Jar encarava todos os robôs que construíra. Eram mais do que máquinas de batalha: eram a sua vida. Ainda que não pudesse mais pilotá-los, ver suas criações vencendo uma batalha era o seu maior desejo. Uma lágrima escorreu por seu rosto.
John estava ao seu lado, admirando não só os robôs gigantes, como as também as naves ali estacionadas. Ainda que um pouco obsoletas, talvez tivesse algo a oferecer além de uma bela visão da história do auge bélico de Ignis.
De repente, ambos ouvem um som de porta se abrindo. Olham para trás e tomam uma surpresa:
– Eu ouvi barulhos vindos daqui e vim checar. Está tudo bem?
Era o robô que John ativara horas atrás. Estava de pé. Se não fosse pela poeira em sua lataria, era possível dizer que ele estava novo. Seus olhos eram da mesma cor que a esfera de energia, que por usa vez, era igual à de Jar. John se espanta um pouco, porém o engenheiro nanotecnológico o olha com um certo alívio:
– Então acordaram você também. Bem-vindo de volta. – diz Jar.
– É bom vê-lo, Jar. E quem é este?
Jar pede a John para que se apresentasse. Este dá alguns passos em direção ao robô e se introduz:
– Sou John Sageman.
– Meu nome é Yotta Binary, mas pode me chamar de Yobi. – apresenta-se o ser metálico e sua voz ríspida de computador. Ainda assim, aparentava traços humanos.
Ambos se aproximam e trocam um aperto de mãos:
– De qualquer forma, há variáveis que não compreendo. Como chegou aqui e o que está fazendo aqui?
– Eu sou um ex-militar de Sapphire... – começou John. –... Fui traído e jogado na Terra.
– Sapphire? Ignis não a venceu?
– Venceu. Porém, anos depois, ela foi explodida. De forma muito estranha, segundos os registros históricos militares. – lembra-se o homem.
– Entendo. Em que ano estamos?
– Cinco mil e setenta e nove.
– Incrível, ver que resistimos a todo esse tempo... Porém agora não temos mais utilidade. – insinua Yobi. Jar acena positivamente com a cabeça.
– Errado, talvez vocês possam me ajudar. Eu tenho que acertar contas com um sujeito que me jogou na Terra. Eu vou destruí-lo! Jurei isso!
– Sou assistente de controle da Magnus. – diz Yobi. –... Então irei ajudá-lo.
– Eu também. – complementa jar. –... Conte comigo!
A STX dava sinais de instabilidade, e logo dá um grande choque em John, causando surpresa em Jar e Yobi. Ambos levam o ex-militar até a enfermaria. Ali, retiram sua armadura:
– Yobi, leve a armadura para conserto! – pede Jar.
– Pode deixar.
Yobi sai levando a armadura em seu compartimento de carga. Jar, por sua vez, põe sondas ligadas a um metal. Queria medir a intensidade do choque. Quando colhe os resultados, toma um grande susto:
– Somente uma pessoa teve uma carga tão poderosa assim...
Para confirmar o que pensava, Jar liga o computador da enfermaria e pesquisa a intensidade indicada pelo medidor de corrente. Ao encontrar, não teve dúvidas:
– John... Você é descendente do capitão Jamus!
No hangar havia várias ferramentas. Embora empoeiradas, ainda tinham algumas funcionalidades. Yobi põe a armadura na mesa de operações. Ativando suas funções de reparador, suas mãos transformam-se em dois cortadores de aço. Seu sensor a laser lhe indicava exatamente onde estava o defeito. E não era pequeno:
– Ironicamente, uma falha pequena. Não há materiais contemporâneos para substituí-la. Solução encontrada: reconstruir com o que tiver, ainda que não haja total compatibilidade. – processou o robô, começando a operar na armadura.
Jar pega na prateleira um neutralizador de carga, fazendo assim a corrente de John se dissipar. Em alguns minutos, o ex-militar já estava plenamente consciente:
– O que houve...? – pergunta ao abrir os olhos.
