Este especial acontece 3 anos antes do especial: "Memórias de um samurai"
Num lago de uma região desabitada, uma jovem mulher de cabelos prateados e olhos castanhos aproveitava a completa ausência de pessoas para lavar o seu corpo como costumava fazer todos os dias.
No momento em que se preparava para sair e se enxugar, reparou em algo a boiar na água. Curiosa, aproximou-se, percebendo rapidamente que era um homem de cabelos negros inconsciente e com parte de uma flecha cravada no ombro, tingindo de vermelho a água em volta do sujeito, ao lado do mesmo flutuava também uma espécie de colar com uma pena de corvo.
A mulher entrou em pânico e decidiu arrastar o homem para terra firme. Sem ainda saber o que fazer, deitou o homem na grama e vestiu-se rapidamente.
“O que faço? O que faço?” Pensou ela correndo de um lado para outro. “Ele tem pulso, portanto não está morto, mas o que eu devo fazer? Espera aí, se bem me lembro, neste tipo de situação devesse fazer… R-r-respiração boca-a-boca! Não, não, não. Não quero dar o meu primeiro beijo para um desconhecido. Mas se não fizer nada, ele vai morrer. Droga, não tenho escolha!”
Ajoelhou-se então perto do homem e começou a aproximar lentamente o seu rosto ao do desconhecido. Fechou os olhos com força, enquanto ficava cada vez mais vermelha, até que os seus rostos ficaram a poucos centímetros de distância.
“Não é que eu tenha algo contra. Mas não nos devíamos conhecer primeiro?” Ouviu ela de repente abrindo os olhos e ficando frente a frente com o olhar rubro do homem que salvara.
“P-p-p-p-p-PERVERTIDO!” Gritou a mulher esmurrando a cara dele com tanta força que causou uma pequena cratera onde a cabeça do sujeito estava assentada.
“Para que foi isso?” Reclamou o moreno agarrado ao nariz que agora sangrava. “É assim que tratas alguém que alguém que acabas de conhecer?”
“Até tens sangue a sair. Seu pervertido, não te atrevas a tocar-me, não cederei a minha bela inocência assim tão facilmente, nem por 300 Yens!” Falou Ela se afastando e colocando-se numa posição defensiva.
“Estou sangrando porque provavelmente me partiste o nariz!” Respondeu ele. “E esse valor não é um pouco baixo demais?”
“Não quero ouvir nada de um pervertido como você.” Afirmou a albina mostrando a língua.
“Fala a pessoa que nada pelada, ao ar livre.” Comentou o estranho desviando o olhar.
“Então você viu…” Murmurou ela com os olhos cobertos pela sombra da franja.
“Eh?” Indagou ele tendo um mau pressentimento.
“Viu, não viu? Agora vai ter de assumir a responsabilidade.” Afirmou a albina rodeada por uma aura obscura e com os olhos emanando um brilho vermelho ameaçador, estalando os dedos.
“E-espera aí. Não precisamos passar para a violência, porque não falamos um pouco e nos acalmamos? P-Prometo que esqueço tudo.” Sugeriu o moreno assustado.
“Sim, vou fazê-lo esquecer tudo.” Concordou ela aproximando-se lentamente dele, com uma aura cada vez mais assustadora:”
“Socorro!” Gritou ele ao ser atacado.
Algum tempo depois, o homem completamente espancado recuperou a consciência e reparou que a flecha tinha sido retirada e o ferimento tratado de uma forma um pouco descuidada e apreçada.
“Sinto que fui atacado por todo um exército.” Murmurou ele ainda zonzo.
“Oh, já acordou.” Reparou a albina num tom e uma expressão bem mais amigáveis, enquanto comia alguns morangos silvestres. “Encontrei alguns morangos aqui perto, quer provar? São deliciosos.”
“Não obrigado.” Recusou ele acariciando a sua cabeça cheia de dores, enquanto pensava. “Ela não está agindo de uma forma um pouco diferente de antes?”
“Já agora, o meu nome é Yamiko e o seu?”
“Karasu. Sakata Karasu.” Apresentou-se levantando-se. “Obrigado por me teres salvado, mas agora tenho de ir.”
