele gritou. Talvez tivesse tentado abafar o som de sua voz, mas não obteve sucesso. Eu suspirei. - Ei, Hinata. - ele chamou.

    - Hm?

    - Você ouviu isso? Minhas garotas adoram me chamar de baka. - zombou. Revirei os olhos.

    - Não sou sua garota. E você é mesmo um baka. - respondi. Ele gargalhou.

    - Até mais, baixinha. - e desligou.

      Fiquei olhando para a tela do celular, vendo o número dele ali. A luz do aparelho enfraqueceu e enfim apagou-se por completo. Guardei-o no bolso e peguei algumas notas de dinheiro, enfiando-as também no jeans. Apanhei um moletom azul, para caso o clima ficasse mais frio, e desci para a cozinha. Lá embaixo, a família de três se  reunia ao redor da mesa. Pensei em pegar um biscoito e uma chícara de chá e comer longe dali, mas o olhar de Hiashi frustrou meus planos. A contra gosto, sentei-me com eles. Pigarreei, incomodada. Servi do chá e beberiquei. Aiko e Hiashi comiam em silêncio, mas Mayumi me fitava.

    - Como vai, Hinata? - perguntou o patriarca, quebrando o silêncio. Olhei para ele e dei de ombros. Meu celular vibrou outra vez e eu o peguei. Era uma mensagem do Grandalhão.

    - O Conselho está te mandando mensagens? - perguntou Hiashi, desconfiado.

    - Hm, o Conselho? Não. - respondi. Abri a caixa de mensagens e vi seu recado de "dez minutos". Guardei o celular, lembrando-me de que não deveria ligá-lo à mesa.

    Suspirei, notando o olhar pesado de Aiko. Bebi o chá rapidamente.

    - Vai sair? - perguntou Hiashi outra vez.

    - Hai. - respondi sem rodeios.

    - Para onde?

    - Não sei ainda. - o olhar de todos da mesa estava sobre mim.

    - Com quem vai sair, Hinata?- perguntou outra vez. Aquilo já estava me irritando.

    - Um amigo. - minha confissão fez todos arregalarem as orbes irritantes. Mayumi quase cuspira o biscoito.

    - Amigo? - ecoaram em uníssono. Arqueei as sobrancelhas.

    - Hai.

    - Quem é esse amigo? - perguntou Mayumi, desconfiada. Semicerrei os olhos para ela.

    - Hinata. - Hiashi reforçou a pergunta da filha com o olhar.

    - Hm, Naruto. É o nome dele. - respondi, dando de ombros. A jovem Sasaki tossiu o seu chá, surpreendendo seus pais.

    - O quê? - gritou. Levantei-me. - Uzumaki Naruto?

    - Hai, Uzumaki Naruto. Mais alguma coisa? - perguntei ironicamente. Hiashi olhou-me seriamente, sua expressão tornou-se lívida e seu hashi foi abruptamente jogado no prato.

    - Nenhum membro da família Sasaki conversa com esses Uzumaki, Hinata. Você não sairá com ele. - disse o patriarca, parecendo realmente nervoso. De uma forma grandiosa, aquilo me atingiu em cheio e despertou uma irritação impressionante. Lancei meu olhar frio para ele.

    - Acontece, Hiashi, que eu sou uma Hyuuga. - respondi, deixando-os estatelados na cozinha. Saí porta afora e decidi esperá-lo na calçada da rua. Qualquer coisa seria melhor do que ficar dentro daquele lugar. Após alguns minutos, o Altima apareceu no início da rua. Apressei-me para entrar e um cheiro me invadiu. Era levemente amadeirado e cítrico.

    - Yo! - saudou. Sorri, assentindo.

    - Ohayo. - respondi. O garoto deu a partida e percebi que aquele cheiro vinha dele. Será que nunca havia notado? No rádio, dessa vez, tocava alguma música agitada. Não reconhecia o cantor, mas era japonês. O loiro dirigia com um sorriso nos lábios, o sol lhe banhava como uma carícia, as janelas estavam abertas e o vento lhe bagunçava os cabelos dourados. Ele era... tão bonito. Suspirei. Jamais botava em palavras, mesmo que no consciente, as qualidades de alguém que não fosse Akemi. Não por falta de achar, mas porque considerava um erro fazê-lo. Quando o fiz, há muito tempo atrás, não obtive bons resultados. Mas Naruto era minha única exceção. De algum jeito, eu sabia que podia intitulá-lo como meu amigo e acreditar nisso.

