Um Passado Masoquista

Minha infância foi marcada por uma grande falta de senso. Fazer o que, ele era meu primeiro amigo... Meu único amigo. Para uma pessoa que não conhecia esse sentimento, era perfeito. Ou pelo menos, é isso que ela tentava acreditar ser. 

Flashback ON

Eu havia acabado de entrar na famosa Sweet Amoris. Meus pais ainda trabalhavam duro para que a agência musical de minha família, "Monchiatto", engatasse no sucesso. Por isso, passava a maioria das tardes e noites sozinha. Normal? Talvez. Mas não para uma criança de apenas oito anos. 

Nos meus primeiros dias na escola, me sentia insegura. Não sabia agir, com quem falar e como falar. Muitas pessoas me olhavam de cima, impondo uma sensação de inferioridade sobre mim. Eu me sentia acanhada, mas ainda assim levantava a cabeça e seguia em frente.

Com o tempo, acabei fazendo minha primeira e única amizade naquele lugar. Um moreno de olhos acinzentados, Castiel, foi o primeiro com quem conversei. 

Passávamos todos os recreios juntos. Riamos das bobagens uns dos outros, dividíamos nossos lanches no recreio e estávamos quase sempre juntos. Apesar disso, ele sempre parecia estar distante, misterioso... Ele parecia guardar um segredo dolorido.

Certo dia, recebemos um trabalho para fazer em casa. Optamos por ir para a casa dele, aonde pela primeira vez conheci sua mãe. Seus pais  trabalhavam em uma companhia aérea e mal paravam em casa. Castiel nunca reclamava da ausência deles... E bem, depois do que aconteceu eu entendi o por que.

Castiel havia quebrado um vaso supostamente valioso. Já imaginava que sua mãe ficaria brava, mas jamais poderia supor sua reação. Ela ficou louca, começou a gritar com o Castiel, chamá-lo de "inútil, egoísta, imprestável". Dizia que preferia que ele nunca tivesse nascido, que ele estragou a relação dela e do marido. Por fim, deu um tapa sonoro no rosto dele, deixando a marca de seus dedos no mesmo.

Ela saiu de casa irritada, sem ao menos se preocupar com as lágrimas que corriam no rosto de Castiel. Eu tentei falar com ele, mas ele subiu correndo para seu quarto. Por alguns minutos, respeitei, mas o tempo passava e ele não aparecia. Resolvi subir até seu quarto para ver o que acontecia. 

Ele estava desesperado, utilizando uma gilete para cortar seus pulsos. Por vezes, se agredia com socos mais fortes até dos que sua mãe lhe dava. Não me contive e o impedi, segurando suas mãos.

- Não Cast, por favor! Não faça isso com você mesmo! - falei em prantos. 

- Por favor Lynn, não tente me impedir. Eu preciso descontar minha raiva em algo. Senão vou acabar machucando alguém.

- Eu te imploro Tiel, por favor, pare! - meu rosto já estava salgado de tantas lágrimas.

- Eu não posso evitar - disse, com um pesar em sua voz - Se não eu...

- Faça em mim! - gritei sem pensar - Pode me bater, me espancar, me cortar, o que você quiser! Mas pelo amor de Deus, prometa que não fará isso com você!

- Lynn... - ele parecia surpreso.

- Anda logo idiota! Desconte em mim! Eu estou esperando!

Poucos segundos depois, sinto uma mão forte voando em meu rosto, seguido por chutes e alguns cortes na região das minhas pernas e braços. A dor era muito grande, não pude evitar algumas gotas de lágrima no meu rosto. 

Quando satisfeito de sua raiva, Castiel me envolveu em seus braços e me abraçou com força, chorando muito.

- Obrigada Lynn... Você é minha melhor amiga - ele disse.

- Você também é o meu Tiel... Pode contar comigo sempre, está bem?

Desde então, selamos nosso acordo. Daquele dia em diante, todas as vezes que Castiel sofria ou tinha problemas, descontava em mim. Instantes depois que estava bem, seguíamos como antes de tudo. Rindo e fazendo piadas, como bons amigos. Melhores amigos. 

Ao mesmo tempo que eu sofria com a dor, era feliz por trazer bem ao Castiel. Me sentia bem por poder fazê-lo seguro de si mesmo. 

Complicava apenas quando meus pais faziam perguntas sobre os machucados. Eu sempre mentia, dizendo que era coisa de jogos, acidentes ou coisas afins. Eles não acreditavam muito, mas também não questionavam.

Um dia, no entanto, a casa caiu. Nesse dia, tínhamos doze anos e Castiel começou a namorar uma novata. Aquele dia foi o pior de toda minha vida. 

Eu não era amiga dela. Tentei impedir o moreno de ficar com ela, mas não consegui. Irritado com minhas tentativas, Castiel declarou o fim de nossa amizade e me empurrou em uma piscina gelada em pleno inverno. O pior de tudo, eu não sabia nadar.

Quem me salvou foi Nathaniel, um garoto com o qual mal falava antes. Porém, a notícia chegou aos ouvidos de meus pais. Acabei contando a eles toda a verdade. 

Decepcionados, eles optaram por me tirar de Sweet Amoris no mesmo dia. Nos mudamos para o Japão, aonde moro até hoje, que tenho dezesseis anos.

Flashback OFF

Apesar de toda a série de ocorridos, as coisas melhoraram para mim desde a mudança. Encontrei um novo melhor amigo, Kentin. Totalmente o oposto de Castiel, Ken é dócil, gentil e amável. Ele sempre está ao meu lado quando preciso, além de sempre me fazer feliz. 

Bem, a melhor parte ainda não contei. Desde minha mudança, acabei virando a primeira cliente de meus próprios pais. Segundo eles, eu tinha uma voz totalmente preciosa, que precisava ser compartilhada com o mundo. O primeiro passo que tomaram foi tingir meu cabelo para um tom verde-azulado. O segundo era me promover.

O resultado foi tão incrível que logo no primeiro disco, as vendas foram um sucesso. Lynn Parks agora era uma celebridade, a qual se mantém mais firme do que nunca hoje. 

Palavras que definem minha personalidade? Dócil e sarcástica. Sou bastante alegre (eu acho), mas ainda assim carrego uma certa dor pelo passado. Hoje em dia me sinto uma verdadeira idiota pelo que fiz. Meu namorado Kaname, vocalista de uma internacionalmente famosa banda de J-rock, gosta de comparar meu humor ao veneno. Sútil, porém fatal. Interprete como quiser. Mas para todas as hipóteses, posso garantir que dou o melhor de mim na carreira da música. 

Falando nisso, tenho que iniciar um show em cinco minutos.

Meu último show antes da minha mudança de volta para França.