A Amante de Tokyo - Verão, o Abrigo e sobre um pequeno quarto 3X3...

Tempo estimado de leitura: 17 minutos

    16
    Capítulos:

    Capítulo 1

    O Abrigo

    Linguagem Imprópria

    A você leitor, que no momento está dispensando pouco do seu tempo para ler esse meu pequeno texto, se assim poderia defini-lo, não encontrará aqui pornografia explícita, pois resolvi escrever sobre as minhas memórias, e não desenhá-la. Se eu pudesse desenhar, com certeza eu teria muito mais leitores, no entanto, Deus não me deu a dádiva da mão, tampouco a dádiva de obedecer a proporção do ser humano e dos objetos que o circunscreve... Enfim, resolvi usar a arte de escrever para poder expressar-me, então, peço-lhe que use o máximo de sua imaginação para poder compreender o que eu quero dizer.

    Não quero enganar ninguém. Não é o meu intuito ludibriar pessoa alguma, portanto não vou mentir sobre determinadas proporções ou detalhes relacionadas à minha estada em Tokyo. O que vou falar a partir de agora está relacionado aos três meses em que vivi na capital do leste, essa a leitura literal dos ideogramas que compõem a palavra Tokyo. Bem, como já defini do que vou falar, mais fácil ficará para você, caro leitor, que não terá escusas por não ter compreendido ?textículo?, sobre memórias minhas.

    Acho que estou enfatizando demais que o meu texto é sobre memórias...Bem, talvez porque ainda não estou decidido que estilo adotar para melhor lhe informar. Que seja, no meio dessa tentativa de narração talvez eu fixe o estilo mais apropriado para tanto.

    Era verão. As cigarras em coro uníssono anunciavam o pico da estação. Imagens retorcidas de crianças brincando, donas de casa colocando suas roupas para cercar, o transeunte que esforçava-se para suportar o calor, encharcando um pequeno pedaço de seda com o suor de seu rosto, todos os elementos que formam um quadro da paisagem urbana nos arredores de Tokyo estavam presentes, cada um cumprindo o pequeno papel que divindades haviam-lhe atribuídos.

    O que vim fazer em Tokyo é irrelevante. Digo isso porque não me lembro, de fato, por qual desígnio vim a Terra donde o sol levanta, novamente fazendo uma leitura literal dos kanjis que formam a palavra Nihon. Note somente, leitor, que não estava no centro de Tokyo, local em que a minha carteira não suportaria pagar. Estava eu em um dos comuns quartos 3X3 de Tokyo. Ao certo, não sei se tenho sorte ou azar em ter achado esse local. De fato o aluguel não era caro, no entanto, devido a um abrigo de órfãos em frente ao meu pequeno e temporário lar, não tinha visão privilegiada da caótica Tokyo, nem do seu festival luminoso, atração conseqüente da noite.

    Algumas pessoas preferem, ao viajar, as paisagens majestosas da natureza. No entanto, eu não fazia parte desse grupo. Na verdade, fascina me muito o ar cosmopolita. A sinfonia de ruídos dos carros, junto com os motoristas e pedestres, pra mim, formavam um violento e emocionante ?Ballet?, no qual cada um de seus protagonistas cumprindo o seu papel, obedecendo ao script das leis de trânsito, propulsionavam essa, senão caótica, intricada dança em que o simples erro poderia ser punido com a morte...

    Além disso, como já havia dito, vendo a cidade de longe, principalmente à noite, não só esse ?lago dos cisnes? mortal ganhava uma beleza ainda maior, como também dava lhe uma aparência melancólica a essa paisagem dinâmica, que infelizmente não tenho como, agora, descrever.

    De qualquer modo, era verão em Tokyo. Eu, na plenitude do tédio, nenhuma tarefa ou compromisso possuía. Era uma terça-feira qualquer, pensei, em que o acaso e a álea resolveram permanecer inertes, assim como eu naquele dia, em que fiquei deitado naquele pequeno quarto 3X3, cuja dimensão fazia aumentar somente a sensação de calor.

    As cigarras não calavam a boca, era o que eu pensava. O tédio realmente não me incomodava. O que realmente me enfurecia era a circunstância do coro disforme das cigarras obliterando qualquer oportunidade do sono me levar ao único lugar onde minha razão não estivesse presente, local em que o meus desejos mais profundos se realizariam, conforme diziam certos especialistas sobre o sono...