Assim que deu um passo em frente, Karasu deixou-se cair como se tivesse perdido todas as forças.
“Ei, estás bem?” Perguntou Yamiko aproximando-se dele.
Ela recebeu como resposta um ruído proveniente do estômago dele, apercebendo-se que o sujeito se encontrava famintos.
“Acho que afinal vou aceitar os morangos.”
“Bem… Já comi todos, enquanto falava-mos.”
“Assim tão rápido?!”
“Anda, vem comigo. A minha família tem um restaurante:” Ofereceu apoiando o braço de Karasu nos seus ombros para o ajudar a caminhar.
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Chegaram então a um humilde restaurante com uma placa onde estava escrito “Hokkyokusei”. Parecia não haver ninguém no estabelecimento.
Yamiko preparou-lhe uma porção de arroz e uns poucos Nikuman (N/a: uma espécie de pão japonês recheado com carne de porco moída e outros ingredientes e depois cozido à vapor). Karasu completamente faminto, começou a comer como se não o fizesse há vários dias.
“Tinhas mesmo muita fome.” Comentou Yamiko vestida com um avental e um pano na cabeça como se fosse uma dona de casa.
“Estou de volta.” Informou um homem idoso entrando, trazendo consigo lenha às costas. Que reparou logo em Karasu. “Não sabia que tinha-mos visitas. O restaurante só abre daqui umas horas.”
“Este é um cara que encontrei meio morto no lago. Ele parecia estar com fome, por isso o trouxe aqui.” Respondeu Yamiko apontando para o moreno com o polegar.
“Então é isso. Eu sou o pai da Yamiko e o dono deste restaurante.” Apresentou-se sentando-se de frente para o estranho. “Qual é o teu nome, rapaz?”
“Karasu.” Respondeu ele enquanto comia. “Isto está realmente delicioso, velhote.”
“A minha filha é uma grande cozinheira e também é muito bonita, tal como a mãe. Daria uma bela esposa, apesar de ser um pouco Tsundere.”
“Quem estás chamando de Tsundere, velho maldito!” Reclamou Yamiko corando levemente.
“Mais por favor.” Pediu Karasu terminando de comer. “E desta vez que seja algo açucarado.”
“Não sejas demasiado exigente.” Falou Yamiko voltando para a cozinha.
“Tens dinheiro para paga isto tudo, jovem?” Perguntou o dono descontraidamente.
“Hum… Na verdade não tenho nem um pouco de dinheiro, mas arranjarei uma forma de pagar… Eventualmente.” Respondeu Karasu desviando o olhar nervosamente.
“Espero que sim, afinal seria ruim para nós se não pagasses.” Falou o velho com uma expressão amigável mas rodeado por uma aura ameaçadora.
“C-certo.”
Então os dois ouviram a porta abrir violentamente, quando para lá olharam, viram que um bando de homens que aparentavam ser delinquentes tinha entrado no estabelecimento.
“Oi, oi, velhote. Já tem o dinheiro que nos deve?” Perguntou rudemente um dos homens, que aparentava ter maior autoridade.
“Já disse que quando tiver, pago.” Respondeu o dono com uma expressão séria.
“Você continua dizendo isso nos últimos 15 anos. O chefe começa a ficar impaciente.”
“Eu tenho pagado, mas vocês continuam a aumentar a quantia.”
“Nós só estamos juntando a taxa de proteção do lugar. Afinal, você não quer que aconteça algo de mal à sua querida família, certo.”
“São vocês outra vez.” Reparou Yamiko com uma expressão de raiva no rosto saindo da cozinha com uma bandeja de madeira, onde estava um prato de dangos para o seu convidado. “Porque não nos deixam em paz de uma vez?”
Depois de deixar a bandeja na mesa de Karasu, foi para o lado do seu pai.
“Yamiko-chan! Você está tão crescida.” Comentou o homem com um sorriso repulsivo. “Já sei, velhote. Porque não usa o belo corpo da sua filhinha para pagar a dívida?”
Dizendo isto, o homem agarrou o cabelo de Yamiko, mas rapidamente o soltou, apos algo ter sido cravado no seu pulso.
