O sinal da escola tocou. Antes que eu pudesse pensar, tive que me atirar janela a fora novamente e saí correndo até o colégio mais próximo, procurando não me atrasar muito.
No caminho, tive que colocar minha mente pra funcionar, afinal, eu devo calcular todos os meus movimentos dos próximos dias... Tudo já estava claro na minha mente, se eu voltei, eu posso fazer tudo o que eu fiz há pouco tempo atrás, onde eu estava em paz, em uma banda de garotas que me apoiavam e me aceitavam como eu sou.
Eu recebi mais uma chance nesse mundo, não posso desperdiçar dessa vez.
Rapidamente, cheguei à escola e olhei no mural a lista de nomes de cada sala. Ah, que ótimo, a minha é a última... Não tem problema, não demorei muito e logo me acomodei numa cadeira no final da terceira fila, por ordem de chamada. Estranhamente, avistei uma moça dos cabelos bem claros, praticamente prateados na fila ao lado, ela parecia estar cantarolando uma música que era muito familiar enquanto folheava o seu caderno.
Duas fileiras depois, na última carteira estava uma garota dos cabelos num tom quase vinho, mais claro, parecia estar animada, mas avoada, olhando para fora da janela. Ela também me parecia muito familiar e aquilo me animava e me frustrava um pouco... Será que não me lembro de tudo ainda..? Não sei quanto tempo tenho pra descobrir tudo o que eu fiz, quero saber de tudo logo, juntar quem eu mais preciso... Oh, uma professora adentrou a sala e se prontificou com um discurso de boas-vindas.
- Ohayo, pessoal! Agora vocês estão no segundo ano do colegial, então aproveitem ao máximo, pois o tempo passa num piscar de olhos. – E como eu sei disso... Não é a toa que não posso ficar me demorando nessa missão, quem sabe quando tempo ficarei aqui? Essa ideia me dá um pouco de medo... – Então, vamos começar as apresentações? – Ah, que beleza... Debrucei-me sobre a carteira, esperando minha vez chegar, não demorou muito já que eu era a sílaba “Hi”. – Próxima!
- Eu sou a Hisako, tenho 16 anos e pretendo entrar no clube dos esportes ou de música. – Me levantei, me pronunciando. Não faz pouco tempo que “cheguei”, mas me sinto menos perdida.
- Clube de música? Algum motivo especial? – A sensei sorriu, curiosa.
- Eu sou guitarrista. – Abri um sorriso confiante, já que a pessoa quem me fez enxergar isso era a melhor do mundo.
- Que ótimo, quero ouvir sua música um dia! – Ela respondeu e passou para o próximo aluno. Por um instante, me distraí até que entrei em transe na apresentação da aluna dos cabelos prateados.
- Tachibana Kanade, 16 anos. Pretendo entrar no clube de jardinagem. – Kanade? Mas esse nome não me é nada estranho... Onde eu ouvi isso? Eu já tinha visto essa garota? O mais estranho ainda foi à reação da garota da última fileira, ela parecia olhar incrédula ou coisa do tipo. Algo estava muito errado, certo ou era coincidência... Esperei ansiosamente pela apresentação da garota dos cabelos quase roxos.
- A última aluna, por favor. – Olhei estreitamente, prestando atenção em cada movimento, era minuciosamente importante saber quem ela poderia ser, o que ela sabia...
- Nakamura Yuri, 17 anos. Pretendo fundar meu próprio clube. – Yuri? Meus olhos logo se arregalaram. Yuri. Fundação do próprio clube. Algo me dizia que ela era uma líder nata. Líder? Que dejavu... Aquelas alunas eram tão familiares que eu tinha a sensação de que já as conhecia há muito tempo, mas aí vem a grande pergunta: de onde eu as conhecia? Porque a sensação tão grande de proximidade?
Bom, eu não posso ser tímida agora. Esperei ansiosamente pelo intervalo, fazendo algumas partituras no meu caderno à medida que a Tachibana-san cantarolava aquela música. A sensação de dejavú era cada vez mais forte. Era como se eu já tivesse ouvido, era... Aquilo era um violão melódico... Espera...
Flash Black ~
"Kiseki ni... Arigatou...”.
I-Iwasawa? É claro! Foram os últimos acordes que ela tocou... Quando me lembrei disso, parecia até que eu ouvi ontem... Isso faz tanto tempo... Será que eu demorei pra voltar? Será que ela já está adulta? Oh meu Kami-sama...
Esses pensamentos só serviram pra me deixar mais nervosa. Se Iwasawa estiver mais velha, não tem como formarmos uma banda... Pensando melhor, Yui parecia ter a mesma idade, mas isso ainda era uma preocupação minha já que nossa vocalista atrapalhada havia sido apagada muito depois de a Iwasawa ter desaparecido. Bom... Isso eu tenho que investigar... Meu Kami, eu mal cheguei nesse mundo e já estou cheia de coisas pra fazer. É a vida dos humanos, não é? Viver cheio de coisas pra fazer, faz parte, senão nós não ficamos satisfeitos...