    Não só as cigarras, mas o clima também não era o meu aliado naquele dia. Já viajei para muitos locais, e com certeza essa pequena ilha no oceano pacífico não era o país mais quente. No entanto, novamente o abrigo defronte ao meu pequeno apartamento tornava-se meu antagonista nesse romance épico meu contra as intérperes da estada no Japão. Em resumo, poderia defini-lo como trágico, vez que eu não tinha ar condicionado, e o meu ventilador tinha acabado de quebrar, então provavelmente esse meu pequeno romance teria um final triste.

    Deitado no meio do quarto, não consiga pensar em nada. Durante algumas horas o meu pensamento concentrava-se em fugidios passatempos. Algumas horas fiquei contando quantas gotas de suor deslizavam pela minha fronte, outrora fiquei contando quantos pingos escorriam pela garrafa de Calpis, vazia, próxima a mim. Quando o tédio finalmente começou a me importunar, levantei-me e pensei em caminhar um pouco.

    Era uma terça, estava muito quente, não era o centro de Tokyo, não me lembro porque vim a essa minúscula ilha...Era basicamente isso o que passava pela minha cabeça. Geralmente, algum Koneko (gatinho) surgia dos arbustos, ou algo não pitoresco como uma ave que não era da região ( talvez tenha se perdido do bando) roubava minha rarefeita atenção. Mas, insuficientes eram para vencer o tédio. Naquele dia, a natureza era o Golbes. Com o seu incessante padrão de ataque, o calor era como o Bio, que sugava cada HP meu ( AKA motivação).

    Não conseguia pensar em analogia alguma, pois, porque estou falando de Final Fantasy IV. Para ser sincero, eu nunca consegui vencer aquele Filho da Puta...

    Sem qualquer atenção, passei a vagar pelas ruas próximas de meu alojamento. Visitei as ?Conbi? (lojas de conveniência), parei para comer em uma ou duas barraquinhas, sendo que uma vendia crepes e a outra vendia aquela modinha de cupcakes ou algo parecido. Não fui muito longe, penso eu, para chegar ao Ikebukuro demoraria muito, além disso, por mais que eu goste da paisagem urbana, não gostava de multidões. Essas, junto com o calor, formavam-se aliadas, entristecendo ainda mais o meu pequeno épico contra essa maldita sensação térmica.

    Já próxima a minha pequena moradia, resolvi contemplar a razão de uma de minhas infelicidades por aqui: O abrigo de órfãos. Grande, desengonçado, cheio de remendos, estaria exagerando se eu dissesse que o edifício se parece com um certo castelo que se move, mas qualquer pessoas atenciosa poderia notar que o prédio já passou por várias reformas. Diferentes padrões de janela, certas partes da fachada que estavam pintados com diferentes cores ( alguma parte estava verde, outra estava sem cor, outra estava pintada de rosa...). Será que era assim de propósito?

    Mesmo com a penumbra dominando a paisagem, o calor recusava-se a render. Percebi só naquele instante o quão indomável era aquele meu oponente. Mesmo quando o seu grande general, Sol, recuava, o calor, como que um Samurai, e o mais leal deles, permanecia fiel ao seu quente Shogun, exercendo sua função...Droga, estava eu com tanto calor que eu fazia essas comparações malucas.

    Fiquei por um tempo apreciando aquele arco-íris gigante ( notei que tinha mais cores). O que me deixava perplexo era se alguém vivia naquele local. Olhando da janela donde durmo, é possível ver outra janela. É possível ainda pular para ela, visto que os dois edifícios, o dormitório e o abrigo, estão muito próximos. No entanto, como a janela do abrigo estava sempre fechada, prevejo que minhas proezas Parkour não terminariam bem.

    Depois de ficar apreciando aquela interessante construção, pus-me a voltar para o meu alojamento, para o meu pequeno quarto 3X3, ou seja, para a minha minúscula sauna particular, donde nada se via, além de uma janela cujo interior era tão desconhecido como o interior de um banheiro feminino...( leitoras, por favor não se irritem, isso foi apenas uma comparação, e estou sem idéias, e além disso sou homem e....)

    Era noite, e enfim o destemido e incansável soldado calor obedeceu a ordem de recuar, e as frentes de combate finalmente arrefeciam, literalmente. Não sei por qual razão, mas o abrigo estava fixado na minha cabeça. Indagações como ?Qual é o passado desse abrigo?? ou ?Será que mora alguém dentro dele?? ou ?será que ele é mal assombrado?? ( visto que os japoneses são fanáticos por coisa de espírito, acho que estou ficando com o vício deles...).