    - Muitos estresses? - ele perguntou.

    - O de sempre. - murmurei, olhando para minha janela. O vento levou meus cabelos para trás, dando-me uma gostosa sensação de liberdade.

    - Gosta disso? - perguntou, seu tom de voz era suave. Virei o rosto para ele. Seus olhos acompanhavam minhas feições.

    - Hai. - respondi sincera. Naruto olhou para a estrada e então de volta para mim. Sorriu, esticou uma mão para tirar uma mecha de cabelo do canto de minha boca. Eu fiquei parada, analisando-o. Mas o movimento fora puramente carinhoso, apenas. Sorri, elevando os cantos da boca suavemente.

    - Vai ser um dia bom, ok? Eu sei que você raramente tem um. - murmurou. Olhei para seu rosto enquanto ele dirigia, sentindo-me grata.

    - Para onde vamos? - perguntei, voltando a olhar para a janela.

    - Estava pensando em compartilhar um pouco dessa cidade contigo. - ele falou. Deu uma pausa, talvez esperando que eu me pronunciasse, mas não o fiz. - Eu nasci e cresci aqui, então vou te deixar saber quem sou. Gostaria de conhecer o meu mundo, srta Hyuuga?

      Sorri, sem olhar para ele. O garoto sabia como organizar suas palavras e me acertar em cheio. Sua gentileza era demasiada para ser vencida pelo meu medo. Nunca, em todos os anos, havia conhecido alguém bom de verdade que não se resumisse à minha mãe. E era curioso como, depois de tudo o que me ocorreu, encontrá-lo tenha me dado novamente a vontade de ser alguém. Estava ali, naquele carro com ele, havia deixado-o se infiltrar em minha vida e agora já não podia mais voltar atrás. E nem queria.

                                                                ***

    - E eu disse para ela: Obaa-chan, por que você me bateu? - contava o loiro. Eu balancei a cabeça, rindo baixo. - É sério, ela ficou tão vermelha! E tudo porque a chamei de obaa-chan quando disse que se casaria com o Jiraiya!

    - Ela é jovem demais para ser chamada assim, Uzumaki. - respondi. Ele bufou.

      Estávamos em uma pequena lanchonete tomando o café da manhã. Já que o meu fora interrompido e o garoto nem chegara a ingerir algo, acabamos por decidir retomar a refeição. Ele tagarelava constantemente, tentava me divertir e contava coisas mínimas sobre sua vida. Eu apoiei o queixo no punho e bebi do café americano.

    - Então é como se a diretora fosse da sua família? - perguntei. Ele assentiu.

    - É mais ou menos por ai. A família não é muito grande, então somos abertos à novas agregações. - respondeu.

      O loiro bebeu seu café e olhou para mim. Parecia feliz, de um jeito brando, possuía um sorriso gentil e olhos brilhantes tranquilos como o mar ao amanhecer. Pensei sobre o que aquilo queria dizer, a hospitalidade dos Uzumaki. Me despertava a vontade de conhecê-los. Será que os outros também tinham aqueles pares de orbes azuis?

    - Família... - murmurei. Fechei os olhos, inspirei o ar levemente adocicado da lanchonete. - Aposto que eles têm de suportar você. - brinquei. Ele riu e eu abri os olhos para assistir à cena daquele rosto feliz.

    - Acho que eles podem fazer isso, sim. - respondeu, sorrindo. Meus lábios se repuxaram de leve para cima.

    - E você os ama. Muito. Certo?

      O Uzumaki sorriu mais amplamente, seus olhos se aqueceram e tomaram um tom nostálgico. Devia estar se lembrando de sua família, o que deixava nítido em todo o conjunto de expressões do garoto. A simples menção no assunto o fazia eletrizar-se de sentimentos fraternos.

    - É, baixinha, eu os amo. - respondeu com ternura. Tendi à curiosidade para entender como era aquele sentimento tão puro que ele exibia.

    - Como eles são? - perguntei. Naruto mordeu um cupcake de chocolate, degustando do doce enquanto pensava.