“O que raio foi isto?” Indagou ele furioso, agarrando-se ao pulso, onde estava espetado um palito usado para prender dangos.
“Desculpe aí. O palito escorregou-me das mãos.” Desculpou-se o moreno levantando-se e aproximando-se do bando que era composto por 5 homens.
“Vejo que ainda há pessoas que frequentam esta espelunca.” Comentou o homem tentando fazer-se e superior. “Se pedires perdão de joelhos talvez te deixe partir sem problemas.”
“Ei, velhote, vamos fazer um trato.” Falou Karasu cutucando o nariz. “Pagarei a minha dívida tirando este lixo do seu restaurante, o que lhe parece?”
“Não vejo problema.” Respondeu o velho com um sorriso.
“Não me ignorem, por acaso querem morrer?” Ameaçou o homem desembainhado parte da sua espada, assim como o resto do seu bando.
“Oi, tenham calma aí.” Falou o moreno limpando os dedos na roupa do delinquente, irritando assim o mesmo. “Vamos resolver isto lá fora, não quero sujar nem causar danos a este lugar.”
“Aniki, este cara está se achando.” Comentou um dos homens irritado, sacando a sua espada.
“Não te precipites. Vamos fazer como ele diz, não fará diferença.” Falou o líder com uma expressão de confiança e saindo juntamente com o resto do bando.
“O que estás a fazer? Eles são perigosos!” Advertiu Yamiko preocupada.
“Posso usar aquilo ali?” Perguntou Karasu ignorando a albina e apontando para uma katana que estava na parede do restaurante servindo de decoração.
“À vontade, jovem.” Respondeu o dono atirando-lhe a espada.
O moreno de olhos vermelhos pegou-a e saiu do restaurante sem dizer mais alguma palavra.
“Porquê é que o estás apoiando?” Perguntou Yamiko preocupada e também irritada. “Ele está claramente em desvantagem, vão mata-lo!”
“Faz tempo desde a última vez que vi um olhar como o dele.” Afirmou o velho indo até à porta para ver o combate. “Aqueles eram os olhos de um verdadeiro samurai.”
“Um verdadeiro samurai?” Murmurou Yamiko intrigada indo para perto de seu pai.
“Este cara parece ser bem convencido, temos de ensinar-lhe uma lição.” Disse um dos homens.
“Com o aniki já é suficiente, nem vamos precisar lutar.” Comentou outro deles.
“Então tens algumas palavras, valentão?” Questionou o líder ironicamente causando várias risadas no seu grupo.
“Blá, blá, blá, blá, vocês falam demais. São crianças indo para uma excursão, por acaso, bastardos?” Provocou Karasu com apenas um olho coberto pela sombra da franja, desembainhando a katana que lhe fora oferecida.
“Como é que é?” Indagou o líder revoltado desembainhando também a sua katana. “Cansei-me de esperar. Todos, ataquem-no ao mesmo tempo!”
“Parece que não ouviram falar da mais recente norma do restaurante Hokkyokusei.” Comentou o samurai simplesmente estando parado, enquanto os inimigos se preparavam para o matar. “A partir de hoje, não é permitida a entrada a vermes como vocês.”
Os 4 bandidos rodearam Karasu, mas antes que pudessem partir para o ataque, sentiram um sensação gélida por todo o corpo, não tardou muito para repararem que os seus estômagos tinham sido cortados a uma velocidade impressionante e com uma precisão milimétrica que os impediu de morrerem com o corte, apenas provocando a queda dos 4.
“Incrível.” Murmurou Yamiko espantada, enquanto o seu pai apenas observava tranquilamente.
“Nossa, eu só queria assustá-los um pouco para o começo. Mas eles foram derrotados apenas por isto?” Falou Karasu esfregando a cabeça, enquanto observava os 4 delinquentes caídos. “Não percebo de onde vinha essa confiança toda.”
“Não pode ser… Que tipo de monstro é você?” Inquiriu o líder tão assustado que deixou cair a sua katana.
“Bem acho que agora tens duas escolhas.” Disse o samurai embainhando a katana e prendo-a à cintura. “Ou lutas e acabas como eles ou pior. Ou rendeste e te deixamos partir, juntamente com eles. Como vai ser?”
