O banco Hoolikang é um dos vários na região oeste da cidade de Sapphire. A agência conta com um forte esquema de segurança, quase impossível de se falhar.
Quase.
Oito horas da manhã, alguns funcionários ainda chegavam e logo entravam no local de trabalho. Uma van estacionara em frente ao banco. Preto, nada se via lá dentro pela janela. Em seguida, o propulsor arredondado abaixo do veículo rotacionou-o perpendicularmente. Quatro sujeitos bem-vestidos, e um deles de traje militar, saíram do carro e adentraram o banco, portando malas caras de chumbo. Eles se espalharam: enquanto dois conversavam com outros clientes, a outra dupla ia ao banheiro.
O fato que chamou a atenção foi o não retorno dos dois, o que indicava à primeira dupla que o plano começara.
Sem serem notados, seguiram para o banheiro. Minutos depois, um aviso de limpeza apareceu no monitor acoplado à porta do banheiro masculino. Minutos depois, o grupo percebeu que ninguém passava pelo corredor, fazendo daquele o momento perfeito.
Todos que estavam na rua estranharam o baixar das portas metálicas eletrificadas da agência do banco Hoolikang. Ninguém imaginava que aquele banco pudesse, um dia, ser assaltado. Jamais era esperada uma ação daquelas, principalmente pela ousadia. O sistema de segurança fora evitado perfeitamente, porém em alguns minutos a polícia estaria no local.
Dentro da agência, os clientes estavam apavorados. Os quatro sujeitos encapuzados e de óculos escuros estavam calmos. Eram profissionais. Suas armas eram letais, de uso exclusivo de militares.
O telefone toca, e um dos assaltantes o atende:
– O que vocês querem? – pergunta a voz do outro lado da linha. –... Dinheiro?
– Não. – respondeu seco. –... Isso vale muito mais. O dinheiro é apenas parte dos nossos planos...
– Ora, converse direito comigo, seu idiota! Eu vou atirar em você, se continuar assim! EU sou boa de mira!
– Ah é? – o criminoso acena para um comparsa, que empunha o rifle e ativa a mira a laser. –... Bom saber que você é boa de mira... Mas e quando quem está na mira é você?
Apenas ouve-se um suspiro do outro lado da linha: a dona da voz era da polícia, e mal acreditava que tinha sobre a testa um ponto vermelho. Era alvo fácil para os criminosos:
– Por que... Não me mata?
– Tirar apenas uma engrenagem insignificante como você do sistema? Não... Meu alvo é quem controla essa cidade-nação. Agora, se me dá licença, tenho um assalto para continuar. – e desliga o telefone.
Um dos caixas consegue rastejar, sem ser percebido, até o celular. Ele liga a câmera do aparelho, mostrando ao vivo tudo o que acontecia dentro da agência.
E duas horas se passam.
Um dos criminosos avisa que o pen-drive já tinha acesso a todas as contas. Com um poderoso Code-Breaker, eles conseguiam a senha de quantos usuários achassem necessário.
A van, estacionada do lado de fora, dá marcha à ré e invade o banco, surpreendendo a todos. Os criminosos entram rapidamente no veículo, aproveitando a poeira levantada pela colisão da van com a parede. Eles levam alguns reféns consigo.
O veículo, então, acelera pelo pequeno gramado de enfeite do banco, correndo pela rua livre. Em segundos, as viaturas já os perseguiam pela cidade. A alta velocidade, o veículo negro tentava despistar os furiosos policiais. De repente, fez uma curva fechada para a direita, quase capotando. Os oficiais logo atrás, bateram com força na traseira, fazendo o piloto perder um pouco o equilíbrio:
– Estão na nossa cola! O que faremos, sargento!? – pergunta um dos criminosos.
– Abram a escotilha e deem dez tiros. Logo soltaremos um refém.
– Certo!
Dois assaltantes empurram o pedaço de ferro que compunha a escotilha para cima e atiram com suas armas. Os policiais são atingidos, mas continuam a perseguição. Vendo que a próxima fase do plano iniciara, o sargento abre a porta da van, ficando de frente para os policiais. Neste momento, as quatro submetralhadoras instaladas nos veículos da polícia se mostram e logo começaram a atirar. O homem joga o refém, forçando o cessar-fogo e a diminuída do ritmo dos perseguidores.