    - São boas pessoas. Meio loucos, mas gosto muito disso. - respondeu, comendo outro pedaço. O canto de sua boca ficou sujo com a cobertura e eu sorri, lembrando-me da foto que havia visto há pouco tempo atrás. Ele parecia tão desastrado quanto eu. Estiquei o dedo, limpando a sujeira. O loiro paralisou, analisando minha atitude.

    Quando afastei a mão, ele pareceu segui-la com os olhos, mas rapidamente colou-os nos meus outra vez e corou de leve.

    - Me fale mais. - pedi, verdadeiramente interessada. Seu sorriso foi pequeno, diferente dos outros radiantes. Ele parecia... admirado?

    - Bom, okaasan é muito agitada. - riu - Digo, realmente agitada. E nervosa! Mas apesar disso, é muito amorosa e protetora. Já meu otoosan é totalmente diferente. Ele está sempre calmo, cauteloso, é mais observador e seu jeito de demonstrar amor é mais contido. Fazem uma bela dupla, é o que eu acho. - contou. Sorri minimamente, tentando imaginá-los.

    - Então você não tem irmãos? - perguntei. Ele negou com a cabeça, mordendo o bolinho outra vez.

      Bebi do café, pensando sobre nossa conversa. Há pouco tempo atrás, Hiashi dissera com desprezo que os Sasaki não se misturavam com os Uzumaki, o que me fazia pensar que o motivo pudesse ser a diferença entre as duas famílias. De um lado, um bando de frios com valores invertidos e do outro um grupo feliz e caloroso. Talvez Hiashi achasse isso repugnante. Mas aquele olhar... por que pareceu tão nervoso? E além disso, lembrava-me que Naruto não fora receptivo ao saber quem é o meu pai. A rivalidade, pelo visto, parte de ambos os lados.

    - Ei, senhor bolinho. - chamei. O loiro me lançou um olhar de canto. - Você disse uma vez que cresceu com a conceito formado sobre os Sasaki como pessoas ruins. Por quê?

      Naruto engoliu o que mastigava e pareceu ponderar. Esperei que ele formasse as palavras, queria realmente saber.

    - Bom, meus pais costumavam sair com Hiashi. Eles conversavam no escritório quando eu era pequeno e eu sempre o via sair de lá com uma carranca. Okaasan dizia para eu não puxar assunto com aquele senhor e fazia o possível para me manter longe do olhar dele. Eu achava estranho, mas quando tive idade para perguntar o porquê, minha mãe disse que a família de Hiashi, principalmente ele, eram pessoas corruptas e imorais. E depois disso, nunca mais falamos sobre Hiashi e tampouco o vi outra vez na minha casa. - contou. Franzi o cenho.

    - Estranho... - murmurei.

    - Por quê? - interrogou. Olhei para o meu café, deslizando o dedo indicador pela borda do copo.

    - Hiashi ficou sabendo que somos amigos agora. - respondi. O loiro continuou esperando pela resposta. - Todos ficaram... escandalizados com isso. E eu fiquei irritada, acabei brigando com ele. Mas suas palavras denotaram que ficar longe dos Uzumaki é como uma lei naquela casa.

      Naruto suspirou. Olhei para ele, queria juntar as peças, mas não obtinha nada em mãos que pudesse me trazer respostas.

    - Talvez seja algo relacionado à negócios. - ele deu de ombros. - Meus pais são empresários. Hiashi também. E rivalidade nessas coisas é algo bem comum.

    - Eu não sei. Pode ser, mas acho que não é o motivo que importa, primeiramente. Não sei se estou segura ali. - confessei, encolhendo os ombros. Naruto ficou olhando para mim, absorvendo as palavras com a testa franzida.

    - Acha que a teoria do "cova do inimigo" se aplica à sua realidade? - perguntou, sério. Suspirei.

    - Não sei. Mas estou começando a ficar alerta. Estou cercada por incertezas. Não me entenda mal, mas não conheço você e sua família tão bem assim. E tampouco conheço os Sasaki. Não sei qual lado pode ter mais razão nessa história. Talvez se eu ao menos tivesse essa resposta, pudesse teorizar em quem devo melhor confiar. - admiti. O loiro assentiu, olhando aleatoriamente para a parede.

    - Entendo. - murmurou. Olhei de relance para ele, procurando algum sinal de mágoa por minhas palavras.

    - Mas tem uma coisa.

    - Hm?