“Eu… Eu… Me rendo, por favor nos deixe partir, samurai-san.” Pediu o líder fazendo uma vénia de joelhos.
E assim Karasu permitiu que o líder levasse os membros do seu bando para a carroça e partisse.
“Não devem receber notícias deles durante algum tem…” Dizia Karasu até ter sido golpeado por Yamiko. “O que fiz, agora?”
“Isto foi por me teres deixando preocupada.” Respondeu ela de punho cerrado. “Mas agora está decidido.”
“O quê?” Perguntou ele com parte da cara inchada.
“Sakata Karasu! A partir de hoje serás o segurança do nosso restaurante!” Declarou Yamiko apontando para o samurai confuso.
“Porque é que eu deveria aceitar ser segurança de um lugar como este?” Reclamou o moreno levantando-se.
“Tudo bem. Se não queres ser um segurança, podes ser o nosso cão de guarda.” Sugeriu Yamiko cruzando os braços e com uma expressão decidida.”
“Isso é ainda pior!”
“Pelo que sabemos, não tens nem dinheiro, nem um sítio para ficar, certo? Se aceitares a minha proposta, te daremos estadia e alimentação gratuitas como pagamento.”
“Parece que a minha filha gostou de você.” Comentou o velho rindo. “Ela não costuma ser tão generosa, no que toca a dinheiro.”
“Não é nada disso! Só acho que daria jeito ter alguém como ele protegendo o Hokkyokusei, só isso.” Corrigiu ela corando levemente.
“Tudo bem… Eu aceito, também não tenho nenhum lugar para onde ir.” Respondeu ele desinteressadamente.
“Contamos contigo.” Falou Yamiko alegremente.
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Nesse mesmo dia, ao pôr-do-sol, Karasu testava a sua nova espada nos fundos do restaurante, que ao que parece também era a casa da família de Yamiko. Treinava os movimentos básicos de kendo e também aproveitava para cortar a lenha.
“Até que não és tão inútil como pensei.” Comentou Yamiko sentando-se e observando o samurai que salvara.
“Não sou inútil, só não gosto de trabalhar.” Respondeu ele atirando um pequeno tronco e cortando-o ainda no ar. “Mas se vou proteger este sítio, vou ter de desenferrujar as minhas habilidades de espada, apesar de isso ser um saco.”
“Estão és apenas o preguiçoso.” Concluiu a albina com um olhar entediado, lembrando-se logo de algo. “Já agora, isto estava boiando perto de ti.”
Yamiko levantou-se e mostrou-lhe o colar com uma pena de corvo. Os olhos rubros de Karasu mostraram um grande espanto e rapidamente pegou o objeto.
“Incrível! Pensei que o tinha perdido, já me estava a preocupar.”
“É algo importante?”
“É um amuleto que me foi dado por alguém muito importante para mim. Ando sempre com ele.” Respondeu Karasu colocando-o em volta do pescoço.
“Um amuleto com uma pena de corvo? Isso parece mais algo de azar do que sorte.” Reparou Yamiko analisando o amuleto bem de perto.
“Foi o que disse a essa pessoa. Mas como costumo ser bem azarado, talvez mais azar me dê sorte.” Respondeu ele sorrindo.
“Dizes umas coisas bem estranhas.” Comentou Yamiko virando-se rapidamente de costas, para disfarçar o facto de ter corado com as palavras e principalmente com o sorriso do moreno. “Bem, vamos voltar para dentro, já está quase a anoitecer.”
“Sim, tens razão.” Concordou Karasu entrando de novo no restaurante com ela.
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De noite, num templo abandonado, o bando de delinquentes que atacou o restaurante retornou para reportar o acontecido ao seu chefe.
“Então aquele velho também contratou um samurai.” Falou o chefe do bando, que apresentava um grande porte, tinha uma braba rija e algumas cicatrizes no rosto.
“Por favor tenha piedade de nós, chefe!” Implorou o líder do pequeno bando ajoelhado, assim como os seus companheiros.
“Esse samurai parece ser interessante.” Comentou um homem que estava sentado nas sombras, apenas sendo possível ver a sua silhueta e os seus olhos frios. “Me faz lembrar alguém que conheci no passado.”