Com mais quatro curvas, os policiais não conseguem encontrar os criminosos, acabando com a perseguição e retornando ao distrito policial, nos ombros tinham o fracasso da ação. Mas o consolo era o fato de terem resgatado um refém quase ileso.
Dentro de um galpão na zona industrial, a van finalmente desliga seus propulsores e o suporte no chassi a separa do chão. Assim que o veículo para, as portas traseiras se abrem:
– Bom trabalho, unidade. Descansar. – ordena o suposto líder do grupo.
– Sim, senhor.
Apenas a luz fraca do centro do barracão estava acesa, apesar de instável. Parecia ela que cairia a qualquer momento. Assim que os três comandados vão para seus quartos improvisados, nos fundos do galpão, o líder olha para sua mão, que estava com o pendrive:
– Parabéns, capitão. Outra ação de sucesso, hein? – diz uma voz conhecida.
Ao olhar para trás, vê, sob outra luz fraca, um homem louro de terno preto. Aparentava trinta anos, um pouco mais. Olhos azuis no tom turquesa, um anel no indicador direito e sapatos finos mostravam que ele era poderoso. Porém estava sozinho. Seria fácil acabar com ele:
– Sei o que está pensando, capitão, mas... Sabe como é. Poder em primeiro lugar... – disse o louro.
– Sei, Niko. E você, que antes era algum guerreiro admirável, agora defende com unhas e dentes o seu banco doado.
– É isso o que você pensou quando roubou o meu banco, duas horas atrás?
– É... Deve ter sido. – respondeu, caminhando para longe.
– Acho que você não entendeu, John... – falou o louro.
– Hã?
As outras luzes do armazém se acendem, revelando inúmeros homens fardados, com armas apontando para a cabeça de John. Ele toma um susto:
–... Você vem dando muitos problemas, tanto para mim quanto para essa cidade-nação. Eu vou te dar um fim.
John olha para trás, onde vê os três comparsas apontando-lhe as pistolas usadas mais cedo:
– Então é isso!? – grita ele, vendo-se cercado.
– Você devia ter morrido na guerra, John. Ao menos sairia de lá como herói...
– Que vergonha... – falou um dos comparsas. –... Viver a revolução da nação e terminar como um mero assaltante de bancos...
– Seus traidores... Eu matarei a todos vocês! – gritou John.
– Fale o que quiser. Em pouco tempo, você estará bem longe daqui. Bem longe...
– Malditos!!
Uma clava de madeira acerta o capitão, nocauteando-o. Em poucos segundos, sua visão se escurece totalmente. A última coisa que vê é vários soldados, com os quais serviu, agora de armas apontadas para sua cabeça.
Era o fim.
Os raios de luz ardiam em seus olhos avermelhados. Assim que acostumou-se à claridade, percebeu que já não estava mais no galpão da zona industrial. As palavras dos traidores, porém, ainda ecoavam em sua mente. Faria-os pagar, um por um. Mas seus pensamentos foram interrompidos pelo som da porta eletrônica se abrindo:
– E então, como está? – pergunta um homem de jaleco branco que acabava de adentrar a sala.
– Bem... Bem mal... Malditos... – ainda resmungava.
–... Agora que você sabe o que seus amigos viraram, tem motivo para querer sair daqui?
– Sim, eu vou matá-los!
– Pense bem, seu animal! Acha mesmo que consegue invadir um sistema como o do Hoolikang sem ajuda interna? Acha mesmo que, ao roubar um banco daquele tamanho, somente duas viaturas da polícia te perseguiriam? O seu amigo loiro facilitou as coisas para você!
Tudo o que o cientista dissera era perturbador. John apenas abaixou a cabeça, pensativo. De certa maneira, ele tinha razão. Se tentasse vingança agora, morreria em vão. Era melhor deixar de lado por enquanto e pensar naquilo depois:
– Mas e então, quem é você e o que quer aqui, para falar comigo como se eu fosse um conhecido seu?
– Oh, desculpe-me... Capitão. – ironizou. –... Sou Tenant Rogers, pesquisador de nanotecnologia.