Refletindo agora, essa frase faz muito sentido... Nós fomos nos encontrar “lá no céu” porque deixamos as coisas inacabadas por aqui. Nós humanos somos muito atarefados e vivemos em prol dos nossos sonhos, por mais que eles sejam impossíveis, alguns de nós não desistem. E eu sou uma dessas, não vou parar até achar aquela garota que me salvou...
~Trrrrrimmmm!~
Quando o sinal tocou, praticamente todos os alunos saíram da sala, menos eu, e as duas garotas que eu suspeitamente acho que as conheço. Eu não sou boa com comunicação, mou... Que droga! Meu estômago roncou. Espero que ninguém tenha ouvido... Seria uma boa desculpa chamar alguma delas para almoçar, não é? Ah, que seja! Puxei a respiração e me dirigi a outra fileira, fui me aproximando e levei uma mão sobre o ombro, afastando os cabelos prateados da moça à minha frente.
- Tachibana-san? Você poderia me acompanhar até o refeitório...? – Consegui falar com ela, já era um progresso.
- Sim. – Ela respondeu timidamente e esperei que ela levantasse e tomasse à frente, eu havia esquecido completamente da escola, seria um jeito útil de descobrir onde eu poderia lanchar ao invés de ficar procurando feito uma tonta para achar um lugar tão conhecido.
O caminho até lá foi dolorosamente silencioso, eu não sabia muito o que perguntar, até porque ela parecia ser tão séria que a qualquer momento que eu tentasse abrir a boca para dizer algo, tinha medo de sair algo que soasse besteira.
Também notei que durante o trajeto, tive a sensação de estar sendo seguida por alguém, o frio na barriga e a impressão de vários olhos por trás de mim estavam ficando cada vez mais fortes a cada passo e cada corredor que atravessei. Tive que me aliviar quando chegamos no refeitório, eu iria parecer uma idiota com as pernas tremendo de medo caso a Tachibana notasse.
Pedi um pão de yakissoba e um café gelado, foi estranho quando chegou à vez dela, pois já tinha em mente qual seria o pedido da menina ao lado. Ao sentarmos na mesa, confirmei minhas suspeitas: mapo tofu. Parecia ser um prato insuportavelmente só pela coloração vermelha, automaticamente fez meus olhos arderem.
- Você está bem, Hisako-san? – Ela perguntou tão baixo que quase não dava para ouvir.
- O-Oh... Sim... Eu estava intrigada na aula hoje... – Me assustou ao vê-la levar aquela colherada na boca sem implorar por um copo d’água.
- Quer compartilhar seu incomodo? – Suspirei baixo. Bom, eu podia confiar nela, não é?
- Eu ouvi você cantarolar na aula hoje e essa música me deu uma nostalgia, uma lembrança tão grande... – Ela me olhou, parecendo estar assustada.
- Oh, gomenasai... Incomodei sua concentração? – Fiquei um tanto receosa ao ver que ela parecia magoada.
- Não, não... Eu queria saber onde você ouviu essa música... Preciso muito saber... Ela é tão familiar... – Ela esboçou um sorriso tímido pela primeira vez.
- Se eu te contar, acho que você não acreditaria... – Dessa vez, eu quem sorri. Ela esteve lá. Olhei para o nada, apoiando o cotovelo na mesa e o meu queixo na palma da mão. Suspirei, relembrando.
- Da primeira vez que ouvi ela tocar essa música, eu sei que a alma dela se sentiu em paz... E aceitou a vida do jeito que é... Seu objetivo de viver...
- Sim, eu sinto o mesmo... Eu lembro o que aconteceu... – Acho que esse seria o momento certo para interrogá-la, até que...
- Posso me juntar a vocês? Estou me sentindo perdida sozinha nesse lugar. – Ah, era a Nakamura. Será que era ela que estava nos seguindo há poucos minutos atrás? É, acho que tenho razão.
- Nakamura-san, sem problemas. Eu também estava me sentindo assim! – Ela puxou uma cadeira e sentou do nosso lado, abrindo um sorriso radiante.
- Okay! Arigatou, pode me chamar de Yuri mesmo. As duas primeiras aulas foram tão entediantes, não é? – Yuri deu uma mordida em seu pão de yakissoba e ficou fazendo círculos na mesa com os dedos.
- Pra mim, as três primeiras foram muito chatas. – Ri baixinho e pisquei pra Tachibana. Acho que o assunto de antes havia sido encerrado por enquanto.
- Acho que foi produtivo... – Acho que ela era do tipo de aluna aplicada, não me admirava muito.
A conversa foi seguindo num fluxo normal, acho que essa é a verdadeira vida de adolescente. Conversando bobagens, criticando os momentos chatos sem esperar julgamentos. É claro que ainda havia um vazio para ser preenchido e eu vou correr atrás disso.