Atrás de um sorriso

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    18
    Capítulos:

    Capítulo 1

    Lágrimas do Céu

    Hentai, Heterossexualidade, Homossexualidade, Nudez, Sexo, Violência

    Nunca se vira um Inverno tão rigoroso como aquele que despontara em Kyoto. Bátegas de água tamborilavam nos telhados de madeira e lavavam as ruas. Os raros passantes caminhavam apressadamente sob as sombrinhas de laca, chapinhando na água que caia com os zori (1), completamente alheios a um jovem completamente encharcado, com os gi(2) e hakama(3) colados ao corpo. Apertava a sua pouca bagagem contra si, caminhando de cabeça baixa. O cabelo negro como laca, caído para o rosto, gotejava.

    A noite acabara de cair, mas os poucos Ryu(4) que tinha não lhe permitiam arranjar abrigo nem uma refeição decente. Estremeceu sob a chuva gelada e olhou para o céu negro. Fora debaixo desta mesma chuva que asassinara a sua família adoptiva, num acto de desespero.

    Uma espada assassina, numas mãos de criança.

    O passado perseguia-o sempre. Nas noites longas, os pesadelos dos seus crimes surgiam na forma de sangue e morte.

    Poderia alguma vez redimir-se?

    Levou uma mão ao estômago vazio. Não comia há 3 dias. De nada valia bater as portas a pedir abrigo ou uma refeição quente; ninguém se comovia. Naquela época de turbulência que o Japão atravessava, não havia uma alma que arriscasse a deixar passar para lá da sua porta um desconhecido qualquer. Mas quem sabe se ainda teria sorte? Olhando em volta, viu uma casa que lhe parece acolhedora. Bateu. De dentro, ouviu-se uma grande agitação e logo a seguir uma voz.

    -Quem é?

    -Procuro um abrigo, sou apenas um viajante. Abram, por favor.

    Ouviram-se passos e um postigo abriu-se na porta de madeira. Surgiram uns olhos negros e frios, que percorreram toda a sua figura.

    -Bem, ele não está armado-disse o homem para dentro.

    Esperançado, Soujirou levantou a cabeça, olhando o homem. Mas,mal deu de caras com o rosto do jovem, o homem abriu a boca num esgar e, num ápice, fechou o postigo.

    -Saia daqui! Não temos ninguém escondido! Não chame os seus homens!

    Soujirou estava espantado. Porquê aquela reacção? E de que estava ele a falar?

    -Não quero fazer mal nenhum! Só sou um viajante!

    Ninguém voltou a responder. No entanto, ouvia murmúrios dentro da casa.

    "Primeiro enganavam com venda de medicamentos, agora disfarçam-se de mendigos...eles são manhosos demais!"

    Encolhendo os ombros, voltou as costas, desanimado e gelado. Era demasiado azar terem-no confundido com qualquer um, quando estava quase a conseguir. O homem mudara de atitude ao ver o seu rosto. Pareceria-se assim tanto com um monstro? Era verdade que não cortava o cabelo há meses e não se lavava há uns tempos...não tinha então outro remédio senão passar a noite ao relento, sob um abrigo qualquer. Na manhã seguinte retomaria o seu caminho, caso não morresse de frio e à míngua. Continuando a andar, avistou uma velha ponte arruinada. Havia espaço suficiente para se abrigar sob ela. Podia evitar ficar mais molhado do que estava, mas aquele pobre abrigo não lhe aliviou a fome nem o frio. A cabeça pesava-lhe. Encostando-se a pedra fria, cedeu ao cansaço e adormeceu.

    (1) As sandálias que os japoneses usavam

    (2) O quimono de cima

    (3) As calças largas

    (4) Moeda antiga que foi substituida pelo yene após a Restauração Meiji.


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