Recordações

Tempo estimado de leitura: 15 minutos

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    Capítulos:

    Capítulo 2

    II

    Spoiler

    História escrita para a Semana Shiryu de Dragão e para o Desafio Epistolário, desafios promovidos pela comunidade Saint Seiya Super Fics Journal.

    Ignorei o fato de Hyoga desconhecer a existência de Shoryu.

    As datas dos eventos foram estimadas.

    Sobre a cronologia adotada: o Next Dimension se passa em meados de 1990, portanto considerei que Shoryu foi encontrado por Shunrei nesse ano. No Ômega, Ryuho tinha 13 anos nos primeiros eventos do anime, segundo sua ficha oficial no site da Toei. Sendo assim, considerei que hoje ele tem 14 anos e Shoryu, 23.

    Os personagens de Saint Seiya pertencem ao tio Kurumada. Todos os demais são meus, não ganho nada com eles, mas me divirto muito.

    RECORDAÇÕES

    Chiisana Hana

    Capítulo II

    Ryuho entrou no quarto acompanhado por Shoryu, que tinha acabado de chegar em casa para ver os pais.

    ? Mamãe falou que você estava aqui, pai ? disse Shoryu. Estava alto e forte, e embora não tivesse se tornado cavaleiro, o pai estimulou nele o gosto pelos esportes. Na escola, lutou karatê e praticou natação. Quando foi para a faculdade, continuou praticando seus esportes favoritos. Cursou Engenharia Agronômica em Nanchang, localizada a pouco mais de cem quilômetros de Rozan. No começo, ia e voltava para casa todos os dias. Mais tarde, quando conseguiu seu primeiro estágio, teve de ficar morando lá e só vinha para casa nos finais de semana. Agora, com um emprego e a especialização, as visitas ficaram ainda mais escassas. Ele nunca tinha apresentado manifestações de cosmo e, internamente, Shiryu sentia-se grato, pois por conta disso ele pôde ter uma vida normal. Ryuho, ao contrário, mostrou seu destino assim que nasceu. O garoto transformou-se num cavaleiro e entrou para a história como o próprio pai fizera em seu tempo. Passou por todo o sofrimento e desespero das guerras, mas agora, felizmente, levava uma vida de adolescente normal, frequentando a escola e tendo atividades comuns, namorando, "curtindo", como eles diziam.

    ? Olá, meus filhos ? cumprimentou Shiryu, orgulhoso dos dois. Um era agrônomo, o outro, um cavaleiro admirável que agora sonhava em ser médico como o "tio" Shun.

    Shoryu abraçou o pai. Ainda era difícil acreditar que ele tinha se curado. Acompanhou de perto todo o sofrimento dele e da mãe no começo da 'doença' e, apesar da pouca idade, ajudou Shunrei a cuidar tanto de Shiryu quanto de Ryuho, que ainda era um bebê na época. Com apenas dez anos, ele praticamente virou o homem da casa e assumiu responsabilidades grandes para sua pouca idade. Mais tarde, quando foi aprovado no vestibular, coincidiu de ser na mesma época em que Ryuho foi mandado para a escola de cavaleiros. Quase desistiu da faculdade para que a mãe não tivesse de cuidar sozinha de Shiryu, mas foi ela mesma quem insistiu para que ele fosse estudar, alegando que Shiryu jamais o perdoaria se ele deixasse isso de lado. Acabou indo, apesar de sentir o coração partir-se a cada dia. Na maioria das vezes, só chegava de Nanchang à noite e muito cansado para ajudar a mãe como gostaria. Quando precisou mudar-se de vez para lá, pensou que não ia aguentar a saudade da família, mas mais uma vez foi Shunrei quem o incentivou a ir em frente.

    Não ficou sabendo quando o irmão foi à batalha. Soube apenas quando tudo já tinha acabado e o próprio Ryuho contou-lhe suas façanhas. A princípio, ficou chateado, sentiu-se excluído. Depois entendeu que o irmão e a mãe fecharam-se em segredo para preservá-lo.

    ? O que estava fazendo? ? Ryuho perguntou ao pai, sentando-se ao lado dele.