    Em frente, a janela. Coloquei me de pé e a abri. Para a minha surpresa, o que vejo? Vejo outra janela aberta! Isso responde pelo menos a uma de minhas indagações; existe alguém morando naquele lugar. Pensando melhor, pode responder outra de minha indagação, o local é mal assombrado...Considerando tal hipótese, hesitei em pular para a outra janela. Mas considerando que a sorte finalmente começava a, pelo menos, sorrir cinicamente pra mim, não fiquei muito compenetrado na hipótese de encontrar qualquer tipo de manifestação sobrenatural. Yurei, yuki-onna, palhaços assassinos, meu corpo está pronto! Nada poderia me deter...

    A não ser a maldita Lei da Gravidade, que nas minhas circunstâncias atuais não poderia desobedecê-la. Por um erro de cálculo quase não alcanço a janela, e aqui estou, às oito horas da noite, em Tokyo, pendurado na janela. Enquanto enforcava-me para transpor aquele obstáculo, orei a todas as divindades para que ninguém me visse. Já tinha problemas suficientes com o clima da região, e problemas com a polícia não seriam convenientes. Provavelmente vão pensar que eu sou um Chikan ( Tarado ) roubando roupas íntimas, no mínimo...

    Usando toda a energia guardada em meu corpo, consigo levantar o meu corpo e entrar pela janela. Não sou obeso, na verdade sou bem magro, porém não nasci com um tipo físico privilegiado. Por isso, esforcei-me muito para entrar pela janela. Sabia que a sorte sorria cinicamente para mim. Ela era uma sádica entidade, entretendo-se com os meus percalços, e estampado em sua face, uma lua minguante, um sorriso perigoso e sedutor. Não só estava cansado agora como estava eu suado...Precisaria achar no dia seguinte algum lugar para tomar banho.

    Mas estava eu dentro daquele misterioso local. Como um portal em jogos de RPG que você consegue abrir apenas depois de coletar ou conseguir realizar certas proezas, tinha eu uma curiosidade infantil sobre aquele local. A lua, minha única companheira naquele recinto, iluminava gentilmente o local (Arigatou!Tsuki-Sama!). Era um quarto vazio, com apenas algumas folhas de papel, em branco, espalhadas pelo chão. Os papéis de parede, ora tomados por algum fungo, outrora simplesmente rasgados, denotavam que aquele lugar estava abandonado. Tal revestimento possuía figuras do Doraemon. Talvez aqui ficasse o local onde bebês ou crianças brincassem.

    Sem achar nada que me interessa-se naquele local, fui até a porta do quarto, localizada a direita da janela. A maçaneta estava fria, no entanto, não tinha sinais de envelhecimento, era como se estivesse nova...Isso prendeu-me por alguns segundos; girando ela percebi que estava também em boas condições.

    Atravessando a porta, encontrei um longo corredor, sendo que o quarto donde tinha acabado de sair era o último de vários outros dispostos naquele. Andando por ele, via nas portas plaquinhas com nomes escritos em Hiragana. Tsukimi, Takanashi, Taneshima, Hiromi...Talvez o nome de crianças que moravam naquele abrigo. Por alguma razão, mesmo com o silêncio quase perturbador, não sentia medo, não sentia calafrios ou qualquer reação típica a locais abandonados. O papel de parede colorido, que decorava o corredor, os hiraganas escritos gentilmente nas plaquinhas...Era possível imaginar crianças correndo no corredor, risadas inocentes, uma criança chorando por causa de um brinquedo que havia quebrado...

    Bem pelo menos assim pensava quando, subitamente, ouvi um barulho de uma porta se abrindo. Devido ao susto, e também por ter virado muito depressa, tropecei em um carrinho de brinquedo. Tal ação foi recompensada com um tombo forte. O baque surdo da minha cabeça batendo no chão, junto com o barulho das minhas costas impactando se contra o chão, preencheu o corredor com dolorosos ruídos, junto com as minhas ofensas dirigidas, provavelmente a senhorita sorte.

    Demorei para recompor-me. Provavelmente formaria um galo. Será que eu ativei uma armadilha? Será que foi um erro vir aqui? Por algum momento, passou pela minha cabeça a história de um hospital abandonado, cuja repórter que apresentava a matéria acabou ficando louca e suicidou-se, assim também o fez o cameraman, poucos dias depois. Pulsava, o hematoma pulsava, não conseguia pensar direito. Embora eu massageasse o local, parecia fútil. Não conseguia raciocinar.