– Eu neutralizei a carga. Você é incrível, uma pessoa normal teria morrido!
– Uau, obrigado...
– Somente uma pessoa suportou uma carga tão intensa quanto aquela que você tomou...
– Sério? Quem?
– Jamus, o último capitão da Magnus. E meu capitão.
John toma um susto. Estaria ainda lúcido o bastante para ter ouvido aquilo?
– Nossa...
– Eu tomei liberdade de colher um pouco do seu sangue para analisar após isso e...
O ex-militar agora estava curioso. Levantou-se e limpou os ouvidos, tendo a certeza de que ouvia corretamente:
–... Você é descendente do capitão Jamus, John.
A revelação lhe pega de surpresa. Jamais imaginava ser descendente de tão grandiosa lenda. Só o que sabia era que seus pais eram amantes da revolução que ocorrera em Sapphire quando eram jovens. John finalmente entende o porque de seus pais nunca o colocarem em escolas pagas, ainda que fossem as melhores da cidade-nação. Sempre estudou em casa, e para não chamar atenção, frequentava a pior escola. Aprendeu tudo o que sabia nos campos de batalha. Será que Jamus também fora assim em sua infância?
Nesse momento, Yobi adentra a sala:
– Desculpe-me, eu acabei ouvindo um pouco da conversa. Se você realmente é descendente do capitão Jamus, então sou mais do que obrigado a lhe servir, mestre. – diz o robô.
– Não, não precisa de tudo isso...
– Foram as ordens do capitão Jamus.
A Magnus caíra durante a verdadeira última batalha da nação Ignis. Vendo que sua armada não conseguiria sair a tempo do planeta Terra, o capitão Jamus sacrificou-se e ganhou tempo com a Magnus. Não só isso, ele liberou a todos os operários, ficando apenas Yobi, Jar e mais nove comandantes da nave. Ainda que sua patente fosse inferior, todos o tinham como líder. Jamus permitiu que o prisma de Ikarion chegasse são e salvo em Ignis, fazendo-a ganhar a guerra contra Sapphire ao custo de sua nave.
– Ainda que nossa nação tenha sido destruída, lutaremos ao lado de nosso capitão. – comenta Jar.
– Verdade. – diz Yobi. – Acompanhe-nos, mestre John.
Os três seguem a passos tranquilos pelo corredor. Sobem uma escada grande que acompanhava o mesmo. Pela curva que o corredor fazia, era possível dizer que estavam na borda da Magnus.
Eles entram por uma das duas portas ali presentes. Ao acenderem a luz, John tem uma surpresa:
– Esse era o quarto do capitão Jamus. Você pode ficar aqui, caso queira. – diz Jar.
John nada diz além de um “obrigado”. Ele passa a mão nos móveis, na cama e na mesa. Quase não tinha areia no local. John vai até o centro do quarto, onde um uniforme da extinta nação Ignis ainda se encontrava intocada. Sem sua STX, estava apenas com uma toalha enrolada sobre o corpo. Será que aquele uniforme militar não lhe serviria?
O uniforme vermelho-escuro bem lhe serviu. As ombreiras douradas e a calça neda mesma cor do uniforme também se ajustaram ao corpo de John. Para finalizar, a capa dourada com o brasão de Ignis era presa às ombreiras. As botas também ficaram confortáveis em seus pés. As luvas negras realçavam ainda mais os detalhes dourados do uniforme.
John estava de costas para os dois, que agora viam nele a vontade de Jamus.
A cabine de controle da Magnus era a torre pela qual John entrara. Agora, devidamente vestido, andava pelo espaço ali. Jar e Yobi o esperavam na porta do sistema de teletransporte, que puseram em funcionamento alguns minutos atrás.
John apalpava a alavanca principal, assim como o volante da nave. Tirava com a mão a poeira dos controles. Ele olha para trás:
– O prisma de Ikarion é o que abastece essa nave, não é?
– Exato. – respondeu Yobi. – Minha varredura indica que temos boas condições de voar.
– Certo. – e pousa sua mão sobre a alavanca.
John fecha os olhos e se concentra. Entrava em contato diretamente com a nave, que ainda tinha vontade de lutar. Nada mais se passava por sua cabeça. Apenas queria sair de lá o mais rápido possível. Sua mão se fechava ao redor da alavanca:
– Levanta-te, Magnus, mostre-me a força que você tem!
Num movimento brusco, puxa a alavanca para trás. Imediatamente, sente um forte tremor na nave. Eram os motores que, travados pela areia, não funcionavam direito, assim como as hélices emperradas. Forçou mais ainda, queria ver a mais majestosa das naves voando.
A nave, agora em sincronia com a mente de John, pareceu entender sua vontade. Com uma força além da máxima que podia, Os motores expulsaram a areia para cima, fazendo uma nova tempestade de areia. Inúmeros grãos saíam do solo e voavam longe por causa do vento. Aos poucos, a lataria negra ficava cada vez mais visível. Os motores forçaram-se ainda mais, pareciam ter vida própria. Ainda que sincronizados, um trabalhava independente do outro. A areia foi saindo mais, e logo os motores eram melhor vistos. Pela saída dos mesmos, um em cada lado da nave, jatos de areia eram expelidos e espalhados aos quatro ventos.
Da cabine era possível ver o tamanho verdadeiro da nave. Tinha quase quatrocentos metros de superfície redonda e monstruosa. A traseira agora se empinava, ela era mais alta do que a própria torre de comando. Ao longo de sua estrutura em “V”, inúmeras armas acopladas. John, ao ver aquilo, ficou impressionado, porém não perdeu o foco.
Faltava apenas a parte de baixo da nave. Tudo tremia, Jar e Yobi seguravam-se na barra de apoio perto da porta. Porém John permanecia ereto, parecia não se abalar pelos fortes tremores. Sua vontade de vê-la decolar era mais forte do que todos aqueles fenômenos.
Os motores gritavam, a areia já estava expulsa totalmente. Era agora ou nunca. John, observando isso, bradou:
– Vamos, vamos!!
Como resposta, a tela holográfica no painel à frente de John mostrou que os propulsores na parte inferior da nave estavam agora ativados e operando à força máxima:
– Levanta-te, Magnus!!
Aos poucos, era possível ver o fogo azulado saindo dos inúmeros propulsores monstruosos abaixo da nave. Agora, nada mais a conectava à areia: estava oficialmente voando.
O barulho dos motores eram música para os ouvidos de todos. John ficou impressionado por ver a Magnus no ar. Jamais sonhara com tal situação.
Aos poucos, as luzes do painel se acendiam, indicando a restauração de funcionalidades da Magnus. Após o choque, John nota um certo item no painel:
– O que é isso?
– Escudos de energia... – explica Yobi. –... Eles impedem a entrada de qualquer corpo, porém permitem a saída. É útil quando se ativar a função “Kamikaze”, quando toda a superfície da nave é coberta por armas.
– Entendi... – disse John.
O ex-militar sentou-se na cadeira de frente ao volante. Esta se moveu e o deixou mais próximo ao mesmo. Com as mãos, empurrou-o para frente, fazendo a nave andar seus primeiros metros sob seu comando.
Jar comentou com Yobi:
– Yobi, vendo ele assim... Não parece o capitão Jamus?
– Não parece. Ele é. – afirmou o robô.
John experimentava os controles, apertava os botões para ver suas funcionalidades. Estava calmo, concentrado em aprender todas as manobras que a Magnus lhe permitia. Tudo aquilo, embora fosse a primeira vez, soava como natural. Aprendia com facilidade funcionalidades que outros capitães demoraram anos ou décadas para lidar.
O tempo de resposta era quase nulo, algo essencial para uma nave de combate como aquela. Assim que sentiu-se preparado, John olhou para seus dois amigos:
– Vamos partir.
Empurrando o volante para frente, o ex-militar faz a nave andar mais e mais, a ponto de alcançar uma velocidade constante:
– Niko Yells... Eu vou voltar.