    ? Eu estava vendo algumas lembranças ? disse Shiryu, apontando a caixa. Os dois rapazes imediatamente se interessaram pelo conteúdo dela.

    ? Isso é meu cabelo? ? Shoryu perguntou ao ver a mechinha num saquinho de tule com seu nome bordado à mão.

    ? É ? Shiryu respondeu. ? Sua mãe guardou.

    Shoryu riu.

    ? Eu vi umas fotos daquele meu penteado... hum... digamos, duvidoso.

    Os três caíram na gargalhada.

    ? É, eu sei, Shunrei disse que era moda naquela época, mas há controvérsias... eu acho que, de certa forma, ela tratava você como se fosse um boneco. Éramos muito novos quando você chegou em nossas vidas. Não estávamos preparados para um filho quando Shunrei o encontrou, mas queríamos muito ficar com você e assim o fizemos.

    ? Eu sei, pai. Sou muito grato por terem ficado comigo.

    ? E ainda bem que ela desistiu logo daquele seu penteado ? Shiryu disse, rindo, enquanto tentava não se emocionar com a lembrança. Recordava-se tão bem daquele dia. Shunrei tinha ido colher ervas medicinais no bosque e voltou com um bebê que aparentava ter apenas algumas horas de nascido, pois ainda tinha resquícios do parto.

    Shiryu lembrou-se também do medo que sentiu. De uma hora para outra, sem qualquer preparação, ele e Shunrei tornaram-se pais. Não tiveram nove meses para se prepararem, num dia eram dois, no outro eram três. E o que fazer?

    Ele tinha ficado aterrorizado. Ela, entretanto, não demonstrou nenhum receio, tinha só amor e vontade de cuidar da criança. Tanto amor que Shiryu acabou imerso nos sentimentos dela, na coragem desmedida que ela tinha para enfrentar o que a vida lhe oferecia. Ele era o homem destemido nas batalhas, mas tinha tanto receio quando se tratava da vida... Ela não. Ela enfrentava tudo de peito aberto, com coragem, otimismo e serenidade.

    Os primeiros dias do bebê em casa tinham sido terríveis. Eles não sabiam lidar direito com ele, especialmente durante a noite, quando chorava praticamente o tempo inteiro. Perdiam tempo preparando a mamadeira e, enquanto isso, ele se esgoelava. Com o passar dos dias, entretanto, foram conhecendo o bebê, criando uma rotina. Habituaram-se a deixar a comida pronta e apenas aquecer quando fosse a hora, o que melhorou bastante as coisas.

    Shunrei deu ao menino o nome de Shoryu em homenagem ao golpe do pai. Ela assumiu o papel de mãe imediatamente, entretanto, para Shiryu a coisa foi acontecendo aos poucos. Ajudava a esposa no que podia, mas ainda não se sentia pai de Shoryu. Só conseguiu realmente experimentar o sentimento de paternidade três meses depois, quando o bebê teve uma gripe. Não tinha sido nada sério, mas ver o pequenino sofrendo, sem conseguir respirar direito, fez o cavaleiro perceber que faria qualquer coisa para protegê-lo. Só então ele conseguiu fazer algo que vinha adiando: escrever para contar a novidade aos amigos.

    Lamentava não ter guardado as cartas, mas lembrava-se que Seiya respondeu com uma carta cheia de exclamações, com frases do tipo "cara, que maneiro!", "nossa, um bebê!", "só acredito vendo!". Mais comedido em sua resposta, Hyoga parabenizou o casal, mas também falou sobre a responsabilidade de tornar-se pai. Shun mostrou-se encantado, pediu fotos do bebê e prometeu uma visita. Saori mandou-lhes felicitações e um presente muito caro. De Ikki, como sempre, não se sabia o paradeiro. No entanto, semanas depois, ele apareceu em Rozan junto com os outros amigos e Saori para visitar o bebê. Mantinha o discurso de não gostar de andar em bando e chegou a acrescentar que não gostava de bebês, mas em poucos minutos rendeu-se às gracinhas de Shoryu. Tinha sido um final de semana maravilhoso, onde ele pôde matar a saudade dos amigos e compartilhar com eles a alegria de ser pai. Havia uma foto tirada nesse dia e Shiryu perguntava-se onde ela estaria. Certamente Shunrei sabia, perguntaria a ela depois.