    - Eu confio em você. - falei. Os olhos azuis dele se suavizaram quando focou-os em mim e o canto esquerdo de sua boca ergueu.

    - Mas ainda assim não pode escolher um lado. Eu sei. - respondeu. Desviei os olhos.

    - Não... ainda. - murmurei. O suspiro que veio dele não foi exasperado, o que me surpreendeu. Naruto parecia compreensivo até demais.

    - Eu admiro você, sabe, baixinha. - começou. Voltei minha atenção à ele, sentindo repulsa de mim mesma ao ouvi-lo sendo tão inocente. - Porque você está aqui, apesar de tudo. Não quero dizer viva, embora ainda seja um grande passo, mas me refiro à estar aqui comigo. - continuou. Balancei a cabeça.

    - Uzumaki. - interrompi. Ele se calou de imediato. - Não sinta isso, ok?

      Notei seu olhar penetrante sobre mim, a insistência de sua fé procurando qualquer brecha para me vencer. Odiava ter que cortá-lo, mas odiava mais ainda o ver se enganando. De repente, senti seu dedo afagar uma mecha de meu cabelo, colocando-a atrás de minha orelha e permitindo à ele melhor visão de meu rosto, agora corado por surpresa.

    - Hina-chan - chamou. Não ousei olhá-lo. - Você pode até tentar pedir que eu não o sinta. Mas não pode controlar isso. Eu admiro você. Aceitando ou não, essa será a verdade. - disse ele.

    - Mas...

    - Vamos nessa, o dia só começou. - ele interrompeu, levantando-se. Deixou duas notas no balcão e acenou para o garçom atrás dele. - Eu sou seu guia, esqueceu? Pode colocar um sorriso nesse rosto ai porque próxima parada, aí vamos nós!

      Dito e feito, fui arrastada pela mão para fora da lanchonete e levada pelas ruas até cada vez mais fundo na vida de um certo loiro.

                                                            ***

         O Altima parou numa rua quase deserta. Era uma pequena área florestal protegida, onde só algumas famílias passeavam com seus cães ao longe. Nós descemos e eu deixei Naruto andar à frente, levando-me até a sombra de uma árvore. Sentamos no gramado fofo e o cheiro doce das flores logo dançou com o vento a nossa volta.

    Analisei o local com uma nostalgia nítida no olhar. Assemelhava-se tanto ao parque que Akemi me levara para tomar o sorvete! Mas não era. E eu sabia disso tão bem que o entusiasmo nem se dava ao trabalho de surgir. O Uzuamki ajeitou-se, encostando o corpo no tronco e inspirando o ar com um sorriso suave. Dobrei os joelhos e os abracei, encolhida ao lado dele.

    - Esse era o meu lugar favorito quando era criança. - comentou.

    - Parece divertido.

    - Na verdade, foi aqui que eu e o Sasuke conhecemos a Sakura quando tínhamos seis anos. A partir desse dia, eu ganhei uma irmã. E na época isso supriu muita coisa nas nossas vidas, sabe. Sasuke odiava garotas, porque o Itachi enfiara na cabeça dele que elas só queriam dinheiro. Era até engraçado, foi uma brincadeira de mau gosto, mas só depois de Saky que ele desencanou dessa ideia. Por muito tempo nós fomos um trio imbatível, fazíamos tudo juntos. E além disso, minha mãe tinha perdido o segundo bebê, já sabíamos que seria uma menina e okaasan ficou tão triste que acabou afastando eu e o otoosan. Mas Sakura apareceu e, como eu disse antes, okaasan viu nela a filha que não teve. Como passávamos tanto tempo com ela, a saudade da irmã e filha que minha família tinha acabou sendo transferida para felicidade de ter Saky.

    Os pais dela sempre foram ausentes, viajavam muito, mas acho que ela não se sente mal por isso. E veja só, hoje os Haruno são muito mais próximos e graças aos ensinamentos que nossa amizade trouxe, os pais de Sakura finalmente compreenderam o valor da filha. - contou. Fiquei olhando para ele, tentando imaginar os três pequenos correndo por aí e fazendo travessuras.

    - Eu não entendo esse sentimento. - admiti. Naruto olhou para mim, seus olhos avaliavam o sentido de minhas palavras.

    - Por quê? - murmurou. Soltei um suspiro, não gostando muito do assunto, mas sentindo que deveria ser honesta.