– E...?
– Temos um projeto para você, John. Por tantos roubos a banco, você vai pegar mais de 570 anos de prisão em regime fechado. Mas eu não acho justo que alguém com tanto potencial como você...
O cientista caminha até a janela da sala, com vista para a lua:
–...
–... Seja descartado de uma maneira pior que lixo. Eu acredito que você tem uma índole... Única.
Tenant anda até a porta, a qual deixara aberta. Ele para na um pouco antes da mesma:
– Como vai ser? Ficar aí se remoendo como lixo ou... Mostrar todo o seu potencial?
O homem de branco lhe estende a mão, como se o chamasse para algo. O capitão o olha cansado, indeciso. Se nada fizesse, ficaria ali até quando quisessem. Não tinha porque recusar. Levantou-se da cama flutuante e aceitou a proposta de Tenant, saindo do quarto com o mesmo:
– Eu... Vou com você.
– Ótima escolha! Venha.
A porta eletrônica se fecha. Ambos seguem, lado a lado, pelo extenso corredor branco com vários canais preenchidos com um fluido azul-escuro. As laterais do corredor eram decoradas por uma fita dourada, simetricamente duplicada em cada lado dos corredores. As portas eram alinhadas uma à frente da outra. Homens de branco entravam e saíam das salas constantemente.
Tenant leva John até a sala 48HZV. A porta eletrônica, igual à do quarto de John, abriu-se. Assim que passaram, porém, esta se fechou.
Diante de si, estavam vários jalecos:
– Tome um banho, John. Você está imundo. Eu vou trocar de jaleco.
Sem condições de questionar, o ex-militar entra na área de duchas e, apertando o botão de acionar a função, deixa a água morna lavar todo o seu corpo. Há quanto tempo não via uma ducha daquelas, com agentes de limpeza já combinados com a água que batia em seu cabelo, em seus ombros, e no resto do corpo.
Terminou o banho e atendeu ao chamado de Tenant, o qual lhe jogara um jaleco:
–Era de um cientista que trabalhava conosco e morreu há alguns anos. Bom, acho que vai servir, já que você não ficará muito tempo mesmo... Vamos.
Vestindo-se com o jaleco, calça negra e sapatos escuros, John parecia um cientista de verdade. Assim, ambos caminharam pelo complexo de estudos do governo. Eles cumprimentam alguns colegas de Tenant e continuam seu trajeto.
Os dois caminham pela passarela que interligava setores da base em que estavam. A passarela contava com paredes de vidro nas laterais, o que permitia uma ampla visão do que havia lá fora: um aeroporto de testes, onde novos protótipos de naves militares pousavam e decolavam. Lá embaixo, John viu pontos brancos e verdes: eram, respectivamente, os cientistas e os militares cooperando uns com os outros:
– Uau... – disse Sageman.
– Impressionante, não? Mas o projeto no qual você está envolvido é muito mais interessante...
– É... O quê?
– Exato. Vem, estamos chegando.
Passando pela porta entre a passarela e o prédio do próximo setor, os dois dão alguns passos e entram no elevador. Este, quando Tenant ordena por voz, desce até o último nível da base militar.
Quando as portas da estrutura de metal se abriram, seguiram pelo único corredor, que levava a uma porta fechada. O cientista digitou um código ni teclado, e a porta se abriu. John foi o segundo a atravessar para a sala que se revelara:
– Bom, o seu destino está atrás dessa porta... – diz Tenant, parando em frente a porta dupla de aço reforçado.
– E o que tem aí dentro? – pergunta John.
– Veja você mesmo.
Ao se aproximar da porta, a mesma se abre. John não acredita no que vê: uma armadura azul-escura, mesmo tom que seu exército de revolucionários usava nos tempos de guerra. Era como um uniforme, porém muito mais preparado para qualquer guerra. Lembrava as armaduras robóticas da idade do auge do império Kalif, algo como a “Idade Média dos anos 3000”.
Ao lado do traje, uma SPAS 5000 construída especialmente para John. Este, descendo as escadas em direção ao seu arsenal, ficou impressionado ao tocar na armadura, que repousava sobre um manequim. Em cima da mesa ao lado do boneco estavam duas pistolas:
– É... Meu...? – indagou perplexo.