    ? Quando você foi para a escola já usava um penteado de gente normal! ? Shiryu disse a Shoryu, tentando afastar as lembranças.

    Os três riram juntos do comentário.

    ? Felizmente! ? disse Shoryu, que agora tinha cabelos compridos como os do pai. ? Já pensou no bullying que eu ia sofrer?

    ? Aqui está a minha ? Ryuho falou, pegando o saquinho com sua mecha de cabelo.

    ? Para sua sorte ? Shoryu disse ?, quando você nasceu, mamãe já havia abandonado os penteados exóticos.

    Novamente os três riram.

    ? E essas cartas, pai? ? Ryuho perguntou ao ver o maço de papeis envelhecidos.

    ? Eu as escrevi para sua mãe. Estava vendo você lá com o telefone, mandando mensagens... Lembrei-me que na minha época era tudo por carta e vim relê-las.

    ? Nossa, e mamãe guardou tudo? ? Shoryu questionou.

    ? Pois é. Na verdade, eu não enviei todas. Algumas foram entregues anos depois de escritas.

    Shiryu pegou mais uma das cartas.

    ? A última dessa época ? ele disse e mostrou o papel aos filhos.

    "21 de julho de 1990

    A guerra acabou, Shunrei.

    Nunca achei que sairia do inferno com vida. Nunca. Entretanto, estou aqui num hospital, escrevendo para você. É tão surreal.

    Saori acha que finalmente teremos muitos anos de paz, que quando a guerra recomeçar, todos nós já teremos morrido de velhice. Assim espero, meu bem. Tenho planos para nós dois, Shunrei... Planos que envolvem a troca de alianças... Espero que também pense nisso.

    Não sei se terei coragem de enviar essa carta. Já são tantas que escrevo e não envio... Seja como for, eu escrevo, pois confio que um dia você lerá todas elas. Quando esse dia chegar, você já saberá o quanto eu a amo, não terei que sufocar meus sentimentos. Nesse dia, nós já seremos uma família, seremos felizes, teremos filhos...

    Você está pronta para o nosso futuro?"

    ? Acho muito bonito esse amor que vocês têm há tanto tempo ? Shoryu disse, interrompendo a leitura. Estava visivelmente emocionado. ? Espero que um dia eu tenha a sorte de encontrar um amor assim.

    ? Você vai encontrar, filho ? Shiryu respondeu, dando um tapinha nas costas dele.

    ? Eu acho que já tive essa sorte... ? murmurou Ryuho, corando ligeiramente. ? O que sinto pela Yuna é muito especial...

    ? Sei que é ? Shiryu disse. ? Mas de vez em quando deixe o smartphone de lado e escreva uma carta, um bilhete, alguma coisa à mão. Acho que ela vai gostar de receber.

    ? Ah, pai, é que mandar carta não é prático, muito menos rápido ? justificou-se o garoto.

    ? Então tá, continue com suas coisas modernas, mas se lembre de que, no futuro, vocês não vão ter o que olhar e relembrar. Às vezes a memória, seja a nossa, seja a dos aparelhos, é insuficiente. É bom ter algo palpável, filho.

    ? Vou me lembrar disso, pai ? Ryuho prometeu.

    ? Meninos ? Shunrei disse ao entrar no quarto. Falava num tom sereno, apesar da expressão de dor que exibia. Com uma das mãos apoiava-se à porta, mantendo a outra sobre a barriga. ? Lamento interrompê-los, mas a bolsa estourou.

    ? Vamos lá, pai ? disse Ryuho. ? Tem algo bem palpável chegando aí.

    ? Pois é ? concordou Shoryu. ? Parece que nosso irmãozinho não gostou de ser excluído da sessão recordação.

    ? É... ? Shiryu disse, enquanto gentilmente amparava a esposa.

    Ele e os dois filhos levaram Shunrei ao hospital onde, horas depois, nasceu Tetsuya, que já tinha um saquinho de tule pronto para receber uma mecha de seu cabelo.

    FIM


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