    Por algum momento, pensei ver uma silhueta no final do corredor. Será que era a morte? Pensava nisso enquanto ela ficava parada, bem ali, na minha frente, encarando-me. Não conseguia ver o que era. Ela ficou inerte, observando-me, enquanto estava em agonia devido a bruta pancada. De fato, a pancada foi mais forte que eu pensei. Não estava sangrando, mas comecei a ficar sonolento. A silhueta, que agora parecia de uma mulher, foi ficando disforme, turva. Talvez fosse a sorte, novamente, sorrindo cinicamente para mim, rindo silenciosamente, uma risada sádica e sedutora...

    ----Man is Sleeping now---Please wait warmly?---

    Era quarta-feira. Naquele dia, não fui acordado pela função despertador de meu celular. O sol queimava o meu rosto; luz que provinha de uma janela no início do corredor, próxima à porta pela qual havia entrado nele. Minha cabeça doía. Fiquei preocupado se a queda havia causado dano mais grave, além do hematoma que decorava a parte detrás da minha cabeça.

    Não sabia que horas eram, e, por alguns minutos, repeti o mesmo passatempo, no qual o tédio era a minha única companheira: fiquei fitando o teto daquele corredor, verificando cada detalhe daquele teto, suas rachaduras, buracos, pormenores esculpidos pelo tempo. Notei alguns padrões de rachaduras, também.

    Após esse pouco período de contemplação da arquitetura não ortodoxa japonesa, levantei-me, e olhei os arredores, agora iluminados pelo Sol. Percebi que havia mais portas do que pensava naquele corredor, e que em cada porta, além da plaqueta indicando a respectiva criança que se alojava em determinado quarto, havia um desenho. Notei, portanto, figuras ilustres, que me fazia deduzir o quão antigo era o abrigo: Percebi gravuras do Ultraman, notei inocentes rabiscos da Hello Kitty, e amadores representações do que pensava ser um Pikachu...

    Enquanto apreciava os desenhos, uma figura que preenchia uma porta prendeu a minha atenção. Na plaqueta, estava escrito em rosa o nome Kurano, e na porta sorria para mim o que parecia ser a figura de um bebê. Era simples o desenho. Utilizando o estilo da maioria das crianças japonesas, dois triângulos formavam as pernas, um retângulo representava o tronco, dois triângulos isósceles formando os braços, e um simples círculo formando a cabeça. Não sabia se a criança representada no desenho era um menino ou uma menina, mas pela cor da plaqueta deduzi ser o quarto de uma garota.

    A curiosidade começou a me importunar. Seduzindo cada grama do meu corpo, ela suspirava palavras venenosas ao meu livre arbítrio. Que diabo, pensei. Já não bastasse o tombo quase mortal da noite passada, qual preço eu deveria pagar caso abrisse aquela porta? Novamente, a mesma curiosidade infantil que me tomou ao querer invadir aquele abrigo, possuiu completamente o meu corpo. Eu queria saber o que estava além daquela porta, a qualquer preço.

    Decidido, então, em minha empreitada de desvendar os segredos que me aguardavam; certo em abrir o que poderia ser a minha própria caixa de pandora, fiquei em frente à porta. Coloquei a mão na maçaneta. Hesitei um pouco em girar, pensando novamente em histórias ?verídicas? de terror que me assombraram a cabeça por um tempo. Passando esse período de hesitação, lentamente comecei a girar a maçaneta. Sentia um pingo de suor caminhando pelo rosto, contrastando com a fria maçaneta da porta. Ouvi as engrenagens da porta gritando, quando subitamente...

    Percebi que a porta estava trancada. Sentia uma gota gigante de suor pendurada no meu rosto. Faz tempo que a decepção não me visitava. Não sei ao certo, mas comecei a pensar em Rockman Zero 4...Enfim, visto que na realidade arrombar portas era mais difícil do que parece, e as minhas habilidades de infiltração não eram de ser elogiadas, a palavra ?Fail? aparecia em cada canto de minha mente, zombando de mim, pulando, pulsando.

    Resolvi encostar a cabeça na porta. Ela estava fria, fria o suficiente para esfriar a minha decepção. Havia o dia apenas começado e já estava quente lá fora. Por tempo indeterminado fiquei naquela posição, filosofando sobre coisas inúteis, sobre o dia que para mim não havia começado ainda, sobre como iria batalhar o tédio, sobre o que deveria comer naquele dia. Tinha tarefas, mas já estavam feitas, afazeres que liquidei no dia anterior.