    - Em toda a minha vida, eu só tive uma amiga. - contei, hesitando. As orbes azuis permaneceram em sua avaliação. - Okaasan. Ela era a única pessoa que eu tinha no mundo, minha melhor amiga.

      Olhei para o céu claro, vendo alguns pássaros sobrevoando a área. Naruto não disse nada, ficou esperando que eu processasse aquilo, para que pudesse exteriorizar o que sentia ao relembrar as memórias do passado. Franzi os lábios, tomando coragem para continuar.

    - Eram... problemas. Muitos. Uma infância diferente das outras. E-Eu... quero dizer, as pessoas, elas não gostavam de ficar perto de mim. - gaguejei, nervosa.

    - Tipo bullying? - perguntou o loiro.

    - O quê?

    - Bullying. Preconceito. Essas coisas... - respondeu sugestivamente.

    - É... eu acho. - murmurei. Apoiei o queixo no joelho, fechando os olhos. Procurei acalmar a agitação interna que me afligia. Falar sobre aquelas coisas era inédito. Mesmo com Akemi, pouco o fazia, mas julgava merecedor de ouvir somente aqueles que fossem puros e livres do olhar de ódio que frequentemente recebia. O que promovia Naruto e o tornava apto para ouvir.

    - Falar sobre isso é difícil? - ele adivinhou. Senti meus lábios tremerem e os olhos ficarem subitamente quentes. Reprimi aquilo com força, não poderia chorar outra vez na frente do Uzumaki. Já devia parecer frágil demais aos seus olhos.

    - Você parece estar frustrada. - comentou. Apertei os dedos na calça, desejando não derramar aquelas lágrimas. Naruto suspirou. - Não fique tão chateada com si mesma. Você é forte! É visível em seus olhos.

                         *Música*

      Levantei o rosto, olhando-o surpresa. Ele tinha um sorriso de canto suave, uma expressão tranquila, afetiva. A luz do sol pousou sobre ele, iluminando-o e fazendo-o olhar em sua direção. O calor parecia aquecê-lo como uma carícia, assim como antes. As lágrimas rolaram pelas minhas bochechas, vencendo a resistência sobre elas.

    Naruto parecia tão convicto do que dizia. O coração tão puro, tão pacífico, os olhos tão claros, tão luminosos. Era como um anjo disfarçado de humano, assemelhando-se tanto à personalidade de Akemi que me fazia tremer inteira só de tê-lo ao lado.

    - Naruto. - sussurrei.

    - Sim, Hina-chan? - perguntou suavemente.

    - Akemi era a única pessoa que eu tinha, mas não é mais a única que eu tenho. Ela se foi. Mas você está aqui. Você... você está aqui. - minha voz falhou, as lágrimas me afogaram e eu escondi o rosto.

    - Eu estou aqui. - ele repetiu. Sua mão segurou a minha e me puxou, levantando-me. Olhei para aquele garoto brilhante à minha frente. - Nós, Uzumaki, costumamos aceitar agregados. Eu já disse isso, não disse? Então... estive pensando, será que você está precisando de uma família, baixinha? - disse, sorrindo. Sem me deixar responder, começou a caminhar de volta para o carro, levando-me consigo. Entrei no carro, estupefata. O loiro deu a partida e sob o choque, mal pude perceber que de repente estávamos em frente àquela casa grande outra vez.

    - Seja bem-vinda. - o garoto murmurou, abrindo a porta do carro e em seguida a de sua residência.

      Fiquei parada na porta, sem conseguir dar um passo. Olhava para aquela sala com o coração saltando do peito. E então no momento em que senti a mão dele tocar a minha novamente, uma mulher apareceu com um copo nas mãos. Longos cabelos ruivos e olhos azuis como o mar.

    - Tadaima, okaasan. Esta é minha amiga, Hyuuga Hinata. - apresentou Naruto. Nesse momento, os olhos da matriarca pousaram em mim. O copo que ela segurava despencou no chão, estilhaçando o vidro por todo lado. A surpresa atingiu todos no cômodo e só então que eu notei o quanto ela parecia com alguém. Nossos olhares se cruzaram e só o que pude enxergar naquelas íris além da grande surpresa foi o que menos esperava, mas o que mais sentia falta.

       Amor.


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