Um novo encontro...

Em meio à conversa, percebi que Kanade era por natureza muito reservada, mas não tanto quanto antes, agora ela tinha pelo menos duas amigas para conversar. Yuri era a garota que começava os assuntos, liderava as conversas. Sempre animada, mas séria até certo ponto, ela era uma pessoa muito agradável até. Isso fazia com que não houvesse aqueles gelos que sempre acontecem nas primeiras conversas, quando se conhece alguém, Yuri era do tipo que sempre tinha um assunto na ponta da língua e não tinha medo de se expressar, às vezes se alterava e subia na mesa demonstrando seus objetivos pra todo mundo ouvir.

Isso poderia ser meio bobo, mas eu me sentia menos deixada de lado por ter criado uma amizade com ela, isso transmitia também no semblante da Tachibana que logo se proclamou a Presidente do Conselho Estudantil. Yuri resolveu acompanhar a amiga e se tornou a Vice-Presidente, o que foi muito agradável, era uma boa parceria.

No fim da aula eu estava exausta e um pouco confusa, andei um pouco pelos corredores, sozinha, para poder repensar no que eu faria nos próximos dias. Yui estava no hospital e eu tinha que ficar nos dormitórios, mas pensar que ela estava ali sozinha, sem nenhum amigo não me deixava dormir, nem o fato de Iwasawa poder estar em qualquer lugar e eu não saber.

Um tempo depois jogada na cama, percebi que Kanade e Yuri haviam terminado a inspeção dos quartos, estava tudo silencioso e eram só sete da noite. A única abertura que eu tinha agora para poder olhar a noite era uma janela razoavelmente grande no meu quarto, parece que minha parceira de quarto ainda não havia chegado à escola, então eu estava ali sozinha. O que atualmente é ótimo pra mim.

Olhei pra baixo atrás da janela e percebi que era fácil descer, afinal eu estava no primeiro andar do prédio, por sorte havia um pilar aonde eu poderia usar sem me machucar e assim realizei o meu plano. Eu voltaria só quando conseguisse encontrar alguma das minhas amigas da banda. Felizmente, o céu estava até claro por um luar bonito e inspirador. Isso me fazia lembrar quando Iwasawa e eu acabávamos entediadas na madrugada, sem sono, e íamos tocar para revigorar nossas almas, nossos laços. E talvez fosse essa mesma Lua que banhava nossas cabeças e nossa música, e as estrelas nos assistiam a todo tempo. Eu me sentia invencível com ela. Ah Iwasawa, como você faz falta... É tão bom poder te lembrar ao ver essas estrelas, me sinto mais forte por ter te conhecido.

Cantarolando My Song, eu cheguei ao mesmo hospital que havia encontrado mais cedo e fui indo para a janela que havia pulado, estava um pouco escuro ali, então usei isso ao meu favor e novamente abri sem fazer barulho algum e entrei sorrateiramente. Pra minha surpresa, parecia que a garota deitada na cama não estava dormindo... Ou estava? O quarto estava mais escuro por conta da luz desligada. Ouvi-a falar, parecia estar sonhando...

– H-Hinata-kun... – Me escondi atrás de um aparelho que estava perto da cama, procurando não ser notada. Acho que ela estava mesmo dormindo, engraçado... Já havia ouvido esse nome. Hinata... Não me é estranho.

Não vendo perigo por ali, supôs que a barra estava limpa e eu poderia fazer alguma coisa, procurar algo... Mesmo no escuro, acabei achando umas folhas em uma gaveta e tentei voltar para fora pra poder ler o que estava escrito, poderia ser receitas médicas, afinal, Yui não se movia da cintura pra baixo. Oh Deus... Como pode ser? Na minha tentativa de fechar a gaveta para voltar, acabei cometendo um pequeno erro e bati com tudo no interruptor, ligando a luz do quarto. Ah meu Kami, está tudo acabado.

Felizmente, ela não acordou e eu pude dar uma olhada nas folhas. Eram uns rascunhos feitos à caneta, junto com uma tablatura que eu conhecia muito bem, as letras eram familiares... O título de uma delas estava escrito “Hot Meal” e ao ler, minhas pernas tremeram. Era como se eu tivesse a sensação de que eu estivesse lá quando a letra, a melodia tinha sido criada. E antes que eu pudesse reagir, ouvi outra voz.