“Não sabia que já estava aqui, Hebizakumaru-san. Está interessado neste samurai?” Indagou o chefe.
“Sim, quero muito corta-lo.” Respondeu o homem misterioso.
“Aniki, quem é aquele cara?” Sussurrou um dos homens.
“Não sabes? Ele é o samurai que foi contratado pelo chefe.” Respondeu o líder. “Dizem que já trabalhou diretamente sob as ordens do Shogun, no seu exército especial.”
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Alguns meses se passaram e Karasu e Yamiko foram ficando mais próximos à medida que trabalhavam juntos no Hokkyokusei.
“Vou buscar lenha.” Informou o idoso dono. “Podes acompanhar-me desta vez, Karasu-kun?”
“Claro, hoje as coisas também andam bem monótonas, portanto não há nada para fazer.” Respondeu o samurai que estava deitado na grama a relaxar.
“Como assim, não há nada para fazer? Eu já te mandei limpar os banheiros!” Reclamou Yamiko, saindo do restaurante já com uma concha de sopa na mão.
“Desculpa aí, o velho pediu-me um imenso favor. Limpo para a próxima. Tchau.” Respondeu Karasu já se pondo a caminho.
“Ele é sempre cheio de energia quando o assunto é fugir ao trabalho.” Suspirou Yamiko, voltando para o restaurante, enquanto os dois homens iam em direção ao bosque.
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No meio do caminho, os dois fizeram um pequeno desvio e param em frente a um pequeno túmulo com um nome de mulher escrito.
“A quem pertence isto?” Perguntou Karasu curioso.
“À minha esposa.” Respondeu o pai de Yamiko amargamente, fazendo com que o samurai se tivesse arrependido de ter feito a pergunta. “Ela tinha uma saúde muito fraca e morreu ao dar à luz a Yamiko.”
“Perdão por o ter feito lembrar.”
“Não há problema, também era a minha intenção falar-te dela, foi por isso que te trouxe aqui, hoje.” Explicou o velho colocando as oferendas junto à lápide de pedra. “Sabes, o sonho da minha esposa sempre foi abrirmos um restaurante, juntos. Um pouco antes da morte dela, conseguimos abrir o Hokkyokusei, tudo corria bem, tirando a morte dela, não tivemos nenhum problema. Mas infelizmente, há 15 anos atrás, por alguma razão começamos a ter cada vez menos clientes e tivemos de acabar por conseguir dinheiro de outro jeito. Foi aí que aceitamos um empréstimo daqueles bandidos, por causa disso, tivemos de lidar com eles todos os meses, sempre aumentando valor daquela ridícula taxa de proteção a cada visita. Eu não quero perder aquele restaurante que a minha mulher tanto amava, por isso estou confiando em você. Acredito que você será capaz de proteger os dois maiores tesouros que a minha esposa deixou para trás, o Hokkyokusei e a Yamiko.”
“Sim, irei protege-los.” Respondeu Karasu com uma expressão séria.
“Queria pedir-te mais um favor, Karasu-kun. Hoje, é o festival de verão, o favorito da Yamiko. Será que podias leva-la, no meu lugar?”
“E quanto a você?”
“Eu ficarei guardando o restaurante. Quem sabe quando mais clientes podem aparecer.” Respondeu o velho sorrindo.
“Ok, acho que não deve haver problema em tirarmos uma folga.”
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Mais tarde, no festival, Karasu e Yamiko estava ambos vestindo yukatas, estando ele de vermelho e ela de azul.
“Incrível, há tantas coisas! Adoro festivais!” Gritou Yamiko animada com uma criança no seu primeiro festival. “Onde devemos ir primeiro? Às barracas de jogos, ou devemos começar com as de comida? Quando serão os fogos-de-artifício?”
“Ela está bem animada.” Pensou Karasu com uma gota de suor atrás da cabeça.
“Vamos primeiro à barraca de tentar pegar o peixe-dourado.” Decidiu ela agarrando o braço do samurai e arrastando-o.
“Aqui têm as vossas redes.” Falou o dono da barraca. “Cada um só tem uma oportunidade.”