    Cansado de ficar naquela posição pouco confortável, decidi sair daquele local. A minha cabeça ainda doía; precisaria de gelo, o qual não sabia onde comprar por aqui. Percorrendo o corredor, adentrando no quarto por onde havia entrado, saltando pela janela, dessa vez com a devida destreza, pronto, novamente estava eu na minha sauna particular, naquele pequeno quarto 3X3, em Tokyo, no ápice do verão.

    A primeira coisa que eu fiz ao chegar ao meu quarto foi ficar sentado na janela, aproveitando a sombra formada pelo abrigo. Por um tempo, fiquei olhando para a janela donde tinha acabado de saltar, observando o ar misterioso, compenetrado na minha curiosidade, essa que não havia abandonado aquela porta na qual não consegui entrar, imaginando que mistérios e surpresas me aguardam. Minha fértil imaginação ilustrava aquela plaqueta rosa, tomando a forma de um Manekineko, chamando me com suas delicadas patas, convidando-me para explorar aquela desconhecida região.

    Aquele dia estava quente, no entanto, sentia uma brisa percorrendo o espaço formado pelas duas edificações, o abrigo e o meu alojamento. Entre os dois, um espaço de 1,5m de comprimento, acho, ambos separados por uma pequena grade, cuja altura não sabia estimar de onde estava sentado. Naquele espaço já vi gatos, pássaros, e outros animais que não tiver paciência para identificar.

    Cansada de percorrer somente aquele pequeno espaço, comprimido entre os dois prédios, a brisa resolveu fazer-me uma visita, no início, educadamente soprando em intervalos dentro do meu quarto, como que pedindo licença para entrar. Consentindo com a conveniente presença dela, acenei com a cabeça, e ela entrou graciosamente pelo meu quarto, dançando, tateando cada espaço daquele pequeno quarto. Sentia que o calor não seria um formidável oponente aquele dia, pois tinha eu uma grande aliada aquele dia. Ao mesmo tempo em que pensava nisso, sentia um cheiro doce de perfume no ar, e...

    Espere um momento. Perfume? Não possuía perfume. Nunca comprei perfume no Japão. Era um cheiro forte, mas não desagradável. Um aroma rico, do qual meu olfato não conseguia fazer descrição. Creio eu nunca ter sentido aquele aroma, aquele doce aroma, aroma que qualquer pessoa imaginaria ser de uma mulher adulta. Isso, se pudesse descrever aquele aroma, diria que era o aroma de maturidade.

    Quando cheguei ao meu quarto, a primeira coisa que fiz foi ficar sentado na minha janela. Devido a sombra projetada pelo abrigo, meu quarto mesmo pela manhã era muito escuro, então eu não enxergava muita coisa a não ser quando muito próximo a minha janela, o único local não atingido totalmente pela escuridão. Resolvi, portanto, ligar a luz do pequeno abajur que tinha.

    ...

    ...

    ...

    Penso agora em como eu deveria descrever a minha atual situação. O que eu vejo poderia ser somente algo proveniente de algum mangá shonen barato, aqueles que poderiam ser facilmente comprados em uma ?Conbi?. Fiquei pensando que evento eu havia iniciado, quais os pré-requisitos que eu havia acidentalmente cumprido; o script mal planejado que eu agora chamo de destino sorria, maliciosamente, aguardando quais seriam as minhas reações diante daquele acontecimento.

    Deitada, de lado, com as pernas encolhidas, uma silhueta feminina repousava calmamente sobre a minha cama. Respira. Expira...A minha presença não a havia despertado. Via uma garota, mais ou menos de minha altura ( eu tenho 1, 68...), com cabelos prateados ( eu achava que era uma peruca), magra, seios grandes ( sem exagero). Um rosto infantil, que não combinava com o seu corpo adulto, descansava naquele meu travesseiro. Ela estava usando um pijama cor azul, sobre o qual estavam estampados alguns personagens para mim desconhecidos. Eram bonitinhos, pensei.

    Esse foi o início, o início de tudo, tudo o que aconteceu naquele meu pequeno quarto 3X3, em Tokyo, local onde por três meses rendi-me aos prazeres carnais, local onde sucumbi aos meus defeitos, local onde finalmente a redenção estendeu-me os braços, local onde minhas lágrimas, junto com outros fluídos corporais, eternamente mancharam o piso de tatame, daquele pequeno quarto 3X3...

    Fim do Primeiro Capítulo.


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