– Como você entrou aqui? – A garota assustada e aparentemente sonolenta se moveu na maca, não tinha mais saída. – Quem é você?

– Y-Yui? Gomen... Eu acordei você... –Ela abriu melhor os olhos cor de rosa, arregalando-os logo depois.

– É quem eu estou pensando? H-Hisako-sama? – Kami... Ela se lembrava de mim? Eu estou sonhando? Isso é um ótimo sinal!

– Sim, você lembra de mim? Nós tocamos guitarra juntas... – Ela abriu um sorriso iluminado e junto, vieram algumas lágrimas que eu não pretendia ver. Ao vê-la assim, chorando, não tardei em abraçá-la. Como eu sentia falta dela, das meninas da banda...

– Hisako-sama, como eu pude esquecer? Pensei que nunca mais veria você, a Iwasawa-senpai... Foi a melhor coisa que aconteceu todo esse tempo... – Ela me abraçou e eu segurei as lágrimas. Eu tinha que ser forte, precisava guardar tudo aqui no meu coração até eu encontrá-la. Não que Yui fosse menos importante, ela é importante sim, mas Iwasawa me salvou, salvou ela também, nos salvou...

– Eu voltei... Eu não sei bem como, mas eu consegui aceitar tudo o que a vida me impôs... Mas não posso deixar as coisas inacabadas por aqui... A banda... Nossa música... E-Ela...

– Eu não me lembro de tudo, mas maior parte das coisas que aconteceram, eu sei que você estava lá e que a senpai também estava... Eu estava tão feliz... Eu estou feliz, sabe? E agora que você apareceu, parece que mais da minha alma se preencheu. E essas músicas que você está lendo, são dela...

Meu coração bateu mais rápido outra vez, as músicas que estavam na minha mão eram da Iwasawa Masami. Não tinha a assinatura dela ali, mas o espírito que emanava ao ver aquelas letras, aquela tablatura impecável desenhada naquele papel me fizeram senti-la em alma.

– Como disse Yuri um dia... “A aura forte e bela da Iwasawa...” – A frase saiu automaticamente da minha boca. Será que eu estava falando daquela Yuri? Enfim, com isso, Yui sorriu, dizendo baixo.

– Ela veio me visitar um dia desses junto com o Hinata-kun. Ela estava animada para voltar à escola, provavelmente hoje. – Com certa dificuldade, por conta da leve surpresa, eu a interroguei.

– Yuri Nakamura? – Ela se sentou na cama com um pouco de esforço por causa das pernas.

– Sim, ela vem aqui quase sempre. Parece que ela se lembra de algumas coisas que aconteceu, pois encontrou o Hinata, que já havia me achado aqui depois de acertar uma bola de beisebol na janela. Aí me lembrei de quando ele me prometeu isso... Atualmente ele ajuda a minha mãe a cuidar de mim...

– Meu Kami-sama! – Suspirei. Como esse mundo é pequeno... Mal cheguei e estou aqui com um monte de gente que conheci quando eu estava morta. – Ela é da minha sala!

– Hontou? Que sorte! Eu queria ir pra escola também... – Ela abaixou a cabeça um pouco triste, mas em seguida levantou-a, fazendo outra pergunta animadamente. – O que pretende fazer agora? Quer a banda de volta, não é?

– Sim, pretendo reunir todas... Mas... Onde será que Iwasawa está? – Olhei distante, agoniada.

– Você sabe que ela morreu num hospital, não é...?

– Eu sei, mas o que isso tem a ver?

– Hisako-sama, não ligou os fatos? E se ela estiver em uma maca de hospital? Assim como eu?

Meus olhos se abriram melhor. Por que não? E se ela ainda estivesse em um hospital assim como esse, sozinha, com contusão cerebral? Ninguém a conhecia, ela sempre foi desprezada pela família, ninguém veio vê-la quando ela morreu...

E se ela estiver por aqui...?