– Sim. – respondeu Tenant. –... É tudo seu...
John toca na altura do peito da armadura:
– Posso vestí-la?
– É sua, John. Faça o que quiser.
Retirando o jaleco, o ex-militar pega a armadura e, com cuidado, a veste. Uma camada sintética interna à roupa se molda conforme o corpo de John, que sente a ação. Logo, o sistema principal da armadura escura se inicia:
– Iniciando sistema... OK. Iniciando funções primárias, secundárias e vitais. Todos os sistemas funcionando. Bem-vindo, John Sageman. Sua armadura Skyfall Titan X está pronta para uso.
– Uau! – exclamou John, sentindo a alta mobilidade que o traje lhe permitia.
– A Skyfall Titan X conta com um arsenal virtual onde você pode guardar até 5090 itens. – disse Tenant, observando o traje e ajustando os óculos simples.
– Certo... Como faço para guardar uma arma?
– Para isso, ative a função “Scanner And Store” pronunciando “SAS”. Depois, passe o leque de luz azul que sair do relógio pela arma que você deseja guardar. – disse uma voz metálica. Era o sistema desta se comunicando no modo tutorial.
– OK... E guardar itens gerais, como alimentos, ferramentas,...?
– O mesmo procedimento. A Skyfall faz o reconhecimento automático e o armazena com as marcações apropriadas.
– E como obtenho acesso a todas as funções da armadura?
– No momento, todas as funções necessárias estão ativadas. Por meio do “Us-Brain”, a armadura está conectada à sua mente, para que ela seja como uma extensão do seu corpo físico.
– Entendi... Obrigado. Sair do tutorial. – concluiu John.
– Entendido. Sair. Volte quando quiser, se julgar necessário.
O tutorial da armadura se desligou, passando o sistema a ficar mudo. John ainda não acreditava na ferramenta sobre a qual tinha poder. É quando Tenant o traz à tona:
– Agora que você já tem as funções básicas, venha logo. O teu futuro te espera.
Tenant vai para a porta metálica. John, antes de segui-lo, faz as operações para guardas as armas no seu arsenal virtual. Logo ambos já estavam juntos no hangar:
– Uau! Eu vou embarcar nessa coisa!? – pergunta o ex-militar.
– Sim. A sua missão na Terra é simples: colete informações e nos mande. Você tem seis meses para fazer isso. Vai, faça o reconhecimento do território e volte. Só isso. – informou Tenant.
– Se é tão simples, por que você mesmo não vai?
– Eu tenho missões maiores a cumprir. Agora vá, entre na nave chamada Little Crap.
Lembrando das condições em que se encontrava, John executou a ordem do cientista. Ao entrar e fechar a passagem da nave, com uma janelinha na frente, a nave foi levada ao Hangar por um imenso robô. Este a pôs na pista 500, uma das várias livres naquele momento.
Pelo comunicador embutido na armadura, Tenant dirige-se a John pela última vez:
– Boa sorte.
O ex-militar nem teve chance de responder. Em segundos, a nave já era impulsionada por jatos propulsores que a empurravam para o lado externo da nação. Adquirindo uma incrível velocidade, ele decola.
Aproveitou o impacto da partida para dormir um pouco. Estava cansado. A nave só tinha espaço para uma pessoa e era muito pequena. Viajava como um asteroide, e em algumas horas estaria na atmosfera da Terra.
“Eu não sei por que aceitei isso. Podia ter recusado e morrido... Mas não... Eu tenho que cumprir essa missão e retornar, acabar com Niko e qualquer um... Que se meta... Comigo...” pensou ele. O tempo não passava, porém a Terra ficava cada vez mais próxima. A sua missão estava ali, o seu futuro estava ali. Não sabia ele o que o aguardava, mas tinha certeza de que não era um comitê de boas-vindas.
A nave começou a soltar um pouco de fogo, devido ao atrito da mesma com a atmosfera do planeta. Aquela imensa nuvem de poeira era realmente assustadora, principalmente quando se está indo direto para ela. Em alguns minutos, sua nova missão começaria. Talvez a última missão do temido John Sageman.