“Eu vou primeiro.” Disse Yamiko confiante. “Sempre quis ter um peixe-dourado.”
Assim que a albina focou o seu objetivo, lançou-se sobre o peixe, mas ao usar demasiada força e velocidade, a delicada rede não aguentou e cedeu.
“Quebrou…” Lamuriou-se Yamiko com algumas lágrimas abandonando os seus olhos.´
“Isso é porque és brusca demais. Vê como se faz.” Falou Karasu concentrando-se.
Ficou encarando um dos peixes do pequeno tanque, sem se mexer um único centímetro, como se fosse uma árvore, apagado por completo a sua presença perante os peixes. Baixou lenta e fluentemente a sua rede até ao tanque, mergulhou-a pacificamente na água causando o mínimo de ondulações, quando finalmente alcançou o peixe e o pegou, a rede quebrou.
“… Eh?”
“Hahahaha! Falhado, nem com essa calma toda conseguiste pegar um simples peixinho.” Comentou Yamiko às gargalhadas.
“Olha quem foi falar! Tu foste bem pior do que eu!” Reclamou Karasu.
“Não me recordes, realmente queria aquele peixe.” Falou Yamiko deprimida.
“Parece que não tenho escolha.” Suspirou Karasu levantando-se e desembainhando a sua espada.
“O que vais fazer?” Perguntou Yamiko confusa.
“Dê-nos um peixe-dourado e não acontecerá nada de mal.” Ameaçou o samurai com uma expressão intimidadora, enquanto apontava a espada para o dono da barraca.
Alguns minutos depois, os dois continuavam a explorar o festival, com Yamiko transportando consigo um saco com um peixe-dourado, enquanto cantarolava felizmente como uma criança.
“Espero que agora estejas satisfeita.” Suspirou Karasu com uma expressão entediada.
“Sim, fico-te devendo uma.” Respondeu Yamiko piscando-lhe o olho. “Agora é a tua vez de decidir onde vamos:”
“Hum… Que tal ali?” Sugeriu o moreno apontando para a entrada do teste de coragem.
“A-a-a-ali?” Gaguejou Yamiko suando frio.
“Qual é o problema? Estás com medo?” Questionou ele com um sorriso matreiro.
“C-c-claro que n-não tenho m-medo. Só acho esses lugares entediantes demais, vamos a outro.”
“Não, já decidi que vamos fazer o teste de coragem. Lembras-te? Disseste que me devias uma.”
“Maldito.” Murmurou Yamiko irritada e entrando contrariada, juntamente com Karasu.
Depois do teste de coragem, Yamiko estava agachada, com as mãos a taparem os ouvidos e a tremer, enquanto murmurava. “Fa-fa-fantasmas n-não e-existem. Fantasmas não existem. Fantasmas não existem…”
“Não fazia ideia de que ela era assim tão medrosa com coisas destas.” Pensou Karasu com uma gota de suor atrás da cabeça. Preocupado, pousou a mão no seu ombro e perguntou. “Ei, estás bem?”
“Kya!” Gritou ela assustada, esmurrando repentinamente a cara do samurai, nocauteando-o sem misericórdia. “Oh, és apenas tu.”
“É a última vez que assusto esta mulher…” Murmurou Karasu antes de apagar por completo.
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Depois de terem passado mais algumas horas no festival e assistido os fogos-de-artifício, Karasu e Yamiko voltaram para casa, falando e rindo dos momentos que passaram lá.
Mas no momento que entraram no restaurante, o clima mudou por completo. Haviam sinais de briga e violência por todo o lugar, coisas quebradas e mais importante, não haviam quaisquer sinais do dono.
Os dois procuraram por todos os lados, mas não o encontraram. Foi então que Yamiko reparou numa nota presa numa mesa com um punhal que dizia:
“Pegamos o velhote como garantia. Têm até a próxima semana para pagarem tudo o que devem, se não ele morre. Também podem pagar dívida entregando a garota para nós ou então entregando a cabeça do samurai. Quando decidirem, venham até ao templo abandonado que fica nos arredores.”
“Eles… Pegaram o meu pai.” Murmurou Yamiko começando a lacrimejar, enquanto Karasu batia na mesa com força e uma expressão de raiva.