Mais um querido personagem mostra as caras.
Espero que gostem :)
Capítulo 03 – A visita
Homura encosta na parede ao lado da máquina de café e dá um gole no líquido preto que acabara de colocar. Suspirando aliviada observa o céu através da janela aberta, fechando os olhos para aproveitar o silencio daquele ambiente. O corredorzinho onde Homura estava termina com uma máquina de café recostada na parede, no entanto, o local não era tão popular entre os funcionários, justamente pelo corredor estreito tornando-se inviável para o momento de descanso e diálogo entre diversas pessoas. E o fato de uma máquina bem mais próxima em um local mais amplo seria motivo suficiente para o abandono daquele minúsculo espaço. Mesmo assim, Homura adorava o silencioso corredor, local ideal quando queria pensar calmamente sobre as coisas, nesse quesito, nem a sua sala de trabalho cumpria com esse objetivo.
Depois de chegar atrasada, Homura correra por diversas divisões da empresa preparando documentos necessários para as próximas reuniões, que sucederiam dali algumas horas. Quando conseguiu um tempo para descanso veio até o dito corredor tomar um café e pensar no que vivenciou de manhã.
Lembra-se de Tatsuya como se ele estivesse ali, ao lado dela, sussurrando a declaração que fizera para ela. Um sorriso surge nos lábios, não era para menos, ter sido alvo de uma declaração amorosa deixaria qualquer mulher feliz e sorridente, mesmo que, a situação de manhã, não coubesse um ponto de vista tão romântico. Pensa na diferença de idade entre os dois, dez anos. Não era uma diferença que causava problemas, na verdade, tinha interesse por homens mais jovens, mas nunca em seus relacionamentos passou mais de cinco anos nessa desigualdade, então a divergência era algo um tanto quanto excitante. O que mais preocupava era o fato dele ser o irmão mais novo de Madoka, mesmo sendo uma realidade de outro “mundo”. Refletia sobre os sentimentos dela pelo rapaz, se era um interesse de uma mulher pelo sexo oposto ou uma esperança de poder sentir e recuperar a existência, mesmo que ilusória, de Kaname Madoka.
Suspira, dessa vez, pela análise retardada que fez, e leva o copinho de café até a boca. Percebendo o vazio, vai para frente da máquina pressionando o copinho contra o botão para enche-lo novamente. Ela não deveria nem estar analisando a possibilidade de uma relação amorosa com Tatsuya. O fato dela nunca mais ter voltado para Mitakihara estava conectado com a necessidade de fuga das lembranças da sua melhor amiga, tentando, dessa maneira, amenizar o sofrimento afastando-se da cidade que viveu com ela.
De repente, uma voz de tom constante, que a chamava, interfere nos pensamentos de Homura como em uma telepatia. Erguendo a cabeça, ligeiramente, do copo de plástico olha em direção à janela.
Sobre a abertura encontrava-se um pequeno ser branco muito similar à um gato, ou mesmo, um cachorro. Arriavam-se um conjunto de pelagens, envolvidas em douradas argolas, das entradas de cada lado das pontudas orelhas, deixando claro o brilho e maciez de seu pelo, junto com a felpuda cauda dançante. Os olhos minúsculos e vermelhos, combinados com o inexpressivo sorriso, fazia Homura sentir um leve arrepio e sentimento de rejeição pelo animal.
“- Fico feliz em ver que está tudo bem com você, Akemi Homura.” diz o ser branco através da telepatia.
“- Pena que eu não possa dizer o mesmo de você.” Com um sorrisinho irônico, Homura cumprimento, pelo mesmo método, o ser branco na sua frente. “- O que veio fazer aqui?”
“- Quanta agressividade com seu antigo companheiro de batalha.”
“- Veio aqui relembrar os velhos tempos como um aposentado senil? Diga logo o que quer, Kyubey.”
“- Nada de mais, lembrei que você vive nessa cidade, então, resolvi fazer uma visitinha para conferir se seus poderes de Mahou Shoujo não acabaram voltando.” O ser branco, denominado Kyubey, balança a calda de um lado para o outro, respondendo à pergunta de Homura.
“- Sem problemas. Nem um indício da volta dos poderes. Mas...” Ela enfia a mão no bolso do terne e retira um objeto que parecia uma joia roxa oval, menor que a palma da mão, com as bordas ornadas por um metal dourado e brilhante, lembrando muito a textura do ouro. Mostrando o objeto para Kyubey, diz com uma expressão insatisfeita. “- Nem sinal da Soul Gem voltar a fazer parte de mim novamente."
Dando uma rápida olhada no objeto, Kyubey volta os olhos vermelhos em direção à Homura.
“- Não há relatos da Soul Gem ter voltado ao corpo de suas donas após a perda dos poderes. Nesse caso, você terá que continuar a carregar essa sua alma no bolso do terno daqui para frente, provavelmente, pelo resto da vida.”
Como se já tivesse previsto essa resposta, Homura aperta a Soul Gem dentro da mão e guarda-a de volta onde estava.
Na adolescência, Homura firmou um contrato com Kyubey e se tornara uma Mahou Shoujo. Após a mudança do tempo e espaço que Madoka realizara, durante anos Homura lutou contra Majuus, criaturas não perceptíveis a pessoas normais e que dominavam seus corações fazendo-lhes cometerem atos que iam contra a ética humana. Quando completou dezessete anos começou a sentir uma diminuição gradativa dos seus poderes mágicos e cada vez mais dificuldade em perceber a presença de um Majuu. Na época, Kyubey dissera que era um fenômeno natural das Mahou Shoujos ter uma diminuição nos poderes por estarem chegando na fase adulta, porém desconhecia o que vinha a seguir. Muitas morriam em batalhas contra as criaturas durante esse período. Algo que acabaria acontecendo com Homura se não fosse pelo companheirismo de Sakura Kyouko e Tomoe Mami nas batalhas. Mesmo assim, no ano em que se formou e partiu da cidade de Mitakihara, ficando sem o auxilio das amigas, para preservar a sua vida abandona o oficio de Mahou Shoujo e se torna uma simples estudante do ensino superior. Os poderes somem definitivamente quando acordara de um sono mal dormido na manhã que completou vinte anos de idade.
“- Bom, não se pode ter tudo. Não precisar lutar contra Majuus já é uma grande vitória. Na verdade, nunca imaginei você desfazendo o contrato só pela perda dos poderes.” Com um sorrido de aceitação, diz Homura.
“- Não necessitamos de Mahou Shoujos inúteis, então, desfazer o contrato é o mais coerente nesse caso, tirando um peso morto das nossas costas.”
“- Que seja, não muda o fato em relação a isso. Até acho que esse fenômeno seja alguma modificação causada pela Madoka.” Ignorando o modo e palavras rudes de Kyubey, ela olha para o céu atrás dele.
“- A tal Mahou Shoujo que salvou vocês do destino do desespero e que as outras Mahou Shoujos chamam de ‘Enkan no Kotowari’? Como teoria é algo interessante, tanto que estamos atrás de fatos verídicos para entender o que você diz.” Kyubey fala sem mover um único músculo de sua feição facial.
Por um instante Homura quase deixa cair o copinho de café no chão. Sentindo suas pernas tremerem discretamente, ela olha-o bicho que detestou por tanto tempo como se ele fosse um sacerdote trazendo a palavra divina.
“- Então você acredita no que estou falando!?"
“- Sinto muito, mas ainda não conseguimos encontrar indício sobre a existência de Kaname Madoka.”
Ouvindo as palavras de Kyubey, Homura baixa a cabeça decepcionada. Contara essa história várias vezes na expectativa de ele lembrar-se de Kaname Madoka, mas isso nunca chegou a acontecer.
Apesar da decepção, ela vê um futuro nas palavras dele, pois está atrás de provar a existência de Madoka. Se ela fosse uma menina com treze anos de idade iria fazer de tudo para manter o animal longe da sua querida amiga, no entanto, a solidão e saudades acumuladas durante dezessete anos não permitia Homura barrar o objetivo de Kyubey, pelo contrário, criava-se dentro dela uma esperança do reencontro com a divindade.
“- Fui conhecer os supostos pais e irmão de Kaname Madoka na esperança de adquirir alguma pista, mas não foi de grande utilidade.”
Como se já fizesse muito tempo, Homura lembra-se do ocorrido daquela manhã. Olhando para Kyubey, ela abre a boca com o intuito de falar algo, mas acaba se calando. Kyubey percebendo o comportamento da mulher na sua frente e fala com a voz destituída de emoções.
“- Algum problema, Akemi Homura?”
Por um segundo, ela para de respirar. Pensara em contar sobre Tatsuya para aquela criatura, que não mais o odiava por estarem vivendo em um mundo modificado. Mas naquele momento precisava de um conselho, e um conselho de alguém ciente dos fatos para o surgimento daquele problema. Homura respira fundo e percebe que acabara de amassar um pouco o copinho de café por ter colocado força de mais na mão. Encara o rosto sem expressão de Kyubey, e com uma voz levemente trêmula fala.
“- Não, não aconteceu nada, só que encontrei, ou melhor, reencontrei com Tatsuya, e nisso ele me pediu em namoro.” Depois de dito, ela se arrepende profundamente do que acabara de falar. Além de revelar detalhes da sua vida íntima, depois de colocadas em palavras, fica parecendo um problema amoroso de uma adolescente de quinze anos de idade sem saber o que fazer com a primeira declaração de amor.
Kyubey observa a mulher na sua frente, balançando o rabo felpudo para direita e esquerda.
“- Bom, não vejo nenhum problema no que acabou de dizer, afinal, ele está na idade de procurar uma parceira sexual para procriação. A declaração dele significa que você cumpre com os requisitos como fêmea para dar luz a um filho dele. É um processo natural da raça humana.”
Sentindo aversão das palavras que Kyubey pronunciara, Homura enruga entre as sobrancelhas e encara com olhar feroz a bola de pelo, sentindo a temperatura do seu corpo aumentar por causa da raiva. Kyubey percebe a fúria nos olhos de Homura. Pensa que o motivo seja pelo seu comentário e balança a cabeça para os lados.
“- Eu não compreendo. Por que vocês humanos não gostam de ser comparados com animais? Não tem como negar que a raça humana faz parte do reino animal. A única diferença é que vocês raciocinam, algo que atrapalha na hora da reprodução. Acabam pensando de mais no amor necessário para executar o ato em questão. Apesar que, no mundo atual, nem mesmo com amor, há humanos que optam em não se reproduzirem. Nós incubators gostaríamos que vocês não pensassem tanto, assim teríamos uma fonte estável de Mahou Shoujos no mundo.” Encarando uma Homura, ainda nervosa, Kyubey no mesmo tom de voz continua. “- E vejo que o amor de Kaname Tatsuya está-lhe atormentando, Akemi Homura."
Pega totalmente desprevenida, Homura se surpreende com Kyubey ter percebido, ou mesmo, entendido o problema dela.
“- Estou em dúvida se o meu interesse por ele é simplesmente atração, ou porque ele é irmão de Madoka.”
“- Tudo seria mais fácil se você esquecesse que ele é irmão de Kaname Madoka.”
“- Se fosse fácil não estaria pedindo a opinião de um alienígena.”
Dando a mínima para o que Homura disse, continua.
“- Nesse caso, você deve fazer como os humanos normais quando desejam iniciar um relacionamento: conhece-lo. Dessa forma, você conseguirá fazer uma análise exclusivamente dele, tentando deixar de lado o fator da irmã. Ou mesmo, iniciar um relacionamento amoroso consciente do interesse pelo parentesco com Kaname Madoka. Isso levando em consideração, é claro, a existência dela.”
Homura processa as palavras de Kyubey, pensando no fato de ter que encontrar com Tatsuya, algo que, na verdade, gostaria de evitar, mas o jeito mais plausível de compreender os sentimentos que sentia no momento era marcando o encontro que prometera.
Ela bebe o restante de café em um gole, e amassa o copinho descartável, voltando a encarar Kyubey.
“- Apesar da mesma conclusão que a minha, agradeço pela dica. Não há como fugir desse encontro.”
“- Vocês humanos dão muito trabalho, a coisa deveria ser bem mais simples. Em fim, gastei muito meu tempo nessa conversa, vou atrás de garotas idôneas para tornarem-se Mahou Shoujo.”
“- Tomara que não encontre nenhuma. Aproposito, essa procura será feita aqui, na cidade de Akiyuki?”
“- Não. Essa cidade carece nesse quesito. Irei para Mitakihara, lá tem bons índices de garotas capacitadas.”
“- Sai daqui seu bicho nojento”, Homura dá um passo à frente com uma expressão furiosa.
“- Até mais, Akemi Homura.” Dando uma ultima balançada na calda, Kyubey pula da janela sem se importar com o fato de que lá era o oitavo andar do prédio.
Homura, junto com um suspiro de cansaço, joga o copinho esmagado no lixo ao lado da máquina de café, e sem saber o porquê, olha pela janela o céu sem nuvens, visualizando o azul infinito, onde dava a impressão de liberdade. Colocando a mão no bolso do terno retira o smartphone abrindo a agenda telefônica a procura do número desejado. Aperta o botão de ‘chamar’ e leva o aparelho até o ouvido. Depois de alguns toques da chamada, ela ouve um “alô” baixo do outro lado da linha. É a voz de Tatsuya. Escutando a voz do rapaz, Homura respira fundo tentando acalmar-se.
“- Olá, Tatsuya-kun, só estou ligando para marcar o encontro.”
“- Certo, Homura-san. Para quando está pensando em marcar?” Tatsuya pergunta com uma voz alegre, que fazia lembrar facilmente o sorrido que vira de manhã.
“- Pode ser esse domingo? Eu pelo menos não costumo ter compromisso nesse dia.”
“- Tudo bem, também não tenho nada para esse dia. E onde nos encontramos?”
“- Na frente da estátua no parque Shaft, à uma e meia da tarda, combinado?”
“- Sem problemas. Encontro você lá então.” Dando uma pausa na conversa, e depois de falar com alguém no outro lado da linha, volta para Homura. “- Homura-san, tenho que desligar agora, até domingo”, e desliga o telefone.
Aliviada solta um suspiro, guardando o smartphone de volta no bolço do terno.
Olha para o corredor sem ninguém e sai andando de volta à realidade cheia de trabalho para resolver, esboçando um gentil e tranquilo sorriso